Quer fazer a pós-graduação dos seus sonhos em Nova York, com bolsa integral? Pergunte-me como

Francisco Chocholous - 9 jul 2015Francisco Chocholous: tão importante quanto ser talentoso é ser teimoso - não basta ter farinha no saco, é preciso ter disposição para ralar (Foto: Michell Lott)
Francisco Chocholous: tão importante quanto ser talentoso é ser teimoso - não basta ter farinha no saco, é preciso ter disposição para ralar (Foto: Michell Lott)
Francisco Chocholous - 9 jul 2015
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Por Francisco Chocholous

 

As universidades americanas publicam anualmente os famosos acceptance rates — a porcentagem de candidatos aceitos no ano  —,  competindo entre si para ser a mais cobiçada e a mais seletiva. Universidades como Harvard, em Boston, ou Columbia, em Nova York, aprovam apenas 5% dos candidatos que se inscrevem. É difícil. E diante da dificuldade, do que parece impossível, e do que você quer muito, o que devemos fazer? Tentar, é claro.

Dois anos atrás, quando visitei Nova York pela primeira vez, senti algo como um chamado, um toque em minha alma – eu tinha que morar naquela cidade. Como essa meta já era difícil, resolvi complicá-la ainda um pouco mais: queria ir para lá para me dedicar de uma vez por todas a escrever – algo que sempre quis fazer, mas o dia a dia não deixava.

Naquela própria viagem joguei o roteiro turístico no lixo e fui visitar algumas escolas. Mal cheguei em São Paulo e já estava levantando os documentos necessários e agendando a prova de inglês. Dois meses depois, tinha mandado minha inscrição para as três escolas que me interessavam. Minha preferida era a Tisch, a faculdade de artes da Universidade de Nova Iorque (NYU).

Minha carreira no Brasil ia muito bem: depois de dois anos trabalhando no Marketing de um dos maiores anunciantes do Brasil, envolvido no patrocínio da Copa do Mundo da FIFA 2014, fui convidado, depois de um longo processo seletivo, a assumir a posição de editor-chefe das redes sociais da marca. Uma vaga concorrida – quem não gostaria de trabalhar com as mídias sociais de uma das maiores marcas do país?

Alguns meses depois, uma surpresa. No meio de uma reunião sobre um grande projeto, recebo um e-mail no celular. Tinha sido aceito na NYU. Comecei a tremer. Liguei para o meu pai. Mostrei para a minha melhor amiga. Minutos depois, começo a fazer as contas e caio na real: não tenho dinheiro. Não vai dar para pagar. Preciso de uma bolsa. Como se faz para conseguir uma bolsa?

Em paralelo, todo dia eu me questionava se queria mesmo deixar o meu trabalho. Eu, jornalista formado na UFMG, tinha 24 anos e morava há quatro em São Paulo, para onde tinha vindo ao ser selecionado para um curso de Trainee. Estava bem posicionado – deixar a vida executiva e sair do Brasil implicaria abandonar uma estrada promissora para mim no país.

Pesquisei bastante sobre a bolsa. Não poderia obtê-la no Brasil, porque não sou cidadão brasileiro – nasci em Mendoza, na Argentina. Não poderia ser da Argentina, porque não resido no país. E uma bolsa da própria NYU, nem pensar. A universidade tem “fundos limitados” que usa com muita parcimônia — bolsas integrais são “raríssimas”.

A gente sempre pensa que o cara que está recebendo o prêmio no pódio é um vencedor nato, e está lá, sorridente e elegante, porque as coisas acontecem para ele. A verdade é que ele está lá todo suado, cansado, estropiado. Nada está garantido para ninguém – o que equivale a dizer que tudo está ao alcance de todos.

Teimoso, não desisti. Mandei e-mail para todos os professores e funcionários da NYU cujos endereços eu consegui achar. Alguns ignoraram meu contato, outros foram simpáticos – mas ninguém abriu o bolso. Me dediquei ao trabalho – e vivi os melhores meses da minha vida no marketing. Eu compunha a equipe digital de uma das patrocinadoras oficiais da Copa do Mundo no Brasil. Caí dentro. Muito trabalho – e muita alegria.

Em novembro, fui para Nova York de novo. Marquei reunião com todos aqueles que foram simpáticos ao meu e-mail. Conversei, contei de mim, perguntei deles. Na última conversa, o diretor da área de televisão da faculdade, que tinha lido meus roteiros, me falou que eu era seu candidato favorito. Que não tinha entrado por “um erro”. “Não cometa nenhum crime”, falou, “porque ano que vem você vem pra cá”. Saí de lá flutuando, zonzo, andando sem rumo pela Broadway, com um sorriso bobo no rosto. Voltei para casa e refiz a inscrição. Mandei tudo de novo. Nova York começava a me sorrir.

Na quinta, 19 de março de 2015, às 14h, eu estava pronto pra entrar em um novo ciclo em meu trabalho. Copa conquistada, novos desafios pela frente. Meu celular toca. Um e-mail da NYU. Abro o anexo. A primeira folha da carta é igual à do ano anterior: parabéns, você passou. Na segunda, uma surpresa: “você foi aceito com bolsa integral”.

Faz poucos dias que me despedi dos meus colegas de empresa, deixando para trás três anos e meio de trabalho e convivência. A vida é feita de escolhas. Como dizia meu chefe, “não se pode comer o bolo e ficar com o bolo”.

Mês que vem, embarco num avião para Nova York. Para um período de estudos de dois anos. Fiz a coisa certa? Acho que sim. O que me aguarda no futuro? Não tenho a menor ideia. Mas estou preparado para lidar com o que vier. É fácil dar um salto desses? Absolutamente, não.

Estou trocando um bom emprego – coisa que está em falta hoje no Brasil – e o conforto e a segurança de trabalhar para uma grande empresa, para voltar a ter uma vida de estudante. Apesar da bolsa, que paga o tuition fee na universidade, terei que torrar a minha poupança e realizar trabalhos estudantis para arcar com os custos de casa e comida nos Estados Unidos.

Estou trocando o mercado publicitário, no qual já começava a conquistar meu espaço, para ser roteirista e viver os riscos da economia criativa, trabalhando de projeto em projeto (meu curso na Tisch é “Escrita Dramática”, uma mistura de TV, cinema e teatro). Não foi fácil tomar essa decisão. Assim como nada foi fácil nesse processo que resultou na minha ida para a NYU. Não sou o gênio brilhante que mandou um texto e foi aceito de primeira, com louvores — sou o cara que não desistiu, o que aguentou mais tempo, o que insistiu mais.

A vida tem seu próprio acceptance rate. E com frequência ele é menor que 5%. Então você tem que estar disposto a ralar.

É isso que diferencia os que correm atrás dos seus sonhos, por mais impossíveis que eles possam parecer, e por mais sacrifícios que eles possam impor, daqueles que olham da arquibancada e falam “que cara sortudo, eu queria ter essa sorte também”. Ou então: “que cara talentoso, eu queria ter esse tanto de talento também”. Sim, é preciso ter talento. Sim, é preciso ter um pouco de sorte. Mas, mais do que tudo, é preciso ter muita força de vontade e correr atrás.

A gente sempre pensa que o cara que está recebendo o prêmio no pódio é um vencedor nato, e está lá, sorridente e elegante, porque as coisas acontecem para ele. A verdade é que ele está lá todo suado, cansado, estropiado. Nada está garantido para ninguém – o que equivale a dizer que tudo está ao alcance de todos.

Quando você consegue o que quer, e recebe o prêmio, exausto, no fundo está se perguntando, em silêncio, se tudo aquilo valeu a pena. Faz sentido deixar o conforto, a vida mais segura, o sono tranquilo? Faz sentido ter que falar tchau para seus amigos, sua família, ver as lágrimas rolarem dos olhos de quem você ama – e dos seus também?

Não sei — só vou poder responder isso daqui a alguns anos. Ou, talvez, nunca. Mas mesmo se eu quebrar a cara, ficar sem dinheiro, voltar derrotado, pelo menos eu fui ver qual é. Explorei a possibilidade. Atendi o chamado quando ele surgiu em meu peito. Ninguém poderá dizer, nem eu mesmo, que eu não tentei. E isso não tem preço.

Tenho certeza de que quando o perfil da cidade se desenhar na janela do táxi, e o topo do Empire State Building despontar no meio de Manhattan — meu novo lar visto por quem chega do aeroporto —, pelo menos nesse momento, valerá muito a pena.

 

Francisco Chocholous, 25, é escritor, e atuou como editor-chefe das redes sociais do Itaú de 2013 a 2015.

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