Um cursinho pré-vestibular que garante aprovação no ITA ou seu dinheiro de volta. E o professor tem 20 anos

Breno Castro Alves - 7 ago 2015
Gustavo Haddad, 20 anos, 2 diplomas do MIT e um cursinho pré vestibular com modelo agressivo: tudo ou nada.
Breno Castro Alves - 7 ago 2015
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Gustavo Haddad Braga aprende rápido. Aos 20 anos, já conquistou mais de 50 medalhas em Olimpíadas de conhecimento e dois diplomas de graduação no Massachussets Institute of Technology, o MIT, provavelmente a melhor escola de engenharia do mundo. Agora, seu desafio é ensinar. Abriu este ano o cursinho pré-vestibular que leva seu nome, oferecendo uma garantia inédita no país: aprovação no ITA ou seu dinheiro de volta.

O vestibular do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) é o mais difícil do país na área de exatas. Gustavo, que adora um bom desafio intelectual, tem sete alunos e trabalha para que todos sejam aprovados. Divide com eles a responsabilidade pela aprovação, cobrando mensalidade proporcional ao risco: 3 000 reais por mês (o dobro de um cursinho normal, por metade da quantidade de aulas). “Eu realmente sei que o meu método funciona”, escreveu, na página do Facebook no início deste ano. Ele é assim, um homem-empresa-apostador.

DAS OLIMPÍADAS DE MATEMÁTICA PARA O MIT

Sua realidade atual, porém, contrasta com o começo de sua vida escolar. Gustavo cresceu em São José dos Campos e aprendeu a ler só aos 10 anos, no quarto ano do ensino fundamental, numa escola onde o esperado era aprender ainda no primeiro, talvez segundo. Não gostava do ambiente escolar e foi levando as aulas sem muito ânimo até que, do nada, no quinto ano leu a página seguinte do livro de matemática. Descobriu as equações de primeiro grau, a primeira vez em que a matemática lida com “x” e não com números. Conseguiu dar sozinho este passo abstrato, entendeu a matéria e descobriu que a partir dali não precisaria de ninguém para entender o conteúdo dos livros. Terminou sozinho o material do ensino fundamental ainda naquele ano e já no seguinte completou todos os do ensino médio. Tinha doze anos.

Na beca, Gustavo Haddad exibe o diploma do MIT.

Na beca, Gustavo Haddad exibe o diploma do MIT.

E então, as medalhas. Soraya Guedes foi a professora que o incentivou a participar de sua primeira competição de conhecimento, a Olimpíada de Matemática do Vale do Paraíba. Em tese ele não poderia, pois estava no 7º ano e a competição era para 8º e 9º, mas a professora insistiu e a organização consentiu. Saiu com o ouro. Gustavo adorou o desafio. Foi pesquisar e conheceu o circuito nacional de Olimpíadas. Participou de todas, onde ganhou dezenas de medalhas, inclusive ouro na Olimpíada Brasileira de Linguística. Depois, buscou as internacionais, viajou muito jovem para a Croácia, para o Azerbaijão e, entre outros, trouxe para casa a primeira medalha de ouro brasileira na Olimpíada de Física. Dessas competições levou o seguinte aprendizado:

“Olimpíadas te ensinam a pensar. A maioria das questões de vestibular é aplicação direta de fórmula. Quando alguém diz que entendeu, geralmente quer dizer que sabe aplicar a fórmula. Na Olimpíada é o contrário, são problemas que você ainda não possui o ferramental teórico e precisa desenvolver a fórmula que será aplicada. Isso me ensinou a pensar como cientista”

A próxima fase da trajetória de campeão olímpico precoce veio com o ensino superior. Gustavo cursou um semestre de Medicina na USP, um dos vestibulares mais exigentes do país. Ele largou o curso para estudar no MIT. Como gostava muito de Física e já se imaginava fazendo algo na área de Engenharia, escolheu o melhor curso do mundo. Em paralelo, também participou do processo de admissão de outras gigantes do ensino superior nos EUA. Ele diz que nunca se arrependeu de ter preterido outras universidades onde também foi aprovado: Harvard, Yale, Stanford e Princeton.

O MIT fica em Boston, cidade para onde ele se mudou em agosto de 2012, movimento possível graças à bolsa de graduação plena que conseguiu junto ao CNPQ, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, órgão federal que financia pesquisas acadêmicas. Começou o curso em ritmo regular, o primeiro semestre tem limite máximo de crédito, um teto de quatro disciplinas para dar ao aluno tempo de entender o volume de trabalho. No terceiro semestre, Gustavo se matriculou em 11 disciplinas. No quarto, viu que poderia acelerar um pouco para se formar. Se matriculou em 13 e, assim, cumpriu os créditos necessários para os cursos de Engenharia Elétrica e Ciência da Computação (que normalmente levam quatro anos cada) em apenas dois anos.

ALMOÇO NA VÓ E ENGENHARIA NO ITA

Aos vinte anos e com dois diplomas do MIT, era hora de voltar para casa. Gustavo, então, voltou para São José dos Campos. Mora com a mãe e geralmente almoça com a avó Cida, que cozinha absolutamente qualquer coisa. Sua especialidade é a comida árabe, fiel à origem síria da família.

Entrevistado por Jô Soares, Gustavo Haddad contou sobre sua trajetória acadêmica e os prêmios que venceu.

Entrevistado por Jô Soares, Gustavo Haddad contou sobre sua trajetória acadêmica e os prêmios que venceu.

De volta ao país de origem, ele chamou a atenção da mídia, foi a programas de TV, foi entrevistado por Jô Soares e deu palestras para falar de sua experiência. Experimentou trabalhar no mercado financeiro mas não se adaptou, durou um semestre. Com tantas possibilidades, ele concluiu que queria de começar um negócio próprio. O cursinho surgiu como alternativa natural, pois Gustavo gostou da ideia de testar em sala de aula as técnicas que desenvolveu para si. A propósito, a cidade de São José também é a sede do ITA, o que resulta em uma grande demanda por cursinhos pré vestibulares.

Para criar o seu modelo de negócios, ele se inspirou num case que viu no New York Times. O professor garantia que seus alunos alcançariam a nota de corte no SAT, prova que é uma etapa necessária para entrar nas universidades dos EUA, e o curso, que custava 100 mil dólares, sairia de graça se o aluno não alcançasse o objetivo.

Gustavo entendeu que este homem ficou famoso porque assumiu riscos junto com os alunos. Resolveu apostar neste caminho e contou com a notoriedade conseguida pelas tais medalhas e diplomas para fazer sua comunicação. Fez um chamado simples, via Facebook pessoal e por meio da página que criou para o cursinho. Sem qualquer investimento em marketing, conseguiu sete alunos — um número bom para ele testar sua proposta sem correr tanto risco.

ESTUDE MENOS, ESTUDE CERTO

A ideia de seu método é entender os modelos em vez de decorar fórmulas. O edital do ITA é muito extenso, a quantidade de fórmulas exigidas é enorme. Gustavo acredita que decorá-las é um desperdício da energia necessária para aprender. Há também outras dicas: ele dorme dez horas por noite e aconselha que seus alunos façam o mesmo: “Os estudos são unânimes, é no sono que você fixa o que aprendeu no dia”, diz.

Ele acredita que se matar de estudar não ajuda em nada. Propõe três horas em sala de aula e mais duas estudando em casa. “É humanamente impossível estudar direito 14h por dia. O corpo pode até ter sido feito para se movimentar 14h por dia, mas não para sentar e manter o foco em um único assunto por tanto tempo. Faz mal para o organismo”, afirma.

Sua rotina pessoal é a seguinte. Além das três horas dando aula, Gustavo leva pelo menos uma hora e meia para preparar a exposição de cada dia. Ele também estuda outros assuntos por prazer, por cerca de três horas, e encerra essa rotina com uma hora de corrida ou academia, quatro ou cinco vezes por semana.

Após os dois primeiros meses como professor, ele entendeu que precisava ser mais rigoroso com os horários dos alunos porque, afinal, “se uma pessoa se atrasa, um sétimo da turma vai perder a matéria”. Para avaliar o aprendizado do time, ele promove simulados periódicos.

Além de estudar a trabalho e por prazer, ele dorme 10 horas por noite "para o cérebro assimilar o que aprendeu".

Além de estudar a trabalho e por prazer, ele dorme 10 horas por noite “para o cérebro assimilar o que aprendeu”.

Até agora, considera que eles estão indo bem, ou seja, que têm chances reais de conseguir a aprovação no ITA. Ele também está satisfeito com o seu “empreendimento de um homem só” e não vê lacunas graves. Ainda quer desenvolver um site para poder organizar o cursinho, compartilhar materiais e acompanhar remotamente os alunos. Por enquanto, fica disponível para acompanhamento por email ou Whatsapp.

GÊNIOS NÃO EXISTEM. AQUI É TRABALHO

Apesar do assombro que o seu currículo acadêmico provoca, Gustavo não se considera um superdotado nem se enxerga em qualquer outro adjetivo do tipo. “Durante minha vida, mas principalmente nos últimos anos, estive em contato com pessoas muito inteligentes. Todas essas pessoas, a quem muitos chamavam de gênios, tendem a concordar com isso: gênios não existem. Existem pessoas dedicadas, que estudam mais e que estudam da maneira certa”, diz.

Ele acredita que as pessoas geralmente veem a educação, principalmente no âmbito dos cursinhos, como algo de segundo plano, mas discorda dessa visão. Considera esse trabalho como o meio pelo qual pode passar o seu conhecimento adiante. Então, eu o provoco: “Você poderia estar pesquisando novas formas de energia limpa, mas está apenas ajudando algumas pessoas a passar no vestibular”. E Gustavo responde:

“Se você acha que eu, sozinho, poderia estar fazendo tudo isso pelo mundo, imagine o que meus sete alunos, aprovados no ITA, podem fazer?”

A aposta está na mesa. Daqui até o final do ano, ele se prepara para o próximo vestibular com um afinco renovado, diferente. Dessa vez, não é mais sua aprovação que está em jogo, mas a de sete outras pessoas — e, em última análise, do seu agressivo modelo de negócio. Gustavo já provou que sabe aprender sozinho, o vestibular agora testará se o rapaz aprendeu também a ensinar. E, também, o que aprendeu na incipiente trajetória de empreendedor.

DRAFT CARD

  • Projeto: Cursinho Gustavo Haddad Braga
  • O que faz: Preparação para o vestibular do ITA
  • Sócio(s): Gustavo Haddad Braga
  • Funcionários: 1 (apenas Gustavo)
  • Sede: São José dos Campos (SP)
  • Início das atividades: 2015
  • Investimento inicial: R$ 100
  • Faturamento: R$ 210.000 (estimado para 2015)
  • Contato: braga@alum.mit.edu
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