Ao longo da minha experiência pessoal, ao lidar com meu filho diagnosticado com meduloblastoma estágio 4 — um dos tipos de tumores de cérebro mais agressivos e raros — aos 9 anos de idade, eu me deparei com uma realidade muito difícil de ser digerida.
Além do meu sofrimento pessoal, percebi o quanto os setores privado, público e filantrópico estão deixando a desejar quando o assunto são os investimentos em pesquisa para encontrar alternativas para a cura do câncer em crianças.
De acordo com a Pediatric Cancer Foundation, menos de 4% do orçamento federal dos Estados Unidos destinado ao câncer é alocado para o estudo do câncer pediátrico.
E dentro dessa porcentagem mínima, os tumores cerebrais, principal causa de morte relacionada ao câncer em crianças e que representam 20% de todos os tumores cerebrais, recebem uma fatia irrisória desses recursos
Em relação ao meduloblastoma, esse cenário fica ainda mais sério, pois esse tipo de câncer é considerado uma doença rara e acomete cerca de 15 mil crianças no mundo a cada ano.
É uma doença com 70% de chances de cura, mas que, se ela se tornar recidivante, traz praticamente uma sentença de morte junto com seu retorno. Assim também aconteceu com o meu filho.
Avalio esse cenário de “vazio” nessas pesquisas como uma negligência, originada por uma lógica de mercado perversa, que afeta qualquer possibilidade de redução do número de mortes de crianças por conta dessa doença.
Por ser um tipo de câncer raro, o meduloblastoma não atrai a atenção e o interesse da indústria farmacêutica, que tem seu olhar voltado para a pesquisa sobre novas alternativas medicamentosas para doenças que oferecem melhor retorno financeiro.
Com isso, minha família e milhares de outras, espalhadas em vários locais do mundo, são levadas a lutar não apenas contra a doença, mas também contra a indiferença estrutural que dificulta o progresso da pesquisa e o desenvolvimento de novos caminhos terapêuticos
As crianças diagnosticadas com esses tumores enfrentam um cenário desafiador, com poucas opções terapêuticas, em grande parte com alta toxicidade – o que pode levar a efeitos colaterais que comprometem o desenvolvimento físico, neurológico e emocional.
Além disso, elas têm de lidar com uma expectativa limitada de tratamentos alternativos em casos em que a conduta padrão atual não seja bem sucedida.
Após meu filho passar por uma jornada de tratamentos, eu decidi que queria fazer algo para a medicina avançar mais rápido.
Minha intenção era encurtar o tempo entre as descobertas científicas e o acesso a novas possibilidades terapêuticas para milhares de crianças globalmente — as descobertas científicas no segmento de saúde normalmente demoram entre 7 a 10 anos para chegar aos pacientes.
Até lá, quantos crianças com a doença podem acabar morrendo por falta de alternativas?
Meu desespero se transformou em determinação para dar vida a este propósito. Criei a Medulloblastoma Initiative (MBI), em 2021, juntamente com Roger J.Packer, renomado neurocirurgião americano do Children’s National Hospital de Washington, D.C., que busca colocar em prática a missão de acelerar as pesquisas e os tratamentos.
Contamos hoje com o envolvimento de 14 dos mais prestigiosos laboratórios e hospitais mundiais de locais como Estados Unidos, Canadá e Alemanha.
Diferentemente das demais iniciativas, a MBI anda na contramão do mundo da pesquisa médica ao evitar a criação de silos entre os pesquisadores, estimular o compartilhamento de dados entre as instituições e atribuir tarefas específicas e complementares para cada laboratório
A abordagem de financiamento 100% direto à pesquisa, eliminando custos administrativos, combinada com a colaboração transparente entre instituições, estabelece um novo padrão para como a ciência médica pode operar quando impulsionada pela urgência e a inovação.
Nossos primeiros avanços já se tornaram realidade. Em 30 meses, um tempo recorde, conseguimos arrecadar cerca de 11 milhões de dólares e colocamos de pé dois ensaios clínicos promissores.
Fernando e o filho, Frederico, em Washington.
O primeiro é uma imunoterapia avançada que aproveita a resposta natural do corpo contra células cancerígenas, que está em fase de recrutamento de pacientes e tem mostrado resultados impressionantes em ensaios preliminares, com alto potencial de combate à doença em um cenário de metástase generalizada.
Já o segundo envolve uma vacina terapêutica contra o meduloblastoma baseada em tecnologia semelhante à da vacina contra a Covid-19, projetada para pacientes com a doença e com distribuição global.
Ambas as inovações já receberam o sinal verde da FDA (Food and Drug Administration), a Anvisa americana. E estamos com mais outros testes clínicos em desenvolvimento.
O que me deixa muito feliz e esperançoso em relação ao que vem pela frente são os importantes reconhecimentos internacionais que estamos recebendo.
Isso ajuda a validar nosso modelo, que, ao ser aplicado por outras frentes, pode inclusive ajudar a encontrar a cura de várias doenças.
Recentemente, a publicação MIT Management, do MIT, nos Estados Unidos, destacou a MBI como um caso exemplar de inovação disruptiva no tratamento de doenças raras.
Somos a prova de que, com o investimento privado direcionado com precisão e urgência, podemos transformar não apenas o futuro do meu filho, mas o de milhares de crianças ao redor do mundo. Elas estão contando conosco
Cada investimento na MBI é um passo direto para superar o câncer infantil. Não é uma questão de “se”, é de “quando” encontraremos a cura – queremos alcançá-la o quanto antes, e não daqui a 10 anos.
Quem salva uma vida, salva o mundo inteiro. Devemos agir rapidamente para dar a esses pequenos pacientes uma chance real de lutar, além do futuro saudável e promissor que eles merecem.
Fernando Goldsztein é fundador da Medulloblastoma Initiative e Conselheiro da Children’s National Foundation.
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