Não é nem pivotar: a Brewcicleta passou por uma reviravolta em que só restaram o nome – e as cervejas

Armando Aguinaga - 8 jun 2017Em novo cenário, os fundadores da Brewcicleta repetem a foto para o Draft: Leo e Mari (de cabelo novo) com o gato Haroldo e sua nova companheira, Mafalda (foto: Felipe Scapino).
Em novo cenário, os fundadores da Brewcicleta repetem a foto para o Draft: Leo e Mari (de cabelo novo) com o gato Haroldo e sua nova companheira, Mafalda (foto: Felipe Scapino).
Armando Aguinaga - 8 jun 2017
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Em novembro de 2015 contamos a história da Brewcicleta aqui no Draft, lembra? Uma empresa carioca, cheia de estilo, que vendia cervejas especiais e artesanais e fazia as entregas de bicicleta. Pois bem. Semana passada voltei a conversar com a Mari Rodrigues, fundadora da empresa, ao lado do marido Leo Araripe, e ela contou que tudo mudou — ou quase tudo.

“Eu e o Leo continuamos juntos, na vida e nos negócios. O nome foi mantido e a gente continua vendendo cervejas artesanais. Mas todo o resto nós mudamos”, diz ela. Esse “todo” tem a ver com a localização da empresa e, também, o modelo de negócio. A Brewcicleta saiu do Rio de Janeiro e agora funciona no litoral paulista. Também saiu do asfalto e agora tem uma loja, um ponto de venda fixo. Mais do que “pivotar”, o que eles fizeram foi uma reviravolta completa.

A Brewcicleta apareceu no Draft pela primeira vez há dois anos (clique na foto para ler a reportagem).

A Brewcicleta apareceu no Draft pela primeira vez há dois anos (clique na foto para ler a reportagem).

“Em maio de 2016 a gente começou a se ligar que o nosso contrato de locação ia vencer e começamos a avaliar as opções. Chegamos à conclusão que estávamos cansados do Rio. A empresa estava crescendo, tínhamos amigos e clientes queridos mas precisávamos mudar de ares. Cansamos! No dia 7 de agosto nos mudamos para Ubatuba, onde inauguramos um ponto de venda tradicional”, conta ela.

O casal escolheu Ubatuba por estar perto da capital paulista (cerca de 4 horas de carro) mas não tão longe do Rio — e mais perto ainda de Ribeirão Preto (no interior de São Paulo), a cidade natal da Mari. Ela fala da nova cidade e das mudanças que impôs ao negócio: “Ubatuba é uma cidade pequena, um balneário com movimento sazonal. A cultura cervejeira é muito pequena. Não tínhamos porque seguir com o delivery de bicicleta”.

Leo enumera algumas vantagens da cidade pequena e diz que a bicicleta segue na vida do casal como meio de transporte e lazer. Ele também conta como foi abandonar uma capital para viver numa comunidade bem menor: “Aqui o ritmo de vida é mais tranqüilo e, com isso, conseguimos nos dedicar mais à loja e à nossa vida particular. Fazemos tudo de bike: ir a praia, ir para o trabalho, passeios, compras etc. Ubatuba tem uma estrutura com ciclovias e a bicicleta é um dos principais meios de transporte mais usados por todos”.

Ele diz que desde que chegaram eles encontraram muitas outras famílias que fizeram o mesmo movimento de se mudar para buscar qualidade de vida. “Já fizemos várias amizades aqui mas, como nada é perfeito, às vezes sentimos falta de shows e eventos culturais de uma cidade grande. Tirando esse detalhe, estamos muito felizes em estar aqui”, conta ele. Mari emenda: “Aqui, moramos em uma casa de verdade, com um jardim cheio de árvores. Nossa rotina agora tem praia, mato, cachoeira e surf todos os dias. Era essa qualidade de vida que a gente buscava.”

Espera aí, mas está faltando uma coisa fundamental nessa história toda. E o Haroldo, o fotogênico gato do casal que se tornou o grande garoto propaganda da Brewcicleta na fase carioca? “Ele continua conosco, mas agora tem a companhia da Mafalda que é a gatinha irmã dele”, diz a empreendedora.

QUANDO A MUDANÇA DE LUGAR TAMBÉM TRAZ CONSCIÊNCIA

A loja foi inaugurada em novembro de 2016 para aproveitar a alta temporada. A estratégia foi surfar com a alta demanda do verão, dos feriados e do Carnaval (quando a população da cidade infla com o enorme fluxo de paulistanos em busca de mar e… cerveja) para fazer caixa e pagar parte do que foi investido na troca de cidade e abertura da loja física. A mudança foi também uma oportunidade pra ela aperfeiçoar o que não funcionava direito.

“No Rio a gente não tinha controle de nada que fazia, estoque, financeiro, nada… Eu me sentia um cachorro correndo atrás do próprio rabo”

Então, aproveitando o clima de recomeço, ela buscou ajuda. Começou a fazer workshops e a aproveitar os cursos e consultorias do Sebrae. “Agora entendo a importância dessa parte administrativa”, diz a empreendedora — que desde a nossa primeira entrevista confessou ter horror de planilhas de Excel.

À frente de uma loja física, o casal de empreendedores tem equilibrado as contas e fez as pazes com a burocracia: mais controle e maturidade para crescer.

À frente de uma loja física, o casal de empreendedores tem equilibrado as contas e fez as pazes com a burocracia: mais controle e maturidade para crescer (foto: Felipe Scapino).

Hoje ela se considera uma pessoa mais organizada e experiente. Conseguiu consolidar a saúde do negócio e deixar tudo redondo para o próximo verão. Aliás, é justamente essa sazonalidade o grande desafio do negócio agora. “Por causa da oscilação das temporadas, preciso ter cuidado redobrado. Muitos negócios que abriram junto com a gente no verão já fecharam. Abre, bomba e fecha depois do Carnaval, é uma opção dos comerciantes aqui”, diz. Ela conta que ouve muito desejos de “tomara que vocês vinguem e sobrevivam até o próximo verão” e fala de como se sente:

“Aqui parece um pouco com a série Game of Thrones e o famoso ‘winter is coming’… Mas no frio o povo também bebe, né?!”

Ela segue confiante e afirma que, financeiramente, tudo também mudou bastante na Brewcicleta. Impossível fazer diferente, eles gastaram muito para conseguir inaugurar na alta temporada. Neste período de baixa, diz, estão empatando as contas, mas ela sente que claramente o faturamento é bem maior do o obtido no Rio. Vê, nisso, um amadurecimento —do negócio e, também, dos empreendedores: “Lá no Rio a gente entregava cerveja para clientes fiéis, happy hours de amigos. Era muito bacana, uma coisa meio hippie”.

Na loja, atualmente, só trabalham os dois. Eles conseguiram reunir quase 220 rótulos artesanais, além de oferecer duas opções de chopp. Todas as cervejas ficam expostas. Uma vez por mês eles fazem encontros de cervejeiros e workshops sobre o universo das cervejas artesanais. Cada um com um tema específico (por país ou por tipo de cerveja) e com degustação.

“Também pretendo montar uma confraria feminina aqui, para acabar com o tabu que de cerveja especial é coisa de fresca, coisa cara, ou só para homem”, diz Mari, que já tem o modelo do evento formatado: quer que seja exclusivo para meninas e gratuito, só com o custo dos rótulos degustados.

CRESCER JUNTO COM A COMUNIDADE, QUE TAL?

E eles não param aí. Mari e Leo contam que estão sempre apoiando produtores locais, buscando incentivar a produção de cervejas caseiras da região. É um senso de comunidade mesmo. Um ciclo virtuoso de quem aposta nesse segmento, contam. E Mari fala sobre como se sente puxando este fluxo: “No Rio a coisa está muito desenvolvida, mas em Ubatuba eu é que estou movimentando. Lá eu seguia. Aqui, preciso liderar. Se faço algo e outros comerciantes imitam é porque estamos no caminho certo”.

Ela acredita que o sucesso e principalmente a sobrevivência da nova Brewcicleta depende muito desse aculturamento. Dessa semente que está sendo plantada agora. “Vejo a Brewcicleta é como uma Igreja de conversão de Brahmeiros. O cara chega aqui e de cara fala: ‘Pô, não vou pagar 20 reais por uma cerveja!’, mas aí eu explico, o cara curte, entende, valoriza o produto e volta para buscar mais. Vamos chegar lá!”, diz Mari. Um brinde ao inverno!

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