A Eth&Co quer valorizar e aumentar o alcance da moda slow. É devagar, mas pro lado que elas acreditam

Giovanna Riato - 29 jan 2018Bruna Zampollo, Bruna Doros e Priscila Bajon, que apostam no slow fashion com a Eth&Co.
Bruna Zampollo, Bruna Doros e Priscilla Bajon, que apostam no slow fashion com a Eth&Co.
Giovanna Riato - 29 jan 2018
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Um e-commerce que nasceu para valorizar a produção autoral de designers brasileiros. Este é o primeiro propósito da Eth&Co, plataforma inaugurada há menos de um ano, em maio de 2017. A segunda meta é oferecer ali apenas moda slow, se adequando ao conceito que defende o consumo consciente e atenção à maneira como as peças são produzidas e à regionalidade. Quem vê um projeto tão cheio de vontade de gerar impacto positivo nem imagina que o negócio nasceu de um sentimento nada virtuoso: da frustração com a indústria tradicional da moda.

As empreendedoras Priscilla Bajon, 26, e Bruna Zampollo, 27, se conheceram justamente no curso de Moda da Faculdade Santa Marcelina, em São Paulo. Trabalharam na área, mergulharam o setor e logo entenderam que a paixão pelo design e a valorização do autoral – aspectos que as levaram até ali – não tinham uma presença tão importante no dia a dia dessa indústria quanto elas imaginavam. Concluíram o curso e, para dar vazão à vontade de fazer algo diferente, em 2014 decidiram criar uma marca própria, a Gilda, que busca entregar peças femininas com alta qualidade e respeito à cadeia produtiva.

QUANDO O SEU PROBLEMA TAMBÉM É O DE MUITOS

Quando começaram a vender as peças da marca, deram de cara com um outro desafio: “Vimos que era difícil encontrar espaço para oferecer este tipo de produto. Uma loja multimarca, por exemplo, quer variedade enorme e quantidade de peças, algo que não temos como uma marca slow”, conta Priscilla. Ela percebeu que o problema não era só delas. Uma série de amigas da faculdade também estava trabalhando em projetos autorais e desacelerados com a mesma dificuldade para vender os produtos, para encontrar o público.

Nesta fase, Bruna Zampollo fazia pós-graduação em Gestão Estratégica da Moda. Por lá conheceu a xará Bruna Daros, 27, que também tinha forte queda pelo tema slow fashion e já tinha estudado e trabalhado com moda, apesar de ser formada em Relações Internacionais. As três se juntaram e começaram a pensar em desenvolver um negócio. Juntaram as peças do quebra-cabeças e enxergaram que o problema que precisavam resolver era justamente a dificuldade que as pessoas têm para comprar moda ética. Bruna Daros fala a respeito:

“Queríamos criar algo que tivesse impacto positivo. São marcas pequenas, muito autorais, que em geral não têm e-commerce nem área de marketing”

Em 2016 elas se dedicaram a desenvolver a ideia. De cara não era tão óbvio que o negócio deveria ser on-line, mas elas entenderam que só pela internet conseguiriam ter o necessário alcance nacional. “Aqui em São Paulo é até fácil encontrar moda slow. Há uma série de mercados e lojas. No resto do Brasil as pessoas não têm esse acesso. Sou do interior e sei como é difícil”, conta Daros, que nasceu em Limeira. Assim, logo ficou claro que elas precisariam montar uma plataforma de vendas.

É para ir devagar mesmo. A ideia da Eth&Co é ajudar marcas de slow fashion a venderem.

É para ir devagar mesmo. A ideia da Eth&Co é ajudar marcas de slow fashion a ter visibilidade e vender. Acima, algumas fotos do Instagram da loja online, que reúne 22 marcas autorais.

Pensaram no nome, que deriva de ético, e desenharam o plano de negócio para a Eth&Co. A marca fica com um porcentual de cada venda efetuada ali. Na visão de Priscilla, este foi o formato mais interessante que encontraram. “Assim não sacrificamos as marcas. Ninguém tem que pagar apenas para estar ali”, diz, contando que o plano é ter na plataforma uma vitrine caprichada do design brasileiro (elas ganham uma porcentagem das vendas), que tire a moda sustentável do campo do ecochato. “Além da ética, queremos estética muito bonita.” O plano sempre foi fazer curadoria muito apurado dos produtos que poderiam entrar na plataforma, garantir uma seleção poderosa. Com isso em mente, foram atrás das marcas.

ÉTICO, BONITO E BEM SELECIONADO — NÃO É FÁCIL

“Foi quase um ano de pesquisa e pensamos muito em qual produto queríamos vender. Chegamos à conclusão que seria interessante começar por marcas de roupas”, fala Daros. Elas contam terem se surpreendido com o número de projetos interessantes, com produtos bonitos, que acharam nesse processo. “Quando fomos conversar com os designers, foi ótimo porque todo mundo é pequeno, então já entendiam e aceitavam o que queríamos fazer. Só tivemos um ou outro caso de a pessoa querer ver o site antes, mas ele não estava no ar, de cobrar números”, diz.

O processo todo, lembram, pareceu confirmar que a oportunidade de negócio que viram ali não era uma miragem. Conheceram pessoas e marcas que toparam ter uma loja na Eth&Co antes de a plataforma existir. Elas investigaram cada projeto a fundo para garantir que fossem, de fato, iniciativas de moda slow.

Enumeram boas surpresas que encontraram pelo caminho, como a Brisa Slow Fashion, marca de alfaiataria que só usa tecidos orgânicos e naturais, a D-Aura, que se inspira na arquitetura para produzir roupas sem gênero, além de outros projetos de diversas partes do Brasil que trabalham com a valorização dos materiais e da mão de obra. Ao todo, hoje há 22 marcas à venda na plataforma (Gilda inclusa).

No site, as empreendedoras listaram os pilaras da Slow Fashion que é vendida ali.

No site, as empreendedoras listaram os pilaras da Slow Fashion que é vendida ali.

Mas nem tudo são flores. Precisaram também lidar com o outro lado da moeda, o de serem procuradas por marcas interessadas no projeto, porém com atuação não tão slow quanto propagavam ser. Nestes casos, elas gentilmente recusaram as marcas, sem cobranças. Priscilla fala a respeito:

“Fazemos questão de conhecer a pessoa e, se possível a produção, olhar no olho. É um processo demorado”

Em paralelo ao processo de curadoria, elas iam tocando a construção da plataforma. Encontraram dois especialistas em tecnologia e design que toparam entrar no projeto, ficando com participação minoritária na sociedade. As três se juntaram e investiram 30 mil reais no negócio. No desenho do site, definiram que o melhor formato seria dividir as lojas on-line não só por marcas, mas também por conceitos como upcycling, handmade, sustentável e sem gênero, por exemplo. “O universo slow é muito abrangente, assim mostramos um pouco do que está por trás”, diz Priscilla.

DE REPENTE, AS MENINAS DA MODA ENCONTRAM OS GEEKS

Entre desenhar o site e selecionar as marcas e produtos que iriam para o ar, o projeto começou a se prolongar, a levar tempo demais e a gerar angústia. “Nunca estava bom. A gente sempre achava que precisava de mais projetos ou de mais ajustes para colocar no ar”, conta Daros. No fim de 2016 as três receberam um necessário empurrão para fazer as cosias irem adiante. Interessadas em aprender mais sobre o que era ter um negócio on-line, fuçaram e encontraram o Startup Weekend, que tinha como tema internet das coisas. “Vimos aquilo e não fazíamos ideia do que se tratava. Achamos que era um evento de internet e decidimos ir”, lembra.

Confusão feita, elas saíram de um evento de moda e chegaram lá devidamente montadas… em um evento cheio de geeks. Sem ter a mais vaga ideia do significado de conceitos como Lean Startup ou MVP, conheceram três garotos e formaram o grupo para o desafio do evento no fim de semana. A ideia inicial era fazer um site de moda (ninguém pode dizer que elas não são persuasivas), mas viram que não funcionaria, pivotaram no meio do caminho e criaram outro aplicativo. Contra qualquer expectativa, o improvável grupo levou o terceiro lugar na competição com o projeto.

Daros diz que, por mais que a conquista possa parecer pequena, aquilo deu uma força às sócias que elas não tinham encontrado até então:

“Fomos muito elogiadas e percebemos que, se ganhamos um prêmio pelo negócio que montamos em um fim de semana, então conseguiríamos colocar de pé o projeto em que vínhamos trabalhando há tanto tempo”

A essa altura, os meninos da área de tecnologia já estavam desesperados para que elas deixassem o preciosismo de lado e enfim colocassem a plataforma no ar. Mais alguns ajustes e foi isso que fizeram, em abril de 2017 a Eth&Co estava no ar com nove marcas e poucos produtos.

Ao participarem do Startup Weekend, e serem premiadas, elas tiveram certeza que o negócio podia existir.

Ao participarem do Startup Weekend, e serem premiadas, elas tiveram certeza que o negócio podia existir.

Além da curadoria dos projetos, elas selecionam os produtos mais adequados ao canal. A plataforma é essencialmente uma vitrine: ali os consumidores conhecem as peças e processam os pagamentos, mas a produção e o envio é de responsabilidade da marca – e não há pressão por prazos inalcançáveis. Muitas coisas são produzidas apenas depois que o pedido chega, contam. “Não pressionamos ninguém por estoques. Cada peça tem seu tempo”, diz Priscilla, deixando claro que não há problema em demorar mais que um e-commerce tradicional, mas que o cliente precisa estar sempre completamente informado disso.

Todo o capricho estético e visual clean do site é arrematado por muito conteúdo sobre o universo slow e por uma breve entrevista para detalhar o conceito por trás de cada uma das marcas, assim o cliente sempre sabe o que está apoiando quando compra uma peça com aquela etiqueta, dizem. “O plano é melhorar isso, incluir vídeos e outros conteúdos”, conta Daros. Ainda que veja aspectos a aprimorar, ela reconhece que o caminho foi interessante até aqui.

Elas ainda não vivem da Eth&Co. “O crescimento está dentro do que planejamos”, diz, contando que o faturamento médio gira em torno de 5 mil reais por mês, ainda sem investimentos expressivos em marketing, aspecto em que elas procuram ser bastante cuidadosas, como diz Priscilla:

“Pregamos o consumo consciente, não queremos fazer divulgação agressiva, como oferecer um desconto para o site todo”

Segundo ela, as ações são pontuais. Se o preço a pagar por pregar que os clientes ponderem antes de consumir for receitas um poucos menores, elas dizem estar dispostas.

Uma das recompensas interessantes, contam, é ver as marcas crescerem com elas e direcionarem suas lojas on-line à Eth&Co, concentrando todas as vendas ali. “É uma relação de ganha-ganha, de ajuda mútua”, diz Priscilla. A plataforma quer aumentar a oferta para 30 marcas até o fim deste ano, e planeja fazer parcerias para oferecer curadorias especiais no site. A primeira delas será com o Mercado Itinerante, que fará uma seleção de produtos para ficar à venda ali. Elas admitem a possibilidade de buscar um investidor para o negócio, mas ainda consideram cedo. “É algo para o futuro, talvez”, diz Daros, fiel ao conceito slow que prega na plataforma.

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: Eth&Co
  • O que faz: E-commerce de marcas de moda slow
  • Sócio(s): Priscilla Bajon, Bruna Zampollo e Bruna Daros
  • Funcionários: 5 (incluindo as sócias)
  • Sede: São Paulo
  • Início das atividades: maio de 2017
  • Investimento inicial: R$ 30.000
  • Faturamento: R$ 5.000 por mês, em média
  • Contato: contato@ethe.co
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