Quando o negócio da Bolder surgiu, o nome da marca era outro e os tempos eram outros também. Em 2018, a empresa — que passou recentemente por um rebranding — surgiu como Fábrica de Startups (e foi pauta aqui no Draft), atuando principalmente como uma aceleradora de startups corporativas.
Naquela época, o tema da inovação aberta ainda não era tão popular no Brasil e, por isso, muitas empresas não sabiam exatamente do que se tratava. Era necessário conscientizar o meio sobre a sua importância e educar as organizações sobre como trabalhar em parceria com as startups a fim de inovar mais rapidamente.
De lá para cá, o tema entrou na pauta da mídia, em grandes eventos e em reuniões estratégicas dentro da organização. O interesse cresceu e o debate também! Mas eis que veio 2022 e a crise econômica bateu na porta de vários negócios de inovação.
Termos como bear market (expressão que designa um período de desvalorização na bolsa) e “crise dos unicórnios” tomaram conta dos noticiários, que também contavam histórias de demissões em massa em startups aparentemente prósperas. Paira no ar certo medo de se investir em negócios que até prometem altos retornos, contudo, por vezes, representam um grande risco.
Diante desse cenário, surgem dúvidas. As empresas estão mais reticentes quanto à inovação aberta? Quais tecnologias devem receber mais atenção no próximo ano? Ainda vale a pena as empresas tradicionais unirem forças com startups para lançar uma solução ou testar outros caminhos? Quais as perspectivas para essa relação em 2023?
Essas foram algumas questões abordadas por Ula Amaral, CMO da Bolder, em entrevista exclusiva ao Draft sobre o que esperar do futuro do ecossistema de inovação no Brasil. Leia com atenção para tomar decisões conscientes e estratégicas no próximo ciclo que já está próximo.
Para começar, gostaria de entender o que motivou o reposicionamento da Fábrica de Startups como Bolder. Quais são as novas necessidades do mercado em relação à inovação que impulsionaram essa mudança?
Nós iniciamos como uma aceleradora de startups corporativas e o nome “Fábrica de Startups” fazia muito sentido naquela época. Em certo momento, no entanto, deixamos de caber nesse nome e esse é o principal motivo da mudança.
Além disso, o negócio no Brasil passou a ter alguns rumos diferentes, começamos a direcionar para inovação corporativa custom made, que é o nosso atual posicionamento.
Com isso, passamos a trabalhar mais a cultura de inovação, venture building, inovação aberta com tecnologia e não só com startups. Ou seja, o leque aumentou e o nome precisava crescer junto, por isso, fizemos a mudança para “Bolder”.
O que significa o conceito de inovação corporativa custom made?
Nossa proposta é fazer uma entrega customizada. Se estamos falando sobre inovação e inovação é pensar diferente, por que a entrega tem que ser padrão para todo mundo?
Entendemos que, para cada corporação, cada marca e cada líder que está dentro dessas empresas, precisamos fazer uma entrega diferente e muito mais humanizada. Então, o que combinamos com os nossos clientes é uma co-inovação. Eles trazem seus desafios e nós trabalhamos juntos no desenvolvimento das soluções.
O que nos levou a esse conceito são alguns dados de mercado. Tem uma pesquisa da McKinsey, por exemplo, que revela que 85% dos executivos têm medo do desconhecido — o que reflete muito forte no medo de inovar. E por causa desses 85% de executivos, muitas empresas não se movem
Então, essa nossa mudança também chega para provocar, para dar esse empurrão em direção à inovação, para ajudar a não ter medo de errar, a não ter medo do desconhecido.
Dado o contexto atual da economia, o medo do desconhecido ou mesmo de investir em uma startup é justificado?
Startups sempre serão um tema complexo porque elas fogem do status quo. São modelos de negócio com uma velocidade diferente, um tamanho diferente, uma escalabilidade muito nova em relação às corporações a que estamos habituados. Então, sempre terão as críticas a esse modelo — e é saudável que essas críticas surjam.
Porém, estamos no famoso mundo VUCA, nada é constante, as coisas não são mais previsíveis como eram. E as empresas precisam se preparar para isso
Falamos o tempo todo com o nosso cliente sobre essa questão, temos essas conversas difíceis. Explicamos que não é trabalhar com uma startup por trabalhar, não é pela fama ou pelo status, mas, sim, uma questão de adoção de tecnologia e de inovação dentro do seu core business para a empresa sobreviver às imprevisibilidades.
Não dá pra fazer inovação aberta pensando só no que vai postar no Linkedin, tem que ser algo mais profundo porque, do contrário, as iniciativas não param de pé, certo?
Exatamente, e não param mesmo! Ainda tem quem fale que vai inovar para ter um posicionamento de marca inovadora e tudo bem, nós também ajudamos nisso. Mas a maioria já entendeu que precisa ter algo a mais, precisa de ações bem estruturadas para dar sustentação ao conceito de marca inovadora.
Precisa também desenvolver uma relação que beneficie todos os agentes envolvidos. Gosto de falar em uma visão win-win-win.
No caso das startups, elas ganham muito ao se relacionar com as corporações: ampliam a base de clientes, aceleram o seu desenvolvimento, adquirem know-how no mercado delas.
A corporação ganha muito também porque a startup traz agilidade, escalabilidade, tecnologia, além de um mindset diferente, inovador. E, às vezes, ela consegue trazer inclusive maior engajamento do time, acaba sendo um projeto de RH. Isso porque as pessoas começam a se empolgar com o tema inovação e querem continuar a atuar com esse enfoque, ficam na empresa para intraempreender.
E o terceiro “win” é o da própria Bolder. Nós ganhamos muito ao aprender com esse processo. Se eu quero ser uma empresa de inovação, preciso estar perto dos clientes que estão à frente desse trabalho. Eu tenho que assistir de camarote como funciona essa relação, como as corporações estão se desenvolvendo, para que eu possa construir cases e ser benchmark.
Quando esse processo funciona e todo mundo ganha é perfeito, assim diminuímos aquela desconfiança. Enxergar essa relação win-win-win e esse progresso ajuda no convencimento dos clientes.
E o ecossistema de inovação no Brasil já está nesse ponto de maturidade?
Desde que surgimos como negócio, a nossa intenção é protagonizar a transformação do ecossistema brasileiro em uma referência mundial. Tudo o que pudermos fazer para isso acontecer, faremos.
Agora, como eu enxergo essa história: vejo que um grande caminho já foi alcançado desde que iniciamos a nossa jornada aqui no Brasil, quando trouxemos a Fábrica de Startups para cá. É um ecossistema completamente diferente do que era há seis anos, houve muita evolução.
Quando chegamos, precisávamos educar sobre o que é inovação corporativa, o que é aceleração, ainda era um ecossistema muito voltado para abrir mão de equity em troca de aceleração. Esse era o formato, mas ele não para de pé.
Então, vejo uma grande evolução. Só que ainda precisamos melhorar em outros aspectos.
Se olharmos para os fatores que fazem um ecossistema saudável, um deles é a densidade de startups. Temos um país de dimensões continentais, oportunidade de escalar não falta, nem talentos e nem diversidade para fazer isso acontecer. Mas ainda enxergo uma concentração de startups no Sudeste, principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro
Eu, por exemplo, sou embaixadora do South Summit Brazil, um evento que acontece no Rio Grande do Sul. A organização de lá já trouxe mais de mil startups para a competição do evento — e startups do Brasil todo!
Acho que estamos caminhando para uma descentralização. Vai demorar, mas eu acredito que essa descentralização chega e que ela vai ser muito saudável! E um dos fatores que pode ajudar é o trabalho remoto.
Há dois anos, você precisava ser uma startup em São Paulo, porque o talento estava lá. E agora eu vejo tantas em Porto Alegre, em Belo Horizonte, em Recife que estão dando muito certo e contratando talentos do Brasil inteiro — quiçá do mundo inteiro
Acredito que essa quebra da barreira geográfica vai nos ajudar a descentralizar o país e, por consequência, o ecossistema de inovação.
Considerando todos os desafios, as necessidades e as demandas que a Bolder recebeu das empresas nos últimos anos, quais temas de inovação continuam em alta em 2023?
Com certeza ESG continua sendo um tema forte em 2023, especialmente pelas agendas globais. As empresas continuam trazendo esse tema para nós, muitos dos programas de inovação estão sendo desenhados para solucionar desafios de ESG.
Outro enfoque é na inovação de impacto social porque as corporações estão entendendo que só vão sobreviver se trabalharem nessas duas frentes: social e ambiental.
E isso é muito interessante do ponto de vista do consumo. O consumidor é muito mais consciente na escolha da marca e pode escolher ou deixar de escolher uma marca caso ela cometa um erro neste tema.
Muitos clientes chegam aqui com marcas sendo canceladas e boicotadas por errar em um tema social… Eles pedem ajuda e entendem que a inovação é necessária para acertar nesse tema, não dá para fazer tudo igual
Especialmente no tema ambiental, que é muito de pesquisa e desenvolvimento, que está diretamente ligado à inovação.
Além disso, tem o intraempreendedorismo. Eu estou impressionada com a quantidade de empresas buscando essa prática, falando que gostariam de ter um programa estruturado de intraempreendedorismo.
Dentre as tecnologias mais populares em 2022, qual deve continuar a despertar a curiosidade das pessoas no novo ano?
A maioria dos clientes ainda está no horizonte 1 de maturidade, que é o horizonte de inovação com tecnologias mais acessíveis, mais prontas e com menos complexidade. Porém, todos querem saber sobre metaverso hoje em dia.
Metaverso é a palavra da vez — já foi cripto, já foi blockchain. Os clientes falam muito sobre isso, mas com a consciência de que é tudo ainda muito desconhecido. Estamos vendo o Facebook — na verdade, a Meta — tentando se apropriar desse terreno e ainda tendo dificuldade
O desdobramento disso tudo é o mais desconhecido possível. Quando falamos sobre o medo do desconhecido, aí está um dos maiores. As empresas chegam até nós com esse interesse, falam sobre esse assunto, mas entendem que ainda está longe.
Para trazer esse assunto mais próximo da realidade dessas organizações, nós ajudamos a fazer jornadas mais tangíveis para garantir que o cliente esteja preparado para o digital e entenda em que fase a sua empresa está com relação a essa tecnologia.
Mas também entendemos que a inspiração é muito importante para abrir a cabeça e desenvolver o famoso mindset de inovação. Por isso, fazemos sessões de inspiração.
Por exemplo, convidamos uma startup de metaverso, uma de VR e uma de IA para contarem e discutirem o que está nos horizontes mais longe de inovação que podem inspirar. Não que eu vá plugar no meu negócio; a questão é que, a partir desse contato, eu posso entender os caminhos possíveis.
É um equilíbrio entre essas duas frentes: fazer com que os clientes se preparem para a digitalização de uma forma muito tangível e, por outro lado, conhecer e até testar os temas da moda, as “palavrinhas mágicas”.
Qual mensagem você deixaria para as empresas que estão passando por mais dificuldades nesta crise e consideram cortar o investimento em inovação em 2023? Por que inovar neste momento? É possível fazer isso de maneira sustentável mesmo em meio às turbulências econômicas?
Eu devolvo a pergunta: por que não inovar num cenário de crise econômica? Qual é a sua desculpa para não se preocupar com a inovação num cenário de crise econômica? Me convença do contrário.
É com a inovação que vamos encontrar caminhos de redução de custo, de maior eficiência, de maior receita, de novos produtos, de novas abordagens etc. Então, definitivamente em um cenário de crise, continuar fazendo tudo igual não é a solução. A solução é se movimentar, fazer diferente
A corporação também pode se sentir mais motivada a investir em inovação aberta quando percebe ganhos mais rápidos vindo dessa iniciativa. Não como um hackathon em que vou rodar e, pronto, acabou, mas ganhos rápidos de eficiência.
Quando ela vê esses ganhos rápidos, a empresa pode aumentar esse nível de conscientização e entender que, tudo bem, eu preciso continuar nessa rota da inovação aqui porque é onde vou encontrar caminhos em um momento de crise. A crise não é mais inimiga da inovação, mas um estímulo forte para ela.
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