Com que frequência você faz doações? Para Vivian Barreira, essa prática é uma rotina, tanto que, em 2018, quando se casou, ela convenceu os convidados da festa a converterem os presentes em apoio financeiro para organizações não governamentais.
Foi essa a semente do GiftAid, uma plataforma que incentiva a cultura da doação tanto entre pessoas físicas como empresas.
Fundado em 2023, o negócio social ainda não tem dois anos completos, mas já conseguiu transacionar mais de 1 milhão de reais para ONGs e engajar 3 057 doadores.
Apesar de os convidados do casamento de Vivian terem se animado com a proposta, não foi tão simples assim arquitetar as doações. Ela conta que as pessoas se sentiam perdidas, sem saber para onde doar.
Como não encontrou na internet um site que facilitasse esse processo, apenas plataformas para presentes de casamento convencionais, ela e o companheiro decidiram criar um site para listar projetos sociais que poderiam receber as doações.
“Passamos essa fase pré-casamento correndo atrás de ONGs para criar uma lista com pelo menos dez instituições com diferentes causas. Entramos em contato para pedir informações, algumas não entendiam a proposta, outras achavam o máximo. No fim, chegamos a oito ONGs”
O trabalho valeu a pena: “Recebemos feedbacks ótimos dos amigos, agradecendo porque nós demos a eles a oportunidade de doar”.
Só que depois de tudo isso, o casal ainda tinha uma missão que deixou os noivos preocupados em plena lua de mel:
“Como não achamos outra forma de fazer os processos de doação, o dinheiro foi para a nossa conta. Fomos viajar transtornados porque ainda tínhamos que direcionar aqueles recursos.”
Ou seja, o que deveria ser “uma experiência legal, prazerosa” virou motivo de aflição. “No final, deu tudo certo, mas acabou sendo pesado para a gente.”
Toda essa saga fez Vivian repensar sua carreira. Advogada, ela trabalhava no mercado financeiro, no Pátria, gestora de investimentos alternativos. Mas sempre sentiu um chamado para atuar de forma mais próxima do terceiro setor.
Nos anos seguintes ao casamento, Vivian foi apurando as ideias e em 2021 deixou o emprego para mergulhar nos estudos da filantropia e do empreendedorismo social. No meio de 2023, enfim, colocou no ar o GiftAid.
Na prática, a plataforma cuida de toda a parte operacional que Vivian e o marido tiveram que dar conta manualmente na época do casamento.
Pelo GiftAid, cada pessoa pode criar a página para seu evento (um aniversário, batizado, casamento, chá de bebê etc.) e já encontra ali uma curadoria com mais de 80 ONGs divididas em 15 causas, como animais; arte e cultura; direitos humanos; educação; LGBTQI+; e meio ambiente, entre outras.
Todas as organizações cadastradas são auditadas previamente pelo GiftAid com base em 13 indicadores. Vivian afirma:
“Quando as ONGs se cadastram na plataforma, elas respondem a um questionário simples para entendermos, por exemplo, se atua em uma área de baixo IDH, se tem demonstrações financeiras e dados de impacto mensurados… Mas nossos critérios não são excludentes. Elas precisam atender minimamente três ou quatro e a gente ajuda a desenvolver os demais”
Hoje, compõem a plataforma tanto ONGs mais famosas, como Amigos do Bem, Cruz Verde, Plan International, Santuário Vale da Rainha e Sea Shepherd, como instituições menores, como Mulheres em Construção, Natureza Conecta e Instituto Metamorfose.
Um diferencial, segundo Vivian, é que ao criar um evento, é possível selecionar quantas ONGs você quiser dentro da base, mas quem toma a decisão final sobre qual delas receberá o dinheiro é o convidado da festa:
“A gente percebeu que quando os convidados se identificam com a causa, isso aumenta muito o ticket de doação. Então, se a pessoa tem várias opções ali, pode escolher a que mais se identifica ou ainda pulverizar o valor para várias.”
Quem cria o evento pode acompanhar por um painel na plataforma quais convidados doaram, assim como as quantias e as organização beneficiadas (as ONGs também dispõem de um login no site para acompanhar esse fluxo).
Os convidados, por sua vez, recebem uma notificação para confirmar que a doação foi direcionada. Pela intermediação de todo o processo, o GiftAid fica com uma taxa de 12%.
“Garantimos total transparência, desde nossa taxa ao sistema de notificações automáticas para que os usuários acompanhem todo o processo”
Por enquanto, essa taxa de 12% é insuficiente para garantir a sustentabilidade financeira do GiftAid. O negócio se mantém rodando graças a um fundo administrado por pessoas físicas, que no ano passado entrou como investidor (por contrato, Vivian não pode divulgar o nome do fundo).
O aporte de 1 milhão de reais no GiftAid está sendo injetado na empresa de forma fracionada, ao longo dos meses. Vem com uma meta de contrapartida: cada 1 real aportado por mês precisa ser convertido em 4 reais no fluxo de doações.
Além do aporte mensal, esse fundo fez uma ação pontual em novembro passado que impulsionou uma campanha do GiftAid em torno do Dia de Doar de 2024.
O fundo garantiu que cada 1 real doado ao longo da campanha (que durou uma semana) fosse duplicado por meio de um matchfunding.
“Arrecadamos cerca de 250 mil reais e, como o valor foi dobrado, chegamos a quase meio milhão entregues para as 68 instituições registradas no GiftAid naquele momento.”
Outro episódio que Vivian compartilha com orgulho é o de uma jovem que não queria fazer festa de aniversário, mas convenceu amigos e familiares a doarem em seu nome:
“Para todo mundo que mandava mensagem ou ligava no dia do seu aniversário, ela mandava um recado no WhatsApp assim: ‘Troque seu parabéns por uma doação’, já encaminhando o link do seu evento na plataforma”
Dessa maneira, segundo a empreendedora, foram arrecadados 8 mil reais. “Ela simplesmente usou do poder da amizade para fazer o bem. Isso mostra que não é necessário ter dinheiro ou investir muito tempo para gerar impacto.”
Durante 17 anos trabalhando no mundo corporativo, Vivian sempre se incomodou com os brindes.
“Eu costumava cuidar, dentro da parte jurídica, das contratações desses presentes e achava os valores absurdos, um desperdício.”
À frente do GiftAid, a ideia de Vivian foi transformar as lembrancinhas (como caixa de chocolate, caneta ou squeeze) em impacto real, reforçando o pilar ESG das empresas.
No Dia dos Pais de 2024, por exemplo, o Banco Master investiu 50% do valor dos brindes em gift cards (ou em créditos de impacto).
“Eles compraram presentinhos, mas deram junto um cartão carregado com 150 reais para os funcionários realizarem doações em uma página personalizada do banco e incentivaram os pais a criar um momento de conexão, incluindo os filhos no processo”
A experiência, segundo a empreendedora, ajudou a despertar a consciência social das crianças:
“A gente recebeu feedbacks muito legais de pessoas que contaram que os filhos pequenos não sabiam o que era uma ‘pessoa em situação de rua’ e foi uma maneira de abordar o assunto com eles, fazendo a doação.”
Outras empresas como Monteiro Rusu Advogados e Mindsait também já trocaram os brindes corporativos por créditos de impacto do GiftAid. Ao todo, mais de 60 mil reais que seriam gastos com brindes corporativos já foram destinados para ONGs por meio da iniciativa.
Vivian afirma que, embora haja um prazo de dois meses para realizar a doação, em geral as pessoas já começam a doar ainda durante o evento, logo depois de receber o cartão. E o GiftAid investe em comunicação para estimular esse comportamento:
“A gente tem mensagens bem legais que vão junto com o cartão, como: ‘Esse é o presente mais valioso do mundo e só você pode ativá-lo’…”
Mesmo assim, caso um funcionário esqueça de doar ou perca o cartão, a plataforma pode entrar em contato com a empresa e decidir diretamente com ela para quais ONGs direcionar o valor contratado (ou deixar isso combinado previamente).
Deixar o mundo corporativo e o emprego CLT foi um dos primeiros desafios que Vivian enfrentou quando decidiu criar o GiftAid. Mas não o principal.
“O [pouco] hábito e a [falta de uma] cultura de doar no Brasil ainda são uma grande barreira. Mesmo com nossa plataforma já rodando bem, sinto uma enorme dificuldade em relação a isso”, diz.
Segundo a Pesquisa da Doação no Brasil 2024, publicação bianual do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, os brasileiros doaram 24,3 bilhões de reais no ano passado, um crescimento de 64% em relação ao último relatório. Por outro lado, houve queda na proporção de doadores, de 84% para 78%.
Vivian espera que sua proposta contribua para melhorar cada vez mais esse cenário. E vislumbra novos horizontes para o negócio:
“Hoje, a gente tem uma base de mais de 80 ONGs de todo o Brasil, com diferentes portes e projetos. É um valor agregado imenso… Pensando em potencializar esses projetos para além da questão financeira, já levantamos a possibilidade de criar um pilar de academy para capacitação ou networking”
Se isso acontecer, a plataforma terá não só cumprido seu papel, mas realizado uma metamorfose. “Talvez aí o GiftAid se torne outra coisa… mas isso são planos futuros.”
Falar inglês ainda é um privilégio raro no Brasil. A Storm Education quer ajudar mais gente a se virar no idioma oferecendo (por WhatsApp) um curso de nível básico, com conteúdos rápidos, bem-humorados e adaptados à cultura brasileira.
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