Nasci no Rio de Janeiro, em uma casa cheia de samba, discussão boa e sonhos diferentes convivendo sob o mesmo teto.
Cresci ouvindo histórias do meu pai, nascido no Morro da Providência, dizendo que eu podia ser o que eu quisesse, que bastava acreditar, correr atrás e não depender de ninguém.
E também observando minha mãe, filha de militar, que se desdobrava para seguir sua carreira de auditora fiscal sem abrir mão de cuidar de mim e do meu irmão, dois anos mais velho.
Desde cedo fui boa aluna, curiosa, questionadora. Mas o que ninguém esperava é que, aos 16 anos, eu engravidasse. E que escolhesse ter meu filho
Me casei muito jovem, me separei logo depois, e fui reconstruir minha vida em São Paulo.
Entrei na faculdade de Jornalismo e comecei a escrever não apenas reportagens, mas o primeiro capítulo da minha trajetória como mulher, mãe, profissional e empreendedora – às vezes tudo ao mesmo tempo.
Trabalhei nas grandes redações especializadas em tecnologia. Viajei o mundo, fui premiada, entrevistei gente importante, liderei portais de conteúdo que pautavam o setor.
Mas, mesmo com o brilho, havia algo faltando. Eu queria mais sentido, mais impacto.
Quando a bolha da internet estourou, fui demitida. E foi nesse baque que surgiu, sem que eu planejasse, a oportunidade de empreender como sócia numa agência de comunicação.
Sete anos depois, deixei a sociedade. Não por fracasso, mas por coragem. Coragem de continuar do meu jeito, com meus valores
Nascia a Espiral Interativa, uma agência feita para comunicar projetos com causa e com alma. E, desde o início, com o desejo de incluir.
Logo no primeiro grande projeto, a grande virada. A Fundação Dorina Nowill nos perguntou: “A comunicação de vocês é acessível pra quem usa leitor de tela?”
Eu já conhecia o tema da acessibilidade, mas não o colocava em prática. Naquele momento, entendi, de verdade, o quanto aquilo era necessário e impactante na vida de milhões de pessoas
Comecei a estudar acessibilidade digital com a mesma intensidade com que, aos 13 anos, produzi minha festa tropical com colares feitos de canudo, pranchas emprestadas e folhas de bananeira de um terreno baldio.
Só que agora não era festa. Era urgência. Era compromisso.
Foi nesse contexto que surgiu o Movimento Web para Todos, em 2017. A ideia nasceu quando fui selecionada para o programa internacional 10.000 Women, da Goldman Sachs Foundation.
A iniciativa, super referenciada no universo do empreendedorismo feminino global, mapeia empreendedoras ao redor do mundo que, na visão da instituição, apresentam grande potencial de transformação social por meio de seu negócio.
Lá, em meio a mentorias riquíssimas e trocas ainda mais extraordinárias com mulheres de todo o mundo, ouvi de outras empreendedoras o quanto nós somos ensinadas a duvidar de nós mesmas. Ensinadas a achar que “não somos capazes”, “não damos conta”, “não devemos sonhar grande”…
E foi ali que decidi criar o Movimento. Convidei mais de 20 organizações incríveis para apoiar a iniciativa, entre elas, o W3C Brasil, a Fundação Roberto Marinho e a Fundação Dorina.
O projeto cresceu e, em pouco tempo, fui convidada para compartilhar nossas experiências em eventos internacionais.
Uma das memórias mais simbólicas foi ter minha foto estampada num pilar de 10 metros de altura no saguão da sede do banco, em Manhattan. Ali, entendi que era verdade e era possível.
Vieram os cursos, as oficinas, os diagnósticos, as consultorias. Vieram os nãos também. Porque, por muito tempo (e até hoje, em alguns lugares), acessibilidade digital ainda é vista apenas como algo “bacana de ter” – não como essencial.
Empreender com propósito é isso: vender sonho todo dia, explicar do zero, insistir em algo que muita gente ainda nem reconhece como necessário
Incluir é não desistir. É insistir em ver o que ninguém quer ver. É transformar ruído em voz, invisibilidade em protagonismo. É fazer com que cada pixel conte, e conte pra todo mundo. Não como um favor, mas como direito.
Ser mulher e mãe, no meio disso tudo, é outro capítulo. Tive três filhos. Um deles, ainda na adolescência. E nunca parei.
O que me movia era maior: o desejo de mostrar que dava pra ser mãe, dar conta, e ainda assim construir algo relevante, com impacto social de verdade. Que dava para cuidar de pessoas e de ideias
E hoje, pra minha alegria, sou também avó. Um netinho lindinho chegou há pouco para ressignificar ainda mais tudo. Porque a gente nunca termina de se transformar.
Sigo empreendendo com propósito, com amor e com coragem. Minha equipe é 100% formada por mulheres.
A liderança que exerço é baseada em afeto, escuta e atitude. Fui amando cada parte desse caminho. E fui, o tempo todo, ressignificando.
No fundo, essa sempre foi a minha maior especialidade: ressignificar. Me adaptar sem perder o que sou. Olhar pra frente sem esquecer de onde vim. E lembrar, todos os dias, que inovar de verdade é incluir quem nunca foi considerado parte da inovação
E se posso deixar um recado para outras mulheres que estão começando (ou recomeçando) suas jornadas, é esse: a gente pode, sim. Mesmo quando o mundo insiste em dizer que não. Mesmo quando somos interrompidas, desacreditadas ou colocadas para escanteio.
Nosso jeito de liderar, de sentir, de cuidar, de construir, é uma força. E quando unimos tudo isso a um propósito claro, ninguém segura.
A minha história não é sobre sucesso fácil. É sobre persistência e sobre fazer da inclusão não a “cereja do bolo”, e sim o centro de tudo. Porque, quando incluímos, a gente transforma.
Simone Freire, 53, é jornalista, fundadora da agência Espiral Interativa e idealizadora do Movimento Web para Todos. Mãe de três e avó de um, construiu sua trajetória unindo comunicação, impacto social e acessibilidade digital. Ao longo dos últimos anos, tem se dedicado a ampliar vozes e abrir caminhos para que mais pessoas – especialmente aquelas historicamente invisibilizadas – possam participar plenamente do mundo digital.
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