Por que ensinar empreendedorismo às crianças pode ser um bom negócio (mesmo que seu filho nem sonhe em empreender)

Maria Isabel Macegosso - 10 ago 2021
Maria Isabel Macegosso, sócia-diretora da MBA Kids, escola de empreendedorismo para crianças e adolescentes.
Maria Isabel Macegosso - 10 ago 2021
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A melhor fase de aprendizado do ser humano é nos primeiros anos de vida até a adolescência. O processo de desenvolvimento do cérebro só é concluído pouco antes da vida adulta. Por isso, quanto mais cedo uma criança tiver contato com um determinado tema e for estimulada a realizar determinadas atividades, mais fácil será para assimilar esses conhecimentos. 

Partindo deste princípio e vislumbrando um futuro onde crianças e adolescentes possam desenvolver sua capacidade de montar e gerir seus negócios, o empreendedorismo infantil ganha relevância.

Em um país com uma cultura empreendedora tão forte quanto o Brasil, é comum que as pessoas empreendam de forma repentina, cometam erros graves e não consigam manter uma empresa no mercado por muito tempo.

Além disso, em virtude de tantas transformações – principalmente a digital –, o mercado de trabalho mudou muito e hoje exige competências específicas.

A busca é cada vez maior por pessoas com múltiplas habilidades, que tenham a capacidade de adaptação a situações diversas, autonomia e vontade de ser um agente transformador. Esse cenário deixa clara a importância de proporcionar aos estudantes uma formação completa que lhes dê ferramentas para estimular o pensamento crítico, a análise de problemas e a busca por soluções efetivas

Para além do aspecto profissional, incluir o empreendedorismo no universo infantil é uma forma de trabalhar habilidades pessoais como criatividade, comunicação e liderança.

QUAIS AS VANTAGENS DE ENSINAR UMA CRIANÇA SOBRE O MUNDO DOS NEGÓCIOS?

A partir da educação empreendedora, os estudantes compreendem as diferenças entre diversos empreendimentos, aprendem a se organizar financeiramente e têm contato com aspectos do mercado profissional. Mas não para por aí.

Uma importante competência trabalhada é o desenvolvimento da liderança — habilidade muito valorizada no mercado de trabalho, bem como em diversas dinâmicas sociais.

O desenvolvimento dessa habilidade não é apenas sobre exercer liderança sobre outros. Trata-se mais de mostrar aos jovens que eles são capazes de conduzir a si mesmos rumo à conquista de seus objetivos

O estímulo precoce da liderança prepara crianças e adolescentes para conceber suas próprias convicções, reconhecer suas capacidades e pontos fracos, atuar para desenvolverem-se plenamente, além de estimular que as pessoas ao redor façam o mesmo.

O futuro pede que a educação empreendedora seja levada a sério na formação de nossos jovens. As mudanças socioeconômicas e culturais em curso, por conta da revolução tecnológica que vivemos, pedem que as próximas gerações tenham capacidade de adaptação.

Hoje, diversos países já investem na educação empreendedora na infância. No Reino Unido, por exemplo, aproximadamente metade das crianças estão iniciando pequenos negócios para fazer seu próprio dinheiro, mesmo recebendo mesadas e presentes dos pais.

Uma pesquisa liderada pela investidora britânica Sarah Willingham apontou que 32% das crianças locais querem ser donas do próprio negócio quando crescer.

A “VEIA EMPREENDEDORA” ESTÁ NO DNA OU PODE SER APRENDIDA?

E para ser dono do próprio negócio é preciso preparo. Mas não foi bem isso que um estudo do King’s College de Londres constatou. A conclusão foi de que o talento dos fundadores de grandes negócios está no DNA e não pode ser ensinado.

Felizmente, contrariando os pesquisadores do King’s College, outra pesquisa da Universidade de Minnesota apontou que características inatas como paixão, visão, tolerância ao risco, persistência e liderança natural só determinam o sucesso de um empreendedor em 30% do tempo

O restante depende de boa comunicação, empatia, foco, flexibilidade, colaboração e comprometimento — habilidades comportamentais e emocionais que só podem ser desenvolvidas a partir das experiências individuais.

Outras capacidades que podem ser treinadas desde a infância são a criatividade, o pensamento crítico e a resolução de problemas complexos. A tese deixa clara a importância da educação empreendedora.

OS NEGÓCIOS DOS PEQUENOS: DE CAMISETA ANTICALOR A CUPCAKES

Nesse sentido, iniciativas no Brasil e no mundo têm se dedicado a estimular o empreendedorismo infantil a partir do desenvolvimento pessoal de seus alunos. Entre elas, cito a escola de empreendedorismo da qual estou à frente, a MBA Kids Brasil, com foco em crianças e adolescentes de 7 a 17 anos.

A ideia do negócio nasceu devido ao interesse do meu filho de 15 anos pelo tema. O Gabriel passou a se destacar muito em uma escola de negócios e, a partir dessa experiência, tomou para si a missão de estimular o empreendedorismo em outras crianças.

Assim, decidi trazer a MBA Kids International para o Brasil. O grupo está presente em outros quatro países: Azerbaijão, Cazaquistão, Emirados Árabes e Ucrânia. 

Entre as propostas internacionais, vale destacar a Tomorrow’s Lemonade Stand (ou, em tradução livre, a Banca de Limonada do Amanhã), criada em 2012 e que capacita crianças de 7 a 12 anos por meio de um programa de quatro meses, em que os participantes aprendem conceitos de empreendedorismo por meio de uma plataforma online e se reúnem em clubes fora do horário da escola. A ideia é que, no módulo final do curso, a criança coloque em prática sua ideia de negócio.

O currículo da Tomorrow’s Lemonade Stand  foi todo pensado por Kylee Majkowski, na época com apenas 7 anos. Ela começou a se questionar por que a escola não ensinava empreendedorismo para os alunos, inspirada por uma visita ao escritório de sua mãe, a empreendedora social Amanda Antico, que decidiu fundar a Tomorrow’s junto com a filha

Centenas de crianças já foram formadas pela iniciativa. Os negócios desenvolvidos pelos pequenos abrangem desde um site com a proposta de ensinar tecnologia para avôs e avós, passando por uma produção de cupcakes até a invenção de uma camiseta “anticalor”, que tem um bolso interno no qual se coloca um saco de gelo para refrescar quem a veste.

COMO O EMPREENDEDORISMO PODE AJUDAR ESTUDANTES DE BAIXA RENDA

A educação empreendedora, vale ressaltar, tem um grande potencial para criar postos de trabalho, envolver os jovens na escola e proporcionar ascensão econômica para as pessoas em comunidades de baixa renda.

Pensando nisso, a Network for Teaching Entrepreneurship – NFTE, rede pioneira em educação para o empreendedorismo, foi criada em Nova York no hoje longínquo ano de 1987.

O fundador, Steve Mariotti, era um professor de matemática de uma escola carente do Bronx que vivia frustrado com o número de alunos que abandonavam os estudos. Ele notou que a esperteza e criatividade dos estudantes poderia ser melhor canalizada para idealizar e viabilizar novos negócios, além de aumentar o engajamento dos adolescentes com a escola e  a sociedade

Assim, Mariotti deu início a uma entidade sem fins lucrativos que ganhou escala global. Hoje, a NFTE atua em áreas de baixa renda de diversos países.

A EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA AMPLIA A VISÃO DE MUNDO DAS CRIANÇAS

O modelo tradicional de ensino no Brasil tem, aos poucos, assimilado a educação empreendedora para trabalhar aspectos comportamentais dos alunos que não são estimulados em outras disciplinas da grade curricular.

A formação por meio do empreendedorismo se propõe a desenvolver pessoas com um comportamento mais flexível, proativo, e aptas a lidar com as adversidades de um mundo desigual, diverso e inconstante

Ao viver parte do universo do empreendedorismo, crianças e adolescentes  desenvolvem a capacidade de lidar de forma equilibrada com conflitos internos e externos, e são estimulados a encarar os problemas, independentemente de sua complexidade.

A partir disso, são instigados a enxergar oportunidades e analisar cenários adversos, avaliar recursos de forma assetiva e buscar as melhores soluções para as mais diversas questões, com coragem e autonomia.

O empreendedorismo tem potencial para qualificar o conhecimento de crianças e adolescentes. Por meio do seu ensino, vamos possibilitar que esses jovens cheguem à vida adulta com uma visão de mundo clara e ampliada — e uma bagagem de experiências que vão orientar suas futuras decisões profissionais. 

 

Maria Isabel Macegosso é sócia-diretora da MBA Kids, uma escola de empreendedorismo para crianças e adolescentes que tem como missão apresentar aos pequenos a arte de empreender de forma prática e lúdica.

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