Como a startup VG lucra ao unir gestão ambiental e um marketplace para resíduos industriais

Reinaldo Chaves - 4 jul 2017
Guilherme Arruda, CEO da VG, Deivison Pedroza, diretor grupo Verde Ghaia, e Guilherme Gusman, também diretor da VG.
Reinaldo Chaves - 4 jul 2017
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Quase todos os produtos que você usa geram, ao ser manufaturados, algum resíduo sólido — que pode ser ou não reaproveitado. A maioria das empresas, no entanto, não só não sabe o que fazer com este material como ainda perde dinheiro com isso. Foi para resolver este problema, que a startup VG Resíduos surgiu, oferecendo ao mercado um software online para gerenciamento desses resíduos (que podem ser fibra de papel, sucata de metal, entulho, baterias, restos de lâmpadas etc). A plataforma funciona como um marketplace em que o principal produto negociado são essas sobras de produção.

A VG foi fundada no ano passado como uma spin-off (empresa derivada de outro empreendimento) do Grupo Verde Ghaia, que há 18 anos faz monitoramento em tempo real de requisitos legais para tomadas de decisões corporativas. O investimento inicial na VG foi de 700 mil reais.  Guilherme Arruda, 33, CEO da startup, conta que foi o presidente do Grupo, Deivison Pedroza, que notou essa necessidade de gerenciamento de resíduos ao perceber que diversas empresas não conseguiam fazer a gestão disso. Havia, portanto, um mercado.

Guilherme é engenheiro de controle e automação e foi chamado para ajudar a estruturar a startup. O principal produto da VG é um software, capaz de fazer a gestão diária das sobras de produção, e uma ferramenta para vendê-las ou comprá-las no chamado “mercado de resíduos”. Ele conta que um grande problema das empresas hoje no Brasil é o que fazer com as sobras de produção:

“As empresas pagam caro para levar materiais para aterros sem reaproveitar quase nada. Nosso diferencial é juntar o gerenciamento com o mercado de resíduos”

Por ser cria de um player maior deste mercado, em menos de um ano de operação a VG já tem 209 clientes usando o software de gestão e outros 359 cadastrados como tratadores (nome dado a empresas que compram os materiais). Por este desempenho, a VG foi classificada, em 2017, em terceiro lugar geral no Brasil no Ranking 100 Open Startups, plataforma internacional que conecta startups a grandes empresas.

SURFANDO A ONDA DOS NOSSOS TEMPOS

Guilherme admite que seu negócio é beneficiado pela “onda sustentável”. No país, essa preocupação deixou de ser sonho de ativistas ambientais quando o governo federal tornou lei a Política Nacional de Resíduos Sólidos, em 2010, que define que o gerador do resíduo é também responsável por ele até o final da cadeia.

“Na prática, o gerador precisa garantir que a sobra da produção tenha uma destinação correta ambiental, caso contrário a responsabilidade por danos cairá sobre ele de qualquer forma”, diz Guilherme, e prossegue: “Não adianta contratar o Zé da esquina para levar embora o material porque na hora que acontecer um problema quem vai ser responsabilizado é o gerador”. Há, também, o fator financeiro, pois mesmo quando o excedente de produção é vendido há um custo, seja de desperdício, de estocagem ou logística para transporte:

“Além do impacto ambiental é dinheiro que estamos falando. Se a empresa gerar menos vai economizar também”

A legislação entrou em vigor em 2014 e também exige que os tratadores de resíduos obedeçam a regras ambientais. Por esta razão, um dos produtos que a VG oferece é uma espécie de selo para validar o comprador. Na prática, o software de gestão de resíduos abrange desde a geração até a destinação: controla qual o resíduo e quantidade que foi gerada, os períodos e as formas como foi destinado. O programa gera também automaticamente alguns documentos que são necessários no processo (por exemplo, para transportar o resíduo é preciso um manifesto de transporte e um certificado de destinação final).

A VG faz a gestão de 4 mil toneladas de resíduos por mês. Parece muito, mas o potencial do mercado é bem maior.

A VG faz a gestão de 4 mil toneladas de resíduos por mês (na foto, sobras de cobre). Parece muito, mas o potencial do mercado é bem maior.

O software funciona online, desktop e mobile. O usuário informa a quantidade gerada do resíduo e a data. Na destinação, informa a quantidade, quem vai realizar o transporte e o tipo de tratamento. Se houve receita, informa também o valor. Com isso, automaticamente são gerados os relatórios para os órgãos ambientais. Algumas empresas, dependendo do ramo de atividade, que são obrigadas a informar anualmente tudo o que geraram (o inventário da resolução CONAMA Nº 313/2002).

Atualmente, a VG faz a gestão de 4 mil toneladas de resíduos sólidos por mês, além de 86 mil litros (geralmente resíduos de efluentes), 34 mil m³ (de entulho, principalmente caçambas de construção civil) e 6,9 mil unidades de lâmpadas e baterias.

TIRAR O BODE DA SALA

Segundo a Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), o Brasil produz em média 387 quilos de resíduos por habitante por ano — isso dá 78,6 milhões de toneladas (dados de 2014). Guilherme afirma que essa imensidão de resíduos chega a ser um risco para muitas empresas porque, além da gestão ser complexa, a destinação correta e a venda não são fáceis de acontecer em muitos locais, o que pode acarretar danos ambientais e multas.

“Ainda não é tão comum as empresas venderem seus resíduos, muito por não existirem tantas comprando nas proximidades, então o custo de transporte fica alto e pode inviabilizar o negócio. Ajudamos nisso ao deixar as geradoras e tratadoras mais próximas”, conta.

Por exemplo, um resíduo perigoso, com material contaminado, em alguns casos pode ser usado como combustível em fornos de cimento. Mas a cimenteira tem de gerar um certificado de destinação do resíduo para resguardar o gerador de que foi realizado um tratamento correto. Este documento é exigido até em sobras de produção mais comuns, como de plásticos, fibra de papel, sucata de metais ferrosos e pallets. É aí que a ferramenta da VG Resíduos entra ao filtrar empresas tratadoras que possuam licenças, validades, habilitação dos motoristas, certificados INMETRO dos veículos e validade dos documentos no processo.

E, na hora da venda, o software é similar a um marketplace, no qual as empresas geradoras deixam a descrição de seus resíduos, com componentes, datas de geração, peso e fotos. Aí depois podem combinar preços com os tratadores. Atuando como gestora de resíduos, o modelo de negócio da VG vem de uma mensalidade cobrada dos geradores, de 680 reais por unidade física.

Já no mercado de resíduos, é cobrada uma taxa dos tratadores e geradores que queiram ter destaque nas suas ofertas. “É bem parecido com um site de buscas, com anúncios patrocinados para aparecer na frente”, diz Guilherme. O pagamento por este anúncio mais bem colocado varia de acordo com o porte da empresa e a quantidade de resíduo, mas inicia em 50 reais. A meta da startup é faturar 600 mil reais este ano.

UM MERCADO COM POTENCIAL, MAS MUITAS BARREIRAS

Guilherme sempre cita um dado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) para mostrar seu potencial de negócios: o Brasil poderia economizar cerca de 8 bilhões de reais por ano se reciclasse todos os resíduos. Mas hoje só 3% são destinados à reciclagem.

Apesar do potencial, na realidade ele conta que não é tão fácil conseguir novos clientes. No gerenciamento de resíduos, diz, ainda há uma barreira interna nas próprias empresas. “Muitas companhias ainda fazem isso em planilhas, há uma equipe ou alguém que cuida disso manualmente. Algumas pessoas acham que podem ser substituídas pelo software, o que pode gerar até um boicote à ferramenta”, diz.

foto da tela da plataforma VG: simples e funcional. Ainda assim, encontra resistência, pois algumas empresas relutam em aderir à tecnologia.

Acima, foto da plataforma da VG: simples e funcional. Ainda assim ela encontra resistência, pois algumas empresas relutam em aderir à tecnologia.

Já no mercado de resíduos há um problema da credibilidade da empresa que vai tratar o material. “Como o gerador é responsável até a destinação é muito importante que os tratadores consigam demonstrar sua credibilidade, sem isso muitos negócios não são feitos”, conta. A forma de vencer isso tem sido mostrar os benefícios da VG bem didaticamente. “Em toda empresa fazemos uma conferência para mostrar o software, as funcionalidades, para que usar, quais os benefícios. É um trabalho de convencimento.”

Também foi necessário fazer adaptações para atender exigências inesperadas. Uma delas, diz Guilherme, é um receio das empresas em publicar quais resíduos estão gerando, por questões estratégicas. A solução foi dar uma de Tinder: “Permitimos que a empresa oculte seu nome na apresentação no mercado de resíduos. Só se ocorrer um match na busca, os nomes aparecem para as partes conversarem”.

Outra dificuldade surgiu em relação a alguns documentos gerados no sistema, como o manifesto de transporte. “O caminhão de resíduo só sai da garagem com o manifesto. Ocorreu um caso em que o sistema saiu do ar e o cliente reclamou que o caminhão estava parado. A  solução foi aumentar a capacidade do servidor na nuvem e do número de acessos para evitar isso”, diz.

Ele considera este, ou o dos matchs, ajustes só possíveis de fazer conforme vai entendendo o mercado. Fora isso, enumera, é essencial mostrar que as empresas podem diminuir seus custos e riscos em questão de multas e diminuir os impactos ambientais de suas atividades. E finaliza: “É uma prevenção de danos para as empresas e para a sociedade como um todo, para o lugar em que a gente vive”.

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: VG Resíduos
  • O que faz: Gestão e mercado de resíduos industriais
  • Sócio(s): Guilherme Arruda e Guilherme Gusman (a startup é uma spin-off do Grupo Verde Ghaia, que tem Deivison Pedroza como presidente)
  • Funcionários: 5 (incluindo Guilherme Arruda e Guilherme Gusman)
  • Sede: Belo Horizonte
  • Início das atividades: 2016
  • Investimento inicial: R$ 700.000
  • Faturamento: R$ 120 mil em 2016
  • Contato: [email protected]
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