Verbete Draft: o que é Non-fungible token (NFT)

Dani Rosolen - 14 abr 2021
A colagem digital "Everydays — The First 5000 Days", de Beeple, vendida por mais de 69 milhões de dólares em um leilão da Christie's.
Dani Rosolen - 14 abr 2021
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Continuamos a série que explica as principais palavras do vocabulário dos empreendedores da nova economia. São termos e expressões que você precisa saber: seja para conhecer as novas ferramentas que vão impulsionar seus negócios ou para te ajudar a falar a mesma língua de mentores e investidores. O verbete de hoje é…

NON-FUNGIBLE TOKEN (NFT)

O que é: Non-fungible token (NFT), ou token não-fungível, em português, é um tipo de certificado de autenticidade que atesta que uma pessoa é proprietária de um ativo digital (uma obra de arte, um vídeo, um gif ou até um par de tênis virtual).

“Tokens” são criptoativos que representam, de forma digital, produtos e serviços do mundo físico (ou do digital). “Fungível” designa um bem que pode ser intercambiável, trocado por outro idêntico ou do mesmo valor. Uma nota de dez reais pode ser trocada por outra igual ou por duas de cinco. Logo, não-fungível significa algo que não pode ser fracionado ou trocado — justamente por ser único.

Como funciona: O ativo digital (por exemplo, uma foto) se torna um NFT ao ser registrado pela tecnologia blockchain, ganhando uma sequência única de dígitos. Diz-se que o ativo passou a ser tokenizado. Assim, qualquer pessoa pode verificar sua autenticidade e propriedade, tornando a falsificação desse ativo praticamente impossível.

Quanto mais popular for um ativo, mais valorizado ele será. Pense na Mona Lisa: você pode até imprimir uma cópia e colar na sua parede, mas essa impressão terá no máximo um valor afetivo, pois a tela original segue sendo única. O NFT permite autenticar uma obra digital, tornando-a única, mesmo que haja milhões de cópias digitais espalhadas pela web. 

Segundo o CB Insights — que cita como fonte o site NonFungible –, até o fim de março de 2021 o valor gerado pelas vendas de NFTs soma 500 milhões de dólares (leia no item “Para saber mais”, ao fim deste texto).

Para que serve: Para vender qualquer item digital passível de verificação. Ao comprar um NFT, a pessoa adquire o registro de propriedade de um ativo que ninguém mais pode reivindicar — mesmo que seja uma propriedade simbólica. 

Especialista em criptomoedas (foi um dos fundadores da corretora BitcoinTrade, à qual não está mais ligado), Daniel Coquieri explica que hoje os NFTs são usados sobretudo no segmento de colecionáveis.

“Um grande case é o NBA Top Shot, uma plataforma que tokeniza fotos e vídeos das jogadas no NFT. Ao adquirir esses registros, o comprador passa a ser dono daquele momento”

Os cards digitais da NBA Top Shots já somam 297 milhões de dólares em vendas. Parece loucura comprar cenas de um jogo, ou adquirir versões originais de memes e gifs? Para colecionadores, o que conta são a conexão emocional e a sensação de exclusividade atrelada à escassez daquele patrimônio.

“Tem gente que coleciona de tudo”, diz Daniel. “Para mim, pode não fazer diferença ser dono de uma imagem exclusiva da NBA. Mas para quem tem interesse por aquele assunto, pode valer muito”.

Quando surgiu: Os NFTs existem desde meados de 2010, mas começaram a chamar a atenção em 2017, com a popularidade dos CryptoPunks, do estúdio de games Larva Labs. Trata-se de um jogo de colecionáveis com 10 mil avatares criados por meio de algoritmos. Há avatares com formas humanas, de aliens, primatas e zumbis. E nenhum é igual a outro. Graças aos NFTs, um deles, o CryptoPunk 7804, foi vendido por 7,5 milhões de dólares.

No mesmo ano, a Dapper Labs lançou o CryptoKitties, um game em que os jogadores podem coletar, criar e vender figurinhas digitais de gatos. Também foram criados 10 mil avatares; um deles, o Dragon, foi vendido por cerca de 1 milhão de dólares. 

“Dá para perceber como essa tecnologia ainda se encontra num momento de hype”, diz Daniel. “Há quatro anos, o uso que se dava para os NFTs era colecionar esses gatinhos. Hoje, a aplicação continua praticamente a mesma.”

NFTs no mercado de arte: O uso pioneiro dos NFTs no mundo da arte ocorreu em 2014, em Nova York, num hackathon reunindo artistas e programadores. Em um artigo no The Atlantic, Anil Dash, CEO da Glitch, conta como ele e o artista digital Kevin McCoy criaram uma “versão inicial de uma mídia suportada por blockchain para reivindicar a propriedade de uma obra digital original” (leia no item “Para saber mais”).

OS NFTs têm sido utilizados para obras de artes digitais com o objetivo de proteger direitos autorais online. Por meio dos tokens não-fungíveis e de contratos inteligentes, os artistas conseguem incluir sua identidade na criação. Segundo Daniel:

“Além de obter o certificado de autenticidade e propriedade da obra de arte digital, em alguns casos, com o NFT, o comprador garante o direito de imprimir aquele quadro e acessar informações e serviços relacionados a ele”

Os tokens não-fungíveis permitem ainda monetizar as obras de arte digitais, que até pouco tempo atrás não tinham valor em leilões — e hoje superam milhões de dólares graças aos NFTs. O artista pode vender sua obra como um original único e determinar a quantidade de réplicas existentes, aumentando o interesse de colecionadores.

Os NFTs são vistos como uma forma de artistas retomarem o controle financeiro sobre o que produzem. Uma banda, por exemplo, pode vender seu trabalho atrelando material inédito ou limitado a NFTs, recebendo os royalties sem intermédio de distribuidoras, empresários, gravadoras, revendedores de ingressos etc. 

Oportunidades para empresas: Além de evitar a pirataria em obras de arte, a lógica dos NFTs pode ser usada em outros ramos. Segundo Daniel: 

“Vamos pensar em uma pessoa que tem um carro da Ferrari e quer ter acesso a um manual digital. Como ela garante que aquele arquivo é um documento autêntico da Ferrari? Por meio de um NFT atrelado àquele PDF”

Não se trata só do mercado de luxo. Para empresas, NFTs seriam uma forma de tangibilizar experimentos das marcas no mundo virtual, explorando a conexão emocional dos consumidores ou a nostalgia.

A marca de batatas chips Pringles, por exemplo, lançou um “sabor virtual” em NFT com apenas 50 versões disponíveis e preço a partir de 0,0013 ether (cerca de 2 dólares). O CryptoCrisp é representado por uma obra de arte do artista. 

Transações com NFTs: A venda envolvendo NFTs que causou maior alvoroço foi a do artista americano Beeple (pseudônimo do designer gráfico Mike Winkelmann). Em março de 2021, ele vendeu a obra “Everydays — The First 5000 Days”, um arquivo JPEG, com a colagem de cinco mil imagens coletadas desde 2007, por 69,3 milhões de dólares. 

A transação foi intermediada pela casa de leilões Christie’s. Sua concorrente, a Sotheby’s, também já aderiu aos leilões de obras com NFTs.

A cantora canadense Grimes faturou cerca de 6 milhões de dólares em um evento com um conjunto de obras de artes digitais criadas por ela e registradas como tokens não-fungíveis.

A Kings of Leon tornou-se a primeira banda a registrar um álbum em NFT. Disponível em plataformas de streaming, When You See Yourself ganhou versões únicas tokenizadas que oferecem artes exclusivas e entradas vitalícias em shows do grupo. 

Num leilão em fevereiro de 2021, pares de tênis virtuais projetados pelo RTFKT Studios em parceria com a criptoartista Fewo arrecadaram mais de 3 milhões de dólares — em apenas 7 minutos. Foram vendidos 600 pares; os compradores ganharam um exemplar físico como “brinde”. A versão digital poderá ser usada em plataformas como o Snapchat ou em jogos.

CEO do Twitter, Jack Dorsey vendeu o NFT de seu primeiro tuíte por 2,9 milhões dólares. O valor arrecadado foi doado ao fundo Africa Response, para ajudar no combate à pandemia.

O NFT de um meme de um gatinho, o Nyan Cat, criado pelo americano Chris Torres, foi adquirido por quase 600 mil dólares. Com a disparada da comercialização dos memes, Chris criou o “Memeconomy”, um evento de leilão de memes.

Até jornalistas estão aproveitando a onda. Em março de 2021, Kevin Roose, colunista do New York Times, vendeu, em NFTs, um artigo seu (sobre NFTs!) por 563 mil dólares. Segundo o jornal, o valor arrecadado será destinado a organizações beneficentes.

No Brasil: Segundo o Cryptoart.io, o artista plástico brasileiro Etiene Crauss, de 20 anos, já faturou quase 376 mil dólares com a venda de 15 obras. Texto na Cointelegraph (leia no item “Para saber mais”) lista Nino Arteiro, Vamoss, Tony de Marco, Alexandre Rangel, Monica Rizzolli, Uno de Oliveira, Marlus, Lukas Azevedo como “alguns dos nomes nacionais que estão aliando tokenização, arte, criptomoedas e blockchain”.

O roqueiro Supla foi o primeiro cantor a embarcar nos tokens não-fungíveis. Ele colocou à venda um vídeo do TikTok por cerca de 10 800 reais. 

Onde comprar e vender: Colecionadores e investidores interessados dispõem de algumas plataformas para comprar e vender ativos atrelados a NFTs, como MakersPlace, OpenSea, Rarible, SuperRare e The Dematerialised

Hoje há pelo menos menos duas plataformas brasileiras dedicadas a vendas de músicas por tokens não-fungíveis: o All Be Tuned e o Phonogram.me.

Desvantagens: A principal é a enorme quantidade de energia elétrica despendida nas transações com blockchain. Descentralizada, essa tecnologia requer que um grande número de computadores ceda seu poder de processamento para os protocolos e cálculos na criação de um NFT e na verificação de transações de uma carteira digital para outra.

Segundo o Gizmodo, os NFTs vendidos por Grimes consumiram 122,416 kilowatts-hora de eletricidade — o que daria para abastecer uma casa de família em um país desenvolvido durante 34 anos. O cálculo foi feito pela Cryptoart.wtf, calculadora online recentemente descontinuada por seu fundador) que estimava o impacto ambiental de artes criptografadas. 

Enquanto alguns especialistas apontam o risco de uma bolha no mercado, outros afirmam que, assim como as criptomoedas continuam a gerar interesse e lucro, o mesmo deve ocorrer com os tokens não-fungíveis.

Com o tempo, diz Daniel, essa tecnologia tende a amadurecer e gerar mais valor prático, deixando de lado o hype da venda de memes. Um uso poderia ser para autenticação de documentos. Quanto à vendas de obra de arte digital, ele alerta: 

“É preciso tomar cuidado porque existem NFTs anunciados no mercado que são fraudes. Um artista combina com players de inflar sua obra para que o assunto saia na mídia e atraia compradores e depois promete devolver o dinheiro aos envolvidos nessa especulação.”

Para saber mais:

1) Leia no The Verge: “NTFs, explained”;
2) Confira no Money Times: “Tokens Não Fungíveis (NFTs) são apenas uma febre ou realmente valem milhões?”;
3) Leia na Time: “Digital NFT Art Is Booming—But at What Cost?”;
4) Confira na Cointelegraph: “Artistas brasileiros bombam com venda de NFTs e arte tokenizada”;
5) Leia no New York Times: “What Are NFTs, Anyway? One Just Sold for $69 Million”;
6) Leia no Gizmodo: “How to Fix Crypto Art NFTs’ Carbon Pollution Problem”;
7) Confira no The Atlantic: “NFTs Weren’t Supposed to End Like This”;
8) Acesse o texto da CB Insights: “NFT: Is The Spotlight-Stealing Blockchain A Cash Grab Or The Next Big Thing?”

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