Quebrar a terra e revolver o solo antes de uma nova semeadura é a função do arado, instrumento agrícola que dá nome ao estúdio criativo do artista visual Bruno Brito e do designer gráfico Luis Matuto.
Com sede na pequena Queluz, cidade de 13 mil habitantes no interior de São Paulo (quase na divisa com o Rio de Janeiro), o Arado não é só um estúdio criativo. É também uma marca e um instituto de pesquisa.
Tal qual a ferramenta que a nomeia, a empresa busca revirar aquilo que já existe e trazer à tona o que estava escondido – principalmente as memórias do rural brasileiro. Bruno afirma:
“Quando olhamos para três ou quatro gerações, as pessoas tinham uma conexão com a zona rural ou uma cidade muito pequena. E parte do reconhecimento que o Arado tem hoje é por conta disso. Nosso público está na cidade, mas há tempos flerta com essa memória de um passado não tão distante”
Como estúdio criativo, o Arado desenvolve projetos para negócios e iniciativas que querem se comunicar por meio de narrativas que remetem ao imaginário rural brasileiro.
Eles criaram, por exemplo, as capas de dois livros do sociólogo Carlos Alberto Dória sobre a culinária brasileira, ambos publicados pela editora Fósforo; a identidade visual do restaurante paulistano Lobozó, focado em culinária caipira; e também a identidade do Sacolão Amazonas, em Belo Horizonte, projeto que foi inspirado nos comércios populares brasileiros.
Em maio de 2021, o Arado lançou sua loja online com artigos autorais, como cartazes, ilustrações, calendário e até cachaça, produzidos de forma artesanal a partir das pesquisas e vivências.
Já a pesquisa é a parte não remunerada do negócio, pelo menos não diretamente, embora seja a base de tudo que é feito. “Nosso foco não é só a produção visando o lucro”, explica Luis. “Temos projetos de pesquisa que são alimentados com o dinheiro dos serviços e da loja.”
O Arado começou em 2018 como uma marca criada por Bruno para vender camisetas, cartazes e produtos de marcenaria que ele mesmo fazia. Por trás de cada item havia uma pesquisa originada nos interesses pessoais dele.
Aos poucos, ele foi percebendo que o interesse pelo conteúdo era maior do que pelos objetos em si.
“Produtores rurais, donos de restaurante, chefs e até instituições ligadas ao campo começaram a me procurar pra desenvolver projetos gráficos. Ou seja: viram que o Arado dominava um vocabulário visual e conceitual que eles precisavam”
Esse vocabulário é alimentado com um trabalho de pesquisa formal, mas também pelas vivências dos sócios, que trazem o universo caipira na sua própria origem e interesse pessoal. Bruno é de Jacareí, interior de São Paulo; Luis, natural de Alfenas, no sul de Minas Gerais.
Registros fotográficos feitos em viagens, livros e ilustrações antigas e até embalagens fazem parte do acervo bibliográfico e imagético que fornece a matéria-prima necessária para os processos criativos. Segundo Bruno:
“Dificilmente a gente vai entrar no Pinterest em busca de referências, porque não queremos cair em cacoetes visuais”
A ideia é crescer gradativamente esse acervo para documentar a memória visual brasileira e ser uma referência da memória gráfica, de costumes, gestos, ingredientes ou arquitetura.
“Embora a gente tenha crescido muito no âmbito da alimentação, falar do rural é falar de todas as dimensões da vida, inclusive uma faceta urbana”, avalia Bruno.
O Arado começou a operar de fato como um estúdio criativo que presta serviços para terceiros em 2019, um pouco antes da pandemia.
Como os principais clientes eram restaurantes, quando as medidas de isolamento social foram declaradas, bateu um medo de que o negócio parasse.
“Fiquei preocupado porque achava que os restaurantes iam falir e eles eram nossos maiores propulsores”, diz Bruno.
No fim das contas, aconteceu o contrário e o estúdio ganhou força.
“Na verdade, a gente cresceu pra caramba, porque [as pessoas] viram que tínhamos histórias pra contar e um design muito ajustado a um conceito que está em pauta, que é essa valorização do pequeno produtor e do artesanal. Então, tivemos muito trabalho nesses quase dois anos de pandemia”
A previsão é fechar 2021 com um faturamento de 300 mil reais, número que inclui as vendas da loja online, lançada em maio deste ano para comercializar a produção autoral da marca. São criações próprias que seguem o tripé da utilidade, educação e decoração.
O estúdio acaba de lançar o calendário 2022, que tem como tema os “Pássaros Cantores Brasileiros”. São 12 gravuras de pássaros que podem ser destacadas e usadas como um objeto decorativo.
Em três semanas foram vendidas 500 unidades (99 reais, cada). Ao todo, serão 700 calendários que devem se esgotar na primeira metade de dezembro.
Ao mesmo tempo que colocava a loja no ar, a dupla decidiu tirar o pé do acelerador na parte de serviços, não aceitando novos projetos para se dedicar apenas à criação e comercialização da produção autoral. Segundo Luis:
“Isso nos deu uma liberdade muito grande, porque não ficamos com total dependência dos clientes”
Hoje, a loja representa um faturamento médio de 15 mil reais por mês, mas os sócios acreditam que é perfeitamente possível que esse número cresça. A estratégia é lançar um novo produto a cada três meses, para sempre manter o frescor.
“Não vamos morder a isca de lançar produtos todos os meses pra sempre ter um pico de vendas”, diz Bruno. “Se fizermos isso, minha intuição diz que vamos perder a novidade.”
Luis vive em Belo Horizonte; Bruno, em Queluz. Essa, aliás, é uma peculiaridade do Arado: enquanto toda a impressão é realizada na capital mineira (onde estão as pequenas gráficas parceiras), o estoque se encontra na cidade paulista.
Portanto, é do correio de uma cidade de 13 mil habitantes que os produtos são despachados para todo o Brasil. A intenção, com isso, é ajudar no desenvolvimento do município. Mas, claro, há desafios.
A própria dinâmica dos Correios é um obstáculo. Queluz tem apenas uma agência. Quando foi preciso despachar um lote de 70 pedidos em plena pandemia, muitos moradores precisaram esperar um bom tempo na fila…
O lado bom, segundo Bruno, é que isso gera uma pressão positiva para melhorar o serviço.
“Do ponto de vista de negócio, o que estamos fazendo é meio burro: seria mais lógico despachar tudo de Belo Horizonte. Mas eu também estou envolvido no desenvolvimento da cidade — e criar essa operação aqui é movimentar um pouco a economia local”
Hoje, o Arado conta com duas pessoas que dão apoio nessa parte de logística.
“Tem também uma narrativa nisso”, diz Bruno. “O produto é despachado de uma cidade que pouca gente sabe onde fica – e, aos poucos, vamos colocando esse nome no mapa”.
Mesmo com o propósito de valorizar o rural e ajudar no desenvolvimento de uma pequena cidade, eles sabem que precisam olhar para o mercado para sobreviver enquanto negócio. Tanto que já vislumbram a possibilidade de ter um ponto de venda em São Paulo, onde está a maior parte do público do Arado.
Dedicar-se à produção autoral não significa abandonar completamente o trabalho para terceiros.
A estratégia dos sócios é seguir assumindo projetos de terceiros, mas em menor quantidade, pegando apenas aquelas com uma certa robustez financeira. Assim, poderão dedicar mais tempo à sua produção autoral.
Se eles fossem continuar focados na prestação de serviços, explica Bruno, isso exigiria contratar um gerente de projetos e manter uma rotina mais estruturada — uma dinâmica que não combina com a proposta do negócio.
“Pra nós, isso não funciona porque existe uma subjetividade no dia a dia… Quando sentimos que um produto precisa ser maturado, seguramos um tempo — assim como não abandonamos uma ideia maluca ou trabalhosa se for conceitualmente importante”
Essa escolha traz seu preço. “Temos uma remuneração modesta — mas fazemos da maneira que queremos”, ,diz Bruno.
Não só o tempo para a execução dos trabalhos é importante.
O alinhamento dos clientes com o propósito do estúdio também precisa ser pesado na balança.
E, nessa hora, surgem alguns dilemas. Por exemplo: o que fazer diante da demanda de corporações pela expertise do Arado?
“Esse assunto é polêmico. Quando surge a oportunidade de prestar serviços um pouco maiores para grandes empresas, a gente pensa: por que não pegar isso e fazer um negócio relevante, que nos dê fôlego para continuar fazendo o que fazemos?”
Até agora, Bruno e Luis realizaram um único projeto para uma grande companhia. Eles preferem não divulgar o nome — e dizem que, por falta de alinhamento, não repetiriam a experiência.
Novos projetos, porém, não estão descartados.. Aparentemente, esse interesse corporativo vem aumentando, junto com o movimento (alavancado pela pandemia) das pessoas quererem se aproximar mais do rural e de uma vida no interior.
“Algumas empresas têm nos buscado porque a gente domina um assunto que, de alguma forma, é inovador. Não existe uma [outra] agência ou estúdio no Brasil voltado pro rural. O Arado preencheu essa lacuna que envolve tanto pesquisa quanto design”
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