Moip Pagamentos: como construir do zero uma startup que vale R$ 165 milhões

Giovanna Riato - 1 mar 2016Daniel, Igor e Leonardo: os criadores da Moip, empresa de pagamentos online capaz de concorrer com gigantes como PayPal e PagSeguro.
Daniel Fonseca, Igor Senra e Leonardo Mendes, criadores da Moip, a startup de pagamentos online capaz de concorrer com gigantes como PayPal e PagSeguro.
Giovanna Riato - 1 mar 2016
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Resiliência e vontade de trabalhar. Este é o combo essencial para qualquer empreendedor que pretende construir uma empresa do zero e vê-la prosperar no mercado. A opinião é de Igor Senra, 37, mineiro bom de papo que fala com propriedade do assunto, com a experiência de ser um dos fundadores e CEO da Moip Pagamentos, startup nascida em Belo Horizonte em 2008 que acaba de ser vendida para a companhia alemã Wirecard por 165 milhões de reais.

A empresa brasileira atua no árduo mercado de pagamentos online com a oferta de soluções para e-commerce, marketplaces, aplicativos e mobile. Para brigar com gigantes como PagSeguro e PayPal, a startup criou o conceito de checkout transparente em que o cliente faz o pagamento sem precisar ser redirecionado para outra página. Outro diferencial é o foco em pequenas empresas e startups.

A receita da Moip vem de uma taxa cobrada dos clientes nas transações: 5,49% + 0,69 real por transação aprovada no cartão de crédito e 3,49% + 0,69 real por transação aprovada no boleto e débito online. Neste link eles detalham as cobranças e o modelo de negócios. Com estes serviços, a Moip transacionou 1 bilhão de reais e alcançou faturamento de 50 milhões de reais em 2015, com uma carteira de 60 mil clientes no Brasil.

O bom resultado é fruto do esforço dos três sócios, Igor, que tem o lado empreendedor forte desde cedo, Leonardo Mendes, 33, e Daniel Fonseca, 33, responsáveis por tocar a parte operacional da empresa e desenvolver as soluções e serviços da Moip. Igor fala sobre a obsessão com a qualidade, algo que sempre marcou o trabalho dos três:

“Competimos em um mercado que só tem gente muito grande e começamos muito pequenos. Antes de ser os maiores, queríamos ser os melhores”

A jornada para construir a Moip começou com Leonardo, que fazia Engenharia de Controle e Automação na Universidade Federal de Minas Gerais. Bom aluno, ganhou bolsa de estudos para um curso de inovação no exterior. Passou um ano fora do país, entre Alemanha e Estados Unidos. Por lá e conheceu o PayPal e voltou com a ideia de desenvolver solução nacional semelhante.

PARA TIRAR O NEGÓCIO DO PAPEL, COMECE

Em 2004, começou a programar o sistema da Moip sozinho. A tarefa não era exatamente a especialidade dele, que aproveitou a necessidade de fazer um trabalho de conclusão de curso na faculdade e buscou um professor da área de ciência da computação para orientá-lo. Na época o amigo Daniel, que fazia o mesmo curso na UFMG e trabalhava na Cemig, a concessionária de energia elétrica de Minas Gerais, estava debruçado em um projeto de inteligência artificial. O objetivo era entender o consumo de energia e criar um modelo para prever a demanda. Decidiram então se unir e criar recurso semelhante para prever e evitar fraudes nos pagamentos, fortalecendo a ferramenta que Leonardo criou. Os dois juntaram as economias e aplicaram cerca de 10 mil reais no negócio.

Igor só entrou mais tarde no projeto, em 2007. Desde cedo ele ajudava o pai a tocar um negócio no setor têxtil e, aos 16 anos, já era emancipado, tocava empresa própria na mesma área. Algum tempo depois, quando o pai se aposentou, ele herdou o negócio. As coisas cresceram e, com apenas 25 anos, Igor comandava 16 lojas e 10 fábricas debaixo do guarda-chuva do Grupo Moda Mineira. Apesar de a empresa ir bem, ele não se identificava com a área. Queria um negócio escalável e capaz de gerar benefícios para o país. Vendeu o empreendimento em 2003 e foi para o mercado de trabalho. Passou pela Telemig Celular e pela Claro, em São Paulo.

Após venda para a Wirecard, Igor mantém o cargo de CEO e quer entregar bons resultados.

Após venda para a Wirecard, Igor mantém o cargo de CEO e quer entregar bons resultados.

Ele admite que já não estava tão feliz profissionalmente quando soube por um amigo do negócio de Leonardo e Daniel, que a essa altura estava em uma incubadora em Belo Horizonte. Ele marcou reunião e, ao chegar lá, descobriu que Daniel era cunhado de sua namorada da época. Eles tinham se conhecido em um jantar de família na noite anterior, mas não conversaram muito, afinal, o foco do Igor era agradar o sogro.

“Quando nos demos conta da coincidência já nos desarmamos. Ele me apresentou o projeto e de cara eu gostei muito e entrei”, lembra Igor, que investiu 60 mil reais na Moip, valor estimado para cobrir um ano de operação. Em 2008 eles estrearam no mercado. E de cara veio a primeira decepção. Foram vítimas de uma fraude que gerou prejuízo de 5 mil reais. “Ao intermediar pagamentos, assumimos também o risco. Na época esse valor foi muito alto para nós. Não quebramos, mas chegamos perto”, diz.

OS PERCALÇOS DA STARTUP

Ao tocar os negócios os três sentiram na pele o desafio de atrair clientes para uma empresa iniciante de apenas três pessoas. Para driblar o problema, os sócios, que são torcedores do Galo, escreveram em um quadro nomes e sobrenomes de jogadores do Atlético Mineiro. “Quando o telefone tocava a gente escolhia um nome para atender. Dependendo da demanda, fingíamos que a ligação era transferida. Até hoje não sabemos se as pessoas percebiam que a voz era sempre a mesma”, conta Igor, reconhecendo o tom cômico da situação, sem esquecer das dificuldades “Se eu falar de todos os problemas, ninguém vai querer empreender, mas com certeza é preciso ter resiliência”, diz, admitindo:

“Nosso negócio tinha muito mais chances de dar errado do que de dar certo”

Cientes dessa fragilidade, eles foram atrás de investidores para conseguir crescer e receberam aportes da Arpex e da Ideasnet. Em 2009, deixaram Belo Horizonte e se instalaram em São Paulo, no mesmo prédio na avenida Brigadeiro Faria Lima que estão até hoje. Na época, no entanto, eles dividiam o andar com mais duas empresas. Ao longo do ano a operação cresceu e o time chegou a 50 pessoas. “Tivemos que decidir se ficaríamos com o andar todo para nós. Parecia um passo muito grande. Quebramos a cabeça para tomar a decisão, mas fomos em frente”, diz Igor.

Daniel, Igor e Leonardo, torcedores do Galo, brincavam de atender o telefone na Moip usando nomes dos jogadores.

Trabalho insano, mas divertido. Daniel, Igor e Leonardo, torcedores do Atlético Mineiro, brincavam de atender o telefone na Moip usando nomes de jogadores do time.

O ritmo de crescimento seguiu acelerado. Em 2010 eles tinham 140 funcionários (hoje são 180) e o desafio diário de administrar cada vez mais gente e mais problemas. A expansão acontecia sobre base pequena de clientes, mas ainda assim era difícil de assimilar. Eles iam tapando buracos e tocando o barco. “Toda hora tínhamos de arrumar o sistema, que caia. Apesar de fazer pouco tempo, naquela época não contávamos com a literatura que temos hoje, com o conceito de Lean Startup, por exemplo. Tomamos a decisão de fazer muita coisa muito rápido, arriscando e corrigindo”, conta Igor.

Ele diz que a máxima de que a ignorância é uma bênção cai como uma luva para ele, que não tinha ideia dos desafios que estavam por vir quando começou a Moip:

“Se eu soubesse o tanto de coisa que teria de enfrentar, nem teria começado”

Igor compara o ato de empreender com uma corrida desenfreada para subir as escadas um prédio alto sem saber o que vai encontrar em cada andar. “No nosso caso, é tipo subir o Empire State Building”, diz. Para ele, a resiliência precisa ser maior do que o cansaço de subir a escadaria.

COMO BUSCAR AJUDA PARA CRESCER E APARECER

No fim de 2014 os três empreendedores decidiram buscar um sócio capaz de ajudar a Moip a crescer rápido. Com a deterioração do cenário econômico no Brasil, o processo parecia pouco promissor. “Era um desafio para nós tocar a empresa, que não podia parar, e ainda cuidar disso em paralelo, então resolvemos contratar uma consultoria para nos ajudar”, diz Igor.

Com isso, eles começaram a receber propostas em volume até maior do que esperavam inicialmente. Ao longo de 2015 cumpriram agenda intensa de reuniões com as empresas interessadas. Na fase final sobrou menos de uma dezena de empresas, entre elas a Wirecard. Antes mesmo de marcar um encontro com os sócios, a companhia alemã mandou proposta para a compra, como Igor lembra:

“Quando recebemos (a proposta de compra) chegamos a duvidar se era sério porque eles não nos deram nenhum trabalho, não nos questionaram, nem pediram reunião”

As coisas só ficaram mais claras depois, quando executivos alemães enfim vieram ao Brasil para conhecer a Moip. “Esperávamos uns caras frios, metódicos, mas foi totalmente diferente. A conversa fluiu e eles levantavam questões super pertinentes, que faziam muito sentido. Parecia começo de namoro: eles nos diziam tudo que queríamos ouvir”, diz Igor. Assim, os interesses casaram e o negócio foi adiante, com a venda de 100% da startup para a companhia.

Com 16 subsidiárias espalhadas por vários continentes, faltava para a Wirecard presença nas Américas, algo que agora acontece por meio da Moip. O próximo passo é internacionalizar, começando pelos países latinos. Outro ponto que contou a favor de fechar o negócio é que, segundo Igor, a empresa tem certa tradição em manter os cargos dos fundadores mesmo depois de comprar startups. Foi assim com a Moip. Daniel, Leonardo e Igor ficaram sem participação acionária, mas permanecem com seus cargos na companhia.

Para alguns empreendedores a venda da startup uma cifra milionária seria um atestado de sucesso. Os três, no entanto, pensam diferente e fazem questão de participar da nova fase do negócio. “Queremos que em um ano eles olhem para a Moip e pensem que pagaram barato na empresa”, afirma Igor. Para atingir a meta, ele pretende fazer o mesmo que tem feito até agora: subir as escadas do prédio, mas desta vez com um pouco mais de clareza acerca do que encontrará adiante. “Sucesso, para mim, é fechar esse ciclo de forma positiva, algo que só vai acontecer quando eu entregar bons resultados.” Os alemães pagaram para ver.

DRAFT CARD

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  • Projeto: Moip
  • O que faz: pagamentos online para e-commerce, marketplaces, aplicativos e mobile
  • Sócio(s): A Wirecard adquiriu 100% das ações da empresa
  • Funcionários: 180
  • Sede: São Paulo
  • Início das atividades: 2008
  • Investimento inicial: R$ 10.000
  • Faturamento: R$ 50 milhões (em 2015)
  • Contato: (11) 3165-4020
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