Ela venceu o câncer de mama. Duas vezes. E hoje inspira outras pessoas falando sobre a doença de forma leve e descomplicada

Linda Rojas - 9 out 2020
Linda Rojas, criadora do projeto Uma Linda Janela (foto: divulgação).
Linda Rojas - 9 out 2020
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Certa vez, entrei numa sala branca, sóbria e sofisticada, que mais parecia uma máquina do tempo.

Na era em que vivemos, cuja tecnologia é amplamente vivenciada e executada, começo me teletransportando para um dia qualquer do ano de 2012, quando aos 24 anos, eu olhava fixo para aquele homem de jaleco branco que me explicava didaticamente o início da minha primeira transformação: o diagnóstico de câncer de mama.

Comecei a perceber tudo em câmera lenta. Meu coração, por instinto, passou a bater mais rápido do que os ponteiros do relógio, que pareciam em descompasso com a realidade prolongada daquele instante.

DOENTE, SIM. SOZINHA, NUNCA. SEMPRE SOUBE QUEM ERA A EQUIPE AO MEU LADO

Eu fiquei doente justamente num período no qual estava planejando, construindo e alicerçando planos e sonhos, inclusive profissionais.

Tudo precisou ser interrompido para dar lugar a cirurgias, quimioterapias e radioterapias. Um tratamento intensivo e eficaz que me devolveu a saúde e a oportunidade de voltar a olhar para o meu presente e o meu futuro

Nunca estive sozinha, por isso aprendi logo a reconhecer minha equipe. Minha mãe, meu namorado Caio, amigos e colegas de trabalho.

PERCEBI QUE QUANTO MAIS EU “ABRIA A JANELA”, MAIS AS PESSOAS ABRIAM AS DELAS

Anos depois, assim que o câncer passou, retomei a faculdade de Relações Internacionais. Mas aquilo tudo se tornou tão próximo de mim que quis defender a causa do combate ao câncer com unhas e dentes.

Por isso, em 2016 desenvolvi o projeto de conteúdo Uma Linda Janela, para compartilhar minha experiência e falar sobre o câncer de uma forma leve e descomplicada — e, assim, poder ajudar muitas outras mulheres e famílias com informação e quebras de paradigma sobre a doença.

Comecei fazendo uma palestra numa multinacional de recrutamento e logo me apaixonei pelo impacto da boa comunicação.

Voltei para casa renovada, lembrando de cada rostinho, de cada abraço. E sentindo que, de verdade, tinha alcançado muitos corações.

Percebi que, quanto mais abria a “minha janela”, mais pessoas se sentiam à vontade para abrir as delas. E tudo isso foi se tornando a minha grande motivação de vida

Comecei a estudar, a me aprimorar e a construir uma narrativa para a palestra “Pequenas Felicidades”. Nela, o protagonista não era mais o câncer, e sim os grandes aprendizados que absorvi nessa jornada — a começar pela valorização das pequenas alegrias.

Na palestra, falo também de desafios versus oportunidades, espírito de equipe, autoestima, empreendedorismo social… Entre outras sacadas que podem ajudar não só na vida, mas no ambiente corporativo.

SE VOCÊ PENSA QUE A MINHA MENSAGEM É SÓ SOBRE O CÂNCER, ESTÁ ENGANADO(A)

Não demorou muito para que outras empresas ficassem interessadas em levar informação, esperança e uma história de superação a seus colaboradores.

Consegui o mais importante: que pessoas diferentes e profissionais de diversos segmentos se identificassem.

Falar para as áreas de tecnologia, moda, mercado financeiro, marketing e até mesmo só para homens, numa empresa de óleo e gás, mostra que a mensagem não é só sobre o câncer de mama, é muito mais do que isso

É sobre entender que há um colega do seu lado e que ele pode te ajudar a passar por um desafio, seja no ambiente de trabalho ou não.

É sobre convidar pessoas a se tornarem parte da solução de um problema.

É sobre vencer e conquistar juntos.

É sobre valorizar todos os dias as nossas pequenas felicidades que muitas vezes passam despercebidas pela velocidade de nossos pensamentos (quase sempre atentos ao que já passou, ou ao que ainda está por vir)

Em suma: a mensagem é sobre mostrar que a vida acontece aqui e agora!

UNI O TRABALHO À CAUSA QUE AMO. E RECEBO RETORNOS INCRÍVEIS DAS PESSOAS

Passado um tempo depois de cada apresentação, por vezes recebo feedbacks de como os funcionários se entrosaram mais e o quanto estão mais estimulados a alcançar objetivos juntos.

Ou como todos ficaram mais participativos e abertos ao diálogo, o que facilitou bastante a relação entre gestores e equipe.

Tudo isso realmente chancela o conceito positivo deste tipo de ação. Além disso, posso me comunicar diretamente com outros pacientes e familiares e alertar toda a população sobre o valor da saúde.

Com minha base acadêmica, profissional e forte inclinação para causas sociais, uni a causa que eu amo ao meu trabalho.

Aprendi a me conectar a outras ferramentas que me ajudaram a levar minha mensagem mais longe e para um número maior de pessoas. Tive retornos incríveis… Como quando lancei o blog e recebi mais de 500 acessos orgânicos já no primeiro dia

Atualmente, temos acessos em mais de 70 países, com mais de 19 mil seguidores no Instagram. É também por ali que tenho motivação diária e inspiração para continuar.

Acredito que o nosso grande diferencial é falar sobre os temas mais difíceis, tidos como “pesados”, mas de forma natural.

QUANDO TUDO PARECIA PERFEITO NA MINHA VIDA, O CÂNCER VOLTOU

Tudo ia maravilhosamente bem. Casei com o homem da minha vida, que construiu tudo isso comigo e foi meu apoio incondicional, o Caio.

Mas, em menos de dois meses, um novo diagnóstico, em 2017.

Sim, o câncer voltou, na mesma mama. Tive que me submeter a uma nova cirurgia e mais tratamento.

Mais uma vez, meu corpo reagiu bem e fiquei curada, ou em remissão, como os médicos gostam de falar. Me reergui depois desse momento doloroso, no qual o sofrimento parecia ter sido maior do que o da primeira vez

Mas mantive meu sonho de deixar um grande legado neste mundo (e se for na área da saúde, melhor ainda).

APRENDI QUE EXISTEM EMPRESAS APENAS INTERESSADAS EM “SURFAR” NA CAUSA

Lembro que, ainda carequinha, retomei minhas atividades e fui chamada para campanhas, ações e muitos trabalhos de empresas, marcas e instituições que queriam se associar ao combate ao câncer.

Porém, muitas vezes com a intenção de “pegar emprestada” minha história como algo voluntário e assim vender sua imagem e seus produtos

As pessoas ainda não estavam acostumadas a remunerar o paciente pela sua vivência, e não entendiam muito bem o valor que a experiência pessoal pode ter.

USO A BOA COMUNICAÇÃO PARA ESPALHAR A MENSAGEM NOS LUGARES CERTOS

Hoje fico muito feliz com o que vem sendo construído. Com muita clareza, firmeza e posicionamento, tenho conseguido me associar sempre a grandes marcas que respeitam o meu trabalho e, principalmente, compreendem o contexto geral de responsabilidade social.

Ainda mais quando a pessoa que representa o combate ao câncer, além de paciente, também é preparada para comunicar de forma assertiva e responsável.

Continuo com muita, dedicação e esforço, tratando de transformar a pauta da doença com menos sensacionalismo e mais amor, gerando assim mais resultados. E exaltando o que mais importa: A VIDA!

Uma das coisas que mais amo ao fazer o Uma Linda Janela é que o projeto me permite receber inúmeras mensagens diárias de carinho e gratidão, que me emocionam e me inspiram a continuar nessa jornada de propagar a beleza da paisagem, seja ela qual for.

 

Linda Rojas, 33, foi diagnosticada com câncer de mama duas vezes e, diante da falta de informação sobre a doença, resolveu compartilhar seus aprendizados no blog “Uma Linda Janela”. O trabalho virou um projeto de conscientização nas redes sociais e ainda uma palestra corporativa motivacional.

 

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