Em três anos, a Plano Feminino virou apenas O Plano, uma consultoria especializada em diversidade, gênero e raça

Camilla Ginesi - 18 jan 2019
Viviane Duarte conta como, em três anos, a empresa triplicou o faturamento, conquistou grandes clientes e criou um novo projeto social (foto: Arthur Nobre/MM).
Camilla Ginesi - 18 jan 2019
COMPARTILHE

Neste janeiro, a consultoria Plano Feminino, criada em 2010 para “questionar o machismo na publicidade”, se tornou apenas O Plano, uma consultoria de branding, conteúdo e educação com foco em diversidade, gênero e raça. “As mulheres continuam sendo o nosso core business, mas queremos falar também com outros públicos, questionar outros privilégios”, diz a fundadora Viviane Duarte, 40.

A ampliação do público não foi a única mudança n’O Plano desde a sua primeira aparição no Draft, em novembro de 2015. De lá para cá, a consultoria triplicou o faturamento (os números absolutos não são revelados), ganhou grandes clientes (como a marca de carros Jeep e a fabricante de cervejas Heineken), transformou em instituto o seu projeto social de mentoria para meninas da periferia (o Plano de Menina) e criou mais um projeto social (o Plano de Menino, ainda sem site). Mas esses são somente os resultados. A história toda, como sempre, é mais complexa.

Viviane na primeira reportagem aqui no Draft, em 2015 (clique na foto para ler).

Para relembrar o que aconteceu nos últimos três anos na sua empresa e na sua vida pessoal, Viviane releu a reportagem publicada pelo Draft – e se disse tocada. “O texto conta que, para fazer a consultoria engrenar, eu deixei o meu marido, o meu filho e o meu apartamento em Maringá, no Paraná, para morar num quartinho de hotel em São Paulo. Lendo, me perguntei se faria tudo de novo. Concluí que foi a Viviane audaciosa do passado que me trouxe até aqui – e que a Viviane do presente me levará ainda mais longe”, diz.

Na época, uma das preocupações de Viviane era como o mercado estava recebendo o seu ativismo. “Apesar de a consultoria já ter alguns anos, muita gente ainda me colocava medo dizendo que o fato de eu ter abraçado o feminismo atrapalharia a minha carreira”, conta. “Não foi o que aconteceu, construí um negócio que tem reputação, visibilidade e lucro.”

Mas o combate ao machismo na publicidade e dentro das grandes companhias se mostrou um processo mais lento do que ela esperava:

“Era ingenuidade minha achar que, no curto prazo, conseguiríamos conscientizar a todos sobre o machismo”

Inclusive, de acordo com Viviane, um dos maiores desafios da consultoria é fazer com que as empresas e marcas se comprometam de fato com o tema – e não o utilizem somente para se promover ou para vender mais.

ERA UMA CONSULTORIA, EVOLUIU PARA TRÊS PROJETOS

Hoje, O Plano é a marca-mãe de outras três — a Plano Feminino, o Plano de Menina e o Plano de Menino. O Plano presta consultoria sobre diversidade, gênero e raça tanto para campanhas publicitárias quanto para ambientes corporativos (com workshops, media training para executivos e criação de comitês para integração de equipe, entre outros serviços). Já a Plano Feminino faz tudo isso, mas de maneira focada apenas em gênero. O valor dos workshops varia de 8 mil a 25 mil reais, dependendo do número de pessoas e do objetivo da empresa. Já as palestras e consultorias dependem de briefing específico.

Segundo Viviane, o lançamento d’O Plano foi uma evolução natural do negócio – assim como, anteriormente, foi a criação da consultoria interna para empresas. “No começo, fazíamos somente consultoria para publicidade. Então, percebemos que não adiantava só desenvolver campanhas empoderadas, também era preciso mudar as companhias por dentro”, conta. “Com O Plano foi igual. Entendemos que já tínhamos experiência e cases suficientes para trabalhar com marcas que não falam apenas com as mulheres. Então, fizemos isso.”

Acima, a evolução da marca e a nova linguagem visual.

Anualmente, a empresa atende cerca de 30 marcas – e 40% do seu faturamento vem da consultoria interna, enquanto o resto vem da consultoria para publicidade e de palestras ministradas por Viviane. São oito os funcionários.

Ainda em fase embrionária em novembro de 2015, o projeto social Plano de Menina se tornou instituto no final de 2018. De acordo com Viviane, neste ano, o instituto deve estar em dez estados brasileiros e contar com a participação recorrente de 10 000 meninas e 300 voluntárias nos workshops presenciais, que acontecem em escolas públicas e ONGs. Sem contar as 4 milhões de meninas que devem fazer cursos semelhantes no portal online.

Entre os workshops, estão “Você não é obrigada!”, sobre direitos da mulher, “Close certo”, sobre identidade, cabelo e body positivity, e “Vida digital”, sobre programação e segurança na internet. “Mostramos para as meninas até como limpar a linha do tempo do Facebook. Por exemplo, deixar de seguir páginas que só mostram violência e passar a seguir perfis de mulheres inspiradoras, como a ativista paquistanesa Malala Yousafzai”, conta Viviane.

O “Vida digital” deve formar 1 milhão de programadorinhas brasileiras até 2030. O workshop é uma parceria com a organização iamtheCODE, que tem como objetivo ensinar meninas do mundo todo a programar.

No primeiro ano, o Plano de Menina foi totalmente custeado pel’O Plano. No entanto, hoje, o instituto tem como marca-madrinha a Seda, de produtos para o cabelo (pertencente à multinacional Unilever) e o patrocínio da marca de biscoitos eQlibri, da multinacional PepsiCo.

Além disso, no final do ano passado, aconteceu o piloto do Plano de Menino, na Brasilândia, na zona norte de São Paulo. Viviane fala dessa estratégia:

“Também precisamos falar com os meninos se quisermos desconstruir o machismo e a masculinidade tóxica. Dizer que eles podem chorar, que não podem ser violentos. O esforço para que a sociedade seja mais justa também precisa vir deles”

Viviane também tem uma grande novidade fora do trabalho. Há um ano e oito meses, nasceu Luiza, a sua primeira neta. A chegada da bebê coincidiu com o momento em que ela havia se permitido desacelerar: “Por anos, abri mão da minha vida pessoal para focar no negócio. Cheguei até a perder amizades por não ter conseguido dar a atenção necessária”.

MUDANÇAS NA VIDA PESSOAL E PLANOS PARA O PLANO

“Mas, agora que O Plano está mais estável, tenho uma vida mais equilibrada, saio com as minhas amigas, viajo com a Luiza e a minha família nos finais de semana”, prossegue. Nos últimos tempos, Viviane também pôde fazer mais cursos – sobre o terceiro setor, sobre negócios de impacto social e de inglês. “Muitos dos nossos clientes são globais, não posso parar o inglês nunca.”

A próxima meta da empreendedora é dar uma sede própria para O Plano. “Por enquanto, estamos em um coworking na Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo. No entanto, quero ter um lugar só para O Plano e para as outras marcas em breve”, diz.

Sobre o atual cenário político do Brasil, que tende ao conservadorismo e ao obscurantismo, ela fala:

“As empresas e marcas que estavam só brincando de falar de diversidade e gênero tendem a se calar, mas as que têm propósito e entendem a importância de serem agentes de transformação estão apenas começando”

Quando perguntada se se vê como empreendedora para o resto da vida, ela diz não ter certeza. “Mas, me vejo sendo do impacto social, do Plano de Menina para sempre, sim. Quer dizer, não para sempre. Só até eu passar o bastão para a Luiza, a nossa CEO-mirim”, diz, rindo.

COMPARTILHE

Confira Também: