Em abril, o Grupo GPA — dono das marcas Pão de Açúcar, Extra e Assaí, entre outras — precisou contratar, às pressas, 5 mil funcionários temporários para dar um gás extra nas operações de lojas físicas e no e-commerce.
A urgência era compreensível. Além do afastamento de profissionais de grupos de risco, a Covid-19 alavancou o e-commerce da empresa, que cresceu 82% no primeiro trimestre de 2020 na comparação com o trimestre anterior. Para dar conta dessa demanda, o GPA recorreu ao ecossistema de startups.
“Conseguimos, em dois dias, rodar junto com a Gupy uma plataforma para o recrutamento desses 5 mil colaboradores”, diz Otávio Thomé, head de inovação do GPA.
A Gupy, startup de RH (ou “hrtech”), já era fornecedora da companhia. “O trabalho da Gupy nos dá mais assertividade para encontrar o melhor perfil para uma vaga. Estamos com outro projeto conjunto para o segundo semestre focado em trazer mais inteligência para reduzir o turnover.”
O case é um exemplo de como a varejista vem se beneficiando de inovação. Com 100 mil colaboradores, o GPA tem mais de mil lojas em 22 estados e no Distrito Federal, incluindo uma pluralidade de bandeiras, como Minuto Pão de Açúcar e Mini Extra.
Em 2019, o faturamento bruto foi de 59,1 bilhões de reais, 10,2% a mais do que no ano anterior. O grupo controla ainda o Éxito, varejista com operações na Colômbia, Argentina e Uruguai.
HÁ TRÊS ANOS, A EMPRESA ESTRUTURAVA A SUA ÁREA DE INOVAÇÃO
O GPA estruturou sua área de inovação em março de 2017, inicialmente com o nome de Inova GPA. Formado em administração pelo Insper, Otávio, o head atual, chegou ao GPA naquele mesmo ano — mas para atuar em outra frente.
“Entrei inicialmente participando de um projeto de sinergia com essas empresas latino-americanas do grupo”, afirma. “Brinco que foi a melhor porta de entrada, porque eram iniciativas transversais e pude conhecer muito bem o negócio do varejo alimentar.”
No ano seguinte, ele migrou para ser gerente financeiro de uma nova área de transformação digital. “Fui apoiar o CTO a construir todo o planejamento. Foi um trabalho de intraempreendedorismo mesmo, de começar uma área do zero.”
Desde setembro de 2019, Otávio está à frente do GPA Labs.
“Vim com o desafio de trazer áreas que [ainda] não abraçavam o mindset de inovação para ‘jogar esse jogo’ — e trazer também um viés de cálculo de retorno financeiro, de como podemos mensurar melhor as iniciativas de inovação como pilar estratégico”
Disseminar esse mindset era, claro, um dos objetivos centrais desde o começo. Era preciso, porém, avançar para além das sessões de Design Thinking e provas de conceito de soluções.
“Desde que assumi, foquei em aumentar essa taxa de conversão de provas de conceito para roll-out [lançamento, operacionalização], sendo um pouco mais assertivo.”
UMA NEWSLETTER SOBRE O TEMA CHEGA A 18 MIL COLABORADORES
Ele explica que a estratégia de inovação do GPA Labs se desdobra em seis pilares. O primeiro deles é chamado internamente de Insights e tem a missão de disseminar conhecimentos e trazer tendências de inovação para dentro do grupo.
“Criamos um grupo no Workplace onde postamos notícias relacionadas ao varejo alimentar, ao que nossos concorrentes estão fazendo em inovação… Esse grupo tem hoje mais de 4 mil membros. Também disparamos uma newsletter semanal para 18 mil colaboradores com tendências que enxergamos como oportunidades.”
O segundo pilar, chamado de Em Loja, tem a ver com incrementar a experiência e a oferta de produtos aos clientes por meio do relacionamento com startups.
“O consumo está cada vez mais focado em produtos naturais, orgânicos, sustentáveis. Nos últimos 12 meses, colocamos para dentro do GPA mais de 130 produtos, principalmente plant-based, de 18 foodtechs, que já venderam aproximadamente 1 milhão de unidades”
Pelo viés de serviço, está em fase de roll-out para todas as lojas uma parceria com a startup Rentbrella, de compartilhamento de guardas-chuvas; as primeiras máquinas foram instaladas em 2019, em unidades do Pão de Açúcar na Zona Sul de São Paulo.
OS EMBAIXADORES DE INOVAÇÃO PASSAM POR UM PROCESSO SELETIVO
A terceira vertical do GPA Labs atende por I.N., iniciais de Innovation Network. Essa rede se compõe de embaixadores, executivos de diversas áreas que cuidam de “capilarizar os pontos focais” de inovação.
Os embaixadores passam por um processo seletivo (com apoio do RH), a partir da apresentação de uma proposta de desafio de negócio relevante ao grupo.
“No início do ano, tivemos mais de 250 inscrições. Fizemos um sprint de 23 dias, entre janeiro e fevereiro, e selecionamos 29 embaixadores. O programa tem uma trilha de desenvolvimento que culmina numa ‘formatura’, em dezembro”
Só nos últimos três meses, o GPA Labs mapeou 55 desses desafios, que vêm sendo atacados em parcerias com startups — vão desde evitar a “quebra da gôndola” (quando produtos próximos do vencimento encalham nas lojas) até missões mais pontuais, como o recente recrutamento-relâmpago via Gupy.
Para destravar pilotos, o Labs conta ainda com “ninjas” de inovação em áreas estratégicas, como jurídico ou TI, que dão feedbacks sobre a viabilidade de se implementar um projeto e como conferir mais fluidez aos trâmites internos.
“Vamos supor que eu precise de um fast track para acelerar os pagamentos a uma startup”, diz Otávio. “Os ninjas nos ajudam a viabilizar isso, e a entender como as soluções daquela startup podem ser plugadas dentro dos nossos sistemas.”
DIÁLOGOS COM O MEIO ACADÊMICO AJUDAM A DIFUNDIR BOAS PRÁTICAS
A inovação não surge apenas dentro de empresas. De olho nisso, o grupo vem buscando conexões fora do ecossistema empreendedor (essa é a quarta vertical da área, denominada GPA Labs Conecta).
“No momento, estamos conversando com a UFRJ e a Universidade Federal de Lavras sobre o uso de bioplásticos em embalagens. Também estamos patrocinando uma pesquisa com o The Good Food Institute que vai trazer insights sobre o consumidor brasileiro e o mercado plant-based”
Dentro ainda desse eixo, o GPA Labs anunciou, em março, a criação de uma rede de cientistas de dados (batizada de Data & Pizza) para discussão e debate.
“A ideia é que a gente troque, com outras empresas, boas práticas relacionadas a ciência e gestão de dados — seja de clientes, seja de colaboradores.”
EM MENOS DE UM ANO, O GPA LABS MAPEOU MAIS DE MIL STARTUPS
Além de um espaço próprio na sede do Grupo, na Avenida Brigadeiro Luis Antônio, em São Paulo, o GPA mantém uma área no quinto andar do Cubo, na Vila Olímpia, para eventos com startups e reuniões de matchmaking.
Essa tabelinha com o ecossistema empreendedor alimenta o quinto pilar, GPA Open Labs, e permite identificar startups que tenham aderência aos desafios de negócios.
“Nos últimos 11 meses, mapeamos mais de 1 050 startups. Hoje estamos com uma taxa de conversão de 10% e reduzimos de 90 para 55 dias o funil entre apresentar uma startup a uma área de negócio e o início de um projeto-piloto”
Entre essas empresas está a Looqbox. A startup se tornou fornecedora do GPA para responder ao desafio de “democratizar o acesso dos colaboradores a ferramentas de BI [Business Intelligence]”. Em três meses, diz Otávio, o GPA Labs viabilizou que 2 mil colaboradores passassem a usar a ferramenta da Looqbox, que permite acessar e comparar indicadores de venda de diferentes lojas em tempo real.
A Looqbox é residente do Cubo. Outro parceiro relevante do GPA é a Endeavor. “Estamos apoiando três linhas temáticas do programa de aceleração de scale-ups da Endeavor. O objetivo é conhecer soluções escaláveis para o nosso negócio.”
AQUISIÇÕES PARA COMPLEMENTAR OS ATIVOS ESTRATÉGICOS
O sexto e último pilar de inovação é o GPA Labs Ventures, a frente de investimento.
“O objetivo dessa vertical é olhar o mercado não só com o viés de fornecedores e parceiros, mas de potenciais startups e scale-ups que possam complementar os nossos ativos estratégicos e trazer vantagem competitiva no médio e longo prazo”, diz Otávio.
Até aqui, foram duas startups adquiridas. A compra da James Delivery foi formalizada no fim de 2018. A startup é uma concorrente de serviços como Rappi e iFood. Otávio explica o que motivou o negócio:
“Uma quantidade grande dos clientes tinha necessidade de uma ‘compra de conveniência’. É aquela compra mais urgente, pequena, de baixo tíquete médio. Por exemplo: você está fazendo o jantar e precisa de azeite e sal. Comprando pelo James, o serviço entrega em até uma hora na sua casa”
A outra aquisição, em novembro passado, foi a da startup Cheftime, que segundo Otávio veio para “complementar a jornada de marcas exclusivas” do Pão de Açúcar.
“Temos a Taeq, que trabalha com saudabilidade, e a Qualità, com soluções para o dia a dia, mas não tínhamos uma marca que entregasse uma experiência”, diz. “A Cheftime é pioneira nesse segmento, atua na oferta de refeições prontas e kits gastronômicos para garantir conveniência, comida fresca e de qualidade.”
Os dois serviços se complementam: as refeições da Cheftime são entregues (por enquanto apenas em São Paulo) via James Delivery.
A COVID-19 VEM ACELERANDO ADAPTAÇÕES E LANÇAMENTOS
Nos últimos meses, o Pão de Açúcar instalou mais de 5 mil “cotoveleiras” nos freezers e geladeiras de suas lojas (a ideia é cobrir todos os 185 endereços da marca até o fim de julho). Desenvolvido junto com fornecedores, o acessório serve de maçaneta, permitindo que o cliente abra a porta com o cotovelo ou o antebraço.
Com a Covid-19, porém, os clientes têm procurado cada vez mais a compra digital. Para dar conta da demanda, o GPA tem feito adaptações.
“Nos últimos meses, inauguramos três mini centros de distribuição para atender o e-commerce no período de Covid-19”, diz Otávio. “São CDs menores, instalados nos fundos de lojas do Extra Hiper, que têm metragem maior.”
O grupo também acelerou o lançamento da operação de lojas Express, modalidade de entrega da compra pelo e-commerce em que os produtos, adquiridos em menor quantidade, saem do estoque da própria loja — e chegam em até 10 horas.
“Hoje, temos mais 200 operações de lojas Express. O número era para ser batido só no meio do ano que vem.”
O e-commerce hoje representa 3% do faturamento do varejo alimentar da companhia (considerando Extra e Pão de Açúcar). Esse percentual deve subir.
“Tivemos a onda da digitalização dos eletroeletrônicos, do varejo de moda… Pesquisas sempre indicaram que o e-commerce alimentar seria a última onda da digitalização do varejo. A Covid está contribuindo para acelerar esse processo.”
O mercado de materiais de construção e decoração sempre foi muito pulverizado. Rodrigo Murta, CTO da Leroy Merlin, conta como a varejista vem testando soluções e refinando sua oferta digital para entregar mais valor a seus clientes.
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