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A Rededots nasceu como um grupo no Facebook. Agora, vai se tornar um marketplace de impacto social

Bruno Leuzinger - 21 jun 2018
Kuki Bailly, da Rededots: um post pós-demissão deu origem a uma enorme comunidade (foto: Gabriel Mayor)
Bruno Leuzinger - 21 jun 2018
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Conectar pessoas é “uma arte” para Kuki Bailly. Uma habilidade natural que ela foi aprimorando ao longo de uma carreira em design no universo da publicidade.

“Tenho um network muito grande. Gosto de cultivar relações, criar oportunidades, então as agências começaram a me pedir indicações”, diz Kuki, uma paulistana filha de mãe chinesa e pai francês. Headhunters recorriam às suas dicas para preencher cargos sêniores, sem que ela ganhasse um centavo. “Virei uma consultora informal.”

Foi esse talento para tecer redes que, mais tarde, impulsionou Kuki (Claudine, no RG) a criar a Rededots, uma comunidade solidária fundada em 2015 como um grupo no Facebook para ajudar pessoas gerando encontros, conexões e oportunidades de negócios.

A Rededots nasceu de uma demissão: depois de um ano à frente de uma área de inovação de conceitos da Natura, mapeando tendências e viajando a Nova York todo mês a trabalho, Kuki viu-se de repente no “olho da rua”. Mais uma a engrossar as estatísticas, que já batiam então em 12 milhões de desempregados.

Havia, porém, uma inquietude mais antiga em relação a trabalho. Uma insatisfação que vinha desde o começo da trajetória profissional, em Paris (onde Kuki viveu dez anos e se formou em artes gráficas). “Eu era muito boa no que fazia, mas achava uma coisa oca: putz, vou ficar desenhando embalagem de iogurte?! Fala sério!

De volta a São Paulo, ainda nos anos 1990, Kuki virou diretora de criação e seguiu “pulando” entre empregos, vendo a vida avançar. Em 2005, mudou-se para Xangai, onde trabalhou, empreendeu. O segundo retorno ao Brasil, em 2009, coincidiu com o nascimento de sua filha e o sentimento de urgência de encontrar um propósito.

“Procurei entender o que era impacto, comecei a ler sobre o [Muhammad] Yunus. Aí as coisas começaram a fazer sentido na minha cabeça… Mas eu ainda não sabia como fazer, com quem conversar. Me sentia uma formiga no meio do mundo.”

Nos anos seguintes, enquanto acalentava em paralelo essa busca por propósito, Kuki tentou se encaixar tanto no ambiente corporativo quanto no terceiro setor, sem sucesso: para ela, um era quadrado demais; o outro, muito lento. Até aceitar a vaga na Natura. “Aí, me mandaram embora. E foi então que eu fiz o post no Facebook.”

Dizem que no olho do furacão o céu é claro, um ponto de calmaria bem no centro da tormenta. Demitida em 2015, num contexto de crise econômica, Kuki encontrou um momento de respiro e lucidez para lançar mão da rede social de Mark Zuckerberg e propor que as pessoas abrissem suas agendas para ajudar umas às outras. Simples assim.

Curioso que, depois de ser uma early adopter quando vivia na China, Kuki tinha se cansado do Face e ficado dois anos sem acessar a rede. Só voltou por demanda de trabalho, e aí preferiu criar um perfil disfarçado, com o nome escrito em ideogramas chineses. Aos poucos, havia sido descoberta (e adicionada) por alguns amigos.

“Quando eu criei o grupo da Rededots, deviam ter umas 150 pessoas no meu perfil, foram elas que viram o meu post. Viralizou por causa do momento, as pessoas empatizaram com a ideia, mas eu não tinha pretensão de impactar tanta gente!”

Em um mês, o grupo fechado (em que os novos membros entram a convite de quem já está dentro) tinha 3.500 pessoas – depois 7 mil, 15 mil… “Lembro que em 8 de julho de 2016, um ano depois, havia 30 mil pessoas. Aí, o bicho pegou: comecei a enfrentar os haters, a moderar e a cuidar de tudo de forma rígida.”

Mesmo sem saber, Kuki havia criado uma rede exponencial – algo que já vinha há tempos no radar do MIT (Massachusetts Institute of Technology), segundo uma amiga estudiosa do futuro do trabalho que faz parte da Rededots.

Kuki abraçou o projeto como missão. Estudou sobre organizações exponenciais e começou a escutar sua comunidade. Percebeu que havia um enorme volume de pessoas transformando o plano B em plano A (para pagar as contas ou por estar infeliz no trabalho). Gente esculpindo, bordando, cozinhando, se virando. Empreendendo, enfim. E fazendo negócios por meio do grupo que ela criou.

“Como empreender se você não tem audiência? Se não tem público? Na Rededots, você tem público para tudo. Professores encontram alunos, terapeutas encontram pacientes, quem não sabe cozinhar encontra seu bolo preferido. Todos precisam de algo que alguém sabe fazer, e isso gera renda para milhares de famílias… A rede se autossustenta, se retroalimenta.”

Um crowdfunding, em 2016, permitiu juntar a grana necessária para pagar contador, tirar o CNPJ, registrar a marca e contratar um escritório para planejar o modelo de negócio e projetar os próximos cinco anos. “Com isso, fiz um pitch e consegui um investidor-anjo. Agora, vamos para a segunda rodada de investimentos.”

A monetização começará a partir de 25 de junho, por meio de um novo marketplace que possibilitará transações com boleto e cartão (via Moip, empresa de soluções de pagamento). A expectativa é levar a audiência colossal de microempreendedores da Rededots no Facebook para a plataforma, cobrando-se uma porcentagem que cabe no bolso.

“Nosso posicionamento é ser um projeto de impacto social, então a comissão será a mais baixa do mercado. Hoje, um marketplace comum cobra 15%. A nossa será de apenas 7% e 3% para o Moip.”

O grupo de Facebook, claro, seguirá firme e forte. Hoje, os dotsters (como eles se denominam) somam mais de 236 mil pessoas apenas em São Paulo. É gente de todas as classes, perfis e campos de atividades (as mulheres respondem por quase 70% das postagens). Uma das regras é que você precisa se apresentar sempre como pessoa física – a PJ fica de fora. A medida serve para instigar o público a se despir dos seus títulos e papéis sociais.

“As pessoas da Rededots se clusterizam entre elas, fazem amizades, se encontram no mundo real. Fornecedores viram amigos. Por quê? Porque de certa forma eu exijo essa relação: você compra porque empatizou com a pessoa. É um pouco como uma cidade do interior. Digo que o nosso feed do Facebook é o coreto da praça. Todas as classes sociais interagem e trabalham juntas. Sem a presença da tecnologia isso seria impossível”

Quinze moderadores voluntários, que abraçaram a causa, compartilham com Kuki a responsabilidade de dar suporte à comunidade, inclusive com mensagens inbox aos membros do grupo quando necessário. Hoje, a Rededots tem ainda 12 funcionários (profissionais de TI e atendimento ao cliente) e, desde novembro, está incubada no Civi-co.

Kuki fala sobre o “privilégio” de estar no polo de impacto cívico-social:

“O Civi-Co tem um ambiente muito rico de trocas e uma sinergia com tudo o que estamos fazendo. As pessoas aqui ‘falam a mesma língua’, querem as mesmas coisas. Então existe uma vibração, uma energia de transformação, construção, empreendedorismo voltado para realmente causar impacto. É muito legal ver tanta gente inteligente, capaz, se dedicando full-time em função da esperança.”

A empolgação se estende ao grupo que ela criou há três anos. Kuki conta que moldou a Rededots como a bolha de um mundo ideal, impondo uma cultura de ética e excluindo tudo o que via de errado “lá fora”.

“O espectro do que o ser humano é capaz de fazer quando a gente se mobiliza é gigantesco. Esse é o poder da rede. Se todas as pessoas soubessem do poder que elas têm e usassem direito, o mundo seria outro. Tenho certeza.”

 

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