A ideia é fazer o mínimo com o máximo de criatividade. Conheça a Editora Mínimas

Isabela Mena - 23 mar 2015Maria e Ivan, os fundadores de Mínimas (foto: Giselle Galvão)
Maria e Ivan, os fundadores de Mínimas (foto: Giselle Galvão).
Isabela Mena - 23 mar 2015
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O bigode de Paulo Leminski passeia por dezenas de pessoas ao som do poema Contranarciso na voz de Arnaldo Antunes. Veem-se referências, transpostas para cenas do cotidiano, da obra do escritor curitibano. A ocasião é o lançamento de Toda Poesia, livro que reúne mais de 600 de seus poemas. Não é um comercial, não é um teaser de filme (embora às vezes pareça), não é um resumo do livro. O nome destes pequenos pedaços de obra de arte é booktrailer, um formato de vídeo na internet que, nas mãos do designer Iván Larraguibel, 44, e da jornalista Maria Lutterbach, 32, da editora Mínimas, passou a ter um novo sentido. Maria fala do que considera essencial no seu trabalho:

“Investimos em um estilo narrativo para booktrailers que ainda não vinha sendo explorado no Brasil. Encaramos cada peça como um curta que traduz a atmosfera do livro em imagens e sonoridades. Mas sem entregar a história”

Segundo a jornalista, o que vinha sendo chamado de booktrailer eram muitas vezes vídeos em que o próprio autor lia um trecho da obra a ser lançada. Feitos na maioria das vezes pela editora da publicação, não se prendiam tanto a um roteiro, narrativa ou intervenções externas – aqui, outra inovação da Mínimas: a participação de artistas reconhecidos, fazendo uma intersecção de áreas. Por exemplo, em um outro lançamento de Paulo Leminski (Vida), é Gregorio Duvivier quem vemos na tela. Há também booktrailers narrados pelo ator Paulo César Pereio (livro de Joca Terron) e pelos músicos Karina Buhr (Paulo Mendes Campos) e Rodrigo Amarante (Vinicius de Moraes), entre outros.

Cena do booktrailer de Toda Poesia, feito pela Mínimas.

Cena do booktrailer de Toda Poesia, livro de Leminski, no qual o bigode do escritor sempre esteve em cena.

A ideia para o formato dos booktrailers da Mínimas não veio de fora, embora tudo tenha se iniciado em Barcelona – a começar da própria editora, criada por Iván em 2006. Voltada apenas para a produção publicações de pequenas tiragens (outra de suas vertentes, que continua firme), a Mínimas talvez até fosse fechar as portas quando Maria entrou na história, em 2012. Ela estava finalizando um mestrado de edição de livros na UAB (Universitat Autònoma de Barcelona) e, por sugestão de seu coordenador, foi conversar com Iván – seu projeto final, a criação de uma editora artesanal, e a produção do livro Bonecas (de Duda Fonseca e Ana Vilar), dialogava com o trabalho dele, ex-aluno do mesmo mestrado.

Deste encontro surgiram grandes conexões e mudanças: Iván e Maria hoje são casados; trouxeram a Mínimas em sociedade para São Paulo em 2012 e um vídeo promocional para o Bonecas deu origem, quase sem querer, aos tais booktrailers – comercialmente, o ponto forte da editora hoje. Tendo entre seus clientes a Companhia das Letras e a editora Rocco, eles faturaram 120 mil reais em 2013 e 103 mil no ano passado.

Os números parecem grandes, mas muito do que é ganho é reinvestido na produção de novos materiais. Fora isso, eles contam que levou um tempo para convencer as editoras de livros, que geralmente têm uma postura de mercado mais conservadora, de que o booktrailer é uma ferramenta eficaz de venda. “A gente acredita que, com o tempo, nosso trabalho vá ser mais valorizado financeiramente porque ainda está rolando um processo de mensuração desses ganhos da publicidade on-line”, afirma Maria.

Uma dica de que eles estão no caminho certo foi a equiparação, em um dado momento, do número de visualizações do vídeo de Toda Poesia, do Leminski, com o número de unidades vendidas do livro. Ficaram exatamente iguais: 50 mil.

NO CHILE, PERO NO MUCHO

Para este ano, Iván e Maria se propuseram um novo desafio: levar a Mínimas para o Chile (eles acabam de se mudar para Santiago) sem, contudo, abrir mão da cidadania (e clientela) brasileira. Maria diz que a editora é um estúdio de criação portátil. “Temos livros e vídeos realizados em inglês, português e espanhol e isso expressa a mobilidade que queremos viver, tanto como pessoas e criadores, quanto como empreendedores”, diz ela.

A escolha do país não foi aleatória: Iván é chileno, embora seja a primeira vez que mora em seu próprio país. Seus pais deixaram o Chile na década de 70, por causa da ditadura de Pinochet, e ele morou grande parte da vida na Venezuela e passou pelo menos 10 anos na Espanha. Mas, desde a abertura democrática, passou a fazer visitas periódicas à terra natal (há familiares morando lá) e tem como cliente, já há alguns anos, a Ekaré Sur, editora infantojuvenil chilena.

Do seu lado, foi a Ekaré quem segurou as pontas no primeiro ano da Mínimas no Brasil, já que Iván prestava serviços de designer para a editora. Já Maria ainda trabalhava como jornalista, editando um site. Durante cerca de dez meses, a Mínimas foi levada como projeto paralelo do casal. “Chegou um momento em que tínhamos umas cinco encomendas de booktrailers para os meses seguintes e eu falei, ah, vamos assumir isso e arriscar”, conta Maria. Ela pediu demissão e a Ekaré passou a ser um cliente conjunto, da Mínimas.

Laerte e Rita Lee no booktrailer da Mínimas para o lançamento de Storynhas.

Laerte e Rita Lee em cena do booktrailer da Mínimas para o lançamento de Storynhas.

Como eles nunca fizeram um business plan nem algo do tipo, durante a entrevista os dois precisam fazer uma pequena retrospectiva para determinar o ponto de partida do negócio: pensam e escolhem o momento em que Maria chegou ao Brasil (ela veio alguns meses antes de Iván), em junho de 2012, quando começou a fazer um levantamento de gráficas para lançar o Bonecas. Os gastos com a impressão do livro, com o booktrailer (na época ainda chamado de vídeo de divulgação) e com as viagens de São Paulo, onde moravam, para Belo Horizonte (cidade natal da jornalista, dos autores do livro e local do lançamento), somaram 15 mil reais e são considerados o investimento inicial da nova fase da Mínimas.

A repercussão do vídeo de Bonecas trouxe a certeza de que o formato funcionava também como um produto editorial. Eles bateram na porta do marketing da Companhia das Letras e saíram de lá com seu primeiro job, o booktrailer de Toda Poesia. Uma característica comum a esses dois trabalhos – o uso de objetos feitos manualmente (máscaras, no primeiro, e bigode, no segundo) – acabou definindo mais uma particularidade dos filmes da Mínimas, como Maria aponta:

“Nossa produção quase sempre combina processos artesanais a digitais. Seja nos livros ou nos vídeos, ali vai ter algo feito a mão e isso acabou virando uma marca nossa”

Ainda assim, eles explicam que o formato é aberto e que cada trabalho é uma experimentação. O booktrailer que fizeram para o livro Storynhas, parceria de Rita Lee e Laerte, foge de qualquer enquadramento anterior. Tem mais de três minutos (contra o 1,5 minuto de média dos demais) e apenas mostra as duas, sentadas em uma poltrona, dialogando sobre o livro. O que, no caso (delas), é mais do que o suficiente.

Iván acredita ser um ótimo momento para trabalhar com booktrailer. “Acho interessante ninguém ainda saber como é e podermos, por isso, explorar um monte de narrativas, planos, tipos de acabamento”, diz ele.

Os booktrailers não são o primeiro trabalho de Iván com vídeo. Em Barcelona, ele fez uma trilogia de curtas, chamada Inside Car, sobre pequenos dramas passados dentro de carros. O último filme está em fase final de produção e será lançado em Santiago, São Paulo e Barcelona, nesta ordem. Por isso, na Mínimas, ele costuma fazer a direção e a filmagem dos vídeos enquanto Maria se ocupa da produção e do roteiro (ela chegou a fazer um curso antes mesmo de trabalhar com jornalismo). Mas não são papéis fixos, já que no booktrailer de um livro de Clarice Lispector (As Palavras), ela assina direção e roteiro.

No catálogo de impressos da Mínimas, além do primogênito Bonecas, estão publicações em espanhol como Hecho Y Dicho e Reglas de Caballería, este uma novela erótica ilustrada por Iván e encadernada à mão. Em 2013 e 14 ele participaram de feiras como a Tijuana e a Plana e pretendem vir este ano também. Mesmo vivendo no Chile, eles mantêm a sede da Mínimas nos dois países. No fim do ano, esperam participar da Furia del Libro, feira indepedente chilena. Além dos booktrailers, também estão trabalhando no primeiro aplicativo da Mínimas, criado a partir da obra de um poeta contemporâneo brasileiro. Vem coisa boa por aí.

A Mínimas segue sua jornada peculiar dentro do amplo universo do conteúdo editorial aproveitando-se do que há de mais bacana em criar algo novo: não há diretrizes para o produto, já que ele ainda está em construção. E isso é o máximo.

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  • Projeto: Editora Mínimas
  • O que faz: Booktrailers e livros em tiragem reduzida
  • Sócio(s): Iván Larraguibel e Maria Lutterbach
  • Funcionários: 2 (os sócios)
  • Sede: São Paulo e Santiago (Chile)
  • Início das atividades: junho de 2012
  • Investimento inicial: R$ 15.000
  • Faturamento: R$ 103.000 (em 2014)
  • Contato: [email protected] e [email protected]
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