Verbete Draft Feminismo nos negócios: o que é Mansplaining

Isabela Mena - 27 dez 2017Nos debates presidenciais dos EUA, Donald Trump protagonizou inúmeros episódios de Mansplaining. Hilary Clinton revidou, algumas vezes (imagem: reprodução YouTube).
Nos debates presidenciais dos EUA, Donald Trump protagonizou inúmeros episódios de Mansplaining. Hilary Clinton revidou algumas vezes (imagem: reprodução YouTube).
Isabela Mena - 27 dez 2017
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De 13 de dezembro a 10 de janeiro, interrompemos a sequência de Verbetes Draft sobre termos da nova economia para apresentar uma série especial dedicada a expressões do “Novo Feminismo”, ou simplesmente Feminismo, como prefere quem entende do assunto, já que as demandas são as mesmas de movimentos passados. Entenda como a discriminação de gênero acontece no mundo dos negócios (e, a propósito, o que você pode fazer para evitar que continue). O Verbete Especial Feminismo nos Negócios de hoje é:

MANSPLAINING

O que acham que é: Homens comuns, sem graça.

O que realmente é: Mansplaining é um neologismo em língua inglesa formado pela junção da palavra man (homem) com parte da palavra explaining (explicando) e cuja tradução literal é “homem explicando”. É um conceito feminista que descreve a prática masculina de, em um diálogo, subestimar o conhecimento de uma mulher e lhe explicar, em tom professoral, o assunto em questão.

Mansplaining é uma dinâmica conversacional baseada na discriminação de gênero que, de um lado, tem a subjugação intelectual feminina e, do outro, a certeza masculina (consciente ou inconsciente) de que tem propriedade para falar sobre tudo, mesmo que seja a mulher (e não ele) especialista sobre o tema. É comum que venha precedido do Manterrupting, interrupções que homens fazem quando mulheres estão falando por (e para) desconsiderar, invalidar e desrespeitar a expressão de suas ideias.

Segundo Joanna Burigo, mestre em Gênero, Mídia e Cultura pela LSE (London School of Economics) e fundadora da Casa da Mãe Joanna, Mansplaining é um termo controverso e bastante carregado social e politicamente. “Geralmente, serve para denominar situações em que um interlocutor, tipicamente um homem, explica algo para outro, geralmente uma mulher, de forma condescendente e sem nenhuma consideração pelo conhecimento prévio que ela possa ter sobre o assunto sendo debatido”, diz.

O Mansplaining pode ocorrer em qualquer contexto (profissional, político, acadêmico, social, pessoal, online etc.) e sobre qualquer tópico. De acordo com Maíra Liguori, cofundadora da consultoria sobre o público feminino para marcas Think Eva, em ambientes profissionais acontece de homens menos qualificados que mulheres agirem como se as ensinassem, em tom paternalista, como fazer seu trabalho. “A arrogância do Mansplaining chega ao absurdo de um homem explicar para uma mulher adulta como funciona a menstruação”, conta.

Liguori diz que o ponto não é dizer que qualquer explicação de um homem deve ser desmerecida mas, sim, evitar que desmereçam o que as mulheres sabem: “A ideia de que as mulheres são seres pensantes ainda não é bem compreendida pelos homens em geral e o Mansplaining muitas vezes é ocultado por uma suposta normalidade, o que coloca as mulheres em posição de inferioridade”.

Quem inventou: O termo é comumente creditado à escritora e ativista Rebecca Solnit em função de um artigo que escreveu para o Los Angeles Times intitulado “Men Who Explain Things” (link em Para saber mais) no qual descreve o conceito, embora não use a expressão.

No texto (que mais tarde virou um livro, de mesmo nome), Solnit conta a ocasião em que um homem a abordou em uma festa e, sem reconhecê-la, começou a explicar-lhe o teor de seu próprio livro. Precisou ser avisado do fato por cinco vezes até que finalmente parasse.

Burigo conta que em Men Who Explain Things Solnit especula sobre as origens do comportamento. “Ela o atribui a um excesso de autoconfiança aliado à falta de escuta da parte dos homens”, afirma.

Já a palavra Mansplaining apareceu pela primeira vez no comentário que o usuário “Fandom_Wank’s blog” fez sobre o texto “Women Who Hate Dean Hating Women Hating… wait”, publicado no LiveJournal.

A partir daí a palavra se popularizou. Dois anos depois, a expressão Mansplainer estava na lista de palavras do ano, categoria Communicating, do jornal The New York Times.

Quando foi inventado: O artigo de Solnit foi publicado em abril de 2008. O comentário que cunhou a expressão, em maio do mesmo ano. A referida lista do New York Times é de 2010.

Como interfere na carreira da mulher: O Mansplaining pode ser nocivo por reforçar estereótipos negativos atribuídos geralmente a mulheres, como menor capacidade intelectual, insegurança, fragilidade emocional, falta ou excesso de força para tomada de decisões etc.

Liguori diz que, muitas vezes, ao se colocar como conhecedora de determinado assunto, a mulher assertiva é taxada de mandona, histérica ou masculinizada: “Desta maneira, ficamos encurraladas em uma situação de desrespeito que impede que nosso talento seja reconhecido”.

Segundo Burigo, a prática independe de hierarquias corporativas, e pode acontecer independentemente da disparidade entre os cargos, como um assistente sobre sua chefe. “O Mansplaining pode minar a autoconfiança de mulheres, que já é tão posta em dúvida”, diz.

Como pode ser evitado (preventivamente): É preciso haver uma mudança na cultura corporativa e, primeiramente, o reconhecimento desse comportamento. Para isso, a educação, segundo Liguori, é a principal ferramenta. “Mansplaining é uma microviolência que as pessoas ainda não enxergam. É preciso falar sobre o tema, citar exemplos, e até haver intervenção em casos mais graves.”

De acordo com Burigo, são necessárias mudanças paradigmáticas profundas, como a desconstrução de hierarquias sociais pautadas em gênero, e isso exige a participação de todos:  “É fundamental que exista o reconhecimento do fenômeno, tanto por homens como por mulheres. Além disso, colegas que se dizem aliados das pautas feministas devem estar dispostos a compreender as nuances das opressões e trabalhar para sejam trazidas à tona”.

Casos, reações e repercussões: Ano passado, os casos mais notórios de Mansplaining aconteceram entre Hillary Clinton e Donald Trump nos debates presidenciais nos EUA. Muitos veículos de comunicação escreveram a respeito, inclusive com sarcasmo, quando Hillary passou a usar o Mansplaining contra Trump. No Huffington Post, “10 Times Women Wanted To Throw Things At The TV During The Debate”; no Washington Post, “Last night’s debate, or the mansplaining Olympics” e “Actually, Hillary Clinton beat Donald Trump at his own game: mansplaining”; no New York Times, “Hillary Clinton, Mocking and Taunting in Debate, Turns the Tormentor”. Já o Refinary 29 usou o gancho para um texto educativo: “9 Tips For Tackling Mansplainers We Learned From Clinton’s Debate Performance”.

Burigo conta que, com ela, o Mansplaining não só é frequente como parte de conhecidos. “Entre outros exemplos, homens já vieram me explicar sobre machismo no futebol, mesmo eu sendo fundadora do Guerreiras Project (iniciativa que usa o futebol como ferramenta para revelar, analisar e combater preconceitos de gênero); sobre as diferentes vertentes feministas, ainda que eu tenha estudado teoria política feminista e seja mestre em gênero; a democracia brasileira, mesmo eu sendo organizadora de um livro sobre o tema, o Tem Saída? Ensaios críticos sobre o Brasil“, diz.

Para saber mais:
1) Leia, no Los Angeles Times, o artigo Men who Explains Things, de Rebecca Solnit.
2) No Inc., em How to Thwart “Mansplaining” Debra Bednar-Clark, ex- chefe global de negócios, estratégia e crescimento da Creative Shop do Facebook, explica detalhadamente três passos de prevenção contra o Mansplaining.
3) Na Vanity Fair, Star Wars: The Last Jedi Offers the Harsh Condemnation of Mansplaining We Need in 2017 texto analisa, cena a cena, a prevalente hierarquia superior das personagens femininas no último filme da saga Stars Wars.

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