TODAS AS CATEGORIAS
A COP30 está aí e a Amazônia parece ocupar cada vez mais o centro dos debates sobre o clima. Mas, segundo Lucas Conrado, diretor do Estímulo, fundo criado na pandemia para ajudar pequenos e médios negócios, ainda falta crédito para empresas amazônicas – principalmente para os empreendedores da área urbana.
É com esse olhar que o Estímulo criou um fundo com foco na Amazônia Legal. A ambição é começar a operar ainda neste ano com 100 milhões de reais. O Fundo Vale já está confirmado como parceiro e o momento é de aguardar o desfecho de algumas negociações.
“Existem três perfis de negócios na região que precisam ser fomentados: os negócios da bioeconomia, que têm uma ligação umbilical com a floresta; os produtores rurais; e os negócios urbanos que se conectam com as cadeias sustentáveis. Esses empreendedores urbanos estão fora da agenda de investimentos, porque o capital climático está olhando mais para as outras duas frentes”
O Estímulo Amazônia vai operar da mesma forma que o Estímulo Brasil, atendendo empresas com faturamento médio mensal entre 10 mil e 400 mil reais. Não é exigido nenhum tipo de garantia na concessão do crédito, mas o Estímulo não aceita empresas que estejam muito endividadas.
Os juros começam em 1,99% e variam a depender da saúde financeira do negócio e da região. Os empreendedores também têm acesso a uma jornada de aprendizagem: uma capacitação feita 100% por Whatsapp, com vídeos de 2 a 3 minutos, misturados com algumas mentorias.
O crédito não está atrelado à participação na jornada de aprendizagem, mas, segundo Lucas, está em estudo uma forma de destravar melhores condições a partir da capacitação, que hoje é oferecida, inclusive, para quem não teve o crédito aprovado.
O CRÉDITO COMO FORMA DE PRESERVAR A AMAZÔNIA
Lucas explica que, para além de manter empregos e empresas, o Estímulo Amazônia quer atuar na transformação da região e na preservação da floresta.
“O capital climático ainda está muito focado em projetos de regeneração e bioeconomia. E estamos trazendo outra abordagem, que é o impacto indireto. Financiar pessoas e negócios pode reduzir a pressão sobre a floresta”
Um dos desafios é oferecer oportunidade a pessoas que, por exemplo, querem deixar o garimpo. Eles acreditam que fortalecer os negócios locais é uma forma de fazer isso.
Durante o projeto piloto, realizado em 2024, o Estímulo forneceu crédito para Francisco Ramos, da On-line Stories, uma loja de eletrônicos em Novo Progresso, no Pará. Ele começou como um centro de distribuição de encomendas e, com o crédito, comprou o próprio inventário de equipamentos e começou a vender diretamente, ganhando uma margem maior. Nesse movimento de expansão, contratou um colaborador que saiu do garimpo ilegal e estava buscando outra alternativa.
“Precisamos olhar para essas pessoas que já estão no território, criar condições para que elas se desenvolvam e gerem empregos de qualidade na região”, diz Lucas. “Sem emprego, as pessoas vão pela rota de destruição, para o garimpo ilegal e o desmatamento, atividades que são muito fáceis de ganhar dinheiro.”
APRENDIZADOS DO BRASIL E DO RS PREPARAM O ESTÍMULO PARA A AMAZÔNIA
O Estímulo Amazônia nasceu com o lastro do Estímulo Brasil, que começou a operar em 2020 com o objetivo de ajudar pequenas e médias empresas a não fecharem as portas durante a crise sanitária. O movimento foi encabeçado por Eduardo Mufarej (fundador da Just Climate) e contou com a ajuda de Azor Barros (da Parallax Ventures) e Luciano Huck, entre outros.
Eles mobilizaram recursos filantrópicos para serem direcionados aos pequenos empreendedores. Lucas lembra que Abílio Diniz – falecido em fevereiro de 2024 – foi um dos primeiros doadores, com 5 milhões de reais por meio da gestora Península.
“Na época, começamos a pensar se colocávamos esse dinheiro no formato de doação ou de um crédito acessível. E vimos que o crédito gerava mais compromisso do outro lado – e ainda multiplicava o capital filantrópico”
O montante arrecadado neste primeiro momento foi de 60 milhões de reais e a expectativa inicial era de que haveria perdas na casa dos 50%. “Só que no final de 2020 esse dinheiro volta. Tivemos apenas 3% de inadimplência na época, o que é muito baixo”, diz Lucas.
Isso levou os fundadores e investidores a estruturar uma forma de manter o fundo ativo mesmo no pós-pandemia. Decidiu-se, então, trabalhar com o Blended Finance, combinação de recursos filantrópicos e comerciais.
Em 2024, depois das enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul, o Estímulo aplicou o mesmo modelo para ajudar empresas a se reerguer. Captaram 40 milhões de reais e, junto com o Itaú, levaram esse dinheiro para a ponta.
Segundo Lucas, entre as empresas que se beneficiaram está a Ever Idiomas, que tinha como um dos principais clientes o aeroporto de Porto Alegre, onde oferecia treinamentos feitos sob medida e aulas no ritmo das operações.
Com o fechamento do aeroporto por causa da enchente, o faturamento da Ever foi a zero. O crédito de 30 mil reais do Estímulo ajudou a segurar as contas, reestruturar a casa e investir em marketing para reabrir portas no corporativo.
Lucas conta que foi o segundo contratado do Estímulo. Graduado em Direito pela Faculdade Getúlio Vargas, em São Paulo, ele atuou no mercado de capitais por cinco anos. Mas sentia que faltava um propósito.
“Sem saber muito bem para onde eu ia, em 2020 peguei o meu maior bônus e me demiti. E comecei a ir para rua, com máscara e tudo, para fazer distribuição de cestas básicas”
Uma amiga, sabendo desse trabalho e do interesse, o convidou para fazer parte da equipe que estava trabalhando no Estímulo de forma pro bono. “Fiquei encantado pelo que eles estavam montando com muita agilidade, um ecossistema muito forte desde o início”, diz.
Quando a pandemia começou a arrefecer e eles começaram a pensar no blended finance estruturado por meio de um FDIC (Fundo de Investimento em Direitos Creditórios), instrumento financeiro que permite reunir recursos de diferentes investidores para financiar empresas ou projetos, Lucas se empolgou porque era uma área que ele conhecia muito bem.
“Quando o Azor começou a falar sobre o blended finance, sobre como a gente podia montar um FIDC para alavancar a filantropia, achei encantador. Trabalhei com vários FIDCs na vida, mas nunca tinha visto esse propósito”
O FIDC do Estímulo é estruturado em duas camadas de cotas: uma cota subordinada, que assume o risco da operação, e uma cota sênior, voltada a investidores que buscam retorno financeiro. A cota subordinada é composta por filantropia ou capital concessional (aceitam maior risco ou retornos abaixo do mercado) e funciona como um “colchão de segurança”: se houver inadimplência, ela absorve as perdas, protegendo o capital dos demais investidores.
Essa estrutura permite que investidores tradicionais (como fundos de pensão, family offices e empresas) participem de um fundo de impacto com menor risco. Ao validar o modelo e cobrir parte dos riscos, o capital filantrópico ajuda a atrair mais capital privado e a aumentar o impacto dos recursos.
Hoje, o Estímulo oferece aos investidores um retorno de 105% do CDI (e um relatório de impacto, com dados sobre como o dinheiro investido foi alocado).
Neste ano, o Estímulo deu mais um passo ao firmar uma parceria com o Fampe (Fundo de Aval às Micro e Pequenas Empresas), programa do Sebrae que existe há 30 anos. A parceria é de 6 milhões de reais em garantias e pode alavancar até 90 milhões de reais em crédito com risco reduzido para micro e pequenos empreendedores.
“Basicamente, o Sebrae garante um percentual das perdas dos nossos fundos com o objetivo de destravar mais crédito para pequenos negócios”, afirma Lucas.
Ao longo de cinco anos, o fundo criado na pandemia emprestou 322 milhões de reais, apoiou 5 mil empresas e impactou 51 mil empregos, alocando 91% dos recursos em regiões de baixa renda.
“Um dos objetivos do Estímulo é disseminar conhecimento, estruturar o case e divulgar. Queremos funcionar como um laboratório de crédito, desenvolvendo soluções inovadoras para esses pequenos negócios”
Essa experiência, diz Lucas, virou um case sobre blended finance na Havard Business School. Liderado pelo professor Vikram Gandhi, o projeto foi apresentado, em novembro, por Vinicius Poit (CEO do Estímulo) e Lucas aos alunos do MBA.
Agora, o case integra a plataforma oficial da universidade, podendo ser utilizado em disciplinas por professores de todo o mundo. “Fiquei muito emocionado porque na faculdade estudei cases de Harvard”, diz Lucas. “E, agora, a gente está lá.”
A literatura infantil pode ajudar a deter o aquecimento global? A jornalista Renata Rossi transformou a Agenda 2030 da ONU em um projeto que promove rodas de leitura e conversa para fortalecer a consciência ambiental das crianças.
Engenheira sanitária e ambiental, “ativista por nascença” e diretora do Instituto COJOVEM, Karla Giovanna Braga fala ao Drafters sobre a COP30 e o desafio de incorporar o futuro das juventudes amazônidas à agenda climática.
