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A missão da Hype60+: abrir os olhos do mundo para o público (e o mercado) sênior

Bruno Leuzinger - 14 jun 2018
Layla Vallias, sócia-fundadora da Hype60+, consultoria com foco em consumidores maduros (foto: Rafael Ribeiro)
Bruno Leuzinger - 14 jun 2018
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Layla Vallias tem apenas 27 anos e uma “alma velha”, como sempre escutou de todo mundo. Aos ouvidos dela, certamente soa como elogio. Casou-se cedo, aos 19, destoando das jovens de sua geração. Porém, e ao contrário das mulheres de antigamente, ficar em casa nunca foi uma alternativa.

Em 2011, Layla e o marido trocaram Belo Horizonte por São Paulo, onde ela se formou em marketing. “Fui para o marketing porque queria entender de ‘gente’, tinha paixão por antropologia. Ao mesmo tempo, vim de uma família de empreendedores. Sempre soube que queria empreender, mas não sabia com o quê.”

O pai de Layla é um empresário aposentado e dono de uma holding de importação e exportação onde os oito filhos iniciaram cedo suas vidas profissionais, começando sempre de baixo, distribuindo a correspondência ou cuidando do almoxarifado, por exemplo (“trabalho sempre foi o grande valor da minha família”); os sete irmãos de Layla continuam na empresa familiar.

Ela, por sua vez, vem trilhando seu próprio caminho. Layla é sócia-fundadora da Hype60+, uma consultoria de marketing especializada no público sênior, fundada em 2016 para desbravar, repercutir e potencializar o mercado de consumidores maduros. A startup é uma das residentes do Civi-co, o polo de negócios de impacto cívico-social instalado no bairro de Pinheiros, em São Paulo.

Esse é um mercado ainda largamente inexplorado no país. “Na Hype60+, a gente diz que envelhecer é uma novidade no Brasil”, brinca Layla. Em 2050, ela conta, o Brasil será o sexto “país mais velho” do mundo. Mesmo assim, por miopia ou preconceito, a população dos 60+ parece que só é enxergada pelo viés negativo.

“Os três grandes drives do envelhecimento são: tempo, liberdade e dinheiro. Eles têm tempo para curtir a vida, liberdade para escolher o que querem e dinheiro para pagar por tudo isso. A provocação é: por que as marcas ficam focando em millenials quando há uma galera com grana e vontade de consumir?”

Seus olhos abriram para o mercado de longevidade quando ela estava em Nova York, em 2015, fazendo uma especialização na NYU. A vontade de se engajar com esse público era antiga, mas a jovem pensava que seria por meio de uma ONG ou voluntariado. Até que, conversando com uma colega de curso, de Cingapura, ouviu: Layla, você não imagina a Revolução Prateada que está acontecendo na Ásia!

A revolução, claro, tem alcance global. À medida que a expectativa de vida sobe, pipoca um sem-número de possibilidades de negócios com foco numa parcela da sociedade que cresce exponencialmente. De volta ao Brasil, Layla foi trabalhar na Endeavor, onde conheceu Bete Marin, outra apaixonada pelo tema. Eventualmente, descobriram o interesse em comum – e juntas decidiram fundar a Hype60+.

Desde a sua origem, a empresa foi pensada em um modelo de gestão horizontal, descentralizada, em que todos são sócios e se juntam por projeto, sem hierarquia ou vínculo empregatício. Hoje, essa rede multidisciplinar de sócios-colaboradores (recrutados e engajados a partir do início de 2017) reúne dez pessoas, incluindo três “profissionais incríveis” com mais de 60 anos:

“Uma das nossas regras de ouro é contar sempre com uma pessoa de mais de 60 em cada projeto, para que seja realmente ‘de’ e ‘para’, e não aquela coisa enviesada de uma menina de 27 achando que sabe a realidade de alguém de 60.”

Empreender, assim como envelhecer, é um constante aprendizado. Ao longo de 2017, a turma da Hype60+ quebrou a cabeça, errando e aprendendo muito. “Tudo que a gente imaginava que sabia, em meados de 2016, quando estávamos pensando a Hype60+… Tudo mudou. Imaginávamos que uma certa comunicação iria funcionar, uma foto, uma chamada… Fomos errando, errando, errando.”

A empresa teve clientes desde o começo, mas inicialmente eram negócios de menor porte. Para fincar as raízes, Layla e o time bateram em muitas portas. Ouviram muitos “nãos” e uma explicação (ou medo) recorrente: “As pessoas diziam: ‘Legal, o seu discurso é lindo… Mas eu não quero envelhecer a minha marca’.”

A equipe da Hype60+: derrubando mitos sobre o público maduro (crédito: Nellie Solitrenick)

Uma virada-de-chave aconteceu em agosto de 2017, com a conquista do primeiro grande cliente. A Unibes Cultural queria lançar uma programação para o público sênior, e a Hype60+ entrou para dar o tom e fazer o trabalho de branding. Layla conta que a comunicação do lançamento foi toda baseada em ferramentas digitais:

“Diziam que ia dar errado, mas a gente acreditava muito que daria certo. Fizemos a comunicação com e-mail marketing e Facebook. E foi um sucesso: lotamos o teatro com 300 pessoas, 60% delas com mais de 60 anos. As pessoas acham que esse público não está na internet, mas eles estão sim!”

Naquele evento da Unibes, os palestrantes selecionados pela Hype60+ ajudaram a desfazer outras noções “empoeiradas”. A antropóloga Mirian Goldenberg explicou como as mulheres maduras de hoje, com os filhos já criados, desfrutam a sua liberdade. O motoqueiro Miragaia René Angelino dividiu com a plateia as suas aventuras – aos 82 anos (hoje tem 84), ele rodou a África de moto, sozinho.

Desmontar o preconceito de idade – o termo é “ageísmo” – faz parte da missão. Ao longo de 2017, a Hype60+ conquistou outros clientes, traçou um planejamento estratégico e abriu 2018 a todo vapor: no Civi-co desde janeiro, a consultoria acaba de fechar um projeto com o Grupo DPSP (Drogaria São Paulo e Pacheco), uma parceria com a construtora Tecnisa e está em conversas com uma companhia aérea.

“Tem sido um turbilhão! Com toda essa efervescência do Civi-co, toda essa gente fera, do bem, somada à potência do nosso time para ir atrás de negócios e de fazer diferente, nós realmente conseguimos acelerar muito neste primeiro trimestre!”

Cheia de fôlego e propósito, a equipe da Hype60+ vem desdobrando novas iniciativas. Com apoio do instituto de pesquisa digital MindMiners, lançou uma enquete para gerar dados e tangibilizar o tamanho e o potencial de impacto desse mercado. O questionário online contabilizou mais de 800 respondentes, dos quais 57% se queixaram da dificuldade de achar produtos pensados para eles.

“O setor de beleza, por exemplo: só existe um produto para cabelos brancos no Brasil, e é caro”, diz Layla. “Enquanto isso, tem um grupo no Facebook chamado Projeto Grisalho que já reúne quase 30 mil mulheres conversando diariamente sobre o tema!”

Aos poucos, porém, os empreendedores começam a se dar conta desse gap. Entre janeiro e março, em parceria com a Pipe Social (outra residente do Civi-co), a Hype60+ rodou um cadastro colaborativo para dimensionar e impulsionar o ecossistema. O número de inscritos surpreendeu: 141 startups se cadastraram, e três delas foram selecionadas para um período de aceleração com apoio da rede global Aging2.0 e da Ativen, aceleradora de negócios do setor de envelhecimento.

Agora, a Hype60+ planeja uma pesquisa ainda mais ambiciosa, abarcando cinco cidades e critérios quantitativos e qualitativos. Layla garante: será um estudo inédito, o maior já realizado no país sobre hábitos de consumo e comportamento dos 60+. Fomentar essa cultura gerontológica é essencial para tornar o Brasil cada vez mais inclusivo e adaptado ao futuro. Para além dos 60+, existe o grupo dos chamados “superidosos”, os 80+, que crescem em velocidade ainda maior.

“Hoje, nós já vamos viver 100 anos”, alerta Layla. “Se você se aposentar aos 60, o que vai fazer com os próximos 40 anos? Vamos precisar de calçadas melhores, casas adaptadas, universidades abertas à terceira idade… Existe um mundo de oportunidades! Cada vez que estudo mais, fico mais empolgada!”

Com empolgação e ideias novas, Layla e a Hype60+ prometem revolucionar o nosso olhar para o público maduro, dando outra dimensão àquela lição que todos aprendem na infância, mas poucos aplicam na prática: respeite os mais velhos.

 

 

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