Verbete Draft: o que é Cultura do Algoritmo

Isabela Mena - 3 ago 2016Winona Ryder é uma das estrelas de Stranger Things, série da Netflix cujo sucesso vem sendo atribuído à Cultura do Algoritmo (imagem: reprodução).
Winona Ryder é uma das estrelas de Stranger Things, série da Netflix cujo sucesso vem sendo atribuído à Cultura do Algoritmo (imagem: reprodução).
Isabela Mena - 3 ago 2016
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Continuamos a série que explica as principais palavras do vocabulário dos empreendedores da nova economia. São termos e expressões que você precisa saber: seja para conhecer as novas ferramentas que vão impulsionar seus negócios ou para te ajudar a falar a mesma língua de mentores e investidores. O verbete de hoje é…

CULTURA DO ALGORITMO

O que acham que é: Alguma coisa que o Mark Zuckerberg comprou.

O que realmente é: A Cultura do Algoritmo (ou Algorithmic Culture) é aquela através da qual computadores, operando a partir de fórmulas matemáticas, se envolvem no que, muitas vezes, é considerado trabalho tradicional da cultura: escolhas, busca, classificação e hierarquização de pessoas, lugares, objetos e ideias. Robson Carlos da Motta, líder do time de Data Science da Chaordic, empresa de tecnologia e inovação diz que a Cultura do Algoritmo é a forma como o comportamento humano está sendo impactado e influenciado a cada linha de código que busca resolver um problema de forma melhor ou mais eficiente: “É uma mudança social que vem ocorrendo há décadas, mas que começou a ganhar mais força após a popularização da internet. A partir do momento em que as pessoas estão conectadas, o impacto dos algoritmos em rede é muito veloz e a cultura passa a ser disseminada fortemente, transformando a sociedade com soluções que trazem maior bem estar aos indivíduos”.

Ted Striphas, professor de História da Cultura e da Tecnologia na Universidade do Colorado, está escrevendo um livro sobre Cultura do Algoritmo (é autor de The Late Age of Print: Everyday Book Culture from Consumerism to Control) e é referência mundial sobre o tema. Ele diz que estamos experimentando uma mudança no que diz respeito ao significado de tecnologia e cultura, e que ambas parecem estar se fundindo em um significado interessante, que remete ao passado. “O Google usa eletricidade, silício e plástico somados a um exército de engenheiros humanos para classificar a importância de pessoas, lugares, objetos e ideias. Embora os meios e os fins sejam diferentes, é semelhante ao que, já em 1869, o crítico literário inglês Matthew Arnold disse ser o propósito da cultura: determinar ‘o melhor do que foi pensado e dito’”, afirma.

Striphas cita o Facebook (que determina o que aparece no feed de notícias de cada usuário), sites de compras, de vídeo e streaming de músicas (que oferecem produtos com base no que foi buscado ou já consumido). Segundo ele, é importante notar a maneira pela qual a cultura algorítmica alimenta de volta o usuário para produzir nele novos hábitos de pensamento, conduta e expressão que, provavelmente, não existiriam sem ela.

Há pouco mais de um mês, o Facebook anunciou que seu algoritmo passaria a priorizar feeds pessoais nas páginas de seus usuários em relação a conteúdos de páginas institucionais (ou comerciais, de marcas). Vale lembrar que foram justamente as mudanças de algoritmo do Facebook que de certa forma popularizaram o entendimento da Cultura do Algoritmo, há alguns anos, quando uma mudança diminuiu o alcance de páginas institucionais, fazendo os profissionais de Social Media procurarem novos meios de promovê-las (essencialmente, pagando ao próprio Facebook para ter a visibilidade que um dia foi orgânica).

Quem inventou: Segundo Ricardo Murer, professor de Pós-Graduação e MBA em Marketing Digital e Social Media da ESPM-SP, a palavra algoritmo é a tradução, em latim, do sobrenome de Muhammad ibn Musa Al-Khwarizmi, matemático e astrônomo persa que viveu no início do século IX e autor de tratados de álgebra, aritmética e astronomia. “Al-Khwarizmi desenvolveu uma fórmula para resolver sistematicamente um tipo de equação (chamada quadrática) e, na Idade Média, com mais estudiosos disseminando seus tratados, seu nome passou a ser usado para descrever todo e qualquer método sistemático ou automático de calcular”, diz.

Quando foi inventado: A relação dos algoritmos com a ciência da computação tem início com Ada Lovelace (1815-1852). “Ela criou uma sequência de passos para a realização de um cálculo matemático que é reconhecida como o primeiro programa de computador”, diz Murer. O professor da ESPM diz ainda que o trabalho de Alan Turing (1912 – 1954) é o que mais formalmente vinculou algoritmos à ciência da computação. “A ‘Máquina de Turing’ pode ser entendida como um modelo matemático capaz de simular um computador, fornecendo uma construção teórica para estudar e definir algoritmos.”

Para que serve: Objetivamente, para entender o comportamento do consumidor e, assim, saber (ou influenciar) quais são seus hábitos de consumo, aumentando a capacidade de empresas (geralmente digitais) de aumentar seus lucros. Um exemplo é a Netflix que, ao longo dos anos, produz conteúdos (basicamente séries) cada vez mais alinhados aos interesses de seus consumidores, gerando engajamento em todos os níveis. Uma reportagem da Folha de S.Paulo, publicada esta semana, fala sobre isso em relação à série recém-lançada Stranger Things.

Murer diz que nas empresas da nova economia, cujos negócios estão fortemente fundamentados em softwares e serviços digitais, seus programadores devem utilizar de algoritmos como ponto de partida para elaboração de qualquer programa ou aplicativo. “A Cultura do Algoritmo irá ajudar a definir um código de qualidade mais eficiente, além de determinar estruturas de dados e outros relacionamentos que estão ‘ao redor’ do código de programação. A concepção de um algoritmo exige análise, criatividade e uma dose de lógica.”

Quem usa: Google, Facebook, Netflix, assim como sites de compras (como Amazon), de vídeo e streaming de músicas (Spotify). Também Twitter e Instagram aderiram. Murer cita especificamente algoritmos do Google, como o PageRank e o EdgeRank, do Facebook. “Mas a lista é bem extensa. Motoristas do Uber, por exemplo, respondem a um algoritmo que define suas próximas corridas de acordo com avaliações, preços, distância do destino, performance etc”, diz.

Segundo Motta, usam a Cultura do Algoritmo também cursos online, como o Coursera e o Udacity; as Fintechs, e ainda bancos digitais como Nubank, Original e Neon. “Até nossa saúde já é influenciada pelos algoritmos, com aplicativos que nos ajudam a praticar esportes de forma mais saudável e empresas que facilitam o acesso a médicos. Há até algoritmos que fazem o próprio diagnóstico médico, como Scanaduu e Theranos”, afirma.

Efeitos colaterais: Uso impróprio (por empresas e governos) e disseminação de informações pessoais dos usuários, o que pode levar à perda de sua privacidade; ataques digitais, que aproveitam da alta conectividade dos quais os algoritmos se tornam dependentes e levam a um outro efeito colateral, que é a necessidade de investimentos bilionários em segurança digital. Outro efeito negativo, apontado neste artigo do El País, é a homogeneização da identidade.

De acordo com Motta, algoritmos mal construídos podem impactar negativamente milhões de usuários em função de recomendações de produtos e serviços que os influenciem a um consumismo desenfreado e inconsciente. Já algoritmos de empresas de saúde podem prover informações equivocadas sobre um diagnóstico médico.

Murer diz que está ocorrendo a disseminação dos chamados “algoritmos tendenciosos” que refletem posições racistas ou sexistas da sociedade. “Esses algoritmos já foram identificados em diferentes softwares presentes em câmeras fotográficas e programas predictivos da polícia Nova York, Los Angeles, Chicago e Miami e sociedade começa a se mobilizar contra isso.” Em março deste ano, a Microsoft criou no Twitter o perfil de uma robô adolescente, chamada “Tay”, com comportamento guiado apenas por algoritmos. Foi um desastre: em um dia de vida, ela se tornou uma menina ultrassexualizada e adoradora de Hitler — e foi deletada.

Quem é contra: “Talvez o mais recente exemplo sejam os taxistas contra a circulação dos carros do Uber por ter um algoritmo que democratiza o transporte particular e mudou a forma de locomoção. E, na mesma questão, o governo, ao demorar para à posicionar e atualizar suas leis, agindo de forma contrária à evolução do sistema”, diz Motta. Ele diz que alguns usuários (de tecnologia) também são contra, por receberem repetidamente a mesma publicidade enquanto navegam na internet ou quando recebem e-mails de sites nunca visitados. “A regulamentação do Marco Civil da Internet implicará em muita mudança de algoritmo ao atribuir direitos e deveres a usuários, empresas e governos”, conta.

Para saber mais:
1) Leia, no TechCrunch, o texto Algorithmic feeds force us to compete que conta como Instagram e o Twitter estão também mudando seus algoritmos e fazendo com que profissionais de marketing e de mídias sociais, de um lado, e público em geral, de outro, precisem de novas estratégias de alcance de conteúdo.
2) Leia, no The Next Web, Facebook’s new algorithm sucks — here’s how to beat it and see whatever you want, texto com duas dicas para neutralizar (não com total eficiência) no novo algoritmo.
3) Assista ao vídeo Facebook’s Algorithm is Like the Mafia, do College Humor. Uma sátira bem engraçada sobre o poder “maligno” do algoritmo — na história, representado por dois caras vestido de mafiosos.

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