Embora a agenda ESG tenha assumido papel central na gestão dos negócios nas grandes empresas, muitas pequenas e médias ainda estão quebrando a cabeça para entender melhor o assunto e a importância de sua implementação.
Para ajudar a tirar este fantasma da sombra, a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) lançou em dezembro passado um guia inédito: a Prática Recomendada 2030 – Ambiental, Social e Governança (ESG) – Conceitos, Diretrizes e Modelo de Avaliação e Direcionamento para Organizações. Trata-se de um documento que mostra o caminho das pedras: alinha os principais conceitos e princípios do ESG, e orienta os passos necessários para incorporá-los na organização.
“A ideia da ABNT é banalizar o assunto, no bom sentido, para qualquer um entender que ESG não é um bicho de sete cabeças – pelo contrário, é perfeitamente aplicável e é fundamental para gestão”, afirmou Mario William Esper, presidente da ABNT, em entrevista exclusiva a NetZero durante o evento de lançamento do documento, realizado na sede da Fiesp, em São Paulo.
Um modelo de avaliação e direcionamento como parte central de seu conteúdo é o que torna o primeiro documento normativo do Brasil e do mundo sobre ESG (e que, segundo especialistas envolvidos em sua elaboração presentes no evento, servirá de base para uma futura norma internacional da ISO) especialmente útil para companhias de menor porte. É uma ferramenta de autoavaliação que permite que as empresas, independentemente de porte, setor ou constituição, identifiquem seu estágio de maturidade e evolução em relação aos critérios ESG, oferecendo, na prática, uma fotografia da situação, com pontos fortes e fracos nas três áreas (ambiental, social e governança).
São cinco os estágios de maturidade propostos: elementar, não integrado, gerencial, estratégico e transformador. Os dois primeiros ainda não indicam a presença de práticas de ESG, mas apenas iniciativas dispersas ou que têm a função primordial de cumprir a legislação vigente. É a partir do terceiro nível que pode ser constatada uma atuação mais consciente em relação ao tema.
As mais de 120 entidades representantes de diversos setores que participaram da elaboração da prática, que observa normas já consagradas de gestão como ISO 9001 (qualidade), a ISO 14000 (gestão ambiental), ISO 31000 (gestão de risco), ISO 37000 (governança e compliance), ISO 26000 (responsabilidade social) e ISO 27001 (gestão de segurança da informação), acreditam que essa autoaferição possibilita o desenvolvimento e estratégias para avançar no tema. Tudo alinhado com os compromissos internacionais, em particular com os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.
“Com a Prática Recomendada 2030 a empresa não precisa gastar dinheiro em um primeiro momento para identificar sua situação e começar a atuar.”
O passo seguinte – a incorporação do ESG na organização – também é contemplado no documento e dividido em seis passos: Conhecer, Ter a intenção estratégica, Diagnosticar, Planejar, Implementar, Medir e Monitorar e Relatar e Comunicar.
DIFERENTES ATUAÇÕES
Dados de pesquisa da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) em parceria com a FIA Business School, apresentados durante o evento pela especialista em meio ambiente do Departamento de Desenvolvimento Sustentável da entidade Liv Nakashima, confirmam a diferença gritante entre a atuação das grandes empresas e das menores. Com isso, reforçam o peso da PR 2030 para o segundo grupo. Entre as maiores, 60% responderam que realizam relatos de desempenho de ESG, contra 5% das de pequeno e 10% das de médio porte. E, enquanto 35% das maiores recebem benefícios por isso, como financiamento com menores taxas, entre as outras, apenas 6% tiveram benefícios por ter métricas atingidas.
A partir do momento em que se tem um documento normativo que funciona como direcionador de práticas – e, de acordo com Esper, a prática deve ser aplicada por instituições renomadas como a Febraban (Federação Brasileira de Bancos), impactando financiamentos e investimentos – torna-se mais palpável colocar o usuário comum na conta e, eventualmente, equalizá-la.
Dividida em três eixos, subdivididos em 14 temas e 42 critérios (14 ambientais, 15 sociais e 13 de governança), a PR 2030 inclui ainda outro conteúdo valioso para a empresas em estágio inicial – normalmente, as pequenas e médias – que buscam formas de incorporar o ESG em seu planejamento de forma efetiva: uma introdução, com histórico e conceitos mais importantes sobre o tema.
TEMA AINDA NEBULOSO
Se isso parece banal num mundo digitalizado e com acesso a informação a um clique de distância, vale ouvir as impressões de quem acompanha o dia a dia. Segundo Nakashima, o entendimento sobre o tema ainda é nebuloso, principalmente pelas pequenas e médias empresas, o que abre portas para que algumas, inclusive, adotem esforços e adquiram serviços que não trazem resultados efetivos e não levam a lugar algum.
“Um dos principais pontos para o sucesso da estratégia ESG de uma organização está em entender sua materialidade: quais são os impactos socioambientais, como o meio pode atingir as atividades e como ela vai se preparar para isso”, afirmou Nakashima. “Uma vez que a pertinência ou relevância de determinados tópicos é conhecida, passa-se a buscar índices que demonstrem a atuação.”
Esse tipo de análise de risco e acompanhamento de mensuração é muito presente no dia a dia das grandes empresas e serve como demonstrativo de sua eficiência nas adaptações a situações complexas e adversas, tornando-as mais atraentes para instituições financeiras que buscam retorno financeiro e segurança.
“Mas, para as menores, percebemos que ainda é necessário entender a importância da atuação mais responsável em relação às questões ambiental, social e de governança, e o documento traz essa tradução complexa do mercado financeiro para o dia a dia prático.”
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