“Trabalho com dialoguismo: a arte de escutar, o exercício da curiosidade diante do outro”

Renato Zurlini - 16 mar 2018Renato Zurlini era publicitário e se tornou mediador, hoje à frente de uma consultoria que usa um método chamado Dialoguismo.
Renato Zurlini era publicitário e se tornou mediador, hoje à frente de uma consultoria que usa um método chamado Dialoguismo.
Renato Zurlini - 16 mar 2018
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por Renato Zurlini

Um diálogo pode ser feito de palavras ou de silêncio. Às vezes, o silêncio fala mais do que as palavras. Eu, como alguém disposto ao diálogo, acredito que todas as partes têm as suas razões. Como mediador, posição em que devo ser imparcial por princípio, não julgar faz parte do meu trabalho. Não sou eu que vou dizer quem tem razão ou não.

O grande drama das pessoas é a falta de diálogo, de comunicação.

Assim como as pessoas se ouvem e não se escutam, as pessoas muitas vezes falam e não dizem nada. Em minha trajetória, que contarei a seguir, percebi como eu podia usar o meu talento de comunicador para ajudar a criar mais espaços em que o diálogo se faz presente, mostrando que pessoas com posições aparentemente opostas podem, na verdade, encontrar pontos em comum e saídas possíveis para conflitos, que antes pareciam impossíveis. É nisso que acredito.

Tratar o diálogo como inovação já é o melhor caminho para a sociedade contemporânea prestes a entrar na chamada quarta revolução

Essa história começa em janeiro de 2002. Eu era diretor de arte de uma multinacional de propaganda, com uma expectativa de uma carreira brilhante, e logo vi a oportunidade de abrir meu próprio estúdio e atender pequenas e médias empresas de uma forma mais pessoal e customizada. Naquele momento, o mercado era promissor e eu me via mais promissor ainda. Atendi inúmeros clientes e dirigi várias campanhas. Vivia no mundo maravilhoso da publicidade e aquilo me bastava.

Em 2010, o mercado publicitário iniciou um processo de mudança com a chegada avassaladora da internet — e eu sempre foi um apaixonado pelo papel. No meu último esforço de me adaptar àquela nova realidade, busquei parceiros com outras especialidades com a ideia de que, juntos, poderíamos atender clientes oferecendo as mais variadas plataformas, de forma colaborativa, adequados à nova demanda. Daí, me deparei com a maior dificuldade de todas: o ser humano. Conversando com um amigo que é psicólogo, ele me sugeriu fazer um curso de mediação para aprender técnicas de como lidar com pessoas e conflitos.

Curso de mediação começou e o meu negócio com publicidade fracassou.

A publicidade, aos poucos, foi perdendo sentido para mim. Estimular o consumo de produtos e o envolvimento da vida de inúmeras pessoas presas a um sistema de produção-propaganda-trabalho-dinheiro-consumo, não combinava com a maturidade batendo à minha porta e me fez rever meus própositos de vida.

Por sua vez, a mediação é um método alternativo de resolução de conflitos que conta com uma pessoa neutra (o mediador) que tem o compromisso de ouvir as histórias de todos envolvidos, com o objetivo de facilitar o diálogo e buscar soluções para que os conflitos sejam resolvidos da melhor maneira para todos.

Passei a sentir uma necessidade vital de ajudar as pessoas de alguma forma

Neste momento, a Mediação de Conflitos fez sentido e despertou profundamente a minha paixão pelo diálogo, prática em extinção em tempos de smartphones e Facebooks. No fim do curso, eu tinha certeza do que eu gostaria de fazer: transformar as relações humanas através do diálogo.

A Mediação de Conflitos é uma profissão relativamente nova no mundo. No Brasil, foi regulamentada em 2017. Mediador é o profissional imparcial (como eu falei lá no início desse artigo) que utiliza um sistema de perguntas para ajudar duas ou mais pessoas a resolverem uma diferença. Existem algumas linhas de mediação. Abaixo, descrevo muito brevemente cada uma delas:

– A Mediação de Harvard, aplicada em empresas, que tem como objetivo somente um acordo.

– A Mediação Transformativa Reflexiva (Bush & Folger), que tem como objetivo o reconhecimento e o empoderamento dos indivíduos — e busca a transformação da relação entre as pessoas.

– A Mediação Circular Narrativa (Sara Cobb), que tem vários aspectos, tais como a Teoria Sistêmica, a Teoria do Observador, a Visão Construtivista e Construcionista Social, a Teoria das Narrativas e o Processo Reflexivo.

Mediação Transformativa Reflexiva foi a linha em que escolhi atuar, pois o ganho principal é o restabelecimento da relações entre os indivíduos e a tendência é que, ao conseguirem finalmente dialogar, encontrem uma solução para a diferença.

Ao entrar em contato com este tipo de mediação, me deparei com a possibilidade de usá-la também para o indivíduo, daí criei o Dialoguismo. Ele é uma combinação das técnicas de Mediação com outras linhas que auxiliam o cliente com provocações de forma a ampliar sua percepção sobre o cenário atual e possibilidades. É diferente da terapia, que trata profundamente questões da psiquê e emocionais, ou do coaching, que ajuda a pessoa a alcançar um objetivo traçado.

Quando se opta por levar um conflito a um mediador, é preciso estar aberto para se autoconhecer, para a cuidar das suas relações e, também, transformar a própria realidade. Dou um exemplo prático, que aconteceu comigo. Uma cliente me procurou com uma dúvida sobre sua vida profissional. Ela era consultora de marketing e não conseguia mensurar de forma clara o resultado de seu trabalho. Há anos no mercado, começou a ter dúvidas sobre sua capacidade. Na quarta sessão, teve um insight e percebeu que não conseguia entregar o escopo do seu projeto porque se envolvia em outras áreas, nas quais não havia sido chamada, e isso comprometia o sucesso da sua entrega. O Dialoguismo a ajudou a enxergar a questão sobre outros pontos de vista.

Na minha opinião, as pessoas não escutam mais. Conversamos sempre preparando uma resposta, sem ouvir. Não exercermos a curiosidade ou a calma para sermos impactados pelo pensamento do outro.

O Novo Diálogo é um exercício da escuta. Da não ansiedade, da curiosidade, do respeito, da atenção e do não julgamento. Isso é inovação.

Em 2017, ao mesmo tempo que iniciei meu trabalho como Dialoguista, criei o Primeiros Diálogos.
O encontro de quatro pessoas com o mesmo propósito e com habilidades diferentes e complementares: um advogado especializado em conflitos em condomínios, uma ex-diretora jurídica de multinacional, uma facilitadora de processos de inovação e lideranca e um publicitário (eu). Gente que acredita em usar o diálogo como ferramenta de transformação. Juntos atendemos as mais diversas demandas: individuais, familiares, empresarias, condominiais e grupos.

Aos 46 anos, me sinto no caminho. Mais próximo do que nunca no meu novo propósito de vida.
Feliz em ajudar cada vez mais pessoas. Simples assim. E bem inovador.

 

 

Renato Zurlini 46, trabalhou com publicidade antes de mudar de carreira. Atualmente é dialoguista, mediador de conflitos, diretor de arte e surfista. Fundou a Primeiros Diálogos com o propósito de transformar relações humanas por meio do diálogo.

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