Em Porto Alegre, a Nuwa surge como um lugar para fortalecer e unir mulheres nos negócios

Maitê Vallejos - 1 jan 2019
Você é uma empresa que fala com outras empresas. Mas já parou para pensar que, antes de tudo, vocês são duas pessoas buscando manter um diálogo?
Maitê Vallejos - 1 jan 2019
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Abrir caminhos para que mais mulheres se aproximem e descubram todo o seu potencial para criar e desenvolver novas ideias e negócios. Essa é a missão da Nuwa, um clube de negócios e coworking só para mulheres. O nome faz referência a uma divindade da mitologia chinesa, responsável por organizar o caos, e também representa a ancestralidade e o poder femininos. Inaugurado em agosto de 2018 em Porto Alegre, o espaço floresce sob a liderança de Gabriela Teló, 27, e Gabriela Stragliotto, 27, ambas publicitárias de formação. Colegas durante a faculdade, elas costumavam falar brincando: “Eu abriria um negócio contigo” e, então, quase dez anos depois, a Nuwa se tornou a história de empreendedorismo das duas.

A casa, um imóvel de 1950, foi reformada para abrigar a Nuwa em Porto Alegre.

Com experiências bem diferentes no mercado de trabalho, a trajetória de cada uma acabou convergindo no mesmo ideal. Gabi S. criou o departamento de Marketing da empresa da família, no ramo do agronegócio, no Mato Grosso, e sempre viu o empreendedorismo como o modelo em que gostaria de trabalhar, já que teve este exemplo desde cedo. Por outro lado, começou a questionar a estrutura da indústria tradicional e o que fazia sentido para si mesma. “Comecei a pensar mais sobre como liderar de um jeito diferente, levando em consideração as questões do feminino e, em um processo de coaching, entendi que queria ajudar outras mulheres também”, conta.

Já Gabi T., atuava com pesquisa de mercado, mas não se encaixou em empresas tradicionais e criou a Zest, uma rede de profissionais com foco em pesquisa e conteúdo. No meio de um estudo sobre como é ser freelancer no Brasil, começou a se envolver no universo do feminino e a se conectar com as dificuldades e insights que vinham das entrevistas com outras meninas. Assim, trouxe para Porto Alegre o Ladies, Wine & Design (movimento que promove o encontro entre mulheres criativas para falar sobre carreira) e foi percebendo que havia algo em comum entre todas elas: “Vi que todas nós sentíamos a mesma coisa: problemas com autoconfiança, dificuldade de vender nossos serviços, diferença salarial e menos espaço no mercado de trabalho, se comparado aos homens”.

Conversando sobre o assunto em paralelo, as duas começaram a buscar referências de empreendimentos que ainda não existiam no Brasil e que pudessem suprir essa falta, ajudando a melhorar a realidade de outras mulheres no mundo dos negócios. Em novembro de 2017, decidiram que era o momento de materializar essa vontade.

O CONTEÚDO É A BASE PARA FORTALECER A REDE

Um dos lugares que inspiraram a criação da Nuwa foi o The Wing, em Nova York, pelo formato de coworking + comunidade. Mas ainda não era o suficiente. Sentiam também a necessidade de disponibilizar mais informação e espaço para debates em um ambiente acessível (a casa oferece espaço para mães que estão amamentando, por exemplo), como um braço de conteúdo mesmo.

Assim, chegaram ao tripé de elementos que pulam na tela assim que se abre o site: content, community & work base (“conteúdo, comunidade & lugar de trabalho”). O content tem um tema central todo o mês (em dezembro foi economia, por exemplo) e, a partir disso, rolam bate-papos e palestras sobre a temática, que são desdobrados em diferentes formatos na plataforma online, através de vídeos, textos e podcasts. Community é a rede de apoio que se forma com as assinantes e todas que se envolvem com a Nuwa de alguma forma, seja online ou presencialmente. Já work base é o espaço de trabalho em si.

Para viabilizar o projeto financeiramente, as sócias fizeram um pitch para convencer um investidor que faz parte da família para levantar 500 mil reais. Não foi fácil, contam, mas, segundo Gabi S., elas fecharam um acordo com data para terminar e prazo para retorno do investimento. “Da ideia até a concretização foi tudo muito rápido. Encontramos uma casa de 1950, alugamos, reformamos, realizamos o projeto de arquitetura e desenvolvemos a marca. Todas as etapas contratando mulheres, com exceção da obra, porque não bateu com o orçamento”, conta ela.

A Nuwa conta com estações de trabalho, biblioteca, espaço para eventos e para amamentação.

No dia 31 de julho de 2018 a Nuwa abria as portas, com uma equipe 100% feminina: Jacqueline Glat (redes sociais), Isabela Daudt (designer), Brunna Radaelli (coordenadora de conteúdo) e as parceiras Jocelem Fernandes (socióloga, responsável pelo grupo de estudos), Naíma Lorber (guia de meditação) e Dulce Ribeiro (coach). Para fazer parte da rede, existem três planos disponíveis: o Content Club custa 40 reais por mês e dá acesso a todo o conteúdo (é ideal para mulheres que não moram onde a Nuwa tem espaço físico); o Social Club custa 240 reais mensais e, além de dar acesso ao conteúdo e aos eventos, permite à associada trabalhar uma vez por semana no local; por fim, o Work Base  custa 540 reais por mês, oferecendo todos os benefícios dos anteriores mas com acesso livre à casa.

Para tabelar os preços, fizeram uma pesquisa que levou em consideração a demanda de mercado e o custo de vida na capital gaúcha. Gabi T. fala sobre isso:

“Há um grande tabu com relação a dinheiro. Muita gente ainda espera que negócios com algum viés social não custem nada ou custem pouco, mas não se pensa em todo o valor que está por trás”

Mais do que um espaço ou um clube, a Nuwa se coloca como um movimento para estimular as mulheres a desconstruir o que aprenderam sobre o posicionamento feminino dentro do mercado — e que, na visão das sócias, está enraizado. “Queremos que elas se sintam acolhidas neste espaço para serem vulneráveis, se expressarem mais, falarem mais e questionarem mais, porque se tem um homem na sala, provavelmente vamos medir a forma como nos comunicamos e, inclusive, como nos vestimos”, diz Gabi T.

NÃO É SOBRE EXCLUIR HOMENS, MAS SOBRE FORTALECER MULHERES

Falando nisso, homens não podem entrar no coworking, com exceção de uma sala de reuniões, que é acessada por uma porta lateral: “Não é uma questão de excluir os homens, mas de compensar o tempo em que não tivemos esse modelo de educação de igual pra igual e fomos muito podadas. A ideia é se fortalecer para crescer junto com eles depois”, prossegue a empreendedora.

Nina Silva (de cabelo black power, à frente) foi à Nuwa falar de afroempreendedorismo em um dos seis eventos organizados este ano.

Segundo as sócias, uma das formas de fazer a mudança de paradigma é dar poder a outras mulheres dentro da rede de forma financeira, por exemplo, abrindo mais discussões sobre a capacidade de gerar renda que todas têm. Gabi T. também fala sobre isso: “Tenho uma sensação de que o mercado não leva os negócios femininos a sério. Quando falamos sobre empreendedorismo as pessoas ainda ouvem de maneira pejorativa, principalmente em inovação. É preciso mudar isso”.

Para ajudar tanto no debate como na ação, a Nuwa busca trazer convidadas que já representam a transformação que elas querem trazer para o mundo. Em dezembro, como o tema do mês era economia, trouxeram Nina Silva, executiva da área de tecnologia há mais de 16 anos e uma das fundadoras do Movimento Black Money no Brasil, que busca fomentar o ecossistema afroempreendedor.

Para 2019, as duas Gabrielas já estão montando o esqueleto dos próximos conteúdos, com outros temas importantes para o florescimento feminino, como o gerenciamento de tempo, a relação com o corpo e inteligência emocional. No mês de fevereiro, pretendem lançar uma campanha totalmente voltada para o plano Content Club, com o objetivo de atingir mulheres de todo o país. (É quando pretendem aumentar o número de associadas pagantes, que hoje são dez.)

EXISTIR NÃO É SUFICIENTE. TUDO É UMA ATITUDE POLÍTICA

Ainda em MVP de certa forma, a Nuwa segue em construção e está aberta a mudanças conforme a demanda for surgindo. No cenário ideal, as duas querem expandir o espaço físico para São Paulo em 2019, pois acreditam que o movimento de mulheres nos negócios já está avançando. 

Ambas as sócias têm consciência da responsabilidade política que o negócio delas traz, já que representam e estão impulsionando a potência do feminino em uma sociedade em que o conservadorismo está em ascensão: “Sabemos que existir não é suficiente, precisamos tornar a casa e os empreendimentos que estão aqui viáveis a longo prazo”, diz Gabi S. Crescer, manter e alargar a rede de negócios entre mulheres: esse parece ser o grande grande desafio da Nuwa, e de todas as mulheres.

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: Nuwa
  • O que faz: Clube de negócios e coworking para mulheres
  • Sócio(s): Gabriela Teló e Gabriela Stragliotto
  • Funcionários: 8 (incluindo as sócias)
  • Sede: Porto Alegre
  • Início das atividades: agosto de 2018
  • Investimento inicial: R$ 500.000
  • Faturamento: Já realizaram seis eventos e têm 10 associadas
  • Contato: [email protected]
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