Ex-office boy, ele empreendeu, faliu e chegou a dever milhões de reais. Hoje, é sócio de startups e de um fundo de venture capital

Thiago Oliveira - 1 abr 2022
Thiago Oliveira, investidor e fundador de startups como a Zebra Câmbio e a Conselho Virtual.
Thiago Oliveira - 1 abr 2022
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Quem me vê hoje em dia atuando como pai de uma família linda, com dois filhos maravilhosos (parte principal da minha vida), sócio-proprietário de algumas empresas e startups, investidor, autor e conselheiro não faz ideia de tudo que lutei, chorei e precisei conquistar para chegar até aqui.

Apesar da minha vida ter mudado muito nesses 24 anos de empreendedorismo, alguns princípios nunca mudaram — e foram eles que me guiaram nesse caminho.

São eles, a fé de que Deus estava no comando (e que as coisas iam dar certo no final), a certeza de que nós somos tudo o que superamos — e não aquilo que conquistamos — e que, principalmente, empreender com propósito é a melhor saída.

UM MONZA 94 E UMA IDEIA NÃO OUVIDA PELA GERÊNCIA. OU: COMO TUDO COMEÇOU

Em 1998, quando não imaginava chegar aonde estou, comecei a minha carreira como office boy pelas ruas de São Paulo.

Dois anos depois, com um Monza 94, emprestado do meu pai, passei a trabalhar como motorista agregado, entregando produtos e documentos.

O que isso significava? Eu tinha um emprego sem garantias, como registro em carteira e contrato… Só que isso já significava muito na época — e me ajudou a pensar no meu próximo passo.

A grande questão era que o carro mais quebrava do que me ajudava no trabalho. Então comecei uma batalha de “entrega e empurra” pelas ruas.

Mesmo com todos esses problemas do Monza, identifiquei que o sistema de entregas tinha uma necessidade grande a ser resolvida. E que eu poderia solucionar esse problema e tornar o serviço muito mais eficaz.

Sugeri ao meu chefe na época algumas melhorias para o serviço, pois estava incomodado com a forma com que tudo acontecia e sabia o que fazer para melhorar…, Mas ele não me deu atenção, e assim o modelo de entregas seguiu o mesmo

A ideia não saía da minha cabeça e acabei comentando com um amigo, em uma conversa informal. Momentos depois ele se tornou meu sócio na IS Log & Services, empresa de logística. Isso aconteceu em 2002. Peguei um pequeno capital emprestado, aluguei uma sala, comprei um telefone e comecei o negócio!

EU SÓ TINHA GRANA PARA ME ALIMENTAR DE BISCOITO. ENQUANTO ISSO, A CONCORRÊNCIA ME ENGOLIA

Começar o seu negócio é libertador, pois você entra no mercado cheio de ideias e com propósito de trazer uma solução inovadora ao mercado.

Só que as coisas não melhoram da noite para o dia. O começo foi muito difícil. A empresa demorou para engatar e dar lucro.

Conquistei meu primeiro cliente só seis meses depois da IS Log & Services estar no mercado. Nesse período, passamos por situações complicadíssimas.

O biscoito Club Social, que todo mundo conhece, virou o meu almoço. Estávamos com falta de capital de giro, pouco dinheiro e aquilo era tudo o que podíamos comprar

Após dois anos como empreendedor, eu contava com 80 colaboradores e, ainda assim, não conseguia fechar as contas da empresa.

A concorrência me engoliu. Enquanto eles cresciam estrategicamente, eu ficava cada vez menor. Eis o meu primeiro grande erro. A falta de uma estratégia para o meu negócio.

Fica aqui o meu conselho para você que deseja empreender: é necessário ter um plano muito bem estruturado — de preferência no longo prazo — e saber que desvios vão ocorrer no caminho. A economia é instável e você precisa se adaptar para sobreviver.

ACUMULEI MILHÕES DE REAIS EM DÍVIDAS, ALÉM DE NOITES MAL DORMIDAS E MUITOS QUILOS A MAIS

Demorei cinco anos para formar um time, de fato, na IS Log & Services.

Porém, pela falta de planejamento — e devido a promessas irreais que acabei fazendo ao longo do caminho —, cheguei em 2007 com despesas de 400 mil reais e faturamento de apenas 100 mil…

A empresa às vezes não tinha dinheiro para o pedágio; em outro momento, não havia nem sequer para abastecer os veículos e sair para trabalhar.

A situação se complicou de tal forma que cheguei a atrasar o pagamento dos meus colaboradores em dois dias. O resultado, você já deve imaginar: a empresa quebrou…

Com isso acumulei não só uma dívida de 2 milhões de reais junto ao banco, mas noites mal dormidas, preocupações, problemas psicológicos e financeiros… Cheguei a pesar 110 kg. Tudo isso aos 28 anos

Sem dúvida, foi uma das piores experiência da minha vida. Em meio a esse caos, precisei recuar e me reorganizar. Entendia que era o momento de voltar uma casa para andar duas (ou mais) depois.

MESMO QUEBRADO, CONVENCI MEU TIME QUE IRÍAMOS VOLTAR AO MERCADO E ABRIR FILIAIS. E DEU CERTO

Comecei a analisar minha trajetória, o que poderia ter sido feito diferente. Restabeleci canais de humildade dentro de mim e, não posso deixar de fora, utilizei o poder da oração.

Precisei ter fé de que as coisas iriam melhorar e que eu iria sair dessa situação.

Mesmo devendo muito dinheiro, após seis anos lutando e vencendo obstáculos consegui encontrar o modelo ideal e escalonável para o meu negócio.

E, sim: mesmo quebrado, consegui convencer meu time que iríamos voltar ao mercado e abrir filiais pelo Brasil.

Parecia loucura, a princípio, mas algo me indicava que esse salto de fé era o caminho certo. Convenci os colaboradores, conquistei um parceiro — do qual aluguei 21 caminhões — e a IS Log & Services começou a entrar nos eixos.

Em 2009, o meu negócio chegou a 24 filiais, cerca de 750 colaboradores e, em 2010, começamos a ter dinheiro em caixa.

A EMPRESA CRESCEU DEMAIS E ME VI SEM CONDIÇÕES DE SEGUIR À FRENTE DELA

Foram oito anos até chegar nesse momento. Por isso, para encurtar o caminho, é necessário ter desde o começo um planejamento estratégico. Coisas grandes demoram para vir; é necessário ter inteligência, fé e conhecimento de mercado.

Com a IS Log & Services dando muito lucro, cada vez mais pessoas sendo contratadas para nosso time e o fluxo crescendo, encontrei um problema.

Sim: mesmo em um dos melhores momentos da minha carreira como empreendedor, achei uma situação que me incomodava

Chamei esse momento de “A rolha saiu da garrafa”. Mas por que esse nome? O meu negócio cresceu tanto que já não me sentia parte dele.

Não me via mais com as habilidades para gerenciar a empresa com o tamanho que ela alcançou. Não me sentia mais afiado… Estava paralisado.

Foi aí que eu recebi uma oferta irrecusável e vendi o negócio. O fator financeiro e o planejamento a longo prazo da minha família pesaram na decisão.

Era hora de buscar novos voos e desafios de mercado.

DECIDI VOLTAR AO ECOSSISTEMA EMPREENDEDOR — AGORA, TAMBÉM COMO AUTOR E INVESTIDOR

Depois de receber a “oferta da minha vida” pela empresa, comecei a explorar outras possibilidades no universo dos negócios.

Após muito aprendizado, obstáculos, quebrar feio e perder muita coisa, lancei um livro para compartilhar esse meu conhecimento, o Pense Dentro da Caixa (Editora Gente).

Outra coisa que aconteceu foi a mudança para os Estados Unidos. Decidi estabelecer a minha família na Califórnia. E, após um tempo de calmaria, resolvi voltar ao universo dos negócios e empreendedorismo — mas de uma maneira diferente.

Me tornei investidor, conselheiro e acionista. Além disso, comecei a estudar sobre empresas de tecnologia e saber mais sobre esse mundo cheio de transformações constantes.

Liguei meu radar e voltei ao mercado. Comecei a entender como as empresas estavam, quais eram as necessidades das pessoas…

Nessa retomada, em 2016, me tornei investidor e membro do Conselho de Administração da Gerando Falcões; comprei participações e me tornei também sócio e conselheiro da ACE Startups

Dois anos depois, publiquei, como co-autor (junto com João Kepler), o livro Os segredos da Gestão Ágil por trás das empresas valiosas (Editora Gente).

FUNDEI MAIS TRÊS EMPRESAS, INCLUSIVE UMA QUE OFERECE A OUTROS EMPREENDEDORES A AJUDA DA QUAL PRECISEI

Desde 2019, sou sócio-investidor da Bossa Nova, o maior fundo de venture capital da América Latina. Em 2020, fundei a Oliveira Foundation, com a minha esposa, e a fintech Zebra Câmbio.

Não parei por aí. Ainda em 2020, fundei o Conselho Virtual. Este último empreendimento foi criado para ajudar outras empresas a solucionarem problemas pelos quais eu também passei

Durante a minha jornada, percebi que o empreendedor precisa ter alguém para auxiliá-lo, seja com problemas de governança ou na estruturação do seu negócio — e me senti na obrigação de fazer isso.

No Conselho Virtual, somos mais de 500 CEOs dispostos a ajudar empresários, atuando como um conselho consultivo de maneira acessível.

MUITA COISA MUDOU, MAS  CONTINUO SEM CARTEIRA ASSINADA (O QUE NO MEU CASO NÃO É UM PROBLEMA!)

O Thiago de São Miguel Paulista, que começou tudo com um Monza 94, na batalha do “empurra e entrega”, e chegou a ter um Club Social de almoço, hoje vive uma vida que mesmo em sonho parecia impossível.

Mesmo assim, e mesmo longe, jamais esqueci da minha terra natal. Continuo acreditando no Brasil e investindo em pessoas com ideias incríveis e que empreendem com propósito.

Outra coisa que permanece igual são os meus princípios. Ainda continuo aquela pessoa que tem fé em Deus e na oração.

Continuo também como aquela pessoa que nunca teve sua carteira de trabalho assinada. Afinal, o sucesso é muito relativo — assim como a importância (ou não) de ter a carteira preenchida

Posso te dizer uma coisa? Você é muito mais do que o seu currículo. Você é aquilo que superou a vida toda para chegar aonde está.

 

Thiago Oliveira é sócio-proprietário da Bossa Investimentos, da Ace Startups, da Zebra Câmbio e da Conselho Virtual. É fundador da Oliveira Foundation e investidor e membro do Conselho de administração da Gerando Falcões. Também atua como conselheiro de empresas e é autor de dois livros. 

 

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