Fintech de gestão de pagamentos e antecipação de recebíveis, a Asaas quer ser uma conta digital completa

Alexandra Gonsalez - 1 out 2019
Os sócios da Asaas: da esq. à dir, Jeferson Kortbein, Diego Contezini, Piero Contezini (com Asinha, a mascote da startup, no colo), Monica Dalosto e Fernando Chagas.
Alexandra Gonsalez - 1 out 2019
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Nos anos 1990, a catarinense Joinville, a 185 km de Florianópolis, ainda tinha um certo clima de interior. As crianças pedalavam livremente pelas ruas e brincavam nas praças. Menos Piero Contezini e seu irmão caçula, Diego. Quando tinham 8 e 6 anos, a diversão dos meninos era ligar a TV, plugar o aparelho em um jurássico TK 90X, rodar o BASIC e entrar em um mundo criado por eles mesmos.

“Aprendemos a programar com nosso pai, que fazia manutenção de mainframes. O computador tinha um interpretador da linguagem BASIC, o que facilitava a vida dos principiantes. Juntos, desenvolvíamos joguinhos simples, como caça-palavras. Foi amor à primeira vista pela programação”, conta Piero Contezini, 37, CEO da Asaas, startup de gestão e emissão de cobranças por boleto bancário, cartão de crédito e antecipação de recebíveis.

Olhando para trás, valeu a pena passar a infância na sala de casa. A fintech catarinense, criada em 2013, soma hoje mais de 22 mil operações realizadas pela plataforma e 15 mil clientes ativos em todo o país – 50% deles cadastrados como PJ, seja uma S/A ou MEI, majoritariamente na região Sudeste.

“O foco da startup são os pequenos empreendedores, que tocam o próprio negócio e cuidam de todos os detalhes da operação, independentemente do faturamento”

Segundo Piero, pelo volume de transações dá para imaginar que cerca de 2% dos brasileiros já quitaram algum boleto emitido pela Asaas. Tudo isso rendeu à empresa um faturamento de R$ 12 milhões em 2018.

BANCO DIGITAL VAI OPERAR POR MEIO DE AGÊNCIA FEDERAL AMERICANA

A ferramenta dispensa burocracia, não tem mensalidade e os usuários podem utilizá-la sem ter contratos com bancos ou carteiras de cobrança. “Vendemos modalidades de recebimento e entregamos via email, SMS, do jeito que o cliente escolher.” Há uma versão mobile, para Android e iOS; 50% dos usuários acessam via celular.

A cobrança só é feita em caso de sucesso de pagamento da conta do cliente. “Ganhamos R$ 3,99 a cada boleto único pago e até R$ 2,45 por emissão de grandes quantidades de contas quitadas.” Nas operações em cartão de crédito, esses valores oscilam entre 2,99% a 3,99% por pagamento.

Em maio de 2018, a fintech atingiu o break even, motivo de comemoração para o CEO e os outros quatro sócios cofundadores: o irmão Diego (VP), Fernando Chagas (CTO), Jeferson Kortbein (CFO) e Monica Dalosto (diretora de risco). O trabalho da equipe vem dando resultados. Este ano eles foram eleitos entre as 100 empresas mais inovadoras da América Latina segundo o Innovation Awards Latam (ficaram em 67º lugar no ranking).

A empresa também atua na operação de banco digital. “Estamos trabalhando no rebranding para reforçar o Asaas como uma conta digital completa.” O empreendedor que usa o software não precisa ser correntista para usar diversas funções. A fintech opera na compra e recebíveis via Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), uma aplicação em renda fixa.

“Prevemos a transação de até R$ 150 milhões por mês nos próximos 12 meses.” Eufórico com o potencial de crescimento, Piero acredita que parte do sucesso vem do aprendizado com seus erros e acertos como empreendedor desde a adolescência.

AUTODIDATA, PIERO ABRIU OUTRAS TRÊS EMPRESAS ANTES DA ASAAS

Aos 16, ele empreendeu seu primeiro negócio: uma consultoria em que atuava como White Hat, testando a segurança de sistemas. “Atendia a empresas de software, indústrias de máquinas, supermercados e pequenos comércios. Tinha três sócios, o mais velho com 21 anos.” Paralelamente, ele trabalhava como freelancer em Minas Gerais montando um provedor de internet. “No primeiro mês desse job, ganhei mais do que minha mãe, que era representante de vendas.”

Entretanto, a experiência como empresário fracassou. “Eu não sabia vender”, reconhece. No fim, Piero deu sorte. O grupo catarinense Lince Segurança Patrimonial, estava procurando por uma empresa como a dele para ser incorporada à operação.

“Eles compraram meu negócio e ainda fui contratado! Mudei para Gaspar, a 100 quilômetros de Joinville, e amadureci bastante com a experiência”

Apesar do dinheiro que entrava, o ritmo alucinado acabou prejudicando os estudos. “Passava a noite inteira no computador, dormia na aula e não conseguia ter um bom rendimento escolar. Ia para o colégio virado da internet.” Piero pediu transferência para a noite e nem isso funcionou. “Repeti o 3º ano do ensino médio três vezes!”

O CEO diz ser um desenvolvedor autodidata, mas, por teimosia, concluiu este ano o curso de Gestão Financeira na Unisul. “Estava cansado de explicar por que não tinha formação superior”, diverte-se. No fim, a faculdade contribuiu com os conceitos acadêmicos sobre coisas que ele sempre fez intuitivamente. “Comecei a olhar os detalhes da demonstração contábil depois que peguei o diploma.”

RESOLVER PROBLEMA DA SECRETÁRIA INSPIROU O PROJETO DA STARTUP

A vida com crachá durou até 2003, quando o programador voltou para casa e foi procurado por um empresário espanhol interessado em investir no mercado de jogos eletrônicos. Naquele momento as máquinas de caça-níqueis ainda eram legalizadas e as casas de bingo bombavam no país. A proibição viria mais tarde, em 2007.

“Eu tinha 22 anos e liderava uma equipe de 35 pessoas. Nosso trabalho era arquitetar a plataforma eletrônica e o hardware dos games. Levamos dois anos para concluir tudo”

Era a hora de partir para o próximo projeto: em 2007, ele e o irmão Diego montaram uma empresa de software, a Informant. “Nosso sonho era faturar R$ 1 bilhão por ano. Começamos a ganhar dinheiro, mas não tanto!” O negócio tinha 30 funcionários — entre eles a Sandra, secretária executiva, peça chave para o que viria a ser a Asaas. “Suas ameaças de demissão e reclamações foram fundamentais para minha trajetória profissional”, brinca.

Piero lembra que em dias de faturamento Sandra surtava porque se via soterrada por boletos vencidos. “Ela tinha que parar tudo, ligar para os clientes inadimplentes e pedir a emissão de novos documentos.” Para ajudá-la, os irmãos criaram um sistema que reduzia para cinco minutos os 18 dias de trabalho que a secretária levava para dar conta dos pagamentos atrasados. Foi esta a ideia embrionária do Asaas que surgiu em 2013. Paralelo a isso, Piero e Diego, estavam entre os fundadores originais da ContaAzul, nascida em 2011, e tiveram sua saída como investidores da empresa em 2018.

UMA MENSAGEM VIA CHAT DE UM ENCANADOR PJ MUDOU O RUMO DO NEGÓCIO

O projeto da fintech saiu do papel em 2014, quando os irmãos começaram a buscar novos sócios e investidores-anjo. “Em 2013, captamos R$ 500 mil de um investidor privado que prefere ficar incógnito.” Esse foi o aporte inicial, utilizado para a construção da plataforma e contratação de pessoal. “Não passamos por nenhum processo de aceleração.”

No começo, os sócios imaginavam um modelo de cobrança corporativa, de volume e complexidade. Entretanto, a mensagem via chat que receberam de um encanador, profissional PJ, mudou tudo. “Era um texto em letras maiúsculas, cheio de erros de ortografia, mas revelava claramente por que estávamos no caminho errado”.

O encanador precisava emitir 200 boletos de cobrança e banco nenhum permitia essa operação por conta do limite de emissão. Seu problema foi resolvido no dia seguinte.

“Pedi para meu programador jogar fora tudo o que tínhamos e fazer uma plataforma focada nos pequenos. Criamos o ‘fast-food’ da emissão de boleto de cobranças”

A nova versão foi lançada no dia 13 de janeiro de 2014 e em menos de um mês, a startup já tinha conseguido 43 clientes e um grande volume de emissões.

O ENVIO DE E-MAILS E SMS AJUDOU A REDUZIR A INADIMPLÊNCIA DOS CLIENTES

O CEO afirma que hoje, numa escala macro, seus principais concorrentes são os bancos e empresas das maquininhas de pagamento via débito ou crédito. “Não temos concorrentes diretos com o mesmo modelo de negócios e que ofereça todos os produtos da plataforma.”

Por enquanto, a cobrança representa 80% da receita, com um ticket médio que oscila entre R$ 300 e R$ 400 mensais. “Reduzimos a inadimplência para nossos clientes em 50% através do envio de emails e SMS.” Também há um serviço de mensagens de voz que cumpre a mesma função — um robô faz ligações quando vence um boleto emitido pela plataforma, lembrando o devedor de quitá-lo. “Nesse caso, a taxa de sucesso é de 90%!”

O cenário talvez mude em breve. Nos últimos meses as operações de crédito e antecipação de recebíveis têm crescido bastante.

“A segunda maior dor de nossos clientes é ter fluxo de caixa. Por isso, também estamos concedendo crédito a um valor acessível”

A fintech conta com uma estrutura interna que capta esse dinheiro nas instituições financeiras, negocia os valores e intermedia a transação.

De olho em 2020, Piero conta que o objetivo agora é lançar mais produtos focados na cobrança. “Queremos ter uma conta digital pré-paga ligada ao saldo, de fato.”

DRAFT CARD

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  • Projeto: Asaas
  • O que faz: Plataforma gestão e emissão de cobranças por boleto bancário, cartão de crédito, antecipações de recebíveis e banco digital.
  • Sócio(s): Piero Contezini, Diego Contezini, Fernando Chagas, Jeferson Kortbein e Monica Dalosto
  • Funcionários: 100
  • Sede: Joinville (SC)
  • Início das atividades: 2014
  • Investimento inicial: R$ 500 mil
  • Faturamento: R$ 12 milhões (2018)
  • Contato: [email protected]
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