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Fundadora da PrograMaria, Iana Chan quer empoderar meninas e mulheres através da tecnologia e programação

Fernanda Cury - 13 fev 2020
"Perceber que as mulheres que passam pela nossa formação se sentem encorajadas a enfrentar desafios e percebem que elas podem, sim, entrar na área da tecnologia e prosperar é incrível.", conta Iana.
Fernanda Cury - 13 fev 2020
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Crédito imagem: Estúdio Voii/PrograMaria

 

Apesar das dificuldades – e não foram poucas – ela resolveu empreender em um setor majoritariamente masculino, e não se deixou abater pela crença de que as mulheres não poderiam atuar nas áreas de tecnologia e programação. Venho de uma família de imigrantes chineses que teve sua trajetória marcada por guerras e escassez. Nunca me vi em um espaço de liderança, especialmente pelos estereótipos associados às mulheres asiáticas: obedientes, introvertidas e muitas vezes infantilizadas. Entender que eu podia tomar a frente da PrograMaria, pedir demissão para empreender em um negócio incerto foi bastante difícil para mim. Ao mesmo tempo, hoje reconheço quão empreendedor foi meu pai, que chegou ao Brasil adolescente sem saber falar português, se formou na faculdade, e teve diferentes negócios durante sua vida com o apoio fundamental da minha mãe. Encontro muita força no exemplo deles”, conta Iana.

Com brilho nos olhos e sede de aprender mais e mais, ela é uma das seis empreendedoras do programa Aceleração realizado pelo Itaú em parceria com a IFC, com aceleração da Yunus Corporate e FGVCenn e apoio da Pipe.Social.

Uma apaixonada por seu negócio e pelo desejo de transformar a vida de tantas mulheres através da tecnologia e da programação, ela compartilha aqui um pouco de sua história.

Como surgiu a ideia de empreender e montar a PrograMaria? 

Iana Chan: Sou jornalista e sempre fui apaixonada por tecnologia. Para mim programação é poder dar vida às ideias, poder construir coisas. Desde pré-adolescente, quando tinha meu blog, adorava mexer nos códigos para deixa-lo com ao meu jeito. Entendi que por meio da tecnologia, era possível me expressar e me comunicar com o mundo. Mesmo assim, na hora de decidir um curso, optei pelo jornalismo, nem considerei que Engenharia ou Computação pudessem ser para mim, apesar de gostar muito das áreas e já estar estudando programação. Na minha carreira como jornalista, sempre trabalhei com os desenvolvedores e percebia como a afinidade com a área permitia uma relação muito mais produtiva com eles. Logo fui alçada a gerente de projetos e comecei a sentir na pele os obstáculos de um ambiente majoritariamente masculino. Era sempre a única mulher na reunião e era comum me sentir desconfortável e enfrentar situações em que não me sentia pertencente àquele mundo. Compartilhei essa inquietação com uma amiga designer e, assim, surgiu a PrograMaria. Começamos como um clube de programação para mulheres que queriam aprender a programar. Reunimos outras mulheres, designers, jornalistas e programadoras para aprendermos juntas! Quando vimos que as dificuldades e barreiras entre nós e a tecnologia era um problema de muitas outras mulheres, decidimos criar um projeto com a missão de empoderar mulheres com tecnologia e programação. Durante um tempo, a PrograMaria foi meu trabalho paralelo. Por conta do interesse em empreendedorismo e tecnologia, fui trabalhar na Liga Ventures, uma aceleradora de startups corporativa, e aprendi muito. Em 2018, decidi que tinha chegado a hora de investir neste propósito e constituí a PrograMaria como negócio social, por acreditar que esse modelo nos permite alcançar um impacto muito maior.

Como você identificou o nicho e investiu neste setor?

Iana Chan: As mulheres precisam participar do futuro. Queremos que elas sejam capazes de produzir tecnologia e não apenas consumi-la. Apesar de maioria no ensino superior, as mulheres são cerca de 15% dos alunos de cursos relacionados à computação e apenas 20% do mercado brasileiro de TI. Elas também são as mais afetadas pelo desemprego e isso tende a piorar: de acordo com o Fórum Econômico Mundial, para cada vaga gerada na indústria 4.0, as mulheres vão perder 5 posições, por estarem em empregos que se tornarão obsoletos e não terem capacitação para atuar nas novas vagas criadas. Aliás, o déficit de profissionais de TI já é enorme no Brasil, a previsão da Brasscom é de que até 2024, teremos uma demanda de 420 mil profissionais, enquanto estima-se que as universidades formarão apenas 270 mil.

Independentemente do gênero, as empresas têm um desafio enorme para recrutar talentos técnicos. Além disso, a maioria das empresas já entendeu que diversidade é uma vantagem competitiva. A inovação será muito mais disruptiva quanto mais diversidade houver nas empresas.

“É muito mais fácil inovar quando se tem diversidade de gênero, étnico-racial, cultural e social, porque essa riqueza traz diferentes perspectivas sobre um mesmo problema e faz com que as soluções “fora da caixa” apareçam. Capacitar as mulheres para que entrem e continuem no mercado de tecnologia atende a essa demanda”.

Como funciona a PrograMaria?

Iana Chan: A PrograMaria tem soluções para grandes empresas se conectarem e contratarem mais mão de obra técnica. As empresas nos contratam para oferecermos cursos para mulheres que querem entrar na tecnologia e não têm conhecimento prévio ou formações em tecnologias e ferramentas específicas para aquelas que já atuam na área e querem se aperfeiçoar. Para a empresa, é uma oportunidade de criar relacionamento com elas e contratá-las, além de trabalhar seu employer branding para esse público.

Durante nossa história, já organizamos 16 oficinas com mais de 300 participantes e 4 edições do Curso Eu ProgrAmo, formando 115 mulheres. Nele, ensinamos mulheres sem conhecimento prévio em tecnologia fundamentos de HTML, CSS e Javascript. Dentre as formadas que decidiram seguir carreira em tecnologia, quase 80% conseguiram emprego na área em até 1 ano após o curso. Outro resultado é a formação de uma rede entre as alunas, uma conexão muito poderosa em que elas trocam experiências e dão suporte umas às outras. Além disso, temos uma frente de eventos que nutrem essa comunidade e oferecem oportunidades de engajamento para essas corporações, como o PrograMaria Summit, um dos maiores eventos no tema. Em 2019, reunimos mais de 300 mulheres e 10 empresas contratantes em um dia inteiro de conteúdo e ativações para fomentar a carreira das mulheres, como rodadas de mentoria, networking, sessões de entrevistas rápidas com recrutadoras etc.

Como foi no início? 

Iana Chan: Começar uma empresa é mergulhar num universo de muitas incertezas: vamos conseguir desenvolver algo que realmente entregue valor? Isso vai vender? Como atrair pessoas incríveis para o time? Como vamos crescer? No início não tinha recursos para investir na empresa, então tive que me organizar financeiramente para conseguir fazer essa mudança na minha carreira. Trabalhar sem saber se você será remunerada é um dos principais medos do começo e administrar essa pressão não é fácil.

Por ser uma das iniciativas pioneiras no tema, a PrograMaria conseguiu estabelecer uma comunicação muito autêntica com as mulheres e isso foi atraindo parcerias e empresas interessadas em participar dessa conversa. Isso nos possibilitou entender o mercado, suas necessidades, e criar soluções pensando tanto nas mulheres, quanto nas empresas.

Teve algum momento em que você pensou em desistir?

Iana Chan: Tomamos muitos “nãos” na história da PrograMaria. Quando se vive uma sucessão de “nãos” durante muito tempo e você vê suas contas se acumulando, as dúvidas aparecem e você repensa se suas escolhas fazem sentido. Numa dessas, fui procurada para trabalhar com temas que amo, tecnologia e educação, com um salário extremamente atrativo. Nessas horas, você dá uma balançada, mas foi um momento de reafirmar minha gana de trabalhar com esse propósito, gerando o impacto que quero ver no mundo e com um time que compartilha dessa mesma visão e entusiasmo!

Qual foi o maior desafio que você enfrentou na vida empreendedora?

Iana Chan: Um grande aprendizado na jornada da PrograMaria foi entender que nosso propósito era muito grande: há muitas formas de empoderar mulheres com tecnologia e programação. Foi preciso definir uma visão para realizá-lo, focar e dizer não para oportunidades de negócio que não estavam alinhadas ao nosso objetivo estratégico. É difícil recusar negócios quando você ainda não tem uma situação financeira confortável, mas percebemos que é fundamental para que a gente possa dedicar esforços para desenvolver o que realmente importa. Essa estratégia nos permitiu avançar mais rápido, ter clareza do que fazia sentido e tomar decisões mais rapidamente.

Outro grande aprendizado foi superar a síndrome da impostora que exige de nós nada menos do que a perfeição e conseguir entender que sempre haverá incerteza e coisas fora do nosso controle quando empreendemos. O importante é se mover, aprender com o percurso e não se esquecer de celebrar as pequenas vitórias.

Na sua opinião, o que o empreendedorismo feminino tem de diferente?

Iana Chan: Ser mulher e empreender no universo de inovação e tecnologia é bem desafiador por ser um ambiente predominantemente masculino e cheio de vieses. Vários estudos comprovam que empresas com mulheres na liderança dão melhores resultados, porém não recebem as mesmas oportunidades. Uma pesquisa da BCG, por exemplo, mostrou que as startups criadas por mulheres geram mais receitas, porém recebem menos investimentos do que as startups criadas por homens.

Gosto da abordagem da professora Claudia Melo, que utiliza uma ótica filosófica do que foi construído como “feminino” e “masculino”, sendo que todo ser humano possui características atribuídas aos dois polos. As características tidas como femininas durante muito tempo foram vistas como fraquezas, e valorizamos durante muito tempo o crescimento a qualquer custo, a competição, a hierarquia, a centralização, características tidas como masculinas. Esse desequilíbrio tem gerado uma série de problemas e vejo um movimento que questiona esse modelo e resgata valores como empatia, o senso de propósito, a colaboração, a preocupação com a sustentabilidade, entre outros.

O que a motivou a participar do Programa Aceleração Itaú Mulher Empreendedora 2020?

Iana Chan: O Aceleração Itaú Mulher Empreendedora traz pilares fundamentais para empresas que já estão rodando e precisam de apoio para crescer. São pontos que me interessam muito desenvolver, como liderança, análise de impacto e gestão financeira.

Ter o apoio de uma rede de mentores e mentoras com interesse em fazer o negócio crescer também é uma excelente oportunidade – muitas vezes eles conseguem nos provocar a enxergar coisas que não estamos vendo. E, finalmente, poder conviver e trocar com outras empreendedoras será muito bom. Esse networking é sempre bem-vindo para essa jornada que muitas vezes é solitária.

Qual seu maior objetivo?

Iana Chan: Meu objetivo é diminuir o gap de gênero na tecnologia, transformando o mercado em uma área mais diversa e inclusiva.

“Perceber que as mulheres que passam pela nossa formação se sentem encorajadas a enfrentar desafios e percebem que elas podem, sim, entrar na área da tecnologia e prosperar é incrível. O brilho nos olhos de uma mulher que se percebe capaz de aprender algo que durante toda a vida acreditou ser impossível é muito inspirador”.

Qual é o seu sonho? O que ainda falta realizar?

Iana Chan: Quero viver em um mundo em que as pessoas possam simplesmente ser o que são. Pode parecer trivial dito assim. Mas hoje, o racismo e o machismo estrutural fazem com que muitas pessoas não possuam as mesmas oportunidades para desenvolver seu potencial. Quebrar esses estereótipos e desigualdades nos dá força para continuar o trabalho com a PrograMaria.

Se pudesse voltar no tempo e refazer uma decisão, corrigir algum momento de sua trajetória, o que seria?

Iana Chan: Durante muito tempo acreditei que deveria trabalhar até a exaustão para obter sucesso. Percebi, depois de um burnout, que nenhum “sucesso” valia a pena se eu tivesse que atropelar a mim mesma para alcançá-lo. Hoje consigo entender que cada um define o que é “sucesso” a partir de seus valores e busco esse ideal todos os dias, não quer dizer que sou exemplo de plenitude, mas ao menos consigo ter mais clareza de onde quero chegar e aceito que a jornada não é linear e está tudo bem.

Qual foi a sua maior conquista até aqui?

Iana Chan: Ter me permitido enfrentar o desafio de empreender. Hoje, temos muito orgulho de ser uma das principais referências no tema mulheres e tecnologia no Brasil. A PrograMaria já foi reconhecida por editais e prêmios, recebeu apoio de diferentes instituições, como Artemisia, Google for Startups e do próprio Programa de Aceleração Itaú Mulher Empreendedora. Em 2019, fomos premiadas como a Melhor Startup de Impacto Social de 2019 no Startup Awards.

Se pudesse dar apenas uma dica para quem está querendo empreender, qual seria?

Iana Chan: Conheça e cuide de si mesma. A jornada de empreender é repleta de desafios e seu maior recurso é você mesma. Aprender sempre sobre suas fortalezas, suas fraquezas, o que te motiva, como ser mais produtiva e quais são seus valores, entre outras coisas, vai te fazer chegar mais longe – e mais realizada.

 

Para saber mais

Empresa: PrograMaria

O que faz: Startup de impacto social que empodera meninas e mulheres com habilidades em tecnologia e programação. Realiza eventos, oficinas, cursos de formação técnica e outras soluções para empresas promoverem mais diversidade e recrutarem mais mulheres na tecnologia.

Funcionários: 1

Sede: São Paulo

Início das atividades: Setembro/2018

Contato:  [email protected]

 

Esta matéria pode ser encontrada no Itaú Mulher Empreendedora, uma plataforma feita para mulheres que acreditam nos seus sonhos. Não deixe de conferir (e se inspirar)!

 

 

 

 

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