SumUp: diversidade sem cartaz, autonomia real e o desafio de crescer sem perder a cultura de startup

Cecilia Valenza - 5 mar 2018Igor Marchesini, fundador da SumUp no Brasil, fala do modelo de gestão transparente e humanista que implantou na startup (foto: Mario Rodrigues).
Igor Marchesini, fundador da SumUp no Brasil, fala do modelo de gestão transparente e humanista que implantou na startup (foto: Mario Rodrigues).
Cecilia Valenza - 5 mar 2018
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Baiano, filho de uma funcionária pública e de um pequeno empreendedor “que vivia no cheque especial” fechando um negócio e abrindo outro em seguida, Igor Marchesini escolheu cursar engenharia elétrica com uma certeza: queria ser empregado nessa vida. Nada de ter a própria empresa e viver os perrengues do empreendedorismo. Acontece que, ainda na faculdade, essa certeza começou a cair por terra. “Já nas primeiras experiências fazendo estágio, descobri que gostava mais de gente do que de máquinas”, diz ele. Hoje, aos 36 anos, Igor é o fundador e CEO da fintech de pagamentos móveis SumUp no Brasil.

Assim que terminou a faculdade, abandonou definitivamente os sistemas elétricos e iniciou a carreira como consultor na Bain & Company. Um MBA em Stanford, uns anos mais tarde, e pronto: a sementinha empreendedora estava plantada. Contrariando os anseios da adolescência e tendo deixado para trás uma carreira potencialmente boa como consultor, em 2013 ele mergulhou no mercado das fintechs. Ergueu, praticamente sozinho, a SumUp no país. O principal produto da empresa é uma maquininha de cartão para pequenos empreendedores. Há dois modelos: a mais simples, que usa a conexão do celular, custa 118,80 reais; a outra, recém lançada, tem conexão própria e custa 478,80 reais.

Apesar de ter uma operação global, com faturamento de 100 milhões de dólares no ano passado, é no Brasil que as coisas estão acontecendo. Nos últimos dois anos, a operação por aqui cresceu 15 vezes de tamanho. A SumUp nasceu em Berlim, em 2012, mas tem atualmente o Brasil como seu maior mercado individual (e, em 2013, aportou 1,26 milhão de reais para iniciar a operação brasileira). Dos 740 funcionários, 380 estão aqui. A equipe de Igor dobrou de tamanho em 2017 e a meta é dobrar, de novo, este ano.

COMO ESCALAR UM AMBIENTE DE CONFIANÇA?

E é justamente aí que está o maior desafio do negócio. Como crescer nessa escala e velocidade sem perder a cultura da empresa, que na verdade tem muito do jeito de pensar — e de gerir — do próprio Igor? Defensor da ideia de que “it’s all about people”, até hoje ele se envolve e entrevista pessoalmente candidatos de todos os níveis hierárquicos, realiza uma reunião semanal com todos os funcionários para discutir e alinhar estratégias da empresa e incentiva a atitude do “peça desculpas, não peça permissão”.

“Eu me coloco no lugar das pessoas. Para trabalhar bem, você quer que confiem em você, que te deem autonomia para tomar decisão, mas para isso você precisa de contexto. Sem contexto, por mais inteligente que você seja, você vai tomar a decisão errada”, diz, e prossegue:

“A transparência radical é uma necessidade para a autonomia e para o empoderamento dos funcionários”

O resultado desse jeito de pensar se reflete principalmente na velocidade da tomada de decisão. Igor conta que várias das melhorias implementadas pela empresa aqui no Brasil vieram de sugestões ou comentários feitos durante essas reuniões semanais.

Um exemplo é sobre a duração da garantia das maquininhas. Em uma das reuniões, ele conta, um Atendimento levantou a mão e disse que estava recebendo um monte de ligações de pessoas insatisfeitas porque a SumUp oferecia apenas um ano de garantia enquanto outros players do mercado ofereciam cinco. No mesmo dia, Igor saiu para jantar com o fundador da SumUp na Alemanha, Daniel Klein, que estava no Brasil. Discutiram o assunto, fizeram algumas contas e pronto, no dia seguinte estava implementada a garantia de uma década.

Uma vez por semana, Igor reúne todos os funcionários da SumUp para um bate papo sem hierarquia nem regras. A ideia é manter esse espírito, mesmo com o crescimento.

Uma vez por semana, Igor reúne todos os funcionários da SumUp para um bate papo sem hierarquia nem regras. A ideia é manter esse espírito, mesmo com o crescimento.

“A gente não quer perder jamais essa essência de starup, essa velocidade. Não queremos colocar um monte de processos, engessar as coisas e tornar tudo burocrático. Imagina se para chegar em mim aquela sugestão tivesse que passar por dez níveis hierárquicos. Aí eu seria o gargalo de crescimento da empresa”, diz.

A diversidade também é outra questão tratada com espontaneidade na SumUp, que tem uma parcela grande de funcionários LGBT. Igor lembra que, em outra dessas reuniões, ele pediu que as pessoas falassem brevemente porque gostam de trabalhar lá. “Uma moça levantou a mão e fez um depoimento bastante emocionado. Ela é transexual. Passou por todas as etapas do processo de seleção e ninguém nunca nem questionou isso. Foi algo muito natural. Para mim, isso é diversidade de verdade. Não precisa de cotas, de cartazes, de nada disso”, afirma.

O BENEFÍCIO QUE É SER A MESMA PESSOA NO PROFISSIONAL E NO PESSOAL

Igor narra brevemente a sua experiência pessoal com o assunto. “Na Bain, aprendi um negócio que eles chamavam de bring your full self to work. Antes de eu ir para os Estados Unidos fazer o MBA, eu ainda não tinha saído do armário. Mas aí, lá fora, vivi dois anos com meu companheiro da época e, na hora de voltar, falei que só voltava se fosse assumido”, diz, e prossegue: “Foi tão bom ter uma só vida. Eu não precisava mais inventar desculpas para não sair com o pessoal do trabalho. Tinha gente que até achava que eu não gostava deles porque eu vivia evitando. Acredito genuinamente nisso de você estar inteiro no trabalho. As pessoas precisam poder ser completas na empresa”.

A SumUp tem dois modelos de maquinha, com conexão do celular e outra, com conexão própria.

A SumUp tem dois modelos de maquinha, com conexão do celular e outra, com conexão própria.

A abertura e transparência praticadas na SumUp desde o início tiveram um papel importante também na ocasião da fusão com a Payleven, em abril de 2016 (com a fusão, Fabiano Fialho Camperlingo passou a ser o terceiro sócio da holdind SumUp na operação brasileira — mesma função de Igor e Ticiano).

Naquela altura, a startup tinha pouco mais de 50 funcionários e a Payleven, o dobro disso. “Foi quando vimos a diferença que faz ter a cultura e os valores muito claros. Logo no início do processo, me lembro que em alguma das reuniões semanais alguém vindo da outra empresa, e que ocupava um cargo de liderança, falou algo totalmente contrário ao nosso jeito de pensar. Não deu outra, uma analista super júnior levantou a mão e o confrontou, defendendo que aqui fazemos diferente. Morri de orgulho.”

Mesmo com esse crescimento acelerado dos últimos anos, Igor acredita que poderia ter sido mais arrojado no planejamento de expansão da empresa no Brasil. Ele conta que nunca teve limitação de budget para expandir, mas que a única condição era que todo o dinheiro investido fosse recuperado dentro de um ano. “Acabei dando passos muito pequenos”, diz.

Ele conta que, no início, quando foi convidado para começar a operação no Brasil, trabalhava sozinho de um coworking (o outro sócio da operação brasileira, Ticiano Rodrigues Vieira, hoje responsável pela área financeira, se juntaria logoƒ). Depois, com as primeiras contratações, mudou para uma sala e, depois, para uma sala maior. Igor diz que seu maior medo era contratar alguém e depois ter que demitir porque tinha calculado mal a demanda: “Demorei para me convencer que a fonte não iria secar e que dava para investir pensando no longo prazo”. Hoje, a empresa ocupa três andares de um prédio em Pinheiros, na capital paulista.

Outro arrependimento, segundo o ex-engenheiro e agora empreendedor, foi ter demorado demais para lançar o segundo produto da SumUp. “A maquininha que usa a conexão do celular é perfeita para o pequeno empreendedor. E digo pequeno mesmo, aquele que trabalha sozinho, para você ter uma ideia a média mensal de transações dos nossos clientes é de 2 mil reais. Mas sabíamos da demanda de um produto que tivesse conexão própria, para quem já está um passinho a frente e contratou um primeiro funcionário”, diz. Igor conta que a tecnologia para isso chegou a ser apresentada para o escritório de Berlim, mas na época eles acharam que não era o caso. “Erramos no timing e em não apostar que funcionaria aqui. Outro player lançou isso antes de nós. É pena, mas faz parte.”

Com 2 mil novos clientes e 100 mil transações realizadas diariamente nos 31 países onde opera, a SumUp ganha em escala. Tanto que está no primeiro lugar no ranking da revista Inc. com as 5 mil empresas de crescimento mais acelerado na Europa. A premiação leva em conta o crescimento da receita das companhias entre 2013 e 2016 — que, no caso da SumUp, foi de mais de 14.368%.

Igor fala o motivo de o Brasil representar, individualmente, o maior mercado para a empresa. Ele diz que o país é muito grande, tem um nível de riqueza razoável, mas tem uma penetração de cartão e maquininha completamente desproporcional. “É muito fora da curva comparado com México, Colômbia ou África do Sul, por exemplo. E a explicação disso está no parcelado. Parcelado sem juros, como temos aqui, é algo que não existe em lugar nenhum do planeta. O parcelado é o principal instrumento de financiamento do varejo brasileiro e o único jeito de parcelar de forma segura é aceitando cartão”, afirma.

UM NEGÓCIO COM CARA DE BRASIL

Essas particularidades fizeram com que, por aqui, a empresa já nascesse de uma forma bastante independente. A tecnologia usada é a mesma da Europa, mas o produto teve que ser totalmente pensado para as necessidades do mercado nacional. “Aqui temos também essa questão do mesmo cartão ser de crédito e débito. Na Europa não existe isso e fui firme desde o começo defendendo que sem isso, e sem o parcelado, não funcionaria no Brasil”, diz .

Diversidade e inclusão, pilares da SumUp, no Encontro de Consultores da startup.

No Encontro de Consultores da SumUp, que aconteceu há algumas semanas, diversidade e inclusão são vividas na prática.

Assim como faz com seu time, Igor acredita que o segredo para atrair e manter clientes está na experiência, que, para ele, tem que ser descomplicada. “Nosso cliente é aquela pessoa que tem um negócio próprio e faz tudo sozinho. Ele não tem tempo para burocracia e precisa do dinheiro rápido”. Por isso, diz, a SumUp criou dois tipos de planos. No Econômico, o cliente recebe em parcelas de 30 dias, é cobrada uma taxa de 3,10% no crédito à vista e 3,9% no parcelado (de duas a doze parcelas). No Acelerado, o recebimento acontece em um dia útil e as taxas são de 4,6% no crédito à vista, mais 1,5% a cada parcela da venda. Em ambos, o débito custa 2,3%.

A novidade é que a partir de agora todos os novos clientes terão direito a taxas de apenas 1%, no crédito ou no débito, nos três primeiros meses.

Pensando em “ajudar ainda mais” quem está começando a empreender, a startup acaba de lançar o portal Dono do Negócio, um site com dicas, informações, guias e planilhas para ajudar pequenos empreendedores a crescer. Lá é possível encontrar informações sobre como se formalizar, dicas de livros, filmes e perfis nas redes sociais que todo empreendedor deve conhecer, dicas para melhorar a produtividade, entre outros conteúdos. “Nossa missão é ajudar o pequeno a crescer, e assim a gente cresce também”, diz o tal, aquele, que não queria empreender.

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: SumUp
  • O que faz: Maquininha para pagamentos móveis
  • Sócio(s): Igor Marchesini, Ticiano Rodrigues Vieira e Fabiano Fialho Camperlingo
  • Funcionários: 380
  • Sede: São Paulo
  • Início das atividades: 2013
  • Investimento inicial: R$ 1,26 milhão
  • Contato: suporte@sumup.com.br
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