“Se a gente conseguir crescer em 10% o número de pessoas que têm acesso à escola, isso vai transformar a sociedade brasileira”

Marina Audi - 7 abr 2022
David Peixoto, cofundador do isaac, fintech que facilita a gestão de recebíveis de escolas privadas.
Marina Audi - 7 abr 2022
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O cearense David Peixoto, 35, pode se encaixar no estereótipo do menino prodígio, medalhista das Olimpíadas de Física no Ensino Médio, que se tornou um empreendedor de tecnologia bem-sucedido.

Mais do que isso: a trajetória de David – de Fortaleza, onde cresceu, à faculdade de direito da USP, passando em seguida pelo mercado financeiro da Faria Lima e culminando na fundação do isaac, sua startup que facilita a gestão de recebíveis de escolas privadas – é praticamente um manifesto em prol da educação no Brasil.

O salto dessa jornada começou com o acesso de David a um ensino de qualidade a partir do Ensino Fundamental II, e o vislumbre de outras possibilidades de mundo. 

Aos 23, ele replicou o acesso de alunos de escolas públicas com grande potencial a escolas privadas de alta qualidade por meio da ONG Primeira Chance, fundada em 2011 para conceder bolsas e realizar o acompanhamento desses jovens com mentorias.

Do mercado financeiro, em 2014, David migrou para o setor de educação onde ajudou a construir a Arco Educação, que tem forte atuação pedagógica, acompanhando a evolução da empresa ao status de unicórnio e ao lançamento do seu IPO. 

Em 2020, David e o amigo de infância Ricardo Sales decidiram empreender o isaac. A fintech nasceu para possibilitar que os mantenedores das escolas dediquem mais tempo ao que interessa – alunos e questões pedagógicas –, tirando o risco financeiro atrelado ao não-recebimento das mensalidades das instituições.

O isaac permite que o pagamento das mensalidades escolares seja feito de forma digital por PIX, cartão de crédito, débito, boleto ou recorrência. A solução inclui ainda uma interface para comunicação com as famílias dos alunos, que possibilita o envio de lembretes pré-vencimento. A taxa sobre o serviço é computada com base na inadimplência histórica individual de cada escola, variando, portanto, de cliente para cliente. 

Leia a seguir a conversa de David Peixoto com o Draft.

 

Você cresceu em Fortaleza, entrou no Colégio Militar, depois deixou o Ceará para estudar direito na USP, em São Paulo. O interesse pelos estudos é uma característica pessoal sua ou vem de família?
Minha mãe sempre foi muito apegada ao estudo. Ela sempre entendeu que era a única coisa que poderia fazer com que a gente mudasse a nossa realidade. Essa era a tônica familiar: tudo girava em torno da escola.

Minha mãe era muito presente, cobrava as notas, acompanhava os exercícios, sabia tudo que acontecia no colégio. Todo mundo lá em casa era bom aluno… os três [filhos] fizeram faculdade pública difíceis de passar

O que fez diferença entre os caminhos que eu tracei e os caminhos que os meus irmãos traçaram não tem a ver com estudo em si, nem com dedicação – mas, sim, com perspectiva de mundo.

Como assim?
O processo de admissão no Colégio Militar foi o que mais mudou o meu panorama de vida, porque foi o ponto fora da curva. É uma instituição pública: você faz uma prova e, se for aprovado, entra e não paga nada. A qualidade de ensino é muito boa, então todo mundo quer.

No fim, os aprovados são pessoas que tiveram boas bases escolares, ou seja, são de classe alta. Eu fui uma exceção ali. Antes, eu era bom aluno em uma escola de bairro. O Colégio Militar me possibilitou acesso a um estudo muito bom.

A segunda coisa é que a gente teve que se mudar, porque o colégio era num bairro nobre e a gente morava muito longe. Nossos amigos tinham outras perspectivas na vida; eu e meus irmãos éramos os alunos nerds daquela comunidade

Acabou que perdi contato com aqueles amigos. Formei um novo grupo de amigos, e todos eram muito mais ricos, com educação diferente, eles falavam sobre coisas que eu não conhecia. Os pais eram empresários, empreendedores, executivos bem-sucedidos. Eles falavam inglês, viajavam pra fora [do país]…

Fiquei muito próximo desse grupo. Os meus cinco amigos mais próximos, com quem convivi dos 11 aos 17 anos, eram todos excelentes alunos – o que me forçava a estudar sempre – e eram de famílias consideradas de classe alta em Fortaleza. Eles me abriram a cabeça.

A ideia de estudar em São Paulo, por exemplo, não era óbvia. A USP só tem vestibular aqui [na região metropolitana de São Paulo]. É uma prova regional, porque os temas que cobre são bem paulistas; é um vestibular com um formato diferente, que exige uma preparação diferente. Ninguém [em Fortaleza] fazia. Eu só consegui fazer porque um amigo, mais velho, veio cursar USP… o pai dele tinha feito.

Quando ele voltou nas férias de meio de ano, disse que eu tinha de ir para a USP. Eu respondia que não, porque nem entendia o valor daquilo, achava que era a mesma coisa ficar em Fortaleza ou ir a São Paulo. E ele falou: “Você não está entendendo: é um outro mundo. Eu vou te inscrever”

Meus irmãos, por mais que tenham tido uma baita abertura de contexto quando nos mudamos para uma região melhor da cidade, por vários motivos não fizeram essas amizades que pensavam grande…

Dos amigos do colégio, eu e mais um fizemos USP, quatro fizeram ITA e um fez Medicina em Yale [nos Estados Unidos]. Então, era um grupo especial que se reuniu ali, e um influenciou o outro.

Pelo que você contou em sua palestra no TEDx Fortaleza, isso tem a ver com o nascimento da ONG Primeira Chance: permitir que meninos e meninas de regiões periféricas possam abrir a cabeça e sonhar com essas possibilidades, certo?
Sim, tem um paralelo aí com a minha história e os projetos. A Primeira Chance é uma representação do primeiro movimento que a gente fez: sair de uma escola ruim e ir para uma boa.

Se você pega um aluno da Primeira Chance, expõe ele a uma escola de ponta – o que já aconteceu com 237 alunos de sete estados –, eles começam a ter ambição de fazer coisas maiores. Por mais que você interrompa o programa e retorne o aluno para a sua comunidade, ele já virou uma pessoa indomável, diferente 

Tem outra ONG que eu estava começando a desenhar, mas ainda não andou tanto, que se chama Supera… ela representará o segundo movimento que eu fiz: vir estudar em São Paulo.

O objetivo do Supera é ir nas universidades do Ceará e pegar alunos bons – sem ter o recorte de renda – e dar a eles acesso ao mundo de São Paulo. Pra dizer a eles: “Não pensem pequeno. Existe um mundo muito legal pra você conhecer”.

Sua formação acadêmica é em direito na USP, mas você nunca trabalhou nessa área. O que te levou ao mercado financeiro?
Foi o meu sócio atual, o Ricardo Sales… a gente se conheceu no colégio. Ele é um ano mais velho e fez ITA. Quando estava se formando, começou a trabalhar num banco de investimento, o Goldman Sachs. Ele não entendia por que eu fazia direito.

Quando disse que ia ser advogado societário, participar de operações de M&A e estava para entrar no escritório Pinheiro Neto, Ricardo perguntou por que eu não ia trabalhar em banco, onde o trabalho tinha mais impacto, ganhava-se melhor e a carreira progredia mais rápido… 

Lembro de dizer que não sabia nada de finanças! E ele: “Mas eu te conheço, você é um cara de Olimpíadas de Física, sabe fazer contas, só precisa entender os conceitos…” 

Fiz essa mudança e fui trabalhar no Credit Suisse, em 2011. Meus amigos da faculdade não entendiam bem, demorou cinco anos para eles também cogitarem ir pra banco.

Você parece ser alguém que não tem medo de pivotar sua jornada de vida. Em 2014, você trocou o mercado financeiro pela educação, para trabalhar como CFO no Sistema Ari de Sá (SAS), que veio a se tornar a Arco Educação, o primeiro unicórnio nordestino…
Eu não tenho muito medo de mudar mesmo. Me acostumei a aprender coisas do zero, me colocando na zona de desconforto. Fiz isso muito cedo, sem perceber. Acabou virando algo que eu gosto e me ajuda a abrir possibilidades para coisas diferentes.

Também sou muito confiante na execução. Sou otimista de que a gente vai encontrar um caminho, ainda que não seja exatamente o planejado. Ao mesmo tempo, olho muito para o cenário que dá certo. Então, se existe uma chance de aquilo ser muito legal, grande e de ser uma ótima experiência, eu tento até o fim.

Costumo dizer que prefiro partir do ótimo e descer a barra quando encontrar um problema do que já, automaticamente, definir a minha realidade como algo não-ótimo.

Essa questão do aprender tem a ver com a forma como eu fui estimulado, desde criança. Aprender coisas era a métrica de sucesso que a gente tinha em casa. Então, toda vez que vejo algo em que sou ruim ou que não sei nada, associo com um sentimento de progresso. Como se aprender coisas novas me levasse para um lugar melhor.

Outra coisa é que tomo muitas decisões direcionais, não costumo entrar tanto no tático. Quando você tenta basear cada decisão como se fosse um universo isolado, a probabilidade de ser inconsistente ao longo da vida é ainda maior

Nesse caso, o direcional era assim: quero ir para um lugar que vai me ensinar muitas coisas, onde vou tomar mais risco e estarei mais próximo de construir algo por mim mesmo.

Como você enxergou que migrar do mercado financeiro para o setor de educação poderia ser uma boa profissionalmente?
A decisão foi baseada na seguinte premissa: concluí que eu não queria ser diretor no mercado financeiro e, por outro lado, gostava de ter autonomia e contato com o mundo real, onde as coisas acontecem e você pode ser um pouco mais protagonista na construção. No fim, [é] a decisão de empreender.

É óbvio que eu poderia ter ido para vários lugares, mas o que apareceu foi a oportunidade de trabalhar com o Ari. E era um setor que eu gostava. Eu pensava: “Se eu ficar o dia todo falando sobre isso, acho que vou me energizar mais do que me cansar…”. E sentia confiança no Ari, pensava que a gente conseguiria fazer uma boa dupla.

A oportunidade começou porque Ari era doador da ONG e eu e Ricardo o ajudávamos a discutir o planejamento daquela ideia que ele estava tendo, que era o SAS. Acho que ele via que a gente era bom naquilo, que conseguia contribuir de forma relevante para as discussões.

Até a hora em que ele viu que o meu nível de envolvimento estava além da amizade, que eu estava me apegando muito a tudo que estava sendo construído… e perguntou se eu tinha interesse em trabalhar de fato com aquilo, ser um sócio dele nesse projeto

Na época, o SAS era uma empresa nascente, já tinha o começo da produção de conteúdos para serem vendidos a escolas como um sistema de ensino. O embrião do modelo de negócio da Arco estava lá.

Sinceramente, nunca imaginei que aquilo fosse se tornar algo tão bem sucedido. Aceitei o fato de que largar o mercado financeiro me colocaria numa posição financeira pior, mas pensava que eu conseguiria viver bem e, ao mesmo tempo, ia ser muito mais feliz ao construir algo e tangibilizar as minhas ideias em um projeto.

Em 2018, a Arco fez o IPO na Nasdaq, um marco do ecossistema de inovação brasileiro. Ter passado por isso te fez, de alguma maneira, começar a pensar no isaac em outro nível?
O processo do IPO contribuiu, porque foi um aprendizado. A gente ficou mais maduro e mais exposto; viemos pra São Paulo, fomos pros EUA, começamos a ter acesso investidores do mundo todo. Isso nos deu contexto e capacidade para entender o empreendedorismo no Brasil. E o isaac, de fato, nasceu com uma clareza maior dos próximos passos.

Outra coisa é que os investidores e fundadores brasileiros foram se sofisticando, os casos de sucesso ficaram mais evidentes. Então, foi uma conjuntura de amadurecimento do ecossistema.

Tem algo que a gente viu evoluir no mundo das startups de tecnologia – a visão do negócio. Em um negócio tradicional, o papel da visão é menor, porque basicamente você está replicando algo que existe há muito tempo. As pessoas não precisam que você diga o que aquilo vai se tornar.

Quando você está falando de uma empresa de tecnologia disruptiva, a sua capacidade de conseguir ver um pouco mais à frente é fundamental tanto para construir o produto e recrutar pessoas, quanto para trazer investidores

O Brasil de dez anos atrás não tinha essas disrupções tecnológicas. Os empreendedores tinham mais dificuldade de articular a visão como fazem hoje. Foi um amadurecimento normal do mercado. A construção de coisas grandes acontece primeiro na alma, antes de você tangibilizar.

Às vezes, converso com founders mais antigos e eles falam: “Isso aí é [apenas] uma visão. Qual é o valor que isso tem? Isso consegue pagar a conta do dia a dia?”. Eu respondo: “Mais do que você imagina”.

Construir uma visão clara de longo prazo é a única forma de criar algo disruptivo, inovador e de impacto. Por exemplo, o caso do Nubank: imagine você dizer que vai construir uma empresa e, em oito anos, ela será do tamanho do maior banco do Brasil…? É preciso um grau de projeção de futuro impressionante.

Como foi a decisão de deixar um local que você ajudou a construir, a Arco Educação, para fundar sua própria empresa?
Até hoje eu amo a Arco e continuo sócio lá. Meus amigos estão lá, são pessoas que eu encontro no convívio social. Foi uma decisão emocionalmente carregada. Fui para o Conselho [entre 2020 e 2021] para fazer a transição.

Você tem que ter carinho com a sua história. A Arco é uma parte muito relevante da minha. E o nível de intensidade com que as coisas aconteceram lá criou uma conexão que vai ficar pra vida

Mas tem horas em que algo está perfeito e não precisa continuar. No caso da Arco, fiz um ciclo completo de sucesso com começo, meio e fim. Se eu tivesse continuado, esse ciclo poderia não ser tão bonito como foi até então.

Foi uma decisão consciente: ou eu entrava num outro ciclo de mais sete, oito anos, em que construiria a nova Arco; ou encerraria aquele capítulo e aproveitaria a próxima década para fazer algo diferente.

Houve também o lado de descobrir uma dor das escolas – a gestão financeira – e perceber que você poderia resolvê-la? O isaac nasceu desse entendimento?
A consciência sobre o problema existia, não tão cristalina como se tornou depois, mas eu sabia que as escolas precisavam de uma plataforma que as ajudasse a crescer. Só que separei as decisões para não me confundir.

Sair da Arco para empreender abria um leque de caminhos. A “decisão 1” era sair do lugar. Eu precisava aprender coisas novas, queria trabalhar num negócio de mais disrupção, participar do ecossistema de startups. Em um segundo momento, veio a reflexão sobre o que fazer, a que valeria eu me dedicar por dez anos.

A primeira coisa que triangulei foi: se vou me dedicar tanto tempo e de forma tão intensa, precisa ser algo com um impacto relevante. Defini que trabalharia com educação, saúde ou segurança

Mas você tem que ter senso. Eu não tenho domínio sobre saúde e segurança – e seria arrogância achar que iria encontrar uma sacada e redefinir um setor que desconheço completamente. Já em educação, pensava que havia poucas pessoas que viveram esse setor tão intensamente e numa posição tão privilegiada como eu.

Tentei encontrar um problema longe do core da Arco; no ambiente pedagógico, a Arco é campeã, ninguém faz nada melhor do que eles. Foi aí que eu e meu sócio nos aprofundamos no tema da plataforma financeira – e evoluímos o isaac.

Existem outras plataformas financeiras generalistas que poderiam atender o setor de educação privada. No isaac, vocês desenvolveram tudo proprietariamente dentro de casa?
Plataformas financeiras verticalizadas têm uma vantagem grande com relação a plataformas generalistas B2B. Ao olhar sob o ponto de vista do consumidor final B2C, vejo os usuários como um grupo com as suas especificidades, mas que consomem os produtos com as mesmas dores.

Se você é cliente de um banco, quer uma conta corrente, conta de investimento, cartão de crédito… e não importa muito quem você é, o que faz, qual a sua profissão. Os problemas enfrentados são muito semelhantes. Então, neste caso, ser um negócio ultrageneralista só tem ganhos, porque você tem escala.

No B2B, o negócio de um setor é muito diferente de um outro negócio de outro setor. Uma escola é muito diferente de uma padaria, que é muito diferente de um restaurante. Na minha opinião, é difícil construir uma plataforma que resolva as dores relevantes de forma efetiva sem ser construída para determinada vertical 

Quando você olha para o âmbito setorial, acho que as plataformas verticalizadas se beneficiam. E a gente construiu do zero. Obviamente, temos parceiros tipo Amazon e Google, mas a gente abriu o isaac e não tinha nenhuma linha de código pronta, escrevemos linha a linha.

E acho que foi uma decisão correta, porque o bench de educação não tem muitas plataformas como a nossa. Essa era a beleza do que a gente estava se propondo: desenhar algo customizado para escolas.

Como a sua experiência prévia em educação agregou para diferenciar a solução das concorrentes?
Da vivência da Arco, pude aproveitar duas coisas. A primeira é como se relacionar bem com o cliente – que é o mesmo, ou seja, escolas privadas – tendo uma estrutura de go-to-market e de atendimento, uma forma de me comunicar com o mantenedor.

Esse foi um aprendizado que eu tive na Arco e consegui executar aqui muito mais rápido, porque estava adotando [aqui no isaac] as mesmas práticas que a gente construiu nos últimos anos.

A segunda coisa em que a gente se inspira é a cultura da empresa. A cultura que ajudei a construir na Arco é de foco no cliente, ética e franqueza, carinho com as pessoas, apego pelas relações… Se você olhar as duas empresas, elas têm culturas semelhantes.

O isaac se baseia em fornecer uma base tecnológica de gerenciamento para escolas privadas, a fim de deixar mais tempo para os mantenedores se dedicarem a questões pedagógicas. Com qual produto começaram e por quê?
O isaac começou da percepção de que o setor de educação vivia uma dinâmica semelhante à do varejo de 20 anos atrás, quando você comprava um objeto parcelado e recebia, mensalmente, um carnê em casa.

As lojas tinham departamento financeiro dedicado a essa atividade e absorviam o risco e a complexidade de consignar a possibilidade de pagamento parcelado. Faziam isso para viabilizar o consumo. Mas era trabalhoso e arriscado tocar aquilo individualmente, ainda mais porque a loja não é expert no assunto.

Hoje, se você comprar uma televisão parcelada no cartão de crédito e não pagar uma prestação, isso não tem impacto na loja, que já vendeu e fez a parte dela. É problema do banco.

A escola funciona numa operação semelhante [à do varejo no passado]: vende um curso anual de educação que custa em média 12 mil reais. Como ninguém tem esse valor para pagar na hora, ela parcela em 12 vezes e mantém um departamento financeiro que faz a parte de recebimento, reconciliação, interação e negociação. No fim, todo o risco dessa operação continua dentro da escola.

O que a gente resolveu criar foi essa mesma disrupção dentro do setor de educação, uma forma de deixar a escola focada no core, que é o pedagógico

O isaac atinge dois objetivos: desonerar a escola do estresse dessa operação – que é muito específica, complexa e custosa – e, ao mesmo tempo, tirar o risco da operação, porque uma vez que a escola faz a matrícula, tem certeza de que o dinheiro vai chegar para ela.

Isso faz com que a escola tenha mais tempo e staff para se planejar melhor, uma vez que não fica exposta a suscetibilidade macroeconômica. Quer dizer, a gente replica para as escolas o que os bancos fizeram para o varejo.

Outros produtos – como crédito para a escola e refinanciamento estudantil – serão lançados?
Quando nos posicionamos assim, também podemos oferecer os demais produtos bancários, aproveitando que temos um canal de contato com o cliente, e o ajudamos a crescer, dando capital – algo escasso para as escolas – para investirem no crescimento e expansão da operação.

Já começamos a pilotar isso; porém, é um recurso que a gente não transfere livremente. A escola precisa apresentar um plano de reforma, ampliação ou de construção de uma sala especial para aquele recurso ser usado para o crescimento dela.

E temos capacidade de ajudar não só com recurso financeiro, mas até com os fornecedores, as contas de viabilidade…, para fazer aquilo funcionar e ter retorno.

Do lado dos pais, a gente já começou a entender que existe uma parcela pequena de consumidores que não consegue pagar, não consegue de fato estar naquela instituição; e tem muitos que adorariam que o filho continuasse estudando, mas tiveram algum revés, um problema pontual.

Começamos a prototipar o que chamamos de projeto evasão zero, que permite a esses responsáveis financeiros retomarem a estrutura financeira familiar até o momento em que podem voltar a pagar 

Às vezes, isso é mais temporário do que parece… é um comerciante que teve três meses ruins, a loja dele estava fechada na pandemia. Ou é um dentista que não pôde atender.

Quando a gente constrói uma ponte mínima, a pessoa tem o maior interesse em pagar aquilo, porque ela quer que o filho tenha educação de qualidade.

O que vai vir pela frente é a gente não só evoluir nessas duas camadas, como ajudar a escola a crescer com informação. Às vezes, a escola tem dificuldade de entender de onde vêm os clientes dela? Pra quem ela perde os clientes? Se aquele bairro está ampliando ou não? Quais anos são mais rentáveis, e quais menos?

Se a gente municiar a escola com esses dados, ela toma decisões melhores e, como consequência, ajudamos a escola a crescer.

Essa parte de analytics parece ser um trunfo do isaac. Como funciona na prática?
Esses dados são apresentados em um relatório. Já no processo de matrícula, a gente consegue sugerir decisões, como, por exemplo, ampliação de determinada turma porque tem muita demanda, ou conceder desconto no período da tarde para trazer mais alunos.

Como a escola é um business de custo fixo forte, incrementos – mesmo que marginais – têm um impacto grande na lucratividade. Se esse modelo básico de gestão permitir que a escola cresça 5% [no número de alunos], isso pode representar 25%, até 30% a mais de lucro. Isso permite que ela pague melhor o professor, amplie, invista 

Estou vendo muitas escolas que usam o isaac crescerem. O Brasil teve um problema grande de evasão nas escolas [durante a pandemia] e a nossa base de clientes cresceu mais de 10% em média, acima do mercado.

Tem casos de escolas que cresceram 40%… Outras ficaram do mesmo tamanho, algumas caíram – mas crescer mais de 10%, na média, mostra que estamos acelerando bastante o crescimento dos clientes.

Se a gente conseguisse fazer isso em larga escala no Brasil… se você crescer 10% o número de pessoas que têm acesso à escola – hoje, seriam quase 1 milhão de pessoas [a mais] –, transforma a sociedade!

Essa parte de ciência de dados deve crescer dentro da empresa?
Eu acho que sim, mas é importante entender o BI. Hoje, o baixo nível de visibilidade do que acontece e a ausência de benchmarkings fazem com que a escola tenha decisões piores. Ela está powerless.

Quando você é um sistema operacional alinhado com o crescimento da escola – como o isaac é –, tem acesso a uma estrutura grande de informações e consegue trazer, de uma forma didática e organizada, sugestões do que a escola deveria fazer… Quando você dá visibilidade, empodera a escola para tomar boas decisões.

O que estamos construindo agora é a outra ponta, depois da escola tomar as decisões. Por exemplo, se ela conclui que precisa expandir, nós damos o recurso, um fornecedor e um projeto. É muito mais fácil do que a escola ter de aprender e buscar recursos sozinha 

A gente acaba tirando toda a fricção do crescimento da instituição. Ela começa a se conscientizar de que se fizer um bom trabalho pedagógico, entregar bons resultados, vai ter estrutura e apoio para crescer.

Isso tem um poder grande. É parecido com plataformas de e-commerce como Shopify, Amazon e Mercado Livre, que te olham e dizem: “Eu vou te ajudar, vou te dar ferramentas, visibilidade, infraestrutura, porque quanto mais você vender, melhor pra mim.”

Essa visão do isaac é para mais de sete anos… um ciclo mais longo que os anteriores?
Acho que existe uma beleza grande no compounding, no impacto dos juros compostos…Traduzindo para a realidade de negócios: é difícil começar do zero, reunir o primeiro grupo de pessoas, trazer os primeiros clientes, ter os primeiros aprendizados.

Quando você começa a fazer isso todo dia, vai melhorando… como uma máquina que se retroalimenta e cresce. É como se fosse um movimento – e, aí sim, a inércia é continuar crescendo.

Quando você olha a história de 30 anos, vê o tamanho do impacto causado. Acho que se ela for dividida em quatro ou cinco “minihistórias” de seis anos, o impacto – mesmo que somado – seria muito menor.

O isaac é minha última trajetória empreendedora. Quero ficar aqui enquanto achar que contribuo – e espero que essa seja uma jornada de 70 anos! Vejo um valor muito grande em reunir um monte de gente boa para olhar um determinado problema, por muito tempo. Acho que assim a magia acontece, as soluções aparecem

Não consigo dizer o que o isaac vai ser ou se será bem-sucedido. Mas tem algo que acho que vai acontecer, e já fico superfeliz com isso: o isaac está trazendo para o setor de educação um monte de gente boa e bastante capital. Esse capital intelectual e financeiro está sendo dedicado a uma missão exclusiva.

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