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Harvard ou MIT? Qual a melhor escola de negócios do mundo?

Ricardo Garrido - 4 maio 2015 Qual é a melhor escola de negócios do mundo - Harvard ou MIT? Ricardo Garrido esteve lá e dá seu relato
Qual é a melhor escola de negócios do mundo - Harvard ou MIT? Ricardo Garrido (que faz um belo cover do Van Halen nas horas vagas) esteve lá e dá seu relato
Ricardo Garrido - 4 maio 2015
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Por Ricardo Garrido

Após alguns anos de carreira, é comum que jovens profissionais se encontrem numa encruzilhada: suas atividades diárias começam a se distanciar daquilo que estudaram e passam a se concentrar em liderança de pessoas, reuniões de orçamento, aprovação de projetos.

Assim, jornalistas passam dias sem abrir o Word, arquitetos passam a semana falando, falando e não desenhando nada, programadores param de escrever código e se veem obrigados a participar de reuniões presenciais – com gente de verdade! E então toda a carreira que sonharam some e dá lugar a um novo tipo de trabalho, dentro do mundo corporativo, para o qual não estão preparados. Ao mesmo tempo, já acumularam experiência suficiente para dar vazão ao sonho de abrir aquele negócio próprio, ou de viver de modo autônomo, de acordo com sua especialidade, fora do mundo corporativo.

Nesse momento, uma pausa e uma imersão em uma nova rodada acadêmica fazem a diferença: um MBA no exterior pode expandir os horizontes e o entendimento da vida executiva – ou então dar a inspiração necessária para o empreendimento.

Essa pausa não é mandatória: eu sou um dos que deixaram passar esse momento. A carreira ia bem, o namoro virou casamento, happy hours e futebol e shows ocupavam as horas vagas… Enfim, a vida era boa demais para eu parar tudo, dar um cavalo de pau numa curva que era ascendente, colocar conquistas valiosas em risco e encarar um investimento altíssimo em mim mesmo. E isso fez sentido para mim.

No final, como sabemos, tudo dá certo. A carreira e o casamento evoluíram tão bem que não posso dizer, aos 39 anos, que fiz a coisa errada (meus joelhos estão destruídos por ter me divertido em milhares de horas de futebol com os amigos, mas isso é outra história).

No entanto, cheguei a uma outra encruzilhada: aquela em que esperam que você reinvente o negócio, indique o caminho, lidere o barco em direção a algo novo. Ser o responsável por uma unidade de negócios ou uma empresa é uma pressão nova, especialmente em momentos de recessão, como este que vivemos no país. Desta vez, uma respirada seria bem-vinda.

Quando falo em “uma respirada”, é bem isso mesmo: de vez em quando, à medida que os desafios surgem, gosto de procurar um curso que possa me inspirar ou ajudar a desenrolar a questão. Uma escapada de uma semaninha com frequência joga luz num problema cabeludo. Ou fornece a faísca que faltava para um projeto muito importante finalmente decolar.

Foi assim que tive a oportunidade de conhecer, por meio desses cursos de curtíssima duração voltados para executivos, duas das principais escolas de negócios do mundo: a Harvard Business School, em Boston, e a Sloan School of Management, do MIT, em Cambridge. (Elas ficam a 15 minutos de carro uma da outra.) Meu relato é sobre a diferença das experiências em uma e em outra instituição. Esteja você naquela primeira encruzilhada da carreira, esteja você na segunda bifurcação, considere dar esse salto e investir em você mesmo – sabendo que para que o investimento traga o retorno desejado é imprescindível acertar na escolha do lugar.

A Escola dos CEOs x A Meca dos Nerds

A diferença fundamental entre Harvard e MIT está no sangue azul da primeira e no desprendimento intelectual da segunda: Harvard é a “escola dos CEOs”, tradicionalíssima, centenas de anos formando a elite americana. MIT é a meca dos nerds, um lugar onde pompa e pose não têm vez – ali, quem manda são engenheiros com seu peculiar senso de humor autodepreciativo.

Isso fica claro logo nas acomodações para os cursos: Harvard sabe que parte significativa da experiência é respirar os ares de Harvard. Assim, hospedam os alunos do curso dentro do campus, com aulas oferecidas em salas em formato de anfiteatro, com meia dúzia de lousas old school que se movem por roldanas, cedendo a recursos audiovisuais com frequência. Ao final do primeiro dia de curso, professores recebem os alunos num coquetel numa biblioteca que parece estar ali há trezentos anos (talvez mais). Voltinhas no campus, café da manhã no refeitório e idas à biblioteca central são atividades estimuladas. Tudo para você se sentir um autêntico aluno de Harvard.

Já o MIT é desligado feito aquele nerd brilhante dos filmes da Sessão da Tarde: nem imagina que você nutre altas expectativas sobre o que vai encontrar. Dois dias antes do curso, eu ainda tinha dúvidas se minha inscrição estava devidamente feita, aprovada e paga: aparentemente, tudo tinha dado certo no site do MIT mas, ao contrário de Harvard, eu não tinha recebido e-mails de boas vindas, instruções sobre como me portar na aula (havia um vídeo tutorial sobre isso em Harvard, juro), uma tonelada de material a ser lida antes do curso… Até que chegou um singelo e-mail de uma moça falando que o curso aconteceria num hotel vizinho ao campus, e que algumas leituras prévias haviam acabado de ser disponibilizadas no site. OK.

Chegando no MIT, a diferença é gritante em relação a Harvard: tudo parece meio improvisado, no esquema da feira de ciências do colégio do seu filho. Cheguei bem cedo, a tempo de ver dois funcionários – um deles, descobri depois, era o diretor de Educação Executiva da Universidade – chegando com plaquinhas e materiais para entregar aos alunos. Aí eles montam a sua bancada rapidamente, lhe entregam seu crachá, servem um café e pronto, lá está um professor do MIT falando coisas brilhantes com a despretensão de quem está contando uma piada no bar.

Logo na abertura, um professor deu as regras do jogo: “vocês verão que não nos levamos muito a sério; então, se quiserem perguntar sobre o resultado do jogo dos Patriots, ou sobre onde comprar um moletom do MIT, é só levantar a mão!”

A infraestrutura não é das mais inesquecíveis: um notebook ligado a um projetor, meia dúzia de flipcharts espalhados pela sala, e um inusitado retroprojetor usado para o professor eventualmente desenhar ou rabiscar palavras numa folhinha de acetato. Nenhuma lousa ou quadro branco ou qualquer coisa que lembrasse uma sala de aula, que dirá uma “sala de aula do MIT”!

Que tal estudar o case da ascensão e queda do Myspace no MIT?

Que tal estudar no MIT o case da ascensão e da queda “ignominiosa” do Myspace?

 

Construção teórica e tradição oral x Pontos centrais e aplicabilidade prática

As diferenças não ficam só nas instalações e na abordagem: o conteúdo e a filosofia de ensino são claramente distintas.

Em Harvard, as leituras prévias são extensas, verdadeiros tratados sobre a Microsoft ou a Amazon ou a Apple, incluindo a história completa das empresas, seus balanços, gráficos e clipping de notícias. Você lê tudo e acha que já fez o curso, tal a carga de informação a ser dichavada – antes da aula.

Daí começa a aula e o professor simplesmente ignora a narrativa dos casos. Limita-se a perguntar aos alunos o que a Microsoft fez de diferente, ou por que achamos que os editores de livros reagiram de tal maneira à Amazon, ou onde a Apple falhou no meio da década de 90. Uma aula em Harvard é uma interminável chamada oral, e em meia hora você já entende que não dá para se esconder, e então começa a falar e opinar loucamente – caso contrário, você será chamado nominalmente pelo professor a fazer isso.

Por fim, você descobre que os verdadeiros dossiês que você leu são apenas a tela de fundo para o que vai acontecer: as ideias e conceitos centrais da aula são sacados da cartola, num mis-en-scène sensacional dos professores. Por exemplo, a minha primeira aula em Harvard dedicava-se a explicar o que são “efeitos de rede” – o típico fenômeno verificado em negócios digitais como Facebook ou eBay, empresas que atraem mais pessoas à medida que mais pessoas entram. O tipo de fenômeno que fez você usar Excel, PowerPoint e Word: não foi porque você acha que esses são os melhores softwares de planilhas, apresentações e texto, mas simplesmente porque eram os que todo mundo em volta estava usando. Efeito de rede, brilhantemente construído pela Microsoft. E não havia uma linha usando essa expressão nas leituras que encaramos. Ou seja, não adianta ler o material de apoio; o pulo do gato está no discurso do professor, e não há provas materiais do precioso conhecimento que ele transmitiu na mais pura tradição oral.

Já o MIT não liga para toda essa construção: disponibiliza algumas leituras prévias, mas numa quantidade muito inferior à de Harvard; questiona menos, provoca menos os alunos, evita as chamadas orais que são o constrangimento supremo para o nerd autêntico; e entrega logo de cara, em formato de caderno de encargos, os pontos centrais e conceitos que são o pulo do gato. Harvard filosofa e sugere conceitos elaborados, deixando a seu cargo a aplicação prática daquilo; o MIT entrega um manual de como a coisa deve ser feita, e deixa o resto da aula para você construir um caso de aplicação prática.

Jogo de gente grande

Mas não se engane: ambas as abordagens são coisa de primeiríssimo nível. Os aparentes desprendimento e pragmatismo do MIT disfarçam uma ciência e uma metodologia que não precisam ser enunciadas. Catherine Tucker, professora de Marketing, é uma inglesa de 36 anos, de fala fina e estridente – que ela usa para chamar a atenção da classe de executivos invariavelmente mais velhos que ela. Cath (não viramos amigos íntimos, mas tudo bem) tem a estranha mania de falar sozinha enquanto complementa para si mesma o que os alunos estão falando. Meio desajeitada, engraçada, conduz a aula com graça e humildade.

Uma consulta no currículo de Cath permite ver que ela é estudiosa de métodos de ensino envolvendo dinâmicas de grupo, e que ganhou o prêmio de professora do ano do MIT em 2014. Quem poderia dizer que aquela “desengonçada que fala sozinha” é uma das maiores especialistas do mundo em precificação, orientadora de fundadores de startups como, por exemplo, o Dropbox? E não para por aí: sua maior especialidade é o estudo de privacidade digital – não raramente, é ouvida sobre o assunto no Congresso Americano e até na Casa Branca. Essa é a moça de fala engraçada que passa a tarde conosco.

O sarrafo do MIT é lá em cima. E o de Harvard também. Em uma aula sobre como as editoras de livros – e, em especial, a Random House – enfrentaram o crescimento da Amazon e a disrupção que emergiu no seu negócio tradicional, o professor Bharat Anand – o mesmo que havia me apresentado ao conceito de efeito de rede no dia anterior – deu um show: perguntava a cada um o que a Amazon fez, como a Random House respondeu, os porquês de um e de outro competidor, se achávamos aquilo acertado ou não, por que isso e aquilo etc.

A classe, toda sabichona, olhava para o que tinha acontecido sete ou oito anos atrás e descia a lenha com gosto nos pobres editores de livros, que não enxergavam o óbvio, enquanto a Amazon reinventava o mundo de quem faz negócios com livros. No final, Bharat apresentou um senhor de gravata borboleta que assistia à aula em silêncio, ali na primeira fileira: era o CEO da Random House à época dos acontecimentos discutidos, hoje aposentado.

Num passe de mágica, o chão sólido onde pisávamos, com nossa soberba de obra pronta, sumia debaixo de nossos pés. Éramos subitamente convidados a olhar o que acontecera em 2006, de modo mais humilde, de braços dados com aquele executivo, obviamente brilhante, provavelmente mais do que a maioria dos presentes àquela classe, que tinha sido brindado, na sua gestão, com o maior desafio da história da sua indústria.

Em Harvard, tanto quanto no MIT (foto), o jogo é de gente grande - que vem de toda parte do mundo

Em Harvard, tanto quanto no MIT (foto), o jogo é de gente grande – que aflui de toda parte do mundo

 

Em suma…

Em retrospecto, saí maravilhado de ambas as escolas. Seja opressora e exigente como em Harvard ou descontraída e direta ao ponto como no MIT, ambas as experiências foram as mais impressionantes que tive em sala de aula na vida. Não sei eleger qual me impressionou mais. Sei que extraí das duas escolas direcionamentos importantes para os negócios que eu liderava em cada época. No fim, o que interessa é o conteúdo que você consegue absorver e o quanto você consegue sair de lá inspirado a usá-lo.

Tomando como parâmetro as experiências que tive na Escola Politécnica da USP (cinco anos longos, muito longos) e na FGV (um suplício de dois anos e meio, somado a alguns cursos in company que não melhoraram muito meu sentimento em relação à faculdade), posso dizer com tranquilidade: não há comparação. É o mesmo que botar o Barcelona pra jogar contra o time de futsal da oitava série da escola do seu filho.

Portanto, se você se encontra numa daquelas encruzilhadas de carreira de que falei no começo do texto, ou em outra bifurcação qualquer da sua vida profissional, e se imagina que uma pausa na carreira para estudar no exterior pode lhe ser útil, sugiro que dedique tempo e estudo à questão. Tenho certeza de que estudar não faz mal, e que estudar numa universidade top só pode fazer bem. Há quem diga que o investimento é muito alto, e que serão necessários vinte e poucos anos de carreira para pagá-lo. Já eu acho que dinheiro nenhum paga a experiência que você vai ter, e que essa conta nem precisa ser feita.

O mais importante – sabendo que será um investimento alto de tempo e de dinheiro e de vida pessoal – é saber onde apostar suas fichas. Você é do tipo tradicional, que admira instituições acadêmicas de primeira linha e a liturgia da vida no campus? Ou você prefere ficar mais à vontade, num lugar onde hierarquia e modos são desnecessários, e as ideias são pragmaticamente traduzidas em aplicações práticas, todo santo dia? O grau de exigência é o mesmo, a dificuldade é a mesma, a grana é a mesma, até a cidade – Cambridge, vizinha de Boston – é praticamente a mesma.

Ou então, na dúvida, e se puder, faça como eu e caia dentro das duas.

 

Ricardo Garrido, 39, é engenheiro arrependido, executivo por vocação, corintiano de coração e um consumidor insaciável de literatura, cinema e música. Arrisca uns textos aqui, uns acordes ali e uns chutes tortos acolá – mas admira mesmo é quem nasceu para fazer bem essas coisas.

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