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Advogado, ele fundou uma startup que automatiza processos de compliance, cruzando 3 500 fontes para gerar relatórios em um minuto

Marília Marasciulo - 18 jun 2025
Alexandre Pegoraro, fundador e CEO da Kronoos.
Marília Marasciulo - 18 jun 2025
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Poupar o tempo dos clientes em processos de compliance, que vão da checagem de antecedentes ao chamado due diligence, a avaliação de riscos para garantir a conformidade de empresas ou contratos antes de decisões estratégicas. Essa é a proposta da startup Kronoos.

Lançada em 2020, a plataforma combina mineração de dados e inteligência artificial para consultar mais de 3 500 fontes públicas e privadas, entregando análises em até um minuto. A verificação inclui processos judiciais, indícios de corrupção, lavagem de dinheiro, financiamento ao terrorismo, infrações ambientais, histórico de crédito e menções negativas na mídia.

O objetivo é “evitar qualquer tipo de surpresa negativa”, nas palavras do advogado paulista Alexandre Pegoraro, 36, fundador e CEO da Kronoos. Pelas contas dele, uma checagem manual dessas informações levaria cerca de 175 horas. Segundo Alexandre, o ChatGPT não resolveria o problema, já que os dados, embora públicos, não são indexados em mecanismos de busca como o Google — os sites institucionais, em geral, bloqueiam essa indexação.

A solução da Kronoos foi criar o próprio robô, integrando diretamente essas fontes à sua plataforma, sem depender de indexadores externos.

“A sacada foi automatizar algo que era muito demorado, mas [na época] a gente não chamava de inteligência artificial, chamava de robô”

Com mais de um milhão de análises feitas desde 2020, a Kronoos tem hoje cerca de 350 clientes — entre eles, a fabricante de aço Gerdau e o escritório de advocacia Pinheiro Neto —, que pagam uma assinatura mensal para ter acesso à ferramenta (o valor da mensalidade começa em 1 700 reais).

ANTES DA KRONOOS, ALEXANDRE FUNDOU UMA ASSESSORIA JURÍDICA, PORÉM A CONVIVÊNCIA COM OS SÓCIOS SE MOSTROU COMPLICADA

Formado em Direito pelo Mackenzie, Alexandre fez estágio no Itaú Cultural e chegou a trabalhar em um grande escritório da área de mercado de capitais. Ele conta, porém, que não se identificou com aquele emprego:

“Lembro que vi um menino que ficou dois dias seguidos trabalhando e me dei conta: ‘Odeio fazer isso, não sou que nem esse cara, não adianta dar murro em ponta de faca’…”

Saiu em 2014 para abrir uma empresa de assessoria jurídica com outras três pessoas que conheceu no cursinho da OAB. “Vai soar cringe, mas a vontade de empreender veio dos programas do Roberto Justus, O Aprendiz [versão brasileira do programa que nos EUA foi apresentado por Donald Trump]”.

Alexandre logo foi descobrindo aspectos do mundo dos negócios que a televisão não mostrava. Por exemplo, a difícil convivência entre sócios. “Quando você tem uma empresa, conhece a pessoa como se fosse seu marido ou esposa, o nível de intimidade é muito grande. Assinou o contrato, casou com a pessoa…”

O “casamento”, no caso, não deu certo: eram muitos sócios, com personalidades fortes que não se complementavam, e todo mundo querendo dar opinião. Alexandre então saiu novamente, dessa vez para trabalhar por conta própria, ainda na área de assessoria paralegal e documentação.

“Para quem faz faculdade no Mackenzie, USP ou PUC, é como se fosse uma quinta divisão… Eu queria jogar na Premier League, mas vi que nunca seria um bom ‘jogador’. O que as pessoas da Premier League não sabem é que essa área [de certidões e paralegal] dá muito dinheiro” 

E foi assim que Alexandre se capitalizou para fundar a Kronoos. Ele conta que investiu cerca de 300 mil reais do próprio bolso ao longo de três anos para tirar a a startup do papel.

A AGENDA DE COMPLIANCE PÓS-LAVA JATO IMPULSIONOU A KRONOOS, MAS ELE LEVOU TRÊS ANOS ATÉ CONSEGUIR LANÇAR A STARTUP

A ideia começou a tomar forma entre 2015 e 2016, quando a agenda de compliance ganhou força com a Operação Lava Jato. Deflagrada em 2014, a investigação revelou um esquema bilionário de corrupção envolvendo empreiteiras, políticos e a Petrobras, e se tornou a maior operação anticorrupção da história do Brasil.

“Foi aí que tive a ideia de criar um sistema que apontasse se a pessoa é politicamente exposta, se responde a processo criminal, entre outras verificações. Eu era muito demandado para emitir certidões e percebi que precisava automatizar essas informações”

Traumatizado pela primeira experiência, Alexandre decidiu que não teria mais sócios. “Se o projeto desse certo, os louros seriam meus. Se desse errado, os prejuízos seriam meus”, afirma. O problema é que ele não sabia programar. “Procurei um desenvolvedor e ele falou que sabia fazer, e de fato fez. Mas acabou tendo um problema e sumiu por um ano…”

O primeiro protótipo foi lançado entre 2017 e 2018, e serviu para validar a ideia. “Consegui levar no Pinheiro Neto e no igc partners e eles falaram que se fizesse uns ajustezinhos, eles contratariam. E de fato contrataram, mas eu cobrava muito baratinho na consulta. Não havia nenhum prejuízo da pessoa contratar a ferramenta, porque não tinha uma despesa fixa.”

Alexandre ressalta que, embora cumprisse o que prometia, aquele protótipo ainda “prometia uma coisa bem básica e entregava uma coisa bem básica”:

“Quando você tem uma ferramenta nova, você precisa da educação do cliente, porque ele não tem um parâmetro. Você não chega e fala: ‘Olha, estou te vendendo uma plataforma que é tipo isso aqui’, para a pessoa ter uma noção de ancoragem… Então, eu deixava o cliente usar e, se usasse, pagaria”

Sem o desenvolvedor inicial, Alexandre teve dificuldade para retomar o projeto. Encontrou outra pessoa que o “enrolou por um ano” e, por não ser desenvolvedor, não conseguia apontar o que estava dando certo ou errado.

“Em 2020, eu estava pronto para jogar a toalha e alguém me disse: ‘Fala com esse cara’”. Alexandre pegou o contato e foi atrás do desenvolvedor para apresentar a sua demanda. “Ele me falou: ‘Eu te cobro uns 30 mil reais’. Eu respondi: ‘Não vou nem pedir desconto, mas preciso disso em um mês, senão não consigo seguir com a ferramenta’. Ali foi um momento crítico — mas ele entregou”.

O FOCO DA EMPRESA AGORA É DOBRAR A CLIENTELA EM DOIS ANOS, INCLUINDO MULTINACIONAIS QUE ATUAM NO BRASIL

Em março de 2020, a coisa andou. Com o produto pronto, Alexandre adotou o modelo de assinatura de franquia mensal, conquistou os primeiros clientes — principalmente do setor jurídico —, consolidou a equipe e encerrou o ano com a entrada de grandes nomes, como a empreiteira Camargo Corrêa, uma das empresas implicadas na Lava Jato.

A Kronoos alcançou o break even no primeiro ano de atividade. Hoje, tem uma equipe de 30 pessoas, mas Alexandre segue no modelo bootstrapping, sem sócios ou investidores externos. Estruturar o negócio sozinho foi, segundo ele, o maior desafio até o momento.

“Eu não sabia como montar uma área, como contratar pessoas, como treinar. Nunca fui vendedor, tive que aprender na marra como ser um vendedor”

A expansão dos negócios aumentou seu grau de complexidade. “É fácil quando são só duas ou três pessoas. O desafio veio quando comecei a ter área de TI, vendas, atendimento, projetos. Eu nunca tinha feito isso antes. Hoje tenho diretores que já vêm com essa experiência, mas precisei me preparar ao longo dos anos para conseguir tocar o crescimento.”

A meta agora é dobrar a base de clientes ao longo dos próximos dois anos, mirando também empresas internacionais com operação no país:

“Nós já temos alguns clientes de fora e estamos nos estruturando para atender empresas que têm filial no Brasil. Estive recentemente na Suécia justamente com esse objetivo, e conversei com a Volvo e outras empresas interessadas”

A startup, diz Alexandre, planeja seguir criando novos produtos relacionados ao compliance —  e crescer junto com a demanda por automação em um ambiente regulatório complexo como o brasileiro, onde os dados públicos são numerosos, descentralizados e, muitas vezes, de difícil acesso.

 

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