Você aprende rápido? É ágil em desaprender conceitos velhos? No mundo de máquinas inteligentes, sua sobrevivência depende disso

Alexandre Teixeira - 14 out 2020
O jornalista, escritor e palestrante Alexandre Teixeira, coautor de "Aprendiz Ágil".
Alexandre Teixeira - 14 out 2020
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Três anos atrás, duas grandes perguntas se impuseram na minha mente.

Como as novas tecnologias de automação, “movidas” a inteligência artificial e machine learning estão mudando (e mudarão muito mais) o mundo do trabalho?

Como se manter profissionalmente relevante em um novo cenário, no qual as máquinas inteligentes farão uma parte cada vez maior do trabalho disponível?

Foi quando eu comecei as pesquisas que resultariam em Aprendiz Ágil, livro que lancei recentemente, com Clara Cecchini. 

O livro tem dois eixos narrativos principais. O primeiro é um diagnóstico: nele, abordamos utopias e distopias da era digital e as forças que estão mudando a forma como trabalhamos.

No segundo eixo, encaramos o desafio da relevância e aquilo que Clara chama de “aprendizagem ubíqua” — aquela que está por toda parte.

Gosto de pensar que Aprendiz Ágil traz insights diversos para quem está pensando o futuro do trabalho – em grande medida, transformado em presente pela pandemia – e refletindo sobre como estar um passo ou dois à frente das ondas de transformação.

Entre esses insights, uma visão da aprendizagem como construtora de futuros, para além do indivíduo. Visão ainda mais necessária quando se considera a incontornável desigualdade desde hoje até as sociedades pós-trabalho. 

Os robôs de escritórios já estão entre nós. Vivemos em um mundo em desorganização. Precisamos de uma transformação digital na aprendizagem que vá muito além do conteúdo. Que desça abaixo da superfície. Felizmente, existem movimentos bem promissores neste sentido

Narramos em Aprendiz Ágil uma experiência brasileira com inteligência artificial na educação e inovações nacionais em experiências de aprendizagem. Mostramos um novo jeito de aprender tecnologia, mas também o papel da emoção e da criatividade (beber em diferentes fontes e combinar conhecimentos, afinal, são “coisas” de aprendiz ágil).

A seguir, compartilho um trecho do livro, selecionado para os leitores do Draft.

 

Aprendizagem. Aprendiz Ágil.

Agilidade é muito mais do que velocidade ou rapidez. E não tem nada a ver com pressa. 

Agilidade é ter foco no valor entregue acima do cumprimento de processos e regras. 

É comunicação e feedback constantes, funções integradas dentro de uma equipe para chegar a um resultado, mais do que clientes e fornecedores (internos ou externos) que se cobram e que se controlam. É ter auto-organização e buscar a melhor performance coletiva.

Sem precisar obedecer a uma decisão hierárquica sobre como ser mais eficiente.

Já há algum tempo diversas indústrias passaram a incorporar os valores, princípios e a forma de organização dos Métodos Ágeis, nascidos no mundo do desenvolvimento de software. São vários os métodos, sendo o Scrum apenas um deles, embora tenha se tornado bastante conhecido e utilizado – o que pode nos levar a confundi-lo com o conjunto dos métodos ágeis.

Hoje vemos negócios tradicionais “tombarem para o ágil”, adaptando as possibilidades do método para projetos que não são de tecnologia e mesmo para atividades não relacionadas a projetos. 

Organizações rompem os silos das áreas de negócio e “áreas meio”, transformando alguns de seus times em squads (pequenos grupos multidisciplinares com objetivos específicos), ou incorporam rituais como as daily meetings, em que a equipe toda se reúne por cerca de 15 minutos todos os dias para dizer o que está fazendo e quais impedimentos tem encontrado.

Como qualquer método, o ágil não é aplicável a qualquer coisa. Mas seus valores e princípios, o mindset ágil, são preciosos para atuar no mundo da Quarta Revolução Industrial. Inclusive na aprendizagem. 

Diversas iniciativas educacionais no mundo todo vêm incorporando os princípios ágeis para a inovação nas metodologias de ensino e aprendizagem, desenvolvimento de conteúdos e outros. Aqui, porém, falamos é do aprendiz ágil. Aquele que toma as decisões sobre a sua própria aprendizagem ao longo da vida a partir do mindset ágil. 

Adaptabilidade e flexibilidade são princípios fundamentais. “Responder a mudanças mais que seguir um plano”. O método ágil reconhece e acolhe um dado da realidade: é muito difícil ter clareza sobre tudo o que é necessário no início do desenvolvimento de um software

Projetos passam por modificações porque pessoas têm novas ideias, enxergam aquilo que não viam antes, e a realidade muda constantemente. 

O “método cascata” buscava especificar tudo antes de desenvolver. O ágil se organiza em pequenos ciclos de entrega de valor (software funcionando), trazendo as mudanças como elemento de trabalho, vendo-as como redirecionamentos a partir da prática e da realidade, e não como uma falha de planejamento. 

O aprendiz ágil tem essa visão de processo incremental e conectado à realidade, em que é seu papel definir o que aprende e como colocar em prática. Não espera um manual de uso do conhecimento, mas faz ele mesmo as pontes e compartilha os insights que vêm da prática

Neste sentido, a colaboração, outro princípio do mindset ágil, também é ouro para o aprendiz ágil: o aprendizado se potencializa quando compartilhado; ganha sentido quando vai para o mundo.

A simplicidade, tendência enfatizada neste livro, também está presente na atuação do aprendiz ágil. Simples não quer dizer simplório ou superficial, mas intencionalmente construído, com criatividade e com leveza para realizar o que se propõe, sem esforço desperdiçado. Seja atualizar-se em algo que já conheça ou desbravar um campo do conhecimento totalmente novo.

Outro elemento do mindset ágil essencial ao aprendiz é a importância das interações. O aprendizado personalizado proporcionado pelas tecnologias, a aprendizagem autodirigida, são elementos a serem utilizados, mas não prescindem da interação com outros e com o contexto

Os métodos ágeis ajudam a eliminar os ruídos que tendemos a criar para nos distanciar da essência do que precisamos fazer. Somos capazes de aceitar regras que não fazem mais sentido e processos que se consomem em si mesmos 

Nos acomodamos em decisões tomadas por outros. O aprendiz ágil questiona criticamente a realidade e toma suas decisões sobre o caminho a seguir, subvertendo categorias de conhecimento, ousando interessar-se pelo novo e pelo tradicional ao mesmo tempo. Acolhendo o movimento constante como sua condição.

 

Alexandre Teixeira é jornalista, escritor e palestrante. Trabalhou na revista Istoé Dinheiro, no jornal Valor Econômico e foi editor-executivo e redator-chefe da Época Negócios. É autor de Felicidade S.A.De Dentro Para Fora e Rotinas Criativas, todos publicados pela Arquipélago Editorial, assim como seu livro mais recente, escrito com Clara Cecchini: Aprendiz Ágil — Lifelong learning, subversão criativa e outros segredos para se manter relevante na Era das Máquinas Inteligentes. Dele, o Draft já publicou dois artigos, em 2015 e 2017.

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