por Alejandro Vázquez
Pode parecer clichê, mas o “desglamour” do empreendedor, na maioria dos casos é um fato concreto. É a essência do negócio e o que te faz crescer como tal.
Como argentinos empreendendo no Brasil, meus sócios e eu tivemos que lidar muito com as palavras de outros colegas empreendedores e investidores (e até familiares!) nos dizendo que nosso negócio não ia valer a pena, que o mercado era pequeno, que era impossível crescer, que não conseguiríamos nada no Brasil sem sermos brasileiros e daí por diante.
No entanto, mesmo com todo esse peso sobre as nossas costas, decidimos nos arriscar e vir para este país em 2011. Tínhamos muita confiança que nossa plataforma digital, que permite que empreendedores criem e gerenciem sua própria loja virtual em minutos, ia dar certo. Apesar de já ter um nome e escritório legal funcionando em Buenos Aires, sabíamos que, ao lançar nossa solução no Brasil, o impacto inicial seria baixo, já que é um país maior.
Para lançar o nosso negócio no Brasil, abrir um escritório e contratar brasileiros, precisávamos do básico: aprender português. Isso não era um problema.
Nos primeiros meses daquele ano, acordar cedo todo sábado para estudar português por 4 ou 5 horas foi parte de nossa rotina. Até hoje estamos aprendendo
Agora nossa equipe brasileira e os clientes são os nossos professores. No tocante a importância da língua portuguesa, é bom contar que, na Argentina, a equipe tem aulas semanais com uma professora brasileira.
Como a Nuvem Shop nasceu de uma turma de amigos da faculdade, que por situações da vida já tinham passado por muitas coisas juntos, não pensamos em outro jeito que não fosse viver juntos também em São Paulo. Assim, ao longo de 2012 e 2013 estivemos convivendo cinco pessoas num apartamento de 25 m², com todas as dificuldades que se possa imaginar. Éramos três argentinos (meus sócios e eu) e dois amigos brasileiros.
A gente tinha que dormir no chão. O mesmo espaço era escritório, espaço para comer, dormir e trabalhar. Como se diz aqui: faz parte! Como também faz parte, passamos meses sem salário
Tudo para garantir a saúde financeira da companhia. Nós nunca pensamos em diminuir o tamanho da equipe porque isso era necessário para continuarmos crescendo. Então, fazíamos qualquer outro tipo de ação que nos ajudasse a passar aquele momento de turbulência inicial.
O melhor veio quando começamos a perceber que tanto sacrifício estava dando resultado. Cada ano de empreendimento é um passo à frente que se dá. Confirmamos que estávamos no caminho certo quando conseguimos os primeiros clientes. Isto aconteceu em 2011, na Argentina, e no começo de 2012, no Brasil. Ter clientes foi um primeiro sinal de que estávamos indo bem. Mas, melhor ainda, foi quando tivemos também a confiança de investidores e, depois, validamos isso com o crescimento e novos clientes. Tudo isso é sinal de que valeu a pena.
Hoje, quando penso nessa trajetória, vejo que o mais importante é definir os seus objetivos: saber onde você quer chegar daqui um, seis, 12 meses? Ter métricas claras para isso. Além disso, ter uma missão que guie a companhia no longo prazo e que você consiga transmitir para o resto da equipe. Sem isso, é muito difícil entender o motivo de porque empreender.
Uma das coisas que aprendi morando em São Paulo e trabalhando para os usuários do Brasil é que, no geral, o consumidor brasileiro é mais aberto para te passar as coisas que não gosta ou acha que podem melhorar do seu produto (especialmente se faz isso online, como no site ReclameAqui).
Brasileiros são mais exigentes e menos tolerantes a erros que os argentinos
Acho que isso tem a ver com o fato do brasileiro ter passado por muitos anos com serviços muito ruins, onde sua voz não era ouvida e, com isso, ele já não se sentia respeitado como consumidor.
Hoje o consumidor brasileiro já não quer ser enganado e, por isso, reclama. Até porque encontraram, dessa forma, uma ação que acreditam que vão conseguir o que corresponde ou acreditam ser justo. Isso também existe na Argentina, mas aqui é mais marcante, e isso fez com que a gente tivesse que trabalhar muito acima das expectativas para conseguir dar uma experiência especial aos nossos clientes.
O interessante é que esse comportamento do brasileiro não se reflete em outras situações. Na hora de negociar ou de dar um feedback, por exemplo, o brasileiro evita o confronto.
E, se realmente quer fazer negócios com você, você terá que dedicar tempo ao relacionamento. O brasileiro está mais acostumado a gerar vínculos baseados nos relacionamentos entre as pessoas. Uma reunião, um café, um churrasco… É aí que podemos fazer negócios.
Por empreender em um país vizinho, parecia que não teríamos tantas diferenças, mas elas existem. O que me ajudou bastante a entender isso foi o livro “The Culture Map”, da autora americana Erin Meyer, em que ela aborda as diferenças culturais, mostra como elas são relativas, entre dois pontos de vista, e ainda ensina como melhorar a sua comunicação com as pessoas e equipes de diferentes origens culturais.
Na prática, para nós, tivemos que mudar o paradigma até chegarmos a ser uma companhia “Brazil first”.
Até 2013, todas as ações que tomávamos eram testadas primeiro na Argentina e, se davam certo, levávamos para o Brasil. O que acontecia? Não funcionavam aqui
Assim aconteceram com muitas tentativas: landing pages para que os empreendedores possam se cadastrar, novas melhorias da plataforma que ajudariam ao usuário cadastrar produtos mais rápido, entre outros. Até que a gente teve uma mudança mental onde começamos pensar sempre primeiro no Brasil. Pensar nos problemas dos lojistas brasileiros e pensar em soluções 100% focadas neles. Isso nos ajudou a desenvolver melhores projetos e que realmente funcionaram no Brasil.
Você pode ter o mesmo produto, pode ter o mesmo tipo de usuário, mas existem diferenças culturais que fazem com que você precise pensar uma solução diferente para cada país. Por tudo isso é que viver onde queríamos ter sucesso acabou se revelando o grande segredo para nós.
Me tornei uma pessoa com mais empatia. Hoje, me pergunto mais vezes o porquê das coisas e isso me ajuda a tomar melhores decisões.
Você me vejo pronto para caminhar, e vencer, onde quer que eu esteja: seja em meu país, seja em qualquer outro lugar.
Alejandro Vázquez, 28, é argentino, formado em Administração e Sistemas de Informação, co-fundador e CCO da Nuvem Shop.
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