Quase metade dos consumidores brasileiros (47%) usa quatro cartões de crédito ou mais — e 39% não estão satisfeitos com os limites. Os dados de uma pesquisa do Serasa apontam um problema financeiro que o empreendedor mineiro Daniel Cária enfrentou quando começou a empreender, lá atrás, em 2014: a fragmentação do crédito.
Uma década depois, o próprio Daniel criou uma solução para o problema: a Vanq, uma plataforma que unifica limites de pagamentos.
“Nossa ideia é ser o ponto central para o usuário nesse mundo financeiro fragmentado”
Inspirado no verbo inglês vanquish (conquistar, superar), o nome reflete a proposta da startup de superar barreiras no acesso ao crédito. “Além disso, é parecido com bank”, brinca Daniel. O Q tem ainda um significado especial para o fundador: remete ao fator Q, um conceito da física que mede a qualidade de transmissão de informação, e à computação quântica, que é sinônimo de tecnologia avançada e precisão.
A Vanq permite ao usuário unificar os limites de diferentes cartões de crédito e dividir um pagamento grande em várias contas, além de adicionar outras formas de pagamento, como PIX e boleto. Assim, o cliente economiza no momento em que precisa de crédito para emergências ou compras mais altas, democratizando o acesso a limites maiores de forma instantânea e econômica.
Autorizada para iniciar as operações em julho de 2024, depois de um longo e burocrático processo de validação com entidades de crédito — bancos, processadoras, adquirentes, bandeira —, a Vanq captou 2,7 milhões de reais numa rodada pré-Seed em 2021, e mais 2,5 milhões de reais numa segunda rodada, em 2023, com investidores como Opus Capital e 4Equity.
Hoje, 2 mil usuários têm acesso ao app em caráter de teste beta, dos quais cerca de 300 utilizam de fato as funcionalidades. Segundo Daniel, já existe uma fila de espera de 100 mil pessoas interessadas, que embasa a expectativa da fintech de chegar a 25 mil clientes em 2025.
Daniel, 34, cresceu em Belo Horizonte e desde criança nutriu o desejo de seguir os passos do pai, empresário no setor automotivo.
“Meu plano era explorar o máximo de possibilidades até os 30 anos e, quando me sentisse preparado, encararia meu grande sonho”
Depois de muita insistência, começou a trabalhar aos 12 anos como assistente administrativo no cursinho pré-vestibular da tia. A partir de então, não parou mais. Trabalhou com o pai no setor automotivo, foi para outras empresas da área e virou executivo da BMW. Chegou a fazer faculdade de economia e administração, mas não terminou.
Fora do expediente, começou a empreender. “Já tive agência de marketing esportivo, fábrica de refeições funcionais, sites, indústrias de camisetas. Explorei bem minha trajetória profissional”, conta.
E foi dividindo as contas pessoais e das empresas em vários cartões, cada um com diferentes limites e faturas, que perdeu o controle dos gastos:
“Comecei então a pesquisar alternativas para gerenciar dinheiro: aplicativos, planilhas. Até que achei uma solução de cartão unificador via hardware na Escandinávia. Fiquei obcecado por essa ideia”
Mas ainda levaria muitos anos até a Vanq se tornar o que é hoje. Na época, o setor financeiro engatinhava na transformação digital e inovação, e Daniel pensou que o caminho seria criar uma espécie de aplicativo que possibilitasse tanto a gestão quanto a educação financeira.
Passou cerca de cinco anos estudando a tecnologia disponível até que, em 2019, fez um investimento inicial do próprio bolso e passou a se dedicar totalmente à empresa e formou um primeiro time de sete pessoas, que largou a empreitada no ano seguinte por não acreditar no produto.
Ainda em 2020, Daniel formou uma nova diretoria, que atualmente comanda um time de dez funcionários terceirizados no escritório em Belo Horizonte.
O grupo, que também é sócio da empresa, é composto pelo advogado Renato Ribeiro, que atua como diretor jurídico (CLO); o engenheiro de software Hermano Araújo, diretor de operações (COO); o engenheiro de software Rômulo Santana, diretor de tecnologia (CTO); o economista Johner Dornelles, diretor financeiro (CFO); e o administrador Marcus Magalhães, como diretor de Growth (CGO).
Com a nova equipe, Daniel buscou entender profundamente o público que enfrentava dificuldades com o crédito fragmentado. A partir de uma lista de espera, fizeram contato direto com mais de 200 interessados, descobrindo dois perfis principais que hoje compõem a base de usuários.
“De todos os entrevistados, entre 30% e 40% gostavam da ideia de ter um aplicativo para planejar as faturas, mas já propunham a unificação de limites”
O primeiro perfil de cliente é de jovens de 20 a 40 anos com renda baixa. Esse grupo ganha entre 1 500 e 3 000 reais mensais e utiliza os cartões de crédito para adquirir bens como celulares ou eletrodomésticos. Têm limites reduzidos, geralmente distribuídos entre três ou quatro cartões, e enfrentam dificuldades para realizar compras de maior valor.
O segundo grupo é o de profissionais em ascensão, com rendimentos entre 3 000 reais e 8 000 reais. São pessoas que acabaram de ser promovidas ou estão em início de carreira. Apesar de uma condição financeira mais estável, encontram desafios para acessar limites maiores, especialmente para compras estratégicas.
Conhecer as necessidades desses dois públicos foi o divisor de águas que fez a Vanq deixar de ser um aplicativo de planejamento financeiro com funcionalidade de unificação de cartões, para o oposto.
“Entendemos que a organização financeira é uma ‘vitamina’, que melhora a sua vida, mas não cura a doença. Já a unificação de limites é um ‘analgésico’, que permite você fazer algo que não conseguia fazer antes. Por isso invertemos a ordem de prioridade”
Com a nova ideia, foram necessários dois anos e meio de negociações com players do setor financeiro e — o maior desafio até agora — convencer a Mastercard a emitir um cartão próprio da Vanq, peça fundamental para a missão de unificar os pagamentos.
Hoje, além de ser a bandeira do cartão unificado, a multinacional firmou um acordo de incentivos para expandir a base de usuários e ajudar a desenvolver a infraestrutura tecnológica da Vanq. “A tecnologia tem uma dificuldade: ela nunca termina”, diz Daniel. “Mas aprovar o modelo para poder operar foi o nosso desafio mais complicado.”
O sistema funciona assim: após baixar o aplicativo, o usuário faz um cadastro inicial, fornecendo dados pessoais e enviando uma foto para verificação — como em outros bancos digitais. Depois, adiciona os cartões na carteira digital, que funciona como as carteiras da Apple Pay e Google Pay.
Ao passar o cartão da Vanq ou colocar os dados do cartão em um site, o usuário indica no aplicativo quais meios de pagamento deseja combinar para efetuar aquela compra. Também é possível complementar o pagamento com Pix ou boleto bancário. Para o futuro, a Vanq planeja incorporar novos meios de pagamento, como milhas, moedas digitais e outros ativos, além de retomar a proposta de ser uma ferramenta de planejamento financeiro.
Antes de concluir a transação, o sistema realiza uma verificação em tempo real para garantir que os limites disponíveis sejam suficientes.
“Temos os mesmos sistemas antifraude usados no iFood e Google. Fizemos um investimento muito alto para bater de frente com a tecnologia desses grandes players. Não é só vaidade e qualidade, mas necessidade”
Cobrando uma taxa de 2,9% no valor do pagamento por cartão, a empresa por enquanto ainda não dá lucro. O foco, por ora, é consolidar o produto e aumentar a base de clientes aos poucos — o objetivo é alcançar dois milhões de usuários até 2029.
Para cumprir a meta, Daniel aposta que o futuro do mercado financeiro está na fragmentação. “Não há como um único banco atender todas as necessidades de uma pessoa”, diz. Por exemplo: em um banco, o cliente usa o Pix porque não tem taxas. Em outro, usa o cartão porque os juros são menores.
“A Vanq nasceu para ser o sistema operacional do dinheiro – ajudando o usuário a gerir suas finanças de maneira centralizada.”
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