“A mulher madura está deixando de ser invisível e começando a empreender mais. Não está a fim de ficar em casa fazendo tricô”

Dani Rosolen - 27 mar 2020
A jornalista Claudia Reis criou junto com Bete Marin, do Hype60+, o marketplace Empreendedoras Maduras.
Dani Rosolen - 27 mar 2020
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A jornalista Claudia Reis, 55, esteve sempre ligada a causas femininas em sua cobertura diária, “entrevistando de moradoras da periferia a deputadas”. Depois que saiu das redações, ela resolveu criar, em 2011, o Negócios de Mulheres 50+, uma plataforma com eventos itinerantes, workshops e discussões e discussões sobre temas ligados ao empreendedorismo feminino maduro e seu universo (bem-estar, carreira, comportamento, beleza entre outros).

Há quatro anos, adentrou ainda mais nesse universo ao participar do Grupo Mulheres do Brasil, “uma rede feminina criada em 2013 para defender a liderança da mulher na construção de um país melhor”. Presidido por Luiza Helena Trajano, do Magazine Luiza, o grupo conta com 25 500 participantes no Brasil e no exterior, e está dividido em 18 comitês e 46 grupos.

Logo que entrou, Claudia abraçou o comitê empreendedor. “Achei que faltava alguma coisa para as mulheres mais maduras, porque quando se tem 45 ou 50 anos você encara o mundo de outra maneira do que uma mulher de 20 anos. Para nos fortalecermos, decidi criar o Grupo de Trabalho de Empreendedoras Maduras”, conta. Hoje, cerca de 3 mil mulheres fazem parte do Grupo de Empreendedoras, e quase mil delas estão na categoria Maduras.

Junto com Bete Marin, uma das fundadoras do Hype60+, Claudia resolveu criar o Empreendedoras Maduras, um marketplace que busca conectar mulheres maduras a serviços e produtos de outras mulheres maduras em dez categorias. “Com sonhos, tempo e propósito, cada vez mais mulheres têm tirado do papel ideias que dão origem a novos negócios. São elas que protagonizam a nova geração de empreendedorismo maduro no Brasil.”

A plataforma está em fase de testes e as interessadas já podem se cadastrar. A jornalista ainda teve a ideia de criar, em junho passado, o Fórum Empreendedoras Maduras, evento com propósito de inspirar, capacitar e promover mulheres maduras que já estão empreendendo ou querem empreender.

Leia a seguir o papo com Claudia sobre a construção desse movimento e as dificuldades enfrentadas até aqui.

 

As mulheres maduras empreendem por necessidade ou propósito?
A brasileira infelizmente ainda empreende por necessidade, embora dentro dessa faixa etária madura exista uma porcentagem maior de pessoas empreendendo com por propósito por já saberem melhor aquilo que querem.

Nós temos no país 50 milhões de pessoas com 50 anos ou mais,  sendo que 54% desse grupo é constituído por  mulheres. Para se ter uma ideia do potencial do segmento no país, os consumidores maduros movimentam no país, 1,8 trilhão de reais anualmente. Hoje, segundo o Sebrae, são 24 milhões de empreendedoras, sendo que 34% delas é de 55 anos, ou seja cerca de 8 milhões. Quase metade dos micro e pequenos negócios hoje são liderados por mulheres maduras.

(Leia também: O Brasil está ficando mais velho. Os idosos, porém, não querem saber de estereótipo. Conheça os negócios de olho nesse mercado)

A percepção diante desses números é de que a mulher madura está deixando de ser invisível e começando a se impor e a empreender mais, por uma série de necessidades. Primeiro, porque foi cortada do mercado de trabalho e segundo porque os filhos cresceram e ela não está a fim de ficar em casa fazendo tricô.

O Brasil está envelhecendo, o mundo está envelhecendo e quem tem que ser protagonista desse mercado é a mulher madura

Quais as dificuldades enfrentadas pelas empreendedoras mais maduras na hora de abrir seus negócios?
As principais dificuldades são apoio financeiro e psicológico. Dentro do nosso grupo, o que nota é que elas ainda têm dificuldade em fazer o planejamento econômico e o de marketing digital, das redes digitais.

Em comparação à mentalidade das empreendedoras mais novas, no que as mulheres que começaram a empreender mais madura levam de desvantagem?
Acho que é a falta de ter atitude e educação empreendedora, essa visão de ser independente e protagonista. Começar um negócio ou qualquer coisa nova dá empolgação e medo ao mesmo. E acredito que quando você tem 20 anos, você não tem tanto medo ou tem outros tipos medos de quem já viveu mais.

Como as empreendedoras maduras lidam com o ageísmo (preconceito de idade)?
A mulher nessa faixa é invisível, como já disse, com aquele estigma de ser velha, de não ser bonita.

A idade encurta a carreira da mulher e do homem, mas nós somos mais atingidas, com certeza. Os preconceitos, no geral, tendem sempre a ser piores com o sexo feminino

Para você, existe um declínio de energia, de vontade de estar ativa, a partir de determinada idade?
Isso é relativo. O mundo mudou, as pessoas agora estão no maior pique de produzir por questões de saúde, educação e cultura. Os 50 e 60 anos de hoje são os novos 30 de meio século atrás.

Como a maternidade impacta a carreira da mulher?
Cada vez mais as empresas estão criando espaço para que as executivas tenham flexibilidade de trabalho. No mundo empreendedor, elas estão conseguindo cuidar dos filhos e dar conta do recado gerenciando bem o tempo delas e, muitas vezes, optando por unir as duas coisas e empreendendo num nicho mais focado no setor de maternidade.

Conte um pouco sobre as atividades do Grupo de Empreendedoras Maduras.
Em dois anos de trabalho, a gente já realizou o Fórum Empreendedoras Maduros, em junho passado, com palestras de Luiza Helena Trajano, nossa presidente, e uma série de mulheres de 50+ que inspiram, como Chieko Aoki, Graziele Rossato, Bia Ferraz e Marina de Mattos Staub.

(Confira: “As pessoas precisam entender que a longevidade é um mercado. Estamos falando de algo que já está acontecendo”, entrevista com Layla Vallias, do Hype60+)

Foram mais de 300 participantes presentes na Sede Mulheres do Brasil, no Paraíso (zona sul de São Paulo). A expectativa era de no máximo 150. Além desse evento, já oferecemos uma série de workshops sobre redes sociais, planejamento, atitude empreendedora e mentoria. Existe inclusive um Grupo de Trabalho apenas de mentoras que prestam orientação para essas fundadoras.

Este ano, estamos programando fazer mais coisas. Além do Fórum queremos também promover uma premiação de empreendedoras maduras. A ideia era ser em agosto, mas por conta da pandemia precisamos mudar a data e ainda não temos nada definido.

Num momento em que está cada vez mais difícil se aposentar, como você enxerga o movimento empreendedor maduro?

Se queremos manter uma vida ativa e significativa, está claro que essa conta não vai fechar se dependermos apenas do emprego formal. Por isso a alternativa de empreender se torna evidente

Mas, cabe um alerta. Se as mulheres estão buscando um incentivo na sociedade, não vão encontrar nenhuma motivação. Estamos vivendo em um país onde enfrentamos o machismo, o preconceito com a idade e a falta de investimento financeiro para potencializar os negócios femininos.

Por isso, acho super importante uma apoiar a outra. Empreender às vezes é um movimento solitário, você não está numa equipe enquanto empreendedora pequena. Então, as redes, esses movimentos que estão acontecendo, como o nosso, são essenciais.

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