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Não são muitos os jogadores profissionais de futebol que fazem transições dignas de carreira ao pendurarem as chuteiras. Uma minoria permanece no esporte, seja como técnico, comentarista de mídia ou, bem mais raro, dirigente; e uma fração deixa esse ambiente para empreender em outros segmentos.
Um dos poucos a trilhar esse terceiro caminho é Paulo César Fonseca do Nascimento, o Tinga, 47, gaúcho de Porto Alegre que atuou por duas vezes nos dois principais times do Rio Grande do Sul, o Grêmio e o Inter. A carreira, claro, foi mais extensa: ele passou quatro anos no Borussia Dortmund alemão, jogou no Rio, Japão e em Portugal e se aposentou em 2015 no Cruzeiro após fraturar a perna direita num treino.

Entre outros clubes, Tinga defendeu a dupla Gre-Nal.
Líder nos gramados, Tinga não se distanciou das “quatro linhas” após deixar o Cruzeiro. O próprio clube mineiro o chamou um ano após sua aposentadoria para assumir uma gerência de futebol, ficando responsável pela interlocução entre cartolas e boleiros. Mas foi uma passagem curta, encerrada após uma mudança de diretoria que precederia uma verdadeira implosão administrativa na “Raposa”.
Mas o futebol revelou-se um ambiente limitado para Tinga, corruptela de Restinga, bairro da periferia de Porto Alegre em que cresceu. Tinga sempre foi uma espécie de embaixador dos clubes em que jogou, e nesse papel se relacionava com stakeholders – torcida, comunidades vizinhas, patrocinadores, dirigentes etc.
E foi essa expertise em conectar grupos distintos que ele usou para dar luz a um negócio, uma plataforma digital, o app TMJ by Tinga, lançado ano passado, após as enchentes de outono no Rio Grande do Sul.
Inicialmente pensado como um banco de empregos, especialmente para os gaúchos que ficaram à deriva com as chuvas, a plataforma logo passou a agregar produtos e serviços com condições e preços mais vantajosos para os usuários.
O app foi ganhando diretórios à medida em que Tinga conseguia promoções em setores diversos, como em supermercados e empresas de turismo – aqui, por exemplo, há cashbacks em pousadas na Serra Gaúcha para os usuários da TMJ.
Entrou no app também a promoção de peneiras, algo muito caro ao ex-volante, que foi reprovado nesse processo seletivo “raiz” ao tentar ingressar em seu time do coração, o Internacional. Como hoje Inter e Grêmio já não promovem mais essas peneiras em seus “terrões”, Tinga cria e fomenta a estrutura em escolas de bairros periféricos e cidades-dormitório. Os clubes então levam seus olheiros.
Numa conversa em Porto Alegre com este repórter durante a Semana Caldeira, organizada pelo hub de inovação gaúcho Instituto Caldeira, em que Tinga foi um dos palestrantes do dia de abertura, ele explicou que seu negócio é baseado em “confiança”. E confiança é, para ele, o que dá vantagem competitiva a pessoas físicas e jurídicas na disputa pela atenção do mercado consumidor. Foi num evento na Alemanha, para onde vai regularmente como embaixador do Borussia, que ele teve seu momento eureka.
“Escutei um rapaz dizer ali que as empresas mundiais gastam hoje mais dinheiro em publicidade e marketing do que com a folha de pagamento, tudo para buscar atenção. E que os grandes captadores de atenção no futuro seriam as pessoas com confiança e credibilidade em seus assuntos. Hoje no celular é gente falando de jornalismo sem ser jornalista, de futebol sem jogar futebol, de casamento sem ser casado.”
Querido no Sul e tratado como ídolo por gremistas e colorados, Tinga sabia que há tempos tinha penetração na sociedade gaúcha, em seus variados estratos. Possuía, portanto, esse capital de credibilidade. Com a tragédia das chuvas, decidiu colocar o bloco na rua.
“Alguns falam que o TMJ é um marketplace, outros falam que é uma espécie de mercado livre. Eu criei na verdade um ecossistema em que a base é a confiança Tudo o que confio, em que acredito, as marcas com que tenho conexão, coloco lá dentro. E isso veio na enchente: primeiro era necessário salvar as pessoas, depois fazer casas e criar empregos”
Para o empreendedor, um “milestone” foi atingido quando, com apenas um ano de existência, o app, focado no Rio Grande do Sul, chegou ao número de 90 mil pessoas cadastradas. Isso porque, para Tinga, preencher cadastro não é uma atividade corriqueira, exige alguma confiança do usuário na plataforma, é uma relação diferente daquela entre seguidor e ídolo.
“Ser seguidor é ‘se gostei, entro‘ na rede do cara; depois, se não gostei, saio. Cadastro, você põe lá o CPF, é muito mais profundo. Quando o usuário vai lá no nosso ecossistema e preenche o cadastro, ele tem certeza que eu não vou fazer nenhuma sacanagem [com seus dados]”
Mesmo circulando por ambientes como o do Instituto Caldeira, Tinga não usa o vocabulário comum dos “founders” de startups. Palavras como “escalar”, “MVP”, “growth” e “VC”, por exemplo, não aparecem no seu discurso. Não saber ainda como rentabilizar o negócio talvez seja um ponto de contato com outros players do ecossistema. Hoje a TMJ tem oito funcionários, a maior parte dedicada ao desenvolvimento tecnológico da plataforma.
O que não falta a Tinga é storytelling, e ele é bastante tocante especialmente para adolescentes que, como ele, passam ou passaram por privações nessa fase da vida. Nessas conversas, Tinga injeta encantamento e valor ao trabalho, ao dizer que sua mãe fazia algo parecido com passe de mágica quando descia do ônibus da volta do expediente sempre com uma “sacola muito maior” do que aquela que portava no começo do dia.
E para dar também encantamento ao conhecimento, à fome de aprender, outra figura que pode aparecer nas histórias de Tinga é Clóvis Tramontina, conselheiro consultivo e ex-CEO da Tramontina, a grande empresa gaúcha de metalurgia e utilidades domésticas, a quem Tinga perguntou como fazia para “botar um garfo e uma faca na casa de todo mundo”.
Foi Clóvis que de alguma forma despertou em Tinga o que o ex-jogador anda agora a tentar despertar no público que o ouve, algo que, traduzido para o espanhol, pode ser sintetizado num famoso grito de torcida dos times latino-americanos: “Sí, se puede”.
“Clóvis me disse: ‘Tu jogaste duas vezes no Inter e duas vezes no Grêmio, sempre em momentos bons, estiveste na casa de quase todos os gaúchos pela TV. Os gaúchos confiam em ti, não perde isso. Qualquer coisa que tu fizeres, vai dar certo’.”
“Passamos três noites sem dormir para criar essa solução”: Luciano Lorenz, fundador da WebMed, conta os bastidores do desenvolvimento de uma plataforma online que conecta médicos voluntários e vítimas das enchentes no Sul.
Tem muita bobagem na internet sobre gestação e cuidados maternos. De olho nisso, Nathália Tôrres e Samanta Schneider fundaram a Eva Saúde, uma plataforma de conteúdo para gestantes, puérperas e mulheres tentando engravidar.
Recém-fundada, a Bepass encarou o desafio de instalar a biometria facial no Allianz Parque. Além de agilizar o acesso e combater os cambistas, a solução permitiu identificar o suspeito pela morte da torcedora Gabriela Anelli.
