Há futuro após a febre do food truck? O pioneiro, Los Mendozitos, aposta no nicho

Italo Rufino - 19 mar 2015Ariel, André e Danilo, os fundadores do Los Mendozitos.
Ariel, André e Danilo, os fundadores do Los Mendozitos, em mais um dia de trabalho.
Italo Rufino - 19 mar 2015
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Se até não muito tempo comida de rua era uma venda improvisada, com ingredientes de procedimento duvidoso e cuidados com higiene aquém do desejado, hoje essa percepção mudou bastante. No último ano, a cidade de São Paulo viveu um boom de food trucks – o nome “gourmetizado”, alguns dirão, dos restaurantes sobre rodas do momento.

Esses novos elementos da paisagem urbana pouco lembram os carrinhos de cachorro quente, caldo de cana e pastel, comuns nos arredores de estações de metrô, estádios de futebol e centros de comércio popular. Não é raro que chefs de cozinha com experiência em restaurantes badalados ofereçam seus pratos em trailers e furgões com design colorido e atendimento cuidadoso. Também foram criados espaços dedicados para os food trucks, como o Butantan Food Park, com quase 1 500 metros quadrados, e o Calçadão Urbanoide, um espaço entre as ruas Augusta e Frei Caneca que pode comportar até 25 veículos.

A profusão de food trucks suscita uma pergunta tanto para quem já empreende como para quem pretende empreender no setor: há futuro após a febre do food truck? Com a palavra, um dos pioneiros dessa onda, o Los Mendozitos. Eles começaram a rodar em janeiro de 2014, e são especializados em vender vinhos da região de Mendoza, na Argentina. Estão mais para um “wine truck”, e o diferencial (além de inaugurar a venda na rua) é o foco em oferecer vinhos de pequenas vinícolas familiares que não são facilmente encontrados nas grandes distribuidoras brasileiras. São rótulos como Tempranillo Mayol, com apenas 900 garrafas produzidas por safra, e os tintos orgânicos da Familia Cecchin, que já receberam notas elevadas num dos principais guias de vinho do mundo – o Descorchados. “Mesmo sendo bons vinhos, muitas distribuidoras não se interessam em vendê-los, pois os produtores não têm escala para produzir em grande quantidade”, afirma Ariel Kogan, de 29 anos, um dos fundadores do Los Mendozitos e natural de Mendoza.

NÃO CABE NO RESTAURANTE? EXPERIMENTE IR PRA RUA

O preço das taças de vinhos vendidos pelo Los Mendozitos varia de 10 a 15 reais. Se a sede for maior, há opções de garrafas entre 55 e 82 reais. Mas eles não concorrem com os carrinhos de churros na saída do metrô. O segredo, e a vantagem da mobilidade, é estar no lugar certo para o seu público. Nesse caso, predominantemente de classes A e B. “Também atendemos muitos jovens que não têm o costume de tomar vinho, mas se sentem à vontade no nosso ambiente mais descontraído. Aqui eles pedem vinhos doces sem se sentirem envergonhados”, diz Ariel.

bicicleta da Loz Mendozitos food truck

Bicicleta adaptada é usada pelo Los Mendozitos para em eventos e lugares onde o trailer não cabe.

Hoje o Los Mendozitos tem cinco trailers. Três em São Paulo e dois no Rio de Janeiro. A capacidade de armazenamento dos veículos é de até 100 garrafas. Os trucks possuem três geladeiras para refrigerar os vinhos tintos, branco e rosê e conjuntos de mesas e cadeiras que são montadas em redor dos veículos para acomodar os clientes. A empresa também usa uma bicicleta adaptada, ideal para eventos de menor porte. “A demanda foi muito grande no decorrer do ano passado. Criar uma rede foi uma expansão natural”, afirma Ariel. E o crescimento deu certo. Logo em seu primeiro ano de funcionamento, a empresa faturou mais de 1 milhão de reais. No entanto, Ariel reconhece que a época de forte crescimento ficou para trás:

“Dificilmente o mercado de food truck crescerá em 2015 o mesmo que cresceu no ano passado”

Passado o entusiasmo inicial dos consumidores, o mercado agora deverá enfrentar certas dificuldades. A primeira – e, talvez, a mais importante – é a regulamentação que define as regras para comida de rua em São Paulo. O decreto assinado em maio de 2014 pelo prefeito Fernando Haddad determina que os food trucks só podem funcionar em espaços públicos autorizados previamente pelas subprefeituras. Isso quer dizer que o food truck deverá ter um ponto fixo para atender os clientes. “Isso vai contra o modelo do food truck, que tem uma dinâmica de ser itinerante e estar em vários pontos da cidade conforme o fluxo de pessoas”, afirma Ariel. Para se proteger dessa limitação, os trailers da Los Mendozitos funcionam em espaços privados aberto ao público, como estacionamento de lojas e centros comerciais, museus e outros eventos abertos patrocinados por empresas.

Outro fator que compromete as receitas das empresas é o clima. Em dias de chuva ou muito frio as vendas caem drasticamente. A fidelização de clientes também é bem complicada. “O nosso público costuma ser passantes que se deparam com o trailer”, afirma Ariel. “Por mais que a gente divulgue nas redes sociais o local onde vamos estar, é difícil mover os consumidores.”

trailer do Los Mendozitos no Rio de Janeiro

Mobilidade é tudo: trailer do Los Mendozitos é transportado para um terraço de shopping no Rio de Janeiro.

Com muitas pessoas interessadas em ter seu próprio food truck, a concorrência também está cada vez mais forte. Hoje, há inúmeros food truck com produtos bem parecidos, como os especializados em hambúrguer, sucos e lanche natural. A própria Los Mendozitos já identificou dois concorrentes vendendo vinhos. “Para dar certo nesse mercado, o empreendedor precisa cada vez mais segmentar o seu produto para atender nichos ainda inexplorados”, diz Ariel.

A limitação do negócio também se dá geograficamente. Hoje, além das operações em São Paulo e Rio de Janeiro, os sócios do Los Mendozitos pensam em abrir unidades outras cidades, como Belo Horizonte, Brasília e Recife. “O problema é que o Brasil não tem cultura de food truck. Pouquíssimas cidades têm potencial”, diz Ariel. Ele considera que mesmo as maiores regiões metropolitanas brasileiras estão longes de chegar ao nível de consumo de cidades como Nova York, São Francisco e Berlim.

COMO SOBREVIVER DEPOIS DO BOOM?

Rápido crescimento seguido de desaceleração é comum em qualquer mercado emergente. Se a fase do boom dos food truck pode estar chegando ao fim, o próximo estágio será a estabilização do mercado e a maturação dos negócios do setor. Outras empresas também se aperfeiçoaram para atender essa cadeia. Em São Paulo, por exemplo, há empresas especializadas em adaptar furgões e desenvolver trailers para servirem comida de rua. Também existem empresas que adaptam eletrodomésticos para caberem dentro dos veículos. Outro exemplo de negócio que segue corona na tendência é o guia online Food Truck nas Ruas, desenvolvido pela agência de publicidade Recreativi. O site reúne informações sobre restaurantes sobre rodas em sete estados brasileiros. O serviço também está ativo como aplicativo para celular, que usa geolocalização para indicar os trucks mais próximos.

Ao olhar o mercado hoje, Ariel relembra os primórdios de sua empresa. O jovem, que cursou engenharia industrial, veio para São Paulo em 2009 e, nos primeiros cinco anos no Brasil, trabalhou como pesquisador na Rede Nossa São Paulo. “Meu conhecimento em engenharia era útil para entender a complexidade da cidade”, diz Ariel. Com vontade de aproximar as qualidades de sua cidade natal com São Paulo, Ariel viajou para Mendoza para conhecer algumas vinícolas. Sua família também está inserida no mundo dos vinhos e tem uma empresa que vende ferramentas para produtores da região.

A ideia inicial de Ariel era criar uma rede para vender os vinhos de Mendoza na capital paulista num tipo de clube do vinho – os consumidores poderiam fazer assinaturas para adquirir os produtos. “Durante a viagem, dois amigos que estavam no Brasil tiveram a ideia de montar um wine truck, mas eles ainda tinham dúvidas sobre quais vinhos poderiam vender”, diz Ariel. De volta à cidade, ele jantou com os amigos e futuros sócios Andre Fischer e Danilo Janjacomo para apresentar os rótulos que tinha trazido de Mendoza. “Nesse momento já começamos a montar plano de negócios da Los Mendozitos”, diz. Um ano e 1 milhão de reais depois, os sócios ainda mantêm a ideia original da empresa: democratizar o consumo de bons vinhos e dar asas (ou rodas) aos produtos de Mendoza.

 

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  • Projeto: Los Mendozitos
  • O que faz: Vende vinhos argentinos em food trucks
  • Sócio(s): Ariel Kogan, Andre Fischer e Danilo Janjacomo
  • Funcionários: 7 (incluindo os sócios)
  • Sede: São Paulo
  • Início das atividades: 2014
  • Investimento inicial: R$ 100.000
  • Faturamento: R$ 1 milhão (cálculo inicial, referente a 2014)
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