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“Hoje, meus colegas dizem que sou visionário! Seis anos atrás, diziam que eu tinha ‘coragem’ ou que era maluco…”

Marina Audi - 20 ago 2025
Reynaldo Gama, CEO da HSM e da Singularity Brazil.
Marina Audi - 20 ago 2025
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Depois de trabalhar 15 anos no mercado financeiro, onde se formou como profissional, Reynaldo Gama um dia recebeu um telefonema. Do outro lado da linha estava um headhunter. Aquela ligação daria início a uma transição de carreira – para a área de educação corporativa e executiva. 

Desde 2019, Reynaldo é CEO da HSM e também da Singularity Brazil, empresas pertencentes à Ânima Educação. Hoje, aos 40 anos, ele comanda oito unidades de negócio (Learning Village, SingularityU Brazil, HSM+, HSM Academy, HSM Management, HSM Experience, HSM University e B2B Match) e costuma se descrever como um “cara das conexões”. 

Sob sua orquestração, a HSM se transformou, cresceu e neste ano, fará a 25ª edição do HSM+, com preciosismo na seleção dos palestrantes. No “cinto de utilidades” da empresa, figuram programas longos, imersões e cursos dos mais variados matizes

“Não adianta você apresentar um faixa preta de algum tema para alguém que está na faixa branca – vai haver uma desconexão muito grande”, afirma Reynaldo. E completa o raciocínio: 

“Nas redes sociais, todo mundo se diz ‘especialista de tudo’. E essa é a maior dificuldade da curadoria: entender quem, de fato, tem a profundidade necessária para determinada pessoa que está num nível de conhecimento específico.”

Acostumado à cultura de muita exigência do sistema financeiro, ele continua a trazer um olhar crítico e atento a números, à excelência, à performance e ao processo do negócio. Nesta entrevista ao Draft, Reynaldo fala sobre a guinada em sua vida e carreira, e como se vê atualmente:

 

Em 2019, aos 34 anos, você fez a transição do mercado financeiro para o de educação corporativa e executiva, quando assumiu como CEO da HSM e da SingularityU Brazil. Foi um movimento oportunístico ou uma decisão mais “existencial”, tendo em mente que Filosofia foi sua primeira opção de curso Superior? Como você explica essa transição?
Tive uma questão muito existencial no início, mas isso se apagou na minha jornada. Fui para o mercado financeiro porque, na época, ele pagava mais para estagiários e tinha um plano de carreira super bem consolidado.

Comecei no BankBoston, um banco que tinha uma concorrência absurda para o programa de estágio. Entrei, segui nesse path [“caminho” em inglês] e fui gostando. Depois, no Itaú, passei por várias áreas e foram me puxando. Comecei no varejo, depois fui para o banco de atacado e, por último, entrei na área de tecnologia, no Cubo Itaú. Fui pegando gosto, mudando, entendendo as dinâmicas.

Não tem muito romantismo nessa história da transição… Em dezembro de 2018, eu tinha acabado de receber uma promoção e me tornado superintendente no Itaú. Era muito jovem, estava super bem, amava o que fazia no Cubo, estava no ápice. A gente tinha se mudado para um prédio novo, um projeto incrível, lindo.

Eu trabalhava num lugar com a mentalidade de crescimento de startup e era remunerado como executivo de banco. Foi incrível, conheci muita gente bacana. Aí, em 17 de dezembro, recebo uma ligação de uma pessoa representando um headhunter: “Olha, tem uma posição aqui super legal e você foi recomendado. A gente queria fazer uma entrevista contigo…”

Eu ia entrar em férias, então respondi: “Muito obrigado, mas esta é a minha última semana do ano. Estou com a agenda pré-férias. Volto em meados de janeiro, se você quiser me ligar, estarei à disposição para conversar. Agora, infelizmente não consigo”.

Passaram-se mais ou menos duas horas, e recebo a ligação do sócio dessa empresa grande de headhunter: “Estou te ligando porque a minha assistente me contou que, por conta de agenda, você não quis conversar. É uma oportunidade muito legal e eu estou com pressa. Eu não poderia abrir isso pra você, mas vou te dar um spoiler: é uma posição de CEO, na área de educação. Você foi muito bem recomendado e eu acho que pode ter muito fit”.

Fui conversar. Foi um processo longo que durou seis meses e era para assumir a HSM, que a Ânima Educação tinha comprado fazia cinco anos. Eles estavam num processo de digitalização e de expansão, queriam trazer a Singularity University para o Brasil, da qual eu era fã e onde já tinha feito curso. Isso me brilhou os olhos

Pensei: “Que bacana! Sempre trabalhei com serviço, vou trabalhar com serviço de educação”. Havia algumas similaridades: era uma empresa que atuava muito no B2B e que queria migrar a parte de eventos para educação.

[A transição] Não foi pelo propósito. Foi por querer uma mudança diária e por ter me apaixonado pela Ânima Educação e pelos fundadores: Daniel Castanho, Marcelo Bueno e Maurício Escobar. Percebi que eu trabalharia muito próximo a uma empresa de capital aberto e que os fundadores ainda estavam na operação. Na época, o Marcelo Bueno era o CEO, o Daniel Castanho tinha se tornado o Chairman. Os dois estavam ali super presentes. Eu pensei que seria muito legal, teria autonomia num projeto de transformação e ainda assumiria aos 34 anos como CEO!

Chegar à HSM foi um choque muito grande. Eu assustei! E confesso que não foi fácil, não foi legal. Cheguei a pensar: “Vou ficar aqui dois anos e vou sair, porque acho que isso não é meu”

E aí o que aconteceu foi [que encontrei] o propósito… E estou aqui há seis anos. O bicho da educação me mordeu, vi a dinâmica e quantas pessoas são apaixonadas pelo impacto da transformação. Eu não vim pelo propósito, mas estou e fiquei pelo propósito.

Você chegou a sofrer preconceito de antigos pares? Ou seja, no início, essa pivotagem pessoal incomodou alguém? Como você reagiu?
Sua pergunta é provocativa e tem todo um sentido, porque isso foi há seis anos. No começo, pouquíssimas pessoas me encorajaram. Hoje, acho que seria muito diferente.

Uma pessoa que me apoiou muito foi o próprio Ricardo Guerra, que era o meu chefe no Itaú. O Anderson Thees e o Flávio Pripas, da Redpoint eVentures, também, porque tinham esse olhar muito aberto e falaram: “Reynaldo, você é novo, vá testar, olhar e depois, quem sabe, você volta?”

Mas grande parte dos meus colegas e pares, na época, dizia: “Reynaldo, o que você vai fazer numa empresa de educação?”

Na época, a HSM era muito conhecida por eventos e ouvi coisas do tipo: “Vai trabalhar em eventos, abraçar árvore? Vai virar um bicho grilo!” Não deveria ter esse tom pejorativo, porque não faz mal a ninguém abraçar árvore e se conectar com a natureza! 

Questionaram o que eu estava fazendo com a minha carreira e sofri ao me deparar com isso. Eu era uma pessoa de 34 anos, que tinha estado numa empresa muito bacana, com um arcabouço, profissionalismo e uma governança fortes.

E com uma marca empregadora forte também…
Sim! E foi um choque cultural porque é outra dinâmica. Depois de tantos anos no banco, eu tinha algumas convicções. Por ser muito jovem, havia coisas em que eu me achava muito bom e, na verdade, eu não era. O banco é que era muito bom. Por exemplo, o Itaú era muito bom em atrair talentos pelo pacote de remuneração e pelo employer branding muito interessante.

Eu tive de desenvolver a técnica de identificar e chamar as pessoas por propósito… E descobri que havia coisas em que eu não me achava bom e, na verdade, eram as amarras do banco que não me deixavam voar. Eu não tinha liberdade, a governança era muito estrita.

Na Ânima, tocando a HSM e a SingularityU Brazil, pude descobrir novas habilidades que, antes eram mais cerceadas pela governança, pelo colegiado e pelos riscos. Então, foi uma etapa de autoconhecimento e transformação que me assustou, por meus colegas falarem que eu tinha feito uma bobagem. Eu cheguei a me arrepender e pensei que, de fato, tinha feito uma loucura, tinha jogado minha carreira [fora]!

Teve um agravante: entrei aqui dia 10 de junho de 2019. Oito meses depois veio a pandemia. O setor de educação é complexo, tem as margens muito mais baixas. Obviamente, se você é novo, vem uma série de medos. Bateu esse arrependimento, que logo foi compensado. E, de repente, cá estou, muito envolvido pelo propósito e impacto dessa causa

Hoje, meus colegas dizem que sou visionário! Seis anos atrás, diziam que eu tinha “coragem” ou que era maluco… Atualmente, educação é um setor super sexy porque neste mundo de IA, todo mundo está redescobrindo treinamento e desenvolvimento. É interessante olhar isso.

Brinco muito com os colegas do mercado financeiro sobre isso e todos dizem: “Poxa, cara, que legal, quero também! Como faço esse caminho?”

Me ocorre que, no Itaú, por mais que você tivesse ascendido ao cargo de superintendente, talvez não estivesse sendo preparado para ser CEO… lá o caminho é mais longo. Imagino que ao fazer a transição, você teve de aprender a ser CEO enquanto o trem estava andando. Pode comentar algo sobre isso?
O Itaú é um mar de gente… muitas pessoas qualificadas e preparadas. Eu virei superintendente muito novo. Foi uma carreira rápida: em 11 anos, mais ou menos, fui de estagiário a superintendente, o que foi muito bacana.

É lógico que eu tinha o sonho de alcançar essa cadeira [de CEO], mas tinha noção de que não basta somente a competência, o estudo. Você precisa ter os “astros” alinhados para estar no lugar certo, na hora certa. E tem de estar preparado para quando houver esse alinhamento

Eu enxergava no Itaú um caminho muito bacana para chegar a sócio, diretor, diretor executivo. Via outros colegas e amigos caminhando nesse sentido. Mas a cadeira de CEO era, de fato, algo muito distante. 

Aí, quando eu vou para essa cadeira, ainda um “menino” de 34 anos – no melhor sentido da palavra –, eu carregava uma série de estereótipos sobre ser CEO de uma empresa como a Ânima, de capital aberto, com número de funcionários interessante e branding muito legal.

Por exemplo, eu consumia a revista HSM na minha época de faculdade, sonhava em ir no evento, encontrar com o José Salibi Neto, o fundador, grandes gurus e tal. E a Ânima, que tinha comprado a empresa, estava em ascendência.

Eu tinha em mente uma caricatura do CEO: vou sentar na cadeira e só [tomar] decisão estratégica. Mas não… Vi que numa empresa desse porte, muitas vezes, eu tinha que atuar da leitura de contrato às decisões de parcerias mais estratégicas 

Por isso, falo em autoconhecimento. Aos 34 anos, tive a oportunidade de descobrir no que sou bom, no que eu não sou bom e o que eu nem tinha ideia que tinha capacidade e gostaria de fazer… Vi que tem menos glamour do que a gente acha e muito mais horas de trabalho. 

É muito mais difícil de você se desligar, de não estar pensando no teu impacto, em responsabilidade. Estou fazendo a entrevista aqui com você e tenho uma responsabilidade de marca, de reputação e com as pessoas que estão aqui.

Dizer que é um caminho solitário é triste. Eu tive o privilégio… por exemplo, ontem eu e a Paula Harraca, a CEO da Ânima, ficamos até tarde discutindo algo super estratégico… a gente troca muito. Vou almoçar [sempre] com Daniel Castanho, Marcelo Bueno, Maurício Escobar e os próprios colegas como o vice-presidente de tecnologia, o Bruno Machado, e com parceiros, clientes e amigos. 

Então, [vou] falar que é uma cadeira sozinha? Não é. Vai depender muito de você. E eu fui aprendendo isso ao longo do tempo.

É uma cadeira para a qual você nunca vai estar preparado. Eu não me sinto preparado ainda. Você está o tempo inteiro se preparando, principalmente no mundo de hoje, onde temos tantas mudanças e vivemos a era do ineditismo: tudo é novo e perecível – e não se tem especialista em coisa inédita

Hoje mesmo eu conversava com um conselheiro da Ânima e disse: “Caramba, tem coisa que falei um ano atrás e, hoje, discordo totalmente! Como é bom ser antagonista da gente mesmo, olhar pra trás e ver que teve uma evolução!”. Vejo que não estava preparado e sigo evoluindo – como CEO e profissional.

Você costuma falar de skills essenciais do profissional do futuro, como inteligência emocional, percepção do entorno, adaptabilidade, resiliência, conexão e relacionamento. Tudo isso se ensina? Ou essas habilidades meio “etéreas” são aprendidas mais na base de tentativa e erro?
A gente chama de habilidades essenciais e, no mundo da educação, elas são designadas de soft skills. Eu brinco que de soft [“macio”, “suave”, em inglês] elas não têm nada. 

Não acredito que você faça um curso de inteligência emocional e saia dele emocionalmente inteligente, seja um curso de uma hora, duas horas ou de um ano! Mas existem métodos, frameworks e ferramentas que você pode, sim, botar em prática e que ajudam a acelerar todas essas características. E outras, como criatividade, senso crítico, colaboração, empatia… 

Nenhuma dessas habilidades são programas que você faz um download e instala, nem são chips que se compra, diferentemente do hard skill. Com inteligência emocional não é assim. Você pode fazer um curso de duas horas e, à noite, não ter inteligência emocional com um filho ou cônjuge… Mas vai ter ferramentas para praticar, melhorar, poderá comparar frameworks, referências bibliográficas e ir testando. 

Eu acredito que são [necessárias] as duas coisas: trazer conhecimento, estudo, discutir, ouvir e falar daquilo; e colocar em prática a chance de ser mais resiliente, criativo, empático, colaborativo etc. 

Você consegue ver nuances. Um dia se pega pensando: “Opa, aconteceu nessa reunião exatamente aquilo que eu vi. Se eu tiver essa atitude, posso ter um resultado diferente. Deixa eu testar: se eu somente escutar e não vier com uma afirmação, mas sim com uma pergunta, a pessoa com quem estou fazendo a interlocução pode reagir diferente”.

É aquela história de ter repertório. Se você ignora completamente a existência dessas habilidades ou do que fazer…
Você falou a palavra que eu mais gosto de usar: repertório. 

Hoje, o executivo está pouco preocupado com o teu hard skill. Está muito mais preocupado com qual é o repertório que vem para dentro da empresa. Ou seja, o quanto você olha para a solução, se adapta 

Quando se trabalha com educação dentro das empresas, repertório é o que elas querem ampliar – porque é o que vai trazer avanço e evolução nessas habilidades essenciais para o dia a dia.

Você tem uma definição boa: “Inovação é melhorar algo que já existe e disrupção é a criação de algo que torna uma indústria ou setor obsoleto”. Percebe-se por todos os programas, iniciativas e unidades de negócio da HSM e Singularity Brazil, que se trata de uma proposta inovadora para a educação. Você acha possível uma disrupção na educação para adultos? Qual?
Eu acho que é necessário! O setor de educação está no limite… Muitos setores foram disruptados – comunicação, mídia, logística – e diversos outros estão sendo disruptados pelo digital, pela tecnologia. E a educação não é diferente. 

A educação precisa passar por isso para amadurecer e para, cada vez mais, impactar pessoas – não só hoje, mas no futuro. Precisamos de um modelo de entrega, de formatação e de personalização. 

Fala-se muito de IA. Ela é, sim, um impulsionador. Vai impulsionar o professor a se tornar um um mentor, um tutor. Ele vai poder direcionar, questionar, ajudar e ser o “antagonista”: “Será que é isso mesmo?”

É necessário a educação passar por essa disrupção, para ter o olhar mais atento para a personalização, curadoria não só de conteúdos, mas de formatos. Não é digital ou presencial. Não é áudio ou vídeo. Não é só tutor com aula expositiva. A educação não é binária, ela precisa de vários “e” para compor.

Parece-me que as pessoas estão com medo de não saberem mais nada diante de uma coisa chamada inteligência artificial, que elas não sabem exatamente como funciona. Como educador – afinal, além de CEO você também faz a curadoria de conteúdos e de pessoas que vão interagir nas imersões, cursos e programas –, também vê isso? O que você diria para as pessoas que têm medo de não saberem mais?
Todos somos educadores. Em todas as empresas da Ânima Educação, no crachá não tem o cargo de ninguém, está escrito “educador”. Falamos muito de liderança e acabamos de soltar um dossiê na HSM chamado A Ascensão da Liderança Educadora no qual falamos como o líder tem esse papel fundamental. 

Respondendo à pergunta, o medo é muito natural do ser humano. Durante a primeira exibição de filme no cinema [A Chegada de um Trem na Estação, produzido pelos irmãos Lumière, em 1895], quando veio o trem na tela, todo mundo saiu da sala correndo com medo de ser atropelado, [as pessoas] pensaram que o trem ia vazar da tela! A solução não foi parar de fazer filme, mas sim fazer mais filmes. 

Temos de trabalhar cada vez mais com essa mola propulsora. Quando você fala das ferramentas de inteligência artificial, sejam os agentes, chatbots como ChatGPT, um mecanismo de busca como o Perplexity, plataformas como o n8n e lovable, cada uma delas vai impulsionar algo que nós fazemos, trazendo maior eficiência, precisão, qualidade, velocidade ou agilidade. Na área da educação não vai ser diferente 

Para mim, a IA vem como uma mola pra gente ampliar esse espectro e ampliar o papel do professor, tornando-o muito mais fundamental – com o nome que a gente queira dar: professor, mentor, tutor – para ajudar no pensamento crítico, na curadoria, no fazer as perguntas, onde procurar e qual ferramenta usar.

 

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