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“Dentro de todo corpo existe um indivíduo que tem direitos e que deve ser respeitado”

Fernanda Cury - 15 fev 2019
"Queremos que as Wonders também se sintam seguras e confortáveis com seus corpos, que elas entendam que podem e merecem ocupar todos os espaços públicos e fazer suas próprias escolhas", conta Marioli.
Fernanda Cury - 15 fev 2019
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Entrar em uma loja de roupas, provar peças e mais peças e nada ficar bem no seu corpo. Ou pedir um modelo na sua numeração, e ouvir que a confecção não trabalha com esse tamanho. Se você nunca enfrentou essa situação, provavelmente conhece alguém que já passou por essa experiência nada agradável. E foi justamente para virar esse jogo e mostrar que toda mulher pode e deve se sentir bonita, seja qual for o seu peso, que as amigas de infância, Marioli Oliveira e Amanda Momente se uniram e criaram a Wonder Size. Uma marca de roupas para que as mulheres plus size se sintam bem em sua própria pele e em seu próprio corpo.

O que vocês faziam antes? Qual a experiência profissional de vocês?

Marioli: A Amanda era corretora de imóveis e vendia cosméticos. Ela é formada em Negócios Imobiliários. Eu trabalhava como coordenadora de design em uma multinacional de auditoria e consultoria. Sou uma Analista de Sistemas, e tenho curso técnico em Artes Gráficas e Processamento de Dados.

Como surgiu a ideia de empreender?

Marioli: Mesmo antes de entrar no projeto da Wonder Size, a Amanda já tinha esse talento para vender. Nos conhecemos desde os nove anos de idade, e por incrível que pareça naquela época ela já tinha esse perfil comercial. Isso é de família. Seu pai e sua mãe são empreendedores natos, e ela sempre teve esse exemplo dentro de casa. Quando ela voltou dos EUA, em 2013, eu acompanhei bem de perto essa situação. Ela chegou a pesar 140 kilos, e não conseguia encontrar roupas que expressassem seu estilo. A Amanda sempre foi muito vaidosa e expressiva com suas roupas, não conseguia encontrar modelos adequados para seu corpo. Além disso, ela queria voltar a praticar exercícios, e não achava uma roupa que lhe dessem mobilidade. Depois de procurar em diversas lojas e não encontrar nada parecido com o que havia desenvolvido com sua costureira, ela ali viu grande oportunidade. Logo me chamou para ajudá-la neste projeto. Eu, por outro lado, sempre quis impactar de uma forma real a sociedade. Desejo deixar algum tipo de legado, sou feminista e quando a Amanda me falou sobre sua ideia, me empolguei com a proposta de ajudar outras mulheres que sofriam com a dor de não encontrar roupas adequadas para o seu corpo.

Além disso, exatamente na época em que começamos a planejar a Wonder Size, eu estava retornando de uma licença maternidade, e meu gestor me comunicou que eu não seria promovida por conta da licença. Estava lutando por aquela promoção há quase dois anos. Participei de outros processos seletivos em grandes empresas, cheguei até o final, mas acabavam sempre contratando homens. Essas situações me fizeram perceber que caso eu desejasse dar condições melhores ao meu filho, seria necessário eu ter meu próprio negócio, pois infelizmente as empresas ainda têm muito preconceito com a figura da mãe, mesmo nos dedicando ao máximo durante e depois do horário de trabalho. Mas de qualquer forma hoje eu vejo que na Wonder Size podemos deixar um legado muito maior do que se estivéssemos trabalhando em outras empresas. O impacto na vida de outras mulheres é maravilhoso e verdadeiro, e isso sim é o melhor propósito de todos.

Como foi o começo?

Marioli: Na mesma semana em que surgiu a ideia da Wonder Size nos juntamos, eu vendi dez dias das minhas férias para levantar capital e ela juntou um dinheiro que tinha guardado e fizemos a primeira legging. Só tínhamos dinheiro para fazer a preta. Como designer fiquei responsável por criar a estratégia de marketing/design e Amanda ficou responsável pelo comercial. No começo chamávamos a legging de “a pretinha básica que você precisa ter”. O pai da Amanda viu isso e disse: vocês não podem chamar esta calça assim! Precisam de um nome para ela, porque ela é única. Ali vi a chance de homenagear as mulheres que mudaram o rumo da história. Acredito muito no conceito de empoderamento do Paulo Freire: você não empodera ninguém. O que você faz é dar exemplos para que as pessoas dentro delas criem as ferramentas necessárias para se empoderar. Isso é uma transformação pessoal. E mostrar para essas outras mulheres que as figuras históricas impactaram na sociedade começando com uma atitude, foi uma forma que encontrei auxiliá-las a ter referências de que sim, é possível também ser um agente catalizador de mudanças. Não só na sociedade como em sua própria vida. Assim, nossa primeira legging passou a ser chamada de Joana Dark, a legging com a qual nossa cliente enfrentaria qualquer batalha do dia a dia e voltaria ilesa.

Como nasceu a Wondersize?

Marioli: O lançamento da marca foi no dia 27/08/17, no desfile do São Paulo Fashion Week Plus Size. Do prazo em que tivemos a ideia e montamos a coleção para o desfile deu cerca de um mês. Brinco que na nossa ignorância nos jogamos, pois se soubéssemos o quanto seria difícil talvez ainda estivéssemos nos planejando. Para pagar o desfile calculávamos quantas calças teríamos de vender. Foi na raça e na coragem, mesmo. No início a Amanda juntou um dinheiro vendendo cosméticos e eu vendi dez dias das minhas férias. O pai da Amanda é um empresário do interior, viu ali uma oportunidade de negócio e decidiu viabilizar uma coleção. Graças a eles conseguimos lançar no desfile e em duas semanas já havíamos vendido cerca de R$ 30.000.

Como funciona a Wonder Size?

Marioli: Hoje nós desenvolvemos os modelos e as coleções e uma confecção terceirizada produz as peças. Nosso maior diferencial são as modelagens únicas, desenvolvidas para o corpo de uma pessoa gorda. Se aquela peça não interagir de forma funcional com as curvas da nossa cliente, que chamamos carinhosamente de Wonder, não lançamos. Antes de colocar qualquer produto para vender fazemos teste de usabilidade para ver se a roupa realmente será funcional. Já lançamos vários produtos únicos como o roupão que veste até o 66 e a legging meia calça que não tem o pezinho e é mais fácil de vestir. Esse modelo é chamado Hebe em homenagem à Hebe Camargo, que independente da sua idade nunca teve vergonha de mostrar as suas pernas. Queremos que as Wonders também se sintam seguras e confortáveis com seus corpos, que elas entendam que podem e merecem ocupar todos os espaços públicos e fazer suas próprias escolhas.  Principalmente que elas possam se comunicar pela forma com que se vestem. Durante muito tempo essas mulheres foram cerceadas, e queremos que isso acabe. Não fazemos apologia à obesidade, mas não acreditamos em rótulos, pois dentro de todo corpo, independentemente de cor, orientação sexual ou peso, existe um indivíduo, que tem direitos e que deve ser respeitado.

E como é o modelo de negócio?

Marioli: Já atingimos o break eaven de investimento e conseguimos ter nosso capital de giro. Vendemos pelo e-commerce, showroom e em algumas feiras. Através de pesquisas com o público percebemos que as Wonders tinham vivenciado muitas experiências ruins em suas compras, tanto em lojas físicas quanto em sites. A Wonder Size nasceu também para mudar isso. Queremos que nossas clientes tenham a melhor experiência de compra possível em todos nossos canais de vendas, e implementamos a estratégia de Omnichannel, ou seja, a integração dos vários canais de venda, sejam eles virtuais ou lojas físicas, para oferecer a maior comodidade para nossas clientes.

Em resumo, a Wonder Size nasceu para todas. Nasceu para quem malha de segunda à sexta e procura mobilidade. Nasceu para quem trabalha o dia inteiro e procura conforto, e nasceu para quem só quer se sentir bonita, mesmo! Mas principalmente, nasceu para termos escolhas. De amarmos nossos corpos e mostrarmos nossas curvas. Mas se não quiser mostrar, tudo bem também. Mas o importante é que essas escolhas dependam apenas da vontade de nossas clientes, e não de uma sociedade que nos impõe obstáculos e limites diariamente. Queremos que todas as mulheres se sintam ‘Wonders’ e mostrem ao mundo a força, cor e beleza de uma Wonder Size.

Como é a atuação de cada uma na empresa?

Marioli: A Amanda é o coração e eu a razão. Nós duas nos complementamos muito e nos respeitamos demais. Ela me puxa para cima e eu a puxo para a realidade. Hoje ela cuida do comercial e da produção, e eu do marketing e estratégia.

Quais estratégias têm dado melhor resultado nesta trajetória?

Marioli: A de bivotar (mudar de estratégia rapidamente) quando sempre necessário, a de se respeitar muito e de colocar a experiência da Wonder em primeiro lugar sempre. Aplicamos o conceito de Customer Centricy, para desenvolvimento de novos produtos, além do conceito de Ominichanel, onde as Wonders têm a mesma experiência de compra em todos os pontos de contato da marca, além de poder trocar seus produtos adquiridos pela internet em nosso espaço físico.

Por outro lado, quais caminhos foram deixados de lado?

Marioli: Temos ideias sempre, mas neste momento nos perguntamos: mas isso está dentro do nosso propósito? Se não estiver, abandonamos. Acreditamos na importância de nos mantermos fiéis àquilo que acreditamos ser importante e real para as Wonders.

Quais as estratégias para se destacar da concorrência?

“Focar na experiência de nossas clientes para que ela seja única, além de criar produtos realmente funcionais até a numeração 66. Acreditamos na inclusão verdadeira e sempre estamos olhando além. Enquanto olham para a nossa grama, estamos mirando as estrelas”

Na opinião de vocês, o que o empreendedorismo feminino tem de diferente?

Marioli: Normalmente ele começa de uma dor real de uma das empreendedoras, isso faz com que o combate seja mais genuíno do que simplesmente uma hipótese que foi validada por meia dúzia de entrevistas. Além disso, temos de dar conta da casa, emprego, filhos, nos equilibrar nas tarefas do dia a dia. A Amanda é mãe solteira e meu marido mora em Brasília, vem para SP somente a cada 15 dias. Essa jornada faz com que nos dedicamos muito para dar realmente certo. Brinco que filho nos dá um sangue nos olhos, porque empreender não é nada fácil.

No início tivemos muito medo, mas sabemos que tem dois tipos de medo: o que paralisa e o que impulsiona. Preferimos o segundo. Sabíamos o quanto desejávamos impactar a sociedade e mudar a vida das Wonders, e isso virou o combustível para seguirmos em frentes, apesar das dificuldades. As pessoas quando olham quem empreende tem um ponto de vista muito romântico. Empreender e muito solitário e difícil. Enquanto você está lá em plena sexta/sábado à noite trabalhando, os outros estão saindo, viajando, passeando. Abrimos mão de muitas coisas que as pessoas não fazem ideia. Horas de sono, finais de semana, madrugadas. Tem sido imensa a nossa dedicação para que a empresa cresça. As redes que dão o suporte ao empreendedorismo feminino tornam a jornada mais fácil. Nada como a sororidade para você sentir que não está sozinha. A mão no ombro dizendo: força, isso vai dar certo é um tremendo incentivo.

Qual a maior conquista até aqui?

Marioli: O impacto social com toda a certeza, pois o retorno que temos das Wonders dizendo o quanto se sentem representadas e inspiradas a muda as suas vidas é maravilhoso! Muitas clientes contam que depois de adquirir nossas peças enxergam novas possibilidades, pois se sentem bem consigo mesmas.  Outras deixam de usar blusas amarradas em sua cintura (pois nossa legging não fica transparente), arriscam uma blusinha um pouco mais curta, enfim, se permitem explorar suas formas com confiança e liberdade.

Qual maior objetivo de vocês?

Marioli: Queremos ser marca Top Of Mind do segmento plus size e vamos trabalhar para chegar neste patamar. E queremos continuar oferecendo os produtos que as Wonders sempre sonharam em ter, permitindo que elas frequentem parques, baladas, academias e trabalho com mobilidade, conforto e a autoestima elevada. Queremos que elas possam simplesmente fazer suas próprias escolhas e se sintam bem em sua própria pele e em seu próprio corpo.

Se pudessem dar apenas uma dica para quem está querendo empreender, qual seria?

Marioli: Está com medo? Vai com medo mesmo.

Quais seus planos para o futuro?  

Marioli: Vamos iniciar os estudos para exportar, além de abrir os Wonder Places, que são nossos espaços físicos para que as Wonders possam ter o contato com o nosso produto. Além disso teremos as consultoras Wonders (estamos cadastrando e montando o plano de negócio), que é uma forma de ajudar outras mulheres a empreender, e oferecer mais um canal de vendas para nossas clientes.

Para saber mais:

Wondersize

O que faz: Marca casual e fitness Plus Size, que veste até o 66 e faz uso de tecidos tecnológicos.
Sócios: 3

Funcionários: 5

Sede: São Paulo

Início das atividades: 27/08/2017

Investimento inicial: R$ 3.000

Contato: Amanda Momente: (11) 99846-6969 / [email protected]

e Marioli Oliveira: (11) 97266-0890 / [email protected]

 

Esta matéria pode ser encontrada no Itaú Mulher Empreendedora, uma plataforma feita para mulheres que acreditam nos seus sonhos. Não deixe de conferir (e se inspirar)!

 

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