Como um programa interno fez dobrar a quantidade de líderes mulheres na 3M

Maisa Infante - 14 mar 2018Camila Cruz Durlacher, da 3M do Brasil, lidera o fórum que oferece mentoria e prepara mulheres para assumirem cargos de comando na empresa.
Camila Cruz Durlacher, da 3M do Brasil, lidera o fórum que oferece mentoria e prepara mulheres para assumirem cargos de comando na empresa.
Maisa Infante - 14 mar 2018
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Quando teve seu primeiro filho, Camila Cruz Durlacher, 44, diretora de Pesquisa e Desenvolvimento da 3M do Brasil, não via a hora de terminar a licença maternidade. Ela acredita que, ao contrário dos comentários que ouviu, o fato de ser mãe não precisa interromper a trajetória profissional de uma mulher — se ela não quiser, como é o caso aqui. Camila faz mais: ela é responsável pelo Fórum de Liderança Feminina da empresa, uma iniciativa global para preparar as funcionárias para os cargos de comando. Em três anos, dobrou a quantidade de mulheres nessas funções. É, também, uma rede de apoio e de geração de estímulo e confiança entre mulheres (ao contrário do que, sem perceber, muitas vezes ainda acontece).

“Assim que meu filho nasceu, as pessoas me falavam: agora você vai parar de trabalhar, né? Eu não entendia o que elas queriam por que para mim isso não era uma questão. Cresci em uma casa com pai e mãe trabalhando fora, então, era o normal”, conta. A mãe de Camila era da área de Recursos Humanos e o pai, de Propaganda e Marketing, mas aos 50 anos, tornou-se advogado. Ela fala a respeito:

“Nunca tive conflito com a maternidade. Claro que me cobro para ser uma mãe melhor e penso sempre no que poderia fazer a mais pelos meus filhos”

E prossegue: “No fundo, o que busco é a felicidade e a realização deles, mas nunca colocando isso em uma situação de ter que escolher entre trabalho ou filhos. Uma coisa não precisa existir em detrimento da outra. Elas têm que coexistir.”

Com os filhos já na escola, ela voltou à 3M, onde está desde 2000. Graduada em Química, ela sempre quis trabalhar em uma grande corporação. Depois das aulas de inglês e alemão, que lecionou durante a faculdade, a 3M foi seu primeiro emprego. Camila ingressou na empresa como trainee, enquanto fazia mestrado em Engenharia de Produtos.

Dentro da empresa passou por diversas áreas — incluindo a de Propriedade Intelectual, na qual se ofereceu para trabalhar porque “queria aprender um pouco mais sobre o tema” — até chegar à diretoria de Pesquisa e Desenvolvimento, em 2015, depois de voltar de uma temporada de quase três anos nos Estados Unidos e Argentina, onde atuou nessa mesma área.

INOVAÇÃO E LIDERANÇA FEMININA ANDANDO JUNTAS

Hoje, Camila lidera uma equipe de 135 pessoas e está, também, à frente do Fórum de Liderança Feminina da 3M e ajudar a empresa a buscar cada vez mais diversidade. No seu entender, ter perspectivas, backgrounds e entendimentos de mercado diferentes contribui para que uma equipe gere um produto melhor, porque abarca a pluralidade de visões:

“É preciso diversidade de pensamento, não só de gênero. Precisamos de gente vinda de diferentes áreas e universidades, para que não haja um pensamento uníssono”

Camila conta que sua mãe sempre a orientou a buscar a independência financeira e isso a fez crescer sabendo que queria trabalhar fora e que poderia fazer o que quisesse. Teve liberdade de escolha e optou por uma área sem nenhuma relação com o histórico da família, mas que atendia suas necessidades de conhecimento.

Ela, portanto, foi atrás das oportunidades que apareceram, sempre se preparando para os desafios. Mas essa não é a realidade para muitas mulheres, que ficam inseguras e até intimidadas em assumir cargos de liderança, como diz: “Muitas mulheres sofrem com a Síndrome do Impostor. Quando chegam à posição de líder acham que não são capazes, que vão ser descobertas como uma fraude”.

Ela própria passou um pouco por isso. Camila conta que, quando chegou a uma posição de liderança na área de Pesquisa e Desenvolvimento, era a única mulher em um grupo de homens —  todos mais velhos e com mais tempo de empresa do que ela. Ela conta:

“Eu era um corpo estranho ali. Apesar de não sofrer preconceito direto, sentia que precisava provar mais o meu valor, mas por uma cobrança muito mais minha do que externa”

Esta pressão (ou auto-sabotagem, pode-se até dizer) das mulheres sobre elas mesmas, diz, é uma questão a ser trabalhada e discutida nos ambientes corporativos — como a 3M já faz. Muitas ainda se sentem incapazes de assumir cargos de liderança e ficam preocupadas com o que vai acontecer em suas carreiras quando elas tiverem filhos, por exemplo. “Vejo mulheres, principalmente em começo de carreira, achando que não podem fazer determinado tipo de trabalho porque um dia podem casar e ter filhos. Elas se colocam uma autolimitação antes mesmo disso se tornar uma limitação. E isso faz com que percam oportunidades”.

Em eventos que reúnem lideranças de diversas empresas, como o MEI (Mobilização Empresarial para a Inovação), Camila sente falta de mais mulheres em cargos como o seu. “Esse cargo de Diretor de Tecnologia, Pesquisa e Desenvolvimento ou Inovação ainda é predominantemente ocupado por homens. Existe uma grande oportunidade para a promoção de mulheres, para a liderança de mulheres dentro dessa área de ciência e tecnologia”.

O QUE SE BUSCA E O QUE SE CONSEGUE COM O APOIO ÀS LIDERANÇAS

O propósito do Fórum de Liderança Feminina — projeto mundial da 3M implantado no Brasil em 2014 — é desenvolver mulheres para ter uma organização mais diversa. Ele envolve uma série de atividades que ajudam na preparação das mulheres para as oportunidades. “vivo sob o mantra de que a sorte favorece uma mente preparada. Em vários momentos da minha carreira eu estava no lugar certo, na hora certa. Mas também era a pessoa certa para aquela posição porque eu estava preparada para o desafio. E estar preparado para as oportunidades que surgem é a chave do sucesso”, diz.

O programa de Mentoring Feminino, por exemplo, aproxima as mulheres de alto potencial de algum executivo da companhia, seja homem ou mulher, e tem o foco no desenvolvimento das competências técnicas dessas mulheres para que elas se sintam confiantes em, por exemplo, se candidatar a vagas que são abertas dentro da empresa.

“Muitas mulheres não se candidatam a uma vaga se não atenderem a 100% dos requisitos. Com os homens é o contrário, se atendem a um ou dois requisitos já querem tentar. Falta confiança”

Segundo ela, uma das coisas trabalhadas no mentoring (mentoria) são as habilidades técnicas. Os programas de para mulheres costumam focar na parte de relacionamento, em como conciliar vida pessoal e trabalho, como se portar no ambiente corporativo, diz Camila. “São coisas importantes, mas também é preciso ajudá-las a desenvolver habilidades técnicas para que estejam em pé de igualdade com os homens quando surgir a oportunidade.”

Nos últimos três anos, 31 funcionárias já participaram da iniciativa. Desde 2017, Camila conta, o grupo que está à frente dessa iniciativa junto dela é misto, ou seja, formado por homens e mulheres. “Pessoas diferentes pensam diferente. Trazer essa diversidade de pensamento pra dentro dessa iniciativa era importante e tem ajudado muito”, diz a intraempreendedora.

O resultado do programa é que, entre 2013 e 2016, o número de mulheres líderes na companhia subiu de 23% para 30%. Na liderança sênior, o salto foi de 12,5% para 23,8%. Já na diretoria, de 6% para 30%.

“Claro que isso não é única e exclusivamente fruto do trabalho do Fórum. Outras áreas da empresa também trabalham nessa direção. A área de Recursos Humanos, por exemplo, estabeleceu que para qualquer vaga que seja oferecida no mercado é preciso ter 50% de candidatos mulheres e 50% homens”, diz Camila, e segue: “Não é um programa de cotas, mas a gente acredita que, dessa forma, aumenta a chance da mulher ter uma oportunidade. No fundo, o que se quer é que o melhor candidato seja aquele contratado”. No fundo, é isso. E muito mais.

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