Cansou do MasterChef? Conheça o aplicativo que quer ensinar você a cozinhar de omeletes até receitas de restaurantes estrelados

Leonardo Neiva - 3 jul 2023
Receita passo a passo do aplicativo CREME.
Leonardo Neiva - 3 jul 2023
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Para quem gosta de vestir o avental do cozinheiro amador, não perde um episódio de Masterchef ou sonha em fazer algo para além do arroz e feijão, é difícil saber por onde começar na cozinha. 

Pedir dicas para amigos e familiares? Há uma enorme quantidade de receitas online, mas como saber em quais confiar? Ou mesmo qual influencer de culinária seguir?

Pensando em transformar em negócio essa demanda de um público que passou a apreciar o hábito de cozinhar durante a pandemia, surgiram empresas como a DeliRec, da qual já falamos aqui no Draft.

Lançada há oito meses, a CREME entra nesse mercado com uma proposta única: trazer receitas detalhadas em vídeos produzidos por chefs do mundo inteiro, que vão de uma simples omelete a pratos requintados da alta gastronomia. 

A ideia é que qualquer um pode começar a cozinhar com a ajuda de quem sabe mais do que ninguém o que fazer na cozinha. A plataforma reúne desde chefs renomados, com estrelas Michelin ou que viraram astros de TV, até aqueles de nome menos conhecidos. Todos compartilham algumas de suas receitas através de vídeos na plataforma. 

A CREME nasceu nos EUA, mas é liderada por três brasileiros. O cofundador Diego Zambrano, 43, explica que o nome é uma brincadeira com “create memories” (criar memórias, em inglês):

“A grande maioria das nossas memórias é em redor de comida, em jantares, festas, propostas de casamento… A comida estimula todos os sensos, então fica mais fácil acessar a memória se aquele momento teve um estímulo culinário”

Além de permitir personalizar as receitas, com menus em que o usuário opta pela temperatura em Celsius ou Fahrenheit e define a quantidade de ingredientes conforme o número de pessoas à mesa, a plataforma da CREME divide as etapas das receitas em vídeos curtos, passo a passo, para evitar que o usuário se perca em meio aos preparos.

MOVIDO POR SUA PAIXÃO PELA COMIDA, DIEGO LARGOU A CARREIRA PARA EMPREENDER E INOVAR NO UNIVERSO GASTRONÔMICO

Quando decidiu mergulhar na empreitada, Diego já vivia havia duas décadas nos Estados Unidos, onde passou por gigantes de marketing como Ogilvy e R/GA. Como empreendedor, foi o criador da Bondsy, rede social de venda de objetos usados entre amigos e conhecidos, e sócio na empresa global de design e tecnologia, Work & Co.

Em paralelo a essa carreira na publicidade e tecnologia, ele vinha desenvolvendo uma paixão pela indústria da gastronomia. Ao longo de uma década, Diego viajou para conhecer restaurantes do mundo todo, se conectando com chefs de diferentes nacionalidades. Quando a pandemia começou, viu muitos deles sem saber o que fazer. Diego conta:

“Na pandemia, os chefs tiveram que improvisar para se tornar mais relevantes de forma remota, desde a comunicação nas mídias sociais até a abertura para o delivery. Vi movimentos interessantes que a comunidade foi forçada a fazer devido a essa limitação”

Por ser o único contato de muitos desses profissionais com o mundo dos negócios e do digital, Diego recebeu pedidos de ajuda, passando a ajudar nas estratégias de comunicação digital e delivery para muitos desses restaurantes.

Diego Zambrano, cofundador da CREME.

“Logo ficou claro que não importava de quanto tempo livre eu dispunha: eu não ia conseguir causar impacto dessa forma na comunidade.”

O tempo estava longe de ser suficiente, então Diego decidiu liberar sua agenda da forma mais simples e radical possível: deixando a empresa onde era sócio para se dedicar inteiramente a um novo projeto. 

Como identificou ideias de negócio ainda não exploradas na culinária, ele desistiu de “só colocar um band-aid” no problema, motivado pela pandemia, e trilhar um caminho novo nesse ecossistema. 

UM DESAFIO: COMO EMPACOTAR A EXPERIÊNCIA DE ALGUNS DOS MELHORES COZINHEIROS DO MUNDO NUMA PLATAFORMA DIGITAL?

Inspirado pela forma como a música, com o tempo, deixou os palcos para se tornar um produto que pode ser apreciado tanto física quanto digitalmente, Diego queria fazer algo semelhante com os restaurantes.

“Os chefs só têm capacidade de extrair valor do que criam vendendo comida e bebida no lugar físico onde trabalham… Mas, num mundo digital, existem cada vez mais formas de capturar valor de coisas que viajam digitalmente.”

Esse valor, para o empreendedor, vinha do profundo conhecimento gastronômico que chefs ao redor do mundo possuem — mas que nem sempre se traduz da forma mais palatável para o cozinheiro amador, seja em livros de receitas excessivamente narrativos, em redes sociais ou programas de TV.

“Pensava em criar o melhor formato para todo mundo que cozinha, passo a passo, em vídeo, com consistência, qualidade, dinamismo e apresentado por chefs do mundo todo. Algo para o consumidor que quer cozinhar e que, ao mesmo tempo, não servisse só aquele 0,1% dos influenciadores ou chefs celebridades. Um grande catálogo de culinária”

O primeiro passo para concretizar essa visão aconteceu em 2020, quando Diego deixou a Work & Co. para viajar pelos EUA, Europa e América do Sul numa pesquisa com chefs e produtores rurais para pesquisar e entender a melhor forma de extrair valor desse ecossistema.

Já no começo de 2021, com uma visão construída em torno de democratizar o acesso à propriedade intelectual culinária no mundo, o empreendedor tirou 100% do investimento inicial do próprio bolso e começou a montar um time. 

Primeiro, convidou a especialista em planejamento midiático Fernanda de Lamare, 45, com quem trabalhou numa agência de publicidade em São Paulo, para ser sua cofundadora e coordenadora de conteúdo e operações da marca. Depois, chamou Igor Oliveira, 35, de Los Angeles e sócio na Work & Co., para assumir como cofundador responsável por tecnologia.

HOJE A PLATAFORMA JÁ REÚNE MAIS DE MIL RECEITAS PUBLICADAS, INCLUINDO CRIAÇÕES DE CHEFS-CELEBRIDADES DO BRASIL

O período de planejamento e construção do negócio, que durou cerca de um ano e meio, foi longo não apenas para desenvolver a tecnologia, mas também construir laços comerciais ao redor do mundo e criar regras de captação de vídeos que pudessem ser aplicadas por equipes em qualquer lugar. 

Depois de registradas as imagens usando um guideline da CREME, a empresa centraliza as etapas de edição e publicação na plataforma, para que o conteúdo siga sempre um mesmo padrão.

“Diferente de outros produtos que desenvolvi no passado, a gente criou uma empresa de mídia e tecnologia. Se fosse só design ou mídia, a velocidade seria muito maior, mas tivemos que fazer os dois ao mesmo tempo”

Segundo Diego, a aproximação foi tranquila em relação aos chefs, em sua maioria abertos a participar do modelo de negócio. Hoje, embora a equipe fixa da CREME tenha cerca de 30 pessoas espalhadas pelo mundo, com parte do time de conteúdo e tecnologia no Brasil, a empresa gerencia uma rede de profissionais autônomos pelo mundo, que gravam o conteúdo produzido pelos chefs.

Como o app só foi ao ar em outubro de 2022, os sócios aproveitaram o período para alimentar a biblioteca com centenas de receitas. Diego explica que, embora a plataforma já esteja no ar há oito meses, o lançamento aconteceu quase na surdina, apenas nas mídias sociais e com um público selecionado.

“Era nossa primeira versão, e estamos num processo de melhoria constante nos últimos oito meses. O produto está no ar, mas nunca comunicamos o mundo, porque queríamos aprender como as pessoas utilizavam a plataforma para poder refinar o produto”

Se em outubro havia cerca de 200 receitas no ar, hoje são mais de mil, com um total de 2 700 já gravadas, aguardando na fila de publicação. O anúncio oficial de lançamento da CREME, diz Diego, deve ocorrer no fim de agosto.

Hoje, no app, há chefs como André Mifano, ex-apresentador do “The Taste Brasil” e atualmente à frente do restaurante Donna, em São Paulo; Manu Buffara, eleita melhor chef mulher da América Latina em 2022 com o curitibano Manu; e Thomas Troisgros, filho do chef celebridade Claude Troisgros e que acaba de lançar sua hamburgueria, a T.T. Burger, em São Paulo. 

Navegando pela plataforma, é possível encontrar cozinheiros com estrela Michelin ou que apareceram em realities populares de culinária como “Iron Chef” e “Chef’s Table”. 

Longe da nossa “zona de conforto culinária” também há nomes como o do ucraniano Ievgen Klopotenko, eleito entre os 50 chefs com menos de 35 anos que hoje impactam a gastronomia mundial.

A COLABORAÇÃO COM OS PROFISSIONAIS DE COZINHA SEGUE UM MODELO DE REMUNERAÇÃO SEMELHANTE AO DO SPOTIFY

Atualmente, há mais de 200 chefs e restaurantes na plataforma, com outros 500 já fechados para produzir conteúdo em mais de 50 países pelo mundo. No ritmo atual, a CREME filma cerca de 300 novas receitas todo mês, publicando de quatro a cinco por dia.

Fernanda de Lamare, coordenadora de conteúdo e operações da CREME.

O aplicativo foi lançado em inglês, mas deve ganhar versão em português até setembro (com a adição de outras línguas no futuro). O plano é ser uma plataforma global. Hoje, a maior parte dos acessos vem dos EUA, América Latina e Europa, mas a CREME também inclui chefs da Ásia e Oriente Médio — e já está em contato com restaurantes e equipes da África.

Diego diz que a CREME deixa cada profissional livre para escolher as receitas que quer fazer. Pratos simples e com ingredientes reconhecidos em toda parte, é claro, devem ganhar maior atenção de usuários globais; mas a estratégia deve garantir variedade no app, exibindo desde receitas de omelete até pratos requintados ou específicos de determinadas regiões.

“Não queremos olhar o que se consome em escala para maximizar o ganho. A ideia é fazer crescer o catálogo de coisas inovadoras, trazendo até pratos da culinária regional da Albânia… Filmamos na Ucrânia várias vezes durante a guerra, com mais de uma dúzia de chefs. Isso mostra quem somos, nossos valores

A colaboração com profissionais de cozinha segue um modelo semelhante ao de streamings como o Spotify. Cada chef – e também os fotógrafos responsáveis pelas filmagens – ganha royalties de acordo com a visibilidade e número de acessos do conteúdo. Segundo Diego, 70% da receita líquida da plataforma hoje vai para o bolso desses colaboradores.

O modelo de negócio funciona apenas por assinatura, saindo por 20 reais ao mês ou 160 reais no plano anual. Por ainda estar num estágio inicial, Diego não compartilha o número de assinantes ou o faturamento da empresa, mas informa que usuários de mais de 60 países já utilizam a CREME. 

FINALISTA DE UM PRÊMIO DA APPLE, O APLICATIVO QUER SER UM ALIADO NA LUTA CONTRA A INDÚSTRIA DO FAST FOOD E DA COMIDA PRONTA

Ao longo dos próximos meses, informa o empreendedor, o time estará focado em aprimorar a mecânica de busca do app, expandir suas funcionalidades e criar alternativas para ampliar a receita (financeira) da empresa, com a intenção de conectar a plataforma a e-commerces de culinária. 

Mesmo com esses ajustes ainda em marcha, a equipe já tem o que celebrar. Em maio, a CREME foi selecionada entre os finalistas do Apple Design Awards na categoria “diversão”, ao lado de nomes como o Duolingo, popular app de aprendizado de idiomas. Diego festeja a façanha:

“De quase 2 milhões de apps no mundo, a Apple selecionou 36 finalistas. É uma grande honra para a equipe. Criamos um ecossistema que traz recursos para chefs e restaurantes e leva pessoas a se reconectar com a comida. Para mim, esse é o maior prêmio”

Comer, lembra Diego, é um momento de comunhão partilhado com parceiros, amigos e familiares. Ele se orgulha de dizer que seu app faz parte de uma onda que vai contra uma indústria tomada por fast food e comida congelada, tratando o ato de cozinhar como uma inconveniência a ser evitada a todo custo.

“Lutamos contra décadas de interesse econômico e negócios tentando fazer a gente não cozinhar para comprar soluções como delivery e take out. Essa facilidade trazida pelas tecnologias faz com que tudo que demanda esforço pareça errado. Nossa batalha é fazer com que as pessoas voltem a encontrar valor em cozinhar.”

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: CREME - It’s Time to Cook
  • O que faz: Reúne receitas de chefs do mundo todo em vídeos passo a passo, para usuários cozinharem em casa
  • Sócio(s): Diego Zambrano, Fernanda de Lamare e Igor Oliveira
  • Funcionários: 30
  • Sede: Miami (EUA)
  • Início das atividades: 2022
  • Contato: [email protected]
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