Faz sentido jogar no lixo um produto bom para o consumo? A Gooxxy conecta a indústria e o varejo para evitar o desperdício

Maisa Infante - 22 fev 2021
Vinicius Alves, fundador da Gooxxy.
Maisa Infante - 22 fev 2021
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Em março de 2020, quando a pandemia chegou ao Brasil, boa parte do comércio fechou e a Mondelez (dona de marcas como Bis, Sonho de Valsa e Diamante Negro) percebeu que corria o risco de ver seu estoque de ovos de Páscoa encalhar no varejo das grandes capitais.

A saída? Escoar as mercadorias em redes varejistas do interior do país com apoio de uma startup, a Gooxxy — na época ainda carregando o nome antigo, Xprajá.

A Gooxxy é uma plataforma criada para reposicionar produtos próximos ao vencimento, ou que não venderam bem (e por isso serão descontinuados), ou, ainda, que não passam pelo crivo de qualidade da própria indústria — pense, por exemplo, em um biscoito fora do formato padrão, um rótulo com problema de impressão, uma embalagem com defeito.

Segundo Vinicius Alves, CEO da Gooxxy, cerca de 3% do faturamento anual de toda a indústria brasileira vai para o descarte de produtos nas condições acima. 

Vinicius viu aí uma oportunidade. Para evitar o desperdício, a plataforma da startup conecta grandes fabricantes de alimentos e bens de consumo em geral — como Femsa, Nestlé, Arcor, Unilever — a cerca de 600 varejistas pelo país, permitindo recolocar esses produtos que iriam para o lixo em novos mercados.

Assim, cria-se uma lógica de ganha-ganha-ganha. A indústria não precisa arcar com os custos (financeiros e ambientais) de descartar os produtos. As redes varejistas lucram comercializando essas mercadorias ainda próprias para consumo. E o consumidor final acessa produtos de qualidade por um preço menor.

ELE AJUDOU A EVITAR QUE 30 TONELADAS DE SALSICHA FOSSEM PARA O LIXO

A ideia do negócio surgiu em 2016. Conversando com um executivo do varejo, Vinicius soube que a rede iria descartar 30 toneladas de salsicha que estavam próximas da data de validade. 

Ele resolveu ajudar e fez o meio de campo entre a empresa e uma produtora de eventos do Nordeste, para que as salsichas (ainda boas para consumo) pudessem ser servidas em uma festa na região.

“Comecei a pesquisar mercado e vi que tinha uma necessidade de se construir uma solução para diminuir esse impacto, porque não faz sentido pessoas passarem fome e a gente jogar alimento no lixo”

Hoje, diz o empreendedor, a ONU estima que o desperdício de alimentos no Brasil chegue a 100 bilhões de reais por ano, da produção à chegada em nossas casas. 

“Atuamos na produção e comercialização, que corresponde a 50% desse número”, diz Vinicius, que investiu 1 milhão de reais de recursos próprios para tirar a ideia do papel.

OS CLIENTES SÃO REDES VAREJISTAS ESPALHADAS PELO INTERIOR DO PAÍS

A startup recebe dos fabricantes informações sobre o estoque de produtos fora de padrão ou próximos ao vencimento, e consolida esses dados, em sua plataforma digital, para os clientes — redes varejistas menores ou distribuidores capazes de dar vazão a essas mercadorias com vantagens econômicas.

A partir daí, toda a transação — incluindo emissão de notas, pagamento e entrega — é feita diretamente entre a indústria e os varejistas. A monetização da Gooxxy vem de um percentual fixo sobre cada nota fiscal emitida por serviço, pago pela varejista.

“No início eu fui chamado de maluco por cobrar de quem compra [o produto]. Mas é assim que consigo motivar a indústria a me passar muito mais estoque e melhorar a condição comercial”

O ticket médio é de 50 mil reais. Os clientes são redes do varejo de pequeno e médio porte, com faturamento entre 10 milhões e 2 bilhões de reais por ano, espalhadas pelo interior do Brasil. Assim, evita-se a canibalização do mercado — já que a indústria miraria principalmente o público concentrado nas capitais e grandes cidades.

OS PRODUTOS NA PLATAFORMA TÊM PELO MENOS 60 DIAS DE VALIDADE

Além do custo ambiental, o descarte de produtos gera um ônus financeiro para a indústria. 

Há casos, diz Vinicius, em que as empresas, diante do dilema de descartar um produto ou ampliar sua fabricação (apostando em condições de mercado mais agressivas), escolhem a segunda opção, escoando a mercadoria com apoio da startup. Ele dá um exemplo:

Uma indústria compra um milhão de frascos para sabonete líquido, produz 200 mil e vê que o mercado não aceitou. Ela prefere produzir o sabonete, embalar nos 800 mil frascos que sobraram e dar vazão àquilo pela Gooxxy do que jogar fora o frasco porque acaba sendo financeiramente mais vantajoso

Aquele momento às vésperas da Páscoa, no começo da pandemia, diz Vinicius, acabou sendo um divisor de águas. No ano passado, o negócio cresceu. “Pretendíamos recolocar 130 milhões de reais em 2020, em valor de mercado, e estouramos mais de 200 milhões.”

Assim, a startup evitou o descarte desnecessário de 95 mil toneladas de alimentos e bens de consumo que iriam para o lixo. Vinícius garante que tudo que é comercializado está apto para o consumo.

“A qualidade é uma preocupação natural da indústria. Independentemente da Gooxxy, se houver alguma chance de um produto não estar em altíssima qualidade, ele nem sai da fábrica.”

No caso de produtos próximos ao vencimento, é praxe no mercado que as lojas possam devolver produtos que estejam a 100 dias do prazo de validade. 

Em geral, essas mercadorias chegam para a Gooxxy com um prazo de 60 a 80 dias do vencimento — um período bem “comercializável”. E, claro, quanto mais próxima está a data de vencimento, mais agressivo é o preço, justamente para estimular a venda.

O EMPREENDEDOR DIZ QUE O MERCADO DOS EUA SERÁ O MAIOR DA STARTUP

A ex-Xprajá adotou o nome atual em 2021.

“Tivemos que mudar o nome para reconhecimento global”, diz Vinícius. “O Scale-Up Alimentos e Bebidas, mentoria do programa de aceleração da Endeavor da qual participei em 2020, já havia me falado desta necessidade.”

A internacionalização foi um “pedido” da Unilever e da Mondelez, que acharam interessante levar o modelo a outros países. Uma empresa contratada mapeou o mercado na Colômbia e nos Estados Unidos e não encontrou concorrentes. 

A ideia é, a partir de março, recrutar colaboradores para operar em Boston e Medellín. Vinicius crê que em um ano a operação nos EUA será a maior do negócio. 

“O consumo lá é maior do que aqui. E onde se produz mais, se desperdiça mais. O nosso estudo apontou que, a médio prazo, o mercado norte-americanos será 80% do negócio devido à demanda

Em paralelo, a Gooxxy iniciou, com duas redes varejistas no Brasil, o piloto de uma solução para redistribuir produtos encalhados — evitando-se a queima de estoque, que reduz a margem de lucro. Há também no radar a perspectiva de bolar outra solução para reposicionamento de insumos adquiridos e não utilizados pela indústria.

“Já estamos mapeando o mercado para isso. Mas gostamos de trabalhar focado e o foco agora é a internacionalização”. 

 

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: Gooxxy
  • O que faz: Recoloca no mercado produtos que seria descartados pela indústria
  • Sócio(s): Vinicius Alves
  • Funcionários: 35
  • Sede: São Paulo
  • Início das atividades: 2017
  • Investimento inicial: R$ 1 milhão
  • Faturamento: NI
  • Contato: [email protected]
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