Dá para sentir na pele como pode ser bom cuidar do mundo: é nisso que Vivian Yujin Chun acredita. E foi com base nessa ideia que ela criou, junto com o companheiro, Leonardo Courtois Vidal, a MOMA.
O nome sonoro entrelaça significados. “Mom“, em coreano, é corpo. “Oma” quer dizer mãe. E “maon”, amor como estado de espírito, como explica Vivian, que reuniu esses conceitos para homenagear as origens de sua família, que vem da Coreia do Sul:
“MOMA é isso, uma marca de produtos para cuidados do corpo, mas que cuidam também da Terra”
E por falar em maternidade: no dia da entrevista ao Draft, Vivian estava prestes a dar à luz João, seu primeiro filho; ainda assim, ela generosamente encontrou tempo para falar sobre a MOMA.
Fundada em 2022, a empresa desenvolve cosméticos naturais de beleza limpa, com alta concentração de ativos fitoterápicos da floresta amazônica. Os ingredientes são comprados diretamente de comunidades indígenas, ribeirinhas e agricultores familiares por meio de articulações com redes como Origens Brasil e Inatú Amazônia.
Vivian não vê essa opção como um “diferencial” da MOMA, e sim como a sua própria essência:
“Por que vou comprar um produto que fomenta um grande laboratório de aroma sintético ao invés de comprar de uma comunidade que destila um óleo essencial para gerar renda?”
Ao todo, dez ingredientes amazônicos — como andiroba, babaçu, breu branco e cumaru — compõem os produtos da marca.
O catálogo inclui xampus, condicionadores, desodorantes, sabonetes e sabonete íntimo (todos em barra), além de cremes hidratantes para mãos e pés, corpo e rosto e um sérum para a área dos olhos.
Vivian é farmacêutica, com especialização em fitoterapia, mas sua jornada começou bem longe dos extratos naturais.
Durante um tempo, trabalhou com pesquisa clínica em uma empresa com sede na Avenida Faria Lima, em São Paulo, até perceber que o mundo corporativo não combinava com a vida que desejava.
Ela decidiu, então, buscar novos caminhos. E o primeiro passo foi se matricular, em 2012, num curso de agricultura urbana:
“Passei a plantar, a conhecer as espécies de berinjela, de tomate, a reconhecer as plantas, a ver crescer… Aquilo foi um negócio incrível”
A partir dessa experiência, ela mergulhou em mutirões e novos cursos. “Nunca tinha ido a um congresso de farmácia, mas decidi ir a um de agroecologia”, lembra.
Também começou a se interessar pela saboaria natural: compilou informações na internet, fez um curso de aromaterapia e produziu seu primeiro sabonete artesanal, de capim-limão, curado em uma caixinha de leite. Ela resgata a emoção de criar aquele produto:
“No primeiro banho que tomei com ele, chorei”
Diante de tantas descobertas e da possibilidade de encontrar um novo caminho, Vivian pediu demissão, voltou a morar com o pai e decidiu fazer uma viagem de autoconhecimento. Passou nove meses entre França, Tailândia, Coreia e América do Sul, trocando trabalho por vivências rurais por meio do WWOOF.
“Cuidei de horta, cozinhei, vivi em comunidade, aprendi muito sobre mim: quem eu era de verdade, na essência, o que eu gostava de fazer… Eu sabia que aquele era o momento de descobrir os meus propósitos.”
De volta ao Brasil, em janeiro de 2015, Vivian continuou experimentando: deu aulas de culinária, fez curso de massagem, concluiu uma pós-graduação em plantas medicinais.
Ela também seguiu produzindo cosméticos, vendendo sabonetes em feirinhas. Até então, porém, a ideia de empreender parecia algo distante e muito “burocrático”…
No ano seguinte, a convite de uma amiga, Vivian passou uma temporada na Chapada dos Veadeiros, em Goiás, onde conheceu o seu Zé da Horta, um agricultor local. E esse encontrou impulsionou ainda mais sua busca por mudanças:
“A gente passava a tarde inteira falando de plantas, de espécies, de como cresciam, como se cultivava. Fiquei encantada e pensei: por que eu não posso ser agricultora?”
Ela foi atrás de um curso com o “papa” da agricultura sintrópica, Ernst Götsch, no Rio de Janeiro. Durou três meses: “Foi um intensivão. A gente trabalhava de segunda a segunda no campo, fazendo vários experimentos”.
Lá, além de aprender muito, Vivian conheceu o agroecologista Leonardo, hoje seu marido. Depois do Rio, o casal fez outros cursos e voluntariados em diferentes cidades até que, em 2017, Vivian foi convidada a atuar como gerente de campo do Sítio Semente, em Brasília. Os dois moraram em uma “quitinete rural” por um ano até receberem a proposta de trabalho em uma fazenda em Brotas (SP).
De 2018 a 2021, eles trabalharam com carteira assinada, plantando e colhendo frutas e hortaliças vendidas para restaurantes. Durante a pandemia, com os estabelecimentos fechados, Vivian deu um jeito de prosseguir, organizando uma rede de venda direta para Instituto Chão, Instituto Baru e restaurantes com delivery, em São Paulo.
“Esse episódio me fez entender o que é comércio ético, que é melhor comprar direto do produtor, e me introduziu, de certa forma, no empreendedorismo. Me fez perder o preconceito do que era essa atividade na prática”, diz a fundadora da MOMA.
A cosmética esteve sempre por perto, mas só virou negócio após essa sucessão de acontecimentos: pandemia, seca e geadas que destruíram as plantações em Brotas e, por fim, o encerramento repentino do projeto onde o casal trabalhava, em setembro de 2021.
Mas na verdade, a ideia de empreender já estava latente. Ela conta:
“Lembro que um dia estava no campo plantando agachada, eu ficava horas assim… E pensei: quando eu for mãe — se eu for mãe —, vou ter quatro meses de licença e depois tenho que voltar pro campo, embaixo desse sol. Onde vou deixar meu filho?”
Essas reflexões, somadas à demissão, levaram o casal a investir cerca de 30 mil reais para fundar a MOMA. “A gente queria começar com um propósito bem claro. O Brasil tem tanto potencial, tanta coisa boa. Pensamos: vamos fomentar as pessoas e as cadeias daqui.”
Sabonetes, xampus, condicionadores e desodorantes que fazem parte do catálogo da MOMA.
Desde o início, a ideia era trabalhar com insumos da sociobiodiversidade brasileira. “Mas onde a gente poderia achar essas matérias-primas e trabalhar com um comércio justo e ético?”
Essa foi a pergunta feita à tia de Leonardo, que atuava no Instituto Socioambiental (ISA). A resposta veio com a indicação da rede Origens Brasil e, em seguida, a descoberta de outras organizações como a Inatu Amazônia.
O casal começou a mapear insumos, firmar parcerias e buscar editais. Participaram do programa Amazônia em Casa, Floresta em Pé, da Climate Ventures e da AMAZ. Mais tarde, a aceleradora — que foi pauta aqui no Draft — aportou 400 mil reais no negócio. A empresa também ganhou duas investidoras e sócias ao longo do tempo, Isabela Baleeiro Curado (apoia a gestão estratégica da marca) e Marília Rollemberg de Melo (responsável pela comunicação e marketing), além de um advisor de finanças, o Paulo Porto .
Hoje, a MOMA utiliza ingredientes vindos de cinco estados e pelo menos 14 cidades/territórios da Amazônia Legal — entre eles, a RDS do Atumã (AM), o Xingu (MT), o Acre, o Maranhão e o Pará.
Vivian e Leonardo também passaram a trabalhar com óleos essenciais produzidos por mulheres em sistemas agroflorestais na Mata Atlântica. Segundo levantamento da própria MOMA, são 417 famílias impactadas e mais de 2 milhões de hectares de floresta utilizados de forma sustentável.
Entre os planos para o futuro está amadurecer ainda mais a linha de produtos da MOMA e, segundo Vivian, “torná-los cada vez mais consumidos”:
“Foi um grande aprendizado para a gente entender que ninguém compra nada só pelo impacto. Então, a sustentabilidade da empresa depende de pensarmos produtos pelos quais as pessoas se encantem e [nos quais] sintam benefícios”
De olho nisso, Vivian começou um MBA em desenvolvimento de produtos cosméticos. O objetivo é seguir incrementando as fórmulas e ampliar o alcance de um mercado ainda bastante nichado.
Em 2023, a empreendedora foi convidada a integrar a diretoria da Associação dos Negócios de Sociobioeconomia da Amazônia (ASSOBIO) como diretora de relacionamento. E será através da ASSOBIO que Vivian estará na COP30, em novembro, em Belém, divulgando os seus produtos e os de outros negócios de impacto.
Essa deverá ser, aliás, a primeira viagem de João, o filho de Vivian que estava prestes a nascer no dia da entrevista. Lá atrás, a maternidade (então apenas sonhada) influenciou sua decisão de empreender; hoje, é uma força que molda sua visão e seus desejos para o futuro — não só para o seu filho, mas para todos que vivem e viverão neste planeta:
“Desejo que as pessoas façam a relação [conexão] do que elas vivem, seja pelas mudanças climáticas ou na economia, com a natureza. E [que] essa reflexão possa ajudar a mudar um pouco o modo como a gente se relaciona com os produtos, e os nossos hábitos de consumo.”
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